Romantismo ou Regeneração?
início da década de 80 do Século XIX até sua morte sobre sociedades pré-capitalistas
para além da Europa ocidental11.
A Rússia passou por transformações significativas desde a publicação do
Manifesto em 1848 até o prefácio à edição russa do Manifesto, já em 188212. Essas
transformações foram ressaltadas pelo prefácio, que exprimia o fato de que, na época
da publicação original do Manifesto, “a Rússia se constituía na última grande reserva
da reação europeia”; era a Rússia um dos países que “proviam a Europa de matérias-
primas, sendo ao mesmo tempo mercado para venda de seus produtos industriais” e,
de uma maneira ou de outra, era pilar da ordem europeia vigente (MARX; ENGELS,
2010, p.73). Mas foi após a publicação do Tomo I de O Capital que a Rússia figurou
como um elemento determinante na vida de Marx, não apenas pelo interesse teórico
que aquele país de dimensões continentais possuía, como também um interesse
político, afinal, Marx era o responsável dentro do Comitê Geral da Associação
Internacional dos Trabalhadores de estabelecer relações com esse país.
Teodor Shanin aponta para quatro eventos que marcam experiência política e
intelectual para o pensamento de Marx no período pós publicação de O Capital (ou
seja, após 1867): O primeiro, a Comuna de Paris, de 1871, que ofereceu uma lição
dramática e um tipo de poder revolucionário nunca visto antes; segundo um grande
avanço no campo da produção de conhecimento, que foi a descoberta da “pré-
história”, que trouxe as sociedades “primitivas” para dentro de um espaço de estudos
históricos e etnológicos; terceiro a ampliação do conhecimento das sociedades rurais
11 Mesmo assim, com uma peculiaridade que não pode deixar de ser notada, como demonstra o japonês
Haruki Wada: “o manuscrito do prefácio, marcado ‘Londres, 21 de fevereiro de 1881, foi rascunhado
por Engels; Marx fez apenas uma correção mínima e colocou sua assinatura. Diante do fato de que o
manuscrito que temos hoje tem uma passagem no fim que foi escrita uma vez, rasurada, e não reescrita,
é possível vê-lo como uma cópia limpa que Engels transcreveu ainda de outro manuscrito. Todos esses
fatores nos levam a concluir que Marx, que estava desanimado na época, pediu a Engels para fazer um
rascunho e o assinou. Que Marx não ficou totalmente satisfeito com o resultado pode ser deduzido da
carta que ele mandou a Lavrov com o manuscrito: ‘se esta peça, que é para a tradução do russo, for
para ser publicada como está, em alemão, ainda precisa de toques finais em seu estilo’” (2017, p.116).
Mesmo o único texto produzido por Marx como resultado das investigações finais de sua vida é dotado
de uma complexidade quanto à sua produção. Em conversa particular com Marcello Musto, que estudou
intensamente os aspectos teóricos e biográficos dos anos finais da vida de Marx (cf. Musto, 2018), o
marxista italiano/canadense afirmou não corroborar com a interpretação de Wada, e me confidenciou
que não encontrou, em nenhum momento durante suas investigações, indícios que pudessem endossar
tal interpretação.
12 Interessante adensar a esse ponto, o fato de que os estudos russos que Marx avançou até ali, “foram
interrompidos por um tempo considerável pela Comuna de Paris e, depois da derrota, pela luta interna
dentro da internacional. Foi só depois do congresso de Haia de setembro de 1872 que ele voltou à
teoria e à questão russa” (WADA, 2017, p.84)
Verinotio
ISSN 1981 - 061X v. 28 n. 2, pp. 335-352 - jul-dez, 2023 | 341
nova fase