Sobre “O ideal e a ideologia” em Para a ontologia do ser social de G. Lukács
segundo Lukács, que o direito se transforma “em ideologia no sentido
pejorativo” (VAISMAN, 2010, p.53).
Os procedimentos abstrativantes típicos da área jurídica, com vistas a criação de
normas e leis, procuram generalizar também normas espontaneamente produzidas,
sobre as quais, inclusive, se apoia. É evidente, entretanto que tal processo ocorre na
realidade por meio de múltiplas mediações, não podendo ser concebido de forma
linear e mecânica. Ademais, a generalização abstrativante que lhe é típica tem por
função tornar os regramentos aplicáveis, por princípio, a todos e em toda e qualquer
circunstância.
O direito como corpo coerente e sistemático, instrumento de
resolução dos conflitos sociais cotidianos, reflete de forma
aproximada as características da vida econômica, sem, no entanto,
configurar um reflexo mecânico e deliberado desta; mas, precisamente
para ser instrumento de resolução dos conflitos, cuja direção é dada
pelos interesses da classe dominante, para sua real eficiência na
resolução daqueles, deve pretender o máximo de universalidade
possível naquele momento. Neste contexto, o direito não pode
configurar uma reprodução fiel da realidade econômica. (VAISMAN,
2010, p. 53).
No caso da ideologia do direito, o que importa, de acordo com Lukács não é sua
correção ou falsidade, em relação ao modo como retrata a vida, mas sim, se ainda que
que falso, desempenha com eficiência a sua função regulatória dos conflitos.
Ou dito em outros termos,
O direito é um corpo coerente e sistemático, que serve de instrumento,
pois, para a resolução dos conflitos sociais (em sentido amplo)
cotidianos imediatos, derivados do contexto produtivo. Resolução
essa que é dada a partir da perspectiva da classe dominante, numa
expressão, todavia, maximamente generalizante, ao limite da
sociabilização concreta alcançada. Assim, o direito, dentre as formas
específicas de ideologia, é aquela que desempenha a função mais
restrita, ou seja, mais colada à imediaticidade da vida cotidiana. Basta
pensar que está voltado precisamente à regulagem dos conflitos
cotidianos mais restritos e restringíveis, derivados dos processos de
reprodução material (VAISMAN, 2010, p. 53)
Além da análise do direito, outra forma específica de ideologia abordada por
Lukács é a prática política. Desde logo, o autor reconhece a dificuldade de delimitar
com exatidão seu âmbito como ideologia. Isso porque “Não pode haver nenhuma
comunidade humana, por menor que seja, por incipiente que seja, na qual e em torno
da qual não aflorassem ininterruptamente questões que, num nível desenvolvido,
habituamo-nos a chamar de políticas” (LUKÁCS, 2013.p 502). Ou seja, trata-se de um
modo de conscientizar e intervir junto a problemas que concernem à globalidade da
Verinotio
ISSN 1981 - 061X v. 28 n. 2, pp. 259-287 - jul-dez, 2023 | 277
nova fase