Ronaldo Vielmi Fortes
390 | Verinotio
NOVA FASE
ISSN 1981 - 061X v. 27 n. 1, p. 352-393 - jan./jun. 2021
Hartmann. Tanto mais interessante e importante é constatar que suas
tentativas sérias de criar uma ontologia da natureza o levaram de múltiplas
maneiras às suas imediações, mesmo que isso nem sempre tenha ocorrido
com plena consciência. Longe de nós afirmar que, na ontologia de Hartmann,
esse método teria sido executado de modo sistematicamente concludente.
Porém, desde Marx, ele constitui o enfoque inicial para superar, por um
caminho novo, as inevitáveis antinomias das ontologias anteriores. E, mesmo
que sejamos obrigados a negar que Hartmann tenha tido plena consciência
de sua própria tentativa, não há a menor dúvida de que, como foi mostrado
aqui, seus instintos filosóficos e sua rejeição clara e consciente das
tendências falsas de seus contemporâneos o impeliram nessa direção. Muitas
de suas observações singulares mostram que, com bastante frequência, ele
vislumbrou com clareza momentos singulares, relações singulares,
consequências necessárias desse método (LUKÁCS, 2012, p. 149).
Duas importantes considerações ficam evidentes nessas palavras: primeiro, é o
método de investigação e de apreensão marxiano da realidade plenamente
desenvolvido que ilumina as “tentativas sérias” de Hartmann na criação de uma
ontologia da natureza. Segundo: se há um método correto em Hartmann, esse se
efetiva sem plena consciência, é muito mais fruto da rejeição “das falsas tendências de
seus contemporâneos”. Mesmo assim, quanto às impostações falsas da atualidade,
segundo Lukács, a relação de Hartmann com elas não consistia em uma “atitude de
pensar criticamente a fundo as impostações falsas da atualidade ou do desvelamento
histórico-social das fontes dessas tendências”, mas sua força estava muito mais em
“ignorá-las, não em decifrá-las” (LUKÁCS, 2012, p. 150). É sua imediação com o
método plenamente consciente em Marx o critério da correção de seus procedimentos.
Em suma: é Marx quem permite iluminar o pensamento de Hartmann e não o contrário
.
Vale citar, por fim, outra consideração esboçada por Lukács:
Uma crítica cuja intenção seja explicitar as limitações e a problemática da
ontologia hartmanniana de maneira justa, desenvolvendo a filosofia, deve
buscar um ponto de partida essencialmente imanente, isto é, que dê atenção
aos momentos nos quais se manifesta a inconsequência de Hartmann, aquela
estreiteza interna, que faz parar a meio caminho ou até impele para uma
direção por princípio errada aquilo que por ele – em termos bem genéricos
e muitas vezes apenas de modo abstrato – foi intencionado de maneira
correta (LUKÁCS, 2012, p. 150).
Mesmo quando elogiosas, as ressalvas são duras e incisivas: as corretas
intenções de Hartmann somente estão presentes “em termos bem genéricos” e “de
modo abstrato”. A “estreiteza interna” de seu pensamento o impede de extrair as
consequências corretas presentes de forma parcial em sua filosofia. Merece destaque
as severas críticas de Lukács a Hartmann, conforme já mencionado, concernentes ao
seu caráter professoral, à ausência sintomática da dialética em seu pensamento: é
necessário, dados os limites de Hartmann, retomar os grandes dialéticos, ou seja, a
Hegel e a Marx, escreve Lukács ao final de sua crítica a Hartmann. Essas palavras