DOI 10.36638/1981-061X.2025.30.2.774  
Lênin como advogado: um problema inicial no  
estudo do direito na obra leniniana  
Lenin as a lawyer: an initial problem in the study of  
law in Leninian work  
Pedro Rocha Badô*  
Resumo: No presente artigo, buscou-se avaliar a  
hipótese geral, e suas derivações teóricas, de que  
Lênin, em sua juventude, exerceu a advocacia  
como forma de luta social. Através da leitura do  
próprio texto leniniano, que implicou também em  
uma breve pesquisa biográfica, concluiu-se por  
uma fragilidade desta hipótese, notando-se que  
não só a breve atividade advocatícia de Lênin  
não teve papel significativo em seu esquema  
tático, como há a preponderância da luta política  
sobre a esfera direito, principalmente através da  
organização de um partido.  
Abstract: This article seeks to evaluate the  
general hypothesis, and its theoretical  
derivations, that Lenin, in his youth, acted as a  
lawyer as a form of social struggle. Through a  
reading of Lenin’s own text, which also involved  
a brief biographical survey, it was concluded  
that this hypothesis is fragile, noting that not  
only did Lenin’s brief activity as a lawyer not  
play a significant role in his tactical scheme, but  
there was also a preponderance of political  
struggle over the sphere of law, mainly through  
the organization of a party.  
Palavras-chave: Lênin; advogado; direito;  
política.  
Keywords: Lenin; lawyer; law; politics.  
Introdução  
A atenção que o tema do direito na obra de Lênin ganhou nos últimos anos no  
Brasil proporcionou uma série de estudos a esse respeito com enfoque em diferentes  
obras e diferentes momentos da vida do revolucionário russo. Exemplo disso é que  
enquanto no artigo Lênin e o direito de Pedro Ferreira (2017) podemos encontrar  
apontamentos sobre a questão dos tribunais nos textos leninianos de 1899 e 1901,  
e na obra Filosofia do direito de Alysson Mascaro (2014), no subtópico intitulado “O  
direito em Lênin”, uma análise a respeito do direito restrita à obras O estado e a  
revolução de 1917, em A questão do direito em Lênin, Jair Pinheiro (2015) aborda a  
temática jurídica a partir do período pós-revolucionário na Rússia.  
Parece-nos, entretanto, que uma das vertentes que mais tem ganhado fôlego  
em meio essa profusão de estudos é aquela que defende com variada ênfase e  
diferentes matizes a ideia de que Lênin, principalmente durante sua juventude, fez  
da advocacia uma forma de atuação na luta de classes da Rússia. E é precisamente à  
*
Doutorando em direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). E-mail:  
pedrobado.doc@gmail.com. Orcid: 0000-0001-7214-4378.  
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Lênin como advogado: um problema inicial no estudo do direito na obra leniniana  
análise desta ideia que dedicamos o presente artigo.  
Nosso objetivo, portanto, é estabelecer um diálogo com os textos que têm  
sustentado tal argumento a começar pelo o pioneiro ensaio Lênin e os problemas do  
direito de Pachukanis contrastando com uma atenta leitura dos textos do próprio  
Lênin, principalmente daquele que é considerado sua obra política inaugural, os  
opúsculos de 1894 Quem são os “amigos do povo” e como lutam contra os sociais-  
democratas?  
A fragilidade da ideia de um “Lênin advogado”  
A argumentação de Pachukanis (2018, p. 1904) de que “tanto o fetichismo da  
forma jurídica”, quanto “seu completo oposto” – isto é, “a incapacidade de  
compreender o verdadeiro significado que uma ou outra forma jurídica pode ter em  
um dado estágio” –, “são igualmente estranhos a Vladimir Ilich” é a base para sua  
concepção de que Lênin, diante do direito, recusaria tanto “o fetiche legalista do  
sistema”, quanto “um fetichismo de negação da legalidade” e que, portanto, existiria  
ao longo de toda a obra e de toda a atuação prática do líder bolchevique a ideia de  
um “uso de ‘possibilidades legais’” (PACHUKANIS, 2018, p. 1.905).  
Entre as diversas passagens citadas por Pachukanis para corroborar esta  
posição, aqui vamos nos concentrar nos primeiros anos da militância de Lênin e, por  
isso, nos interessa particularmente o trecho em que Pachukanis narra um suposto  
acontecimento da vida do jovem revolucionário que teria ocorrido por volta da década  
1890. Trata-se de “um episódio da vida de Lênin, contado por Elizarov logo após a  
morte de Vladimir Ilich”.  
A situação foi que Vladimir Ilich, que ao tempo estava ainda vivendo  
em Samara, quis dar uma aula a um aproveitador arrogante, um  
fornecedor de transportes, que deteve arbitrariamente passageiros os  
quais usavam os serviços de barqueiros para atravessar o rio ao invés  
de sua balsa. Ele apresentou uma queixa, a despeito de todos os  
esforços do chefe do antigo conselho distrital (a favor do  
aproveitador, naturalmente) de esgotar o infatigável reclamante,  
protelando ao máximo o interrogatório do caso; finalmente, um  
veredito de culpado foi obtido. (PACHUKANIS, 2018, p. 1.906)  
É bem verdade que as conclusões de Pachukanis a respeito da relação entre  
Lênin e o direito, no decorrer de todo seu texto, possuem certos meandros que devem  
ser olhados com o devido cuidado. No entanto, como já dito, devemos nos concentrar  
em sua afirmação de que a defesa dos barqueiros de Samara demonstra que “Lênin  
ostentava em um caso menor a mesma obstinação, vontade de ferro e firmeza pelas  
quais ele era conhecido nos assuntos principais” (PACHUKANIS, 2018, p. 1.906). Isso  
porque é esta afirmação que parece dar ensejo a uma certa interpretação, por parte  
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de importantes estudiosos brasileiros do tema, de que, baseado em uma “vontade de  
ferro e firmeza” mesmo em um “caso menor”, haveria uma atuação relevante de Lênin  
ligada à prática da advocacia.  
Talvez tenha sido Júlio da Silveira Moreira quem primeiro deu maior atenção a  
essa suposta passagem da vida de Lênin mencionada por Pachukanis. Em seu Lênin y  
los derechos del pueblo de 2015, já na primeira seção do texto, intitulada “Lênin  
abogado del pueblo [Lênin, advogado do povo]”, o autor afirma que “Lênin foi jurista,  
e acima de tudo, um jurista comprometido com o povo”, o qual “a partir de 1892,  
atuava como advogado” (MOREIRA, 2015, p. 138, tradução nossa), citando  
diretamente o mesmo argumento pachukaniano de que “Lênin dedicou-se a problemas  
menores com a mesma tenacidade, vontade de ferro e firmeza pela qual era conhecido  
por problemas maiores” (MOREIRA, 2015, p. 139, tradução nossa).  
Se apoiando no caso dos barqueiros, Moreira traz uma narrativa ainda mais  
detalhada do suposto acontecimento de Samara, agora baseando-se em um conto  
russo traduzido para o castelhano como ¡Rema adelante!1 , e afirma que após a  
vitória judicial de Lênin no caso, a “vitória elevou a moral e a crença dos barqueiros  
em seu poder e seus direitos (MOREIRA, 2015, pp. 138-9, tradução nossa).  
Aqui também é importante notar o objetivo que subjaz ao argumento de  
Moreira. No decorrer do texto, fica claro que o autor busca aproximar a ideia de um  
“Lênin advogado do povo” da conhecida figura dos “advogados populares”, que  
ficaram conhecidos entre nós brasileiros principalmente durante as duas últimas  
décadas do século passado. Moreira (2015, p. 140) afirma que “ao longo da história  
do século XX, muitas organizações de advogados surgiram em vários países que  
procuraram agir a favor da justiça”, impulsionadas pelas “situações de crescente  
repressão e terror de estado, tais como ditaduras militares” e cita, em especial, a  
“Associação Internacional dos Advogados do Povo, fundada em 2000”. Para o jurista  
brasileiro, entre os princípios de tal associação, “há muito em comum com o caminho  
deixado por Lenin, que ensinou, nos métodos de luta, a tirar partido das  
‘possibilidades legais’” – e aqui ele se remete diretamente ao argumento de  
Pachukanis de que é necessário fazer “com que a ‘legalidade que o nosso inimigo nos  
impõe seja reimposta a ele pela lógica dos fatos’” (MOREIRA, 2015, p. 141).  
Assim, no caso particular de Júlio Moreira, devemos notar que há uma tentativa  
de fundamentar a ação da “advocacia popular” na América Latina do último meio  
1
RADÍSCHEV, L. ¡Rema adelante!In: Mitiáev, Anatoli (Org.). Hogueras. Moscú/La Habana: Editorial  
Progreso/Instituto Cubano del Libro, 1972, pp. 34-41.  
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século no texto leniniano. Porém, em nossa opinião, trata-se de uma operação teórica  
no mínimo questionável na medida em que ignora as diferentes determinações  
históricas que separam a Rússia do século XIX as quais ainda dedicaremos breves  
considerações ao longo do presente texto e dos países latino-americanos do último  
século, e principalmente as diferenças entre a natureza específica do tsarismo russo e  
dos governos autocráticos da América Latina.  
Em sentido próximo à argumentação de Moreira mesmo que não apoiados no  
caso dos barqueiros de Samara, além de partirem de uma argumentação mais robusta  
–, Ricardo Pazello e Pedro Ferreira (2017, p. 146) falam de uma “advocacia, chamemos  
assim, ‘popular’, que Lênin também exerceu, em favor das classes populares (cf.  
PACHUKANIS, 1980, p. 140)”. Ainda que em outro texto Pazello (2014, p. 231) tenha  
feito a importante observação de que apesar do fato de Lênin ter atuado como  
advogado, “isto não significa que tenha se dedicado primordialmente a esta atividade,  
e nem mesmo que realizou um aprofundamento teórico a respeito” – o que o diferencia  
substancialmente da posição de Júlio Moreira (2015, p. 138, tradução nossa) de que  
“Lênin foi jurista, e acima de tudo, um jurista comprometido com o povo”, o qual “a  
partir de 1892, atuava como advogado” –, nos parece que a advocacia como forma  
de luta no ideário leniniano prevalece na posição de Pazello e Ferreira.  
Por óbvio, tanto a posição de Pachukanis sobre o caso dos barqueiros, como a  
crença de Moreira, Pazello e Ferreira a respeito de uma atuação como advogado  
“popular” têm a seu favor o conhecido fato de que Lênin formou-se em direito. Na  
cronologia de sua vida disponível nas Obras completas (cf. LÊNIN, 1981, p. 643)  
consta que o jovem Vladimir Ilitch ingressou na Faculdade de Direito da Universidade  
de Kazan em agosto de 1887 período em que também passa a frequentar o círculo  
político estudantil e apresentou, em outubro, requerimento de matrícula para o  
primeiro semestre do ano letivo 1887-1888 nas disciplinas de História do Direito  
Russo, História do Direito Romano, Enciclopédia do Direito, além de Teologia e Língua  
Inglesa. Ainda em dezembro de 1887, Lênin foi detido em protestos estudantis e  
obrigado a pedir desligamento da Universidade, tendo sido encaminhado  
imediatamente para a aldeia de Kokúshkino e mantido sob a vigilância policial. Em  
setembro de 1888, tanto sua solicitação ao ministro de Instrução Pública para retornar  
à Universidade de Kazan, feita em maio daquele ano, quanto sua solicitação ao ministro  
do Interior para emigrar do país com objetivo de terminar seus estudos superiores  
foram negadas.  
Durante os anos de 1888 e 1889, Lênin permaneceu endereçando petições a  
diversos órgãos oficiais para poder regressar à universidade e todas foram novamente  
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recusadas. Finalmente, sua mãe, Maria Aleksandrovna Ulianova, após enviar também  
diversos requerimentos no decorrer do ano 1890, conseguiu que seu filho fosse aceito  
na Faculdade de Direito da Universidade de São Petersburgo em junho de 1890. A  
partir dessa permissão, a necessidade de prestar os chamados “exames de estado”  
para ingressar na nova universidade, levou Vladimir Ilitch, entre junho de 1890 e abril  
de 1891, a estudar os três tomos da obra Origens do direito estatal russo do renomado  
liberal professor da Universidade de São Petersburgo Aleksandr Dmitrievitch  
Gradovski, ao qual, segundo o editor russo das Obras completas, Lênin fez diversos  
grifos, destaques e anotações nas margens da obra (cf. LÊNIN, 1981, p. 645). A  
cronologia disponível nas Obras completas ainda dá conta também de que em março  
de 1891, Lênin, ao apresentar um pedido de autorização para prestar os exames finais  
como “estudante externo” ao presidente da Comissão Jurídica Examinadora da  
Universidade de São Petersburgo, anexou uma redação sobre direito penal (cf. LÊNIN,  
1981, p. 646), bem como, na primeira quinzena de setembro do mesmo ano, às  
vésperas de prestar os testes de conclusão do curso, realizou um “exame por escrito  
sobre um tema de direito” (cf. LÊNIN, 1981, p. 647). No entanto, todo esse material  
teórico que poderia nos fornecer algumas pistas sobre a posição do então jovem  
estudante Lênin a respeito de temáticas jurídicas não se encontram publicadas.  
Tamás Krausz (2017, p. 49) a partir de fontes documentais primárias afirma  
que, após a conclusão do curso universitário, “Lênin trabalhou como advogado por  
um breve período”. Em 1892 “foi-lhe concedida permissão para trabalhar  
independentemente, sob contínua vigilância policial, no tribunal de Samara” e sua  
“atividade jurídica estendeu-se de janeiro de 1892 a agosto de 1893”, tendo cuidado  
de alguns casos, “24 no total”. De fato, podemos encontrar também na cronologia  
organizada pelo editor russo das Obras completas (cf. LÊNIN, 1981, pp. 647-9)  
menções à algumas causas judiciais em que Lênin atuou como advogado, inclusive,  
constando os nomes de alguns camponeses que eram parte nestas ações.  
No entanto, até o presente momento, nem nós, nem Pachukanis, Moreira,  
Pazello e Ferreira tiveram acesso ao conteúdo de tais ações judiciais, de modo que  
não se sabe exatamente quais as circunstâncias envolvidas nestes casos. Soma-se a  
isso o fato de que nunca foi encontrado qualquer escrito de Lênin a respeito de sua  
atividade como advogado, não sendo possível saber com exatidão qual o nível de  
importância ele atribuía à advocacia sob sua ótica revolucionária.  
Além disso, o citado caso dos barqueiros de Samara nunca mencionado pelo  
próprio Lênin , o qual suscitou todo esse debate, provém de relatos insuficientes e  
sem fontes confiáveis, pois enquanto Pachukanis narra tal evento a partir do relato  
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oral de Elizárov então cunhado de Lênin , Júlio Moreira se baseia no já mencionado  
conto infantil do escritor russo Leonid Radishchev2. A nós, parece muito frágil basear-  
se neste suposto acontecimento da vida do então jovem Vladimir Ulianov para afirmar  
que ele tenha atuado precipuamente como um advogado de causas “populares”.  
Também é preciso observar que o próprio Pachukanis nunca chegou a colocar  
a questão exatamente como abordam Moreira, Pazello e Ferreira. Para ele, como já  
dissemos, o fundamental era que Lênin recusaria tanto “o fetiche legalista do sistema”,  
quanto “um fetichismo de negação da legalidade” (PACHUKANIS, 2018, p. 1.904), de  
modo que, se sua atuação principal não se dava através das causas jurídicas pois  
recusa o “fetiche legalista do sistema” –, ele também não se furtaria de atuar como  
advogado quando assim julgasse necessário, afastando-se, dessa forma, do  
“fetichismo de negação da legalidade”. Essa posição de Pachukanis, em princípio, não  
soa absurda para qualquer um que reconheça que, na dinâmica da luta concreta, o  
direito pode aparecer como um mediador efetivo dos conflitos sociais. Mas vejamos  
com mais atenção a posição pachukaniana:  
Neste episódio [dos barqueiros de Samara], não somente é importante  
para nós que Lênin ostentava em um caso menor as mesmas  
obstinação, vontade de ferro e firmeza pelas quais ele era conhecido  
nos assuntos principais. Era importante que ele conhecesse, quando  
ele queria e quando ele achava necessário, como mobilizar mesmo  
este método de luta ele recorreu ao tribunal czarista para dar uma  
lição ao pequeno tirano naquele assunto particular e para proteger os  
interesses dos pobres barqueiros. [...] Lênin era um mestre nesse tipo  
de luta, se ele não pudesse obter o resultado que procurava, por assim  
dizer, tomando uma posição partidária à frente da luta que estava  
conduzindo contra a arbitrariedade autocrática e a exploração  
capitalista. Por que provavelmente 99% de nossos bons  
revolucionários teriam cruzado seus braços para este caso particular  
e dito: “Não vale a pena se envolver”? E, é lógico, ao fazê-lo teriam  
refletido não o seu compromisso para com os princípios de  
revolucionários, mas simplesmente uma falta de conhecimento sobre  
o que tinha de ser feito e de que era necessário agir como advogado;  
e mais, uma falta de disposição já que eles eram fastidiosos. O que  
poderia ser mais favorável a um revolucionário do que ir a uma corte  
e, além disso, comparecer diante do chefe do governo local. Porém  
Lênin não foi um sonhador preguiçoso; ele sabia como fazer o  
trabalho sujo quando necessário. (PACHUKANIS, 2017, pp. 1.906-7).  
Em primeiro lugar, é curioso observar a conveniência de se considerar que  
nesse curto período da vida Lênin entre 1892 e 1893 , a prática advocatícia tenha  
sido um “método de luta” e não uma simples e convencional atuação profissional.  
Salientamos isso porque em momento algum, nem Pachukanis, nem nossos autores  
2 O conto Греби вперед consta originalmente em RADISHCHEV, L. N. На всю жизнь. Leningrado: Editora  
de Literatura Infantil, 1970, pp. 30-41.  
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conterrâneos, cogitam a possibilidade de que Lênin atuava na advocacia como um  
profissional liberal comum, recebendo honorários com os quais pagava suas despesas  
cotidianas.  
Por outro lado, é evidente que o fato de o jovem Vladimir Ilitch ter atendido  
tantos camponeses como a cronologia das Obras completas parece sugerir em sua  
breve carreira jurídica suscita em nós a impressão de que sua tomada de posição  
diante dos conflitos da sociedade de classes, em alguma medida, interferia em sua  
atuação nos tribunais, tal como na escolha dos casos em que iria assumir a defesa do  
réu. Isso, de certa maneira, parece se confirmar quando Krausz (2017, p. 49) relata  
que, em uma “certa ocasião”, Lênin “não esteve disposto a defender um rico mercador  
nem mesmo em troca de honorários mais altos, embora um bom número de  
camponeses acusados de roubo aparecesse entre os réus atendidos”. No entanto, ao  
mesmo tempo, há situações em que Lênin defendeu também “mercadores e até mesmo  
um marido que torturava a mulher, ainda que, em tal caso, não tenha pleiteado redução  
de sentença” (KRAUSZ, 2017, p. 49). Para nós, são tais relatos que dificultam a  
hipótese que pretende elevar esta atuação como advogado ao patamar de um “método  
de luta” leniniano.  
A esse respeito é preciso mencionar que, em uma primeira mirada, Pachukanis  
e Krausz parecem convergir quando dizem que a atuação jurídica de Lênin era guiada  
por certos princípios. Da mesma forma que para o jurista soviético tal atuação refletia  
um “compromisso para com os princípios de revolucionários”, demonstrando  
“conhecimento sobre o que tinha de ser feito e de que era necessário agir como  
advogado” (PACHUKANIS, 2017, p. 1.907), para o biógrafo húngaro, Lênin baseava  
“as defesas em razões de princípio”, isto é, “sob a perspectiva dos economicamente  
oprimidos” (KRAUSZ, 2017, p. 50).  
Entretanto, se a conclusão de Pachukanis caminha para o sentido de que o  
sucesso desse “método de luta na prática” se devia não “a questão da conveniência,  
mas a questão do princípio: deve um revolucionário procurar o suporte do tribunal da  
Coroa?” (PACHUKANIS, 2018, p. 1907), para Krausz, Lênin “não se tornaria um bom  
advogado, na medida em que seus princípios norteadores eram sociais, guiados por  
leis éticas, e moldavam todas as suas decisões sob a perspectiva dos economicamente  
oprimidos” (KRAUSZ, 2017, p. 49). Assim, enquanto para Pachukanis é a firmeza de  
princípios revolucionários que guia uma ação positiva de Lênin na advocacia, para  
Krausz, são estes mesmos princípios que impedem Lênin de ser um bom advogado,  
faltando-lhe, ao que nos parece, um certo pragmatismo circunstancial e variável que  
guia a atividade advocatícia. Nesse sentido, não só a evidente estreiteza das  
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possibilidades que a advocacia oferece para a luta social, como a própria curta carreira  
de Lênin como advogado abandonada por ele definitivamente em 1893 parecem  
dar mais razão ao seu biógrafo húngaro.  
Mas há ainda outra questão que Pachukanis e os autores brasileiros deixa  
de tratar. Se por alguns instantes fizermos o experimento teórico de assumir que Lênin  
de fato tenha recorrido à advocacia como “método de luta”, o que impediria de se  
cogitar a hipótese de que tal forma de atuar não era a expressão de uma certa  
imaturidade de suas concepções a respeito da intervenção prática nas lutas sociais? E  
aqui há um elemento importante da história russa que deve ser considerado.  
Como o próprio Pachukanis afirma, naqueles anos próximos da virada de século  
XIX para o século XX, havia na Rússia um “tipo de ‘ativista social’, do qual era um  
representante notável, por exemplo, V. G. Korolenko” – conhecido escritor e ativista  
de extração naródnik –, para os quais “uma luta contra a arbitrariedade semi-servil  
asiática do estado proprietário de terras, ‘em nome da legalidade’ e estritamente por  
meios legais, era uma espécie de bandeira” (PACHUKANIS, 2017, p. 1.906). E era em  
meio a essa atmosfera social que o jovem Lênin começava a se formar enquanto  
revolucionário.  
Sobre isso, é preciso mencionar que, segundo Krausz (2017, p. 47), a  
“perspectiva político-intelectual-moral de Lênin” foi “moldada por numerosos  
movimentos e tradições”, que “além de Tchernychiévski e Marx”, inclui também “os  
narodovólets russos” – a corrente chamada terrorista que descendia dos primeiros  
naródniki e entre os quais estava Aleksandr Ilitch Ulianov, irmão de Lênin – “e o legado  
intelectual dos chamados democratas revolucionários”.  
Se é verdade que no fim dos anos 1880 Lênin já conhecia razoavelmente bem  
a obra de Marx (KRAUSZ, 2017, p. 46), apenas em 1893 é que ele esboçará suas  
primeiras divergências com os naródniki sobre a questão do desenvolvimento do modo  
de produção capitalista na Rússia em Sobre a chamada questão dos mercados. E  
assim, baseando-se exclusivamente nestes textos, Krausz (2017, p. 109) parece ter  
muita razão ao afirmar, na seção intitulada “Rompimento com o narodismo”, que “Lênin  
ocupava-se principalmente das concepções econômicas do narodismo” no período  
anterior a 1894, isto é, anterior à publicação de Quem são os “amigos do povo” e  
como lutam contra os sociais-democratas?, de modo que, até 1894, o que temos são  
polêmicas acerca de temas econômicos com os naródniks, não havendo uma posição  
clara de Lênin a respeito das formas de luta dessa corrente, inclusive de suas  
esperanças em relação a uma atuação jurídica, por assim dizer, em meio ao  
campesinato.  
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Apesar de já ter contato com alguns outros marxistas russos, Lênin, quando  
residia em Samara, ainda não pertencia a um círculo de sociais-democratas  
propriamente dito, já que chegaria em São Petersburgo apenas no outono 1893 (cf.  
KRUPSKAYA, 2021, p. 56) e fundaria a Liga de Luta pela Emancipação da Classe  
Trabalhadora apenas em 1895, tendo se integrado posteriormente ao Partido  
Operário Social-Democrata da Rússia, o qual foi fundado sob os moldes do marxismo  
da social-democracia alemã somente em 1898.  
Como pode-se ver, se em 1893 é certo que Lênin possuía uma crítica marxista  
consistente às teorias econômicas do narodismo liberal, não é possível afirmar com  
plena certeza o mesmo no que diz respeito ao plano das ações práticas mais imediatas,  
principalmente no âmbito político e jurídico. Portanto, quando Pachukanis e os autores  
brasileiros atribuem certa importância à atuação de Lênin como advogado durante os  
anos de 1892 e 1893, ignorando o fato de que possuímos pouquíssimos material  
bibliográfico sobre esse período, deixa de se considerar a possibilidade de que o  
jovem Ulianov pagasse ainda algum tributo às formas de atuação da tradição naródniki  
e dos democratas radicais de sua época.  
É preciso mencionar que Richard Pipes (1968, p. 26, tradução nossa), estudioso  
da história russa de posição conservadora, defende a tese de que a “evolução  
intelectual” de Lênin “passou por quatro fases”, sendo que “durante a primeira fase,  
que se estendeu de 1887 a 1892, Lênin simpatizou com a ala jacobina da  
[organização terrorista] Vontade do Povo”. Segundo o autor,  
praticamente todos os biógrafos de Lênin mencionam seus primeiros  
contatos com a Vontade do Povo (Narodnaia volia) [...]. Mesmo as  
poucas evidências documentais disponíveis para os estudiosos  
estrangeiros [não soviéticos] não deixam dúvidas de que Lênin passou  
os primeiros cinco ou seis anos de sua carreira revolucionária em meio  
aos elementos jacobinos mais extremistas da Vontade do Povo (PIPES,  
1968, p. 28, tradução nossa).  
A partir disso é que Richard Pipes defende que as “evidências disponíveis  
sugerem fortemente que, de 1892, ou no máximo 1893, até meados de 1895, Lênin  
foi” um “tipo de marxista de transição” que, “no fundo”, “ainda era um adepto da  
Vontade do Povo” (1968, p. 37, tradução nossa).  
Podemos mencionar também que, apesar de possuir uma valoração  
radicalmente diferente da que Pipes faz de Lênin, o historiador trotskista Tony Cliff  
afirma que antes  
que a fábrica de mitos stalinista começasse a operar, surgiram  
inúmeras provas de que, em sua juventude, Lênin foi influenciado pelo  
narodismo. Um testemunho dessa influência é V. V. Adoratski, o futuro  
diretor do Instituto Marx-Engels-Lênin. De acordo com ele, em 1905,  
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Lênin como advogado: um problema inicial no estudo do direito na obra leniniana  
Lênin lhe disse que foi muito influenciado pelas ideias dos naródniks.  
Ele admitiu que, em 1888, havia apreciado muito esse movimento  
terrorista e que levou muito tempo para se livrar de suas ideias.  
“Durante seus últimos anos em Samara, entre 1892 e 1893, Lênin já  
era marxista, embora ainda houvesse nele alguns traços ligados ao  
Naródnaia Volia (ou seja, uma atitude especial em relação ao  
terrorismo).” (CLIFF, 2011, p. 27, tradução nossa).  
Nesse sentido, Cliff (2011, p. 27, tradução nossa) traz o relato de que Isaac  
Lalaiants social-democrata e bolchevique da estrita confiança de Lênin por toda vida  
–, “conhecia bem Lênin em Samara e detectou nele, em março de 1893, ‘certas  
simpatias pelo terror do Naródnaia Volia’”, tendo sido “essa inclinação” de Lênin “uma  
causa de conflito entre os dois”. Além disso, o autor afirma que “no outono de 1893”,  
quando “Lênin quis entrar em um círculo social-democrata petersburguês, o  
examinaram de perto quanto à questão do terrorismo, e foi decidido que estava muito  
favorável a ele”. Assim, continua Cliff,  
Vladímir teve que se dedicar a um estudo longo e exaustivo, não  
apenas porque o narodismo tinha raízes profundas, mas também  
porque [...] as linhas de demarcação entre o narodismo e o marxismo  
não estavam claramente definidas para a juventude radical da época.  
Outro motivo foi o fato de que as ideias do marxismo russo ainda não  
haviam permeado nenhum movimento ativo de trabalhadores” [...].  
Lênin precisou de anos de estudo para decidir sua posição a respeito  
do narodismo e do marxismo”. (CLIFF, 2011, p. 27-28, tradução  
nossa)  
Assim, se Lênin começou a “estudar O capital de Marx em algum momento de  
1889”, o historiador trotskista parece estar bem certo de que “isto, em si mesmo, não  
significa que ele renunciara ao narodismo”, já que os “naródniks também estudavam  
Marx” (CLIFF, 2011, pp. 28-29, tradução nossa). Por fim, Tony Cliff (2011, p. 29,  
tradução nossa), dessa vez baseado em documentos mais confiáveis, afirma que em  
“1919, respondendo a um questionário, Lênin deixou claro que havia se tornado um  
social-democrata [...] em 1893. Em 1920, respondendo a outro questionário, à  
pergunta sobre quando ele havia começado a participar do movimento revolucionário,  
ele escreveu: ‘1892-93’”.  
Evidentemente, tais afirmações reforçam nosso exercício de especulação a  
respeito de uma certa imaturidade, entre 1892 e 1893, daquilo que viria a ser o  
marxismo de Lênin posteriormente, no entanto, as fontes que apoiam as afirmações  
categóricas de Pipes são muito frágeis, isso quando ele nos fornece de fato alguma  
fonte. O autor navega por uma leitura psicologizante e moralizante tão caricata e típica  
dos biógrafos de Lênin visceralmente anticomunistas do século XX, que é difícil dar-  
lhe algum crédito. Quanto a Cliff, por mais que apresente um maior número de fontes  
bibliográficas, ele utiliza principalmente relatos de terceiros para embasar suas  
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conclusões, o que dificulta a robustez de suas afirmações.  
A bem da verdade, reproduzimos aqui tais passagens apenas para evidenciar  
como tal período da vida de Lênin é, além de pouco conhecido, de difícil investigação,  
sendo, por isso, passível de todo tipo de interpretação. O mais importante, no entanto,  
é registrar uma conclusão de Tony Cliff com a qual nossas pesquisas têm convergido:  
Os criadores do culto [stalinista a Lênin] foram ainda mais longe,  
atribuindo ao próprio Lênin qualidades sobre-humanas. Segundo eles,  
Lênin veio ao mundo totalmente preparado, era marxista e  
revolucionário desde quase sua infância; e de sua cabeça calva brota  
e se desenvolve bem formado e pronto o partido que está destinado  
a liderar e moldar a classe trabalhadora na revolução! A realidade,  
entretanto, foi muito diferente. Foram necessários meses, ou mesmo  
anos, de estudo e reflexão para que o jovem Lênin se tornasse um  
marxista. Primeiro, ele teve de romper com as ideias conservadoras  
de seu pai e, depois, com a perspectiva naródnik de seu irmão mais  
velho. (CLIFF, 2011, p. 24, tradução nossa)  
Parece-nos que, de certo modo, é dessa maneira descrita por Cliff que o jovem  
Lênin figura na concepção pachukaniana. Longe de afirmar que Pachukanis tenha sido  
um simples adepto do “culto” a Lênin, no entanto, parecem desproporcionais  
afirmações tão categóricas, como a de que “Lênin era um mestre nesse tipo de luta  
[como advogado]” (PACHUKANIS, 2017, p. 1906), diante do simples relato sobre o  
caso dos barqueiros de Samara. Nos parece uma posição muito mais laudatória que  
atribui ao jovem e inexperiente Lênin dos anos 1892 e 1893 “qualidades sobre-  
humanas” (CLIFF, 2011, p. 24, tradução nossa)3.  
Porém, é preciso registrar que se nossa hipótese a respeito de uma possível  
imaturidade do esquema tático leniniano até 1893 não passa de simples especulação  
a partir de alguns dados fragmentados da vida e da obra de Lênin difíceis de serem  
3
Além disso, é preciso ao menos ter em mente a observação que Peter Maggs faz em sua introdução  
ao texto de Pachukanis em sua edição britânica: “O ensaio a seguir foi a primeira tentativa de Pachukanis  
de buscar apoio antecipado para as sérias implicações da Teoria geral do direito e marxismo, nos  
volumosos, porém fragmentados, escritos de Lênin sobre o direito. Ele foi escrito no contexto de duas  
questões não resolvidas no período hesitante após a morte de Lênin em 1924. Que forma deve ser  
dada ao conteúdo das regras e diretrizes do partido? Qual deveria ser a atitude do Partido e do  
proletariado soviético em relação à demanda pelo direito das nações à autodeterminação? E, é claro,  
dentro da estrutura dos debates entre Bukhárin, Trótski e Stálin sobre a centralização e a doutrina do  
socialismo em um único país, essas questões não eram totalmente alheias. Pachukanis argumenta que  
um partido revolucionário deve seguir um curso que evite os perigos tanto da rejeição completa da luta  
legal quanto do fetichismo ligado às regras legais. A legalidade não é um ‘saco vazio’ que pode ser  
preenchido com um novo conteúdo de classe imediatamente após a revolução e, sob a Nova Política  
Econômica, a forma legal deve ser usada como uma arma em um programa de reeducação cultural. A  
resposta de Pachukanis a essas perguntas apareceu em uma coleção especial intitulada Revolução da  
Lei, editada por Stutchka e que incluía teóricos ilustres como Bukhárin, Adoratski e Razumovski. Essa  
coleção foi concebida como a primeira expressão sistemática dos juristas marxistas.” (MAGGS in  
PASHUKANIS, 1980, p. 132) Evidentemente, seria preciso um estudo mais completo do texto de  
Pachukanis para pudéssemos avaliar o rigor da argumentação de Maggs. Entretanto, se o ensaio  
pachukaniano sobre Lênin de fato é parte de um arcabouço argumentativo para uma disputa política, é  
possível compreender porque, ao menos no que se refere à questão da advocacia, as conclusões de  
Pachukanis parecem um tanto açodadas.  
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comprovados, também o é a suposição de que Lênin tenha sido um “advogado  
popular” ou que, durante o período 1892-1893, tenha tido qualquer atuação  
relevante nas lutas sociais através da advocacia.  
Portanto, diante de tais lacunas sobre o papel da advocacia na luta política de  
Lênin entre 1892 e 1893, é muito mais seguro e frutífero recorrer ao que o  
revolucionário russo de fato escreveu a esse respeito. Nesse sentido, como já  
dissemos, se não há textos nem mesmo na forma de correspondência privada que  
abordem este tema durante seus anos como advogado, ao menos no ano 1894, na  
obra Quem são os “amigos do povo” e como lutam contra os sociais-democratas?, ele  
se posicionará frontalmente contra as formas organizativas e de atuação prática dos  
naródniki liberais, incluindo aí a questão dos advogados.  
A oposição de Lênin às “pequenas ações”  
No debate contra a corrente narodista dos anos 1890, centrado no problema  
da expropriação das terras camponesas e na crescente divisão social do campesinato  
entre burguesia rural e proletariado agrícola, Lênin (2022, pp. 167-8) afirma que tais  
naródniki tardios “enterram suas cabeças como avestruzes para [...] não ver que estão  
testemunhando o processo de conversão da terra, da qual o campesinato está sendo  
arrancado, em capital, o processo de criação de um mercado interno”, e que, por isso,  
entoavam “frases humanitárias e benevolentes”, sendo estas “o alfa e o ômega de toda  
a sua ‘ciência’, de toda a sua ‘atividade’ política”. Assim, estes “amigos do povo”  
elevam esse remendo dócil e liberal da ordem atual a uma plena  
filosofia. “Uma pequena e vívida ação – argumenta com profundidade  
o sr. Krivenko – é muito melhor do que uma grande inatividade”. Que  
novo e inteligente. E então, continua ele, “uma pequena ação não é  
de forma alguma sinônimo de um pequeno objetivo”. Como exemplo  
da “expansão dessa atividade”, quando uma pequena ação se torna  
“adequada e significativa”, cita a ação de uma senhora pela a  
instalação de escolas; em seguida, a atividade de advogados entre o  
campesinato, expulsando os canalhas; a proposta de advogados se  
deslocarem até as províncias com sessões itinerantes nos tribunais  
distritais para a defesa dos réus; finalmente, já conhecido por nós, a  
instalação de armazéns de kustari: a expansão da atividade (na  
dimensão de um grande objetivo) deve consistir aqui na instalação de  
armazéns “pelas forças unidas dos zemstvos nos centros mais  
agitados” (LÊNIN, 2022, p. 168).  
Ao descrever de modo bastante irônico a forma de agir dos naródniki liberais  
através das chamadas “pequenas ações”, Lênin nos fornece exemplos de tais  
atividades, como é o caso da “instalação de escolas” por “senhoras” ricas, da  
implementação de armazéns coletivos para os chamados kustari termo que  
designava tanto as pequenas fábricas artesanais, como os pequenos capitalistas  
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proprietários dessas fábricas , bem como aquelas ações que aqui nos interessam mais  
particularmente, com é a atuação de advogados na defesa de camponeses enganados  
e processados por usurários e senhores de terra. E é precisamente a essa forma de  
atividade que Pachukanis (2017, p. 1906) se refere quando fala de um “tipo de  
‘ativista social’” – na Rússia do final do século XIX – para quem a “luta contra a  
arbitrariedade semi-servil asiática do estado proprietário de terras, ‘em nome da  
legalidade’ e estritamente por meios legais, era uma espécie de bandeira” e que  
“ninguém escarneceu mais causticamente essas pessoas que Lênin”.  
No mesmo sentido, o relato de Krupskaia sobre a ocasião em que conheceu  
pessoalmente Lênin em 1894 também nos traz algumas pistas da posição leniniana a  
respeito das “pequenas ações”:  
Lembro-me particularmente de um momento: surgiu a questão  
referente a quais caminhos deveríamos seguir. Por algum motivo, não  
havia consenso. Alguém (creio que Shevlyagin) disse que o trabalho  
do Comitê de Alfabetização era de grande importância. Vladimir Ilyich  
riu, e sua risada soou malévola e seca (nunca mais o ouvi rir daquele  
jeito).  
“Bem, se alguém quiser salvar o país trabalhando no Comitê de  
Alfabetização”, disse ele, “deixe-o ir em frente”. É preciso que nossa  
geração testemunhou, em sua juventude, a luta entre o Narodnaya  
Volya e o tsarismo. Tínhamos visto como os liberais, em princípio  
“simpáticos” a tudo, ficaram com medo de qualquer farfalhar e  
enfiaram o rabo entre as pernas após a repressão do Partido  
Narodnaya Volya. Partiram, então, a pregar a realização das  
“pequenas coisas”.  
O comentário sarcástico de Lenin era perfeitamente compreensível.  
Ele tinha vindo para discutir estratégias conjuntas de luta e teve de  
ouvir, ao invés disso, um apelo para distribuição de panfletos do  
Comitê de Alfabetização. (KRUPSKAYA, 2021, p. 58)  
Assim, é importante notar o significado de tais medidas para Lênin quando ele  
as classifica como um “remendo dócil e liberal da ordem atual”, isto é, medidas que  
recusam uma certa radicalidade, que partem de uma concepção liberal e que não  
pretendem mais que “remendar” a ordem social então vigente. O panorama dado por  
Krupskaia ajuda a explicar como as “pequenas coisas”, tal como o “Comitê de  
Alfabetização”, representavam uma posição amedrontada diante do tsarismo, uma  
posição covarde que se chocava com a radicalidade ainda que de cunho terrorista –  
dos narodovólets.  
Todas essas são, é claro, ações muito elevadas, humanas e liberais –  
“liberais” porque limparão o sistema burguês de produção de todas  
as suas restrições medievais e, assim, facilitarão a luta do trabalhador  
contra esse próprio sistema, que, é claro, não só não será afetado por  
essas medidas, mas, ao contrário, será fortalecido e tudo isso nós  
lemos há muito tempo em todas as publicações liberais russas. Não  
valeria a pena opor-nos a isso se não fossemos forçados pelos  
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Lênin como advogado: um problema inicial no estudo do direito na obra leniniana  
cavalheiros da “RB” [Rússkoie Bogátstvo], que começaram a  
apresentar esses “princípios dóceis do liberalismo” CONTRA os  
sociais-democratas e, ao mesmo tempo, como lição a eles,  
censurando-os por renunciarem aos “ideais de seus pais”. E então não  
podemos deixar de dizer que é, no mínimo, divertido se opor aos  
sociais-democratas com a sugestão e a indicação de tal atividade  
liberal (ou seja, a serviço da burguesia) moderada e bem comportada.  
Quanto aos pais e seus ideais, deve-se observar que, por mais  
errôneas e utópicas que fossem as antigas teorias dos naródniki  
russos, de qualquer forma, eles tinham uma atitude ABSOLUTAMENTE  
negativa em relação a esses “princípios dóceis do liberalismo”. (LÊNIN,  
2022, pp. 168-9)  
É bem verdade que Lênin avalia que as “pequenas ações” dos “amigos do povo”  
– tratadas novamente de maneira cáustica como “ações muito elevadas, humanas e  
liberais” – não mereceriam em princípio sua oposição já que têm um certo sentido  
positivo quando buscam livrar “o sistema burguês de produção”, que florescia na  
Rússia de então, das “restrições medievais” que permaneciam. No entanto, é notável  
que, para ele, tais ações não têm em si a potencialidade de apontar para além do  
próprio “sistema burguês de produção”, o qual “não só não será afetado por essas  
medidas, mas, ao contrário, será fortalecido”.  
Mas o debate aqui se dá na medida em que os “amigos do povo” opõem tais  
medidas à forma de atuação dos sociais-democratas, isto é, aos marxistas de então.  
Para Lênin, que a essa altura se posicionava indubitavelmente como um social-  
democrata, essas “pequenas” ações eram liberais não apenas porque se opunham aos  
restolhos medievais, mas também porque trata-se de uma atividade dócil, “moderada  
e bem comportada” que, diretamente “a serviço da burguesia” russa, não é um tipo  
de ação radical ou revolucionária. De tal maneira, comparando os “amigos do povo”,  
os naródniki liberais dos anos 1890, com os chamados “pais”, isto é, os naródniki  
revolucionários dos anos 1860 e 1870, Lênin demonstra como que “por mais errôneas  
e utópicas que fossem as antigas teorias dos [primeiros] naródniki russos”, “eles tinham  
uma atitude ABSOLUTAMENTE negativa em relação a esses ‘princípios dóceis do  
liberalismo’” que agora reivindicavam os naródniki liberais.  
Mas isso foi há muito tempo, há tanto tempo que os “amigos do povo”  
tiveram tempo de esquecer completamente tudo isso e, com suas  
táticas, mostraram claramente que, na ausência de uma crítica  
materialista das instituições políticas, na ausência de uma  
compreensão do caráter de classe do estado moderno, é apenas um  
passo do radicalismo político para o oportunismo político. (LÊNIN,  
2022, p. 169)  
A explicação mais profunda de Lênin é que as “táticas” dos “amigos do povo”  
padecem de “uma crítica materialista das instituições políticas”, “de uma compreensão  
do caráter de classe do estado moderno”, o que faz com que o “radicalismo político”  
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utópico dos velhos naródniki transforma-se facilmente em “oportunismo político” nas  
mãos dos naródniki dos anos 1890. Vemos assim que se estas “pequenas ações” não  
são propriamente posições reacionárias que necessariamente mereçam um combate  
ativo por parte dos marxistas, elas são demasiadamente “dóceis” pois recusam um  
radicalismo e redundam, inevitavelmente, em uma forma de ação oportunista, isto é,  
um tipo de ação que se baseava.  
Ao defender o tipo de ação dos primeiros sociais-democratas russos tal como  
Plekhânov contra as acusações de Mikhailovski, Lênin afirma:  
Era natural que os sociais-democratas dirigissem toda a sua atenção  
e depositassem todas as esperanças nesta classe [trabalhadora], que  
reduzissem o seu programa ao desenvolvimento da sua consciência  
de classe e orientassem todas as suas atividades em direção ao auxílio  
à elevação desta classe a fim de travar uma luta política direta contra  
o regime atual, e no sentido de atrair todo o proletariado russo para  
essa luta. (LÊNIN, 2022, p. 88)  
Como fica claro, se nos basearmos nos textos que de fato foram escritos e  
publicados por Lênin em 1894, a forma fundamental de luta reivindicada por ele  
passava muito longe das “pequenas ações” dos naródniks liberais, sendo ela a “luta  
política direta contra o regime atual” levada a cabo pela classe trabalhadora. Mais  
especificamente, sua posição coloca a “tarefa direta de ORGANIZAR UM PARTIDO  
SOCIALISTA DOS TRABALHADORES” (LÊNIN, 2022, p. 217) e que a “atividade política  
dos sociais-democratas consiste na promoção do desenvolvimento e a organização do  
movimento de trabalhadores na Rússia”, sendo necessário alcançar “uma luta  
organizada de TODA a CLASSE trabalhadora russa direcionada contra o regime  
burguês” (LÊNIN, 2022, p. 222). A política, portanto, principalmente através da ação  
de um partido a ser organizado, era o terreno privilegiado em detrimento das  
“pequenas ações”.  
Portanto, é na classe trabalhadora que os sociais-democratas  
concentram todas as suas atenções e todas as suas atividades4.  
4 É notável como, a essa altura do desenvolvimento das concepções teóricas leninianas, os trabalhadores  
rurais e os camponeses parecem ainda desempenhar um papel menor na luta política. “Se à percepção  
da ideia da luta de classes entre o proletariado e a burguesia conseguem aderir, por enquanto, apenas  
os trabalhadores urbanos fabris-industriais, e não os ‘ingênuos e simplórios’ batráki [trabalhadores  
rurais/camponeses assalariados], ou seja, precisamente as pessoas que perderam essas qualidades  
encantadoras tão intimamente ligadas aos ‘fundamentos seculares’ e ao ‘espírito comunitário’, – isso  
apenas comprova a correção da teoria dos sociais-democratas sobre o trabalho progressivo e  
revolucionário do capitalismo russo.” (LÊNIN, 2022, p. 137). Se em relação aos trabalhadores  
assalariados rurais o jovem Ilitch acentua que “por enquanto” eles não haviam aderido à “ideia da luta  
de classes entre o proletariado e a burguesia”, em relação aos camponeses, em 1899, Lênin (1982, p.  
204) ainda acreditava que “embora a propriedade fundiária adquira formas distintas na Rússia e na  
França, aplica-se perfeitamente aos camponeses russos o que Marx disse do pequeno camponês francês:  
‘Os camponeses parcelários constituem uma enorme massa, cujos membros vivem todos na mesma  
situação, mas que não se unem uns aos outros por relações variadas. Seu modo de produção, ao invés  
de conduzi-los a relações recíprocas, isola-os. Esse isolamento é ainda agravado pelo mau estado dos  
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Lênin como advogado: um problema inicial no estudo do direito na obra leniniana  
Quando seus representantes avançados tiverem dominado as ideias  
do socialismo científico, a ideia do papel histórico do trabalhador  
russo, quando essas ideias estiverem disseminadas, e quando  
organizações estáveis estiverem formadas entre os trabalhadores para  
transformar a guerra econômica dispersa atual dos trabalhadores em  
luta de classes consciente aí o TRABALHADOR russo, indo à frente  
de todos os elementos democráticos, vai derrubar o absolutismo e  
liderar o PROLETARIADO RUSSO (lado a lado com o proletariado de  
TODOS OS PAÍSES) pelo caminho direto da luta política aberta para A  
VITORIOSA REVOLUÇÃO COMUNISTA. (LÊNIN, 2022, pp. 224-5)  
Fica evidente, portanto, como que, a partir de 1894, Lênin já tinha traçado com  
clareza que sua forma de atuação se daria através da “atividade política” de promover  
o “desenvolvimento e a organização do movimento de trabalhadores”, transformando  
a “guerra econômica dispersa” em “luta de classes consciente” para “derrubar o  
absolutismo” e avançando para a revolução comunista “pelo caminho direto da luta  
política aberta”.  
E mesmo em relação às questões que diziam respeito ao campesinato, as  
propostas de Lênin parecem estar bem distantes das chamadas “pequenas ações” dos  
“amigos do povo”:  
[...] falar sobre a ausência de direitos dos camponeses como causa de  
sua expropriação e exploração só pode, é claro, ser feito pelos  
senhores Iujákov e V.V., mas a opressão da administração sobre o  
campesinato não apenas é indiscutível, como também não se trata de  
uma simples opressão, e sim de uma direta humilhação dos  
camponeses, tratados como uma “plebe desprezível”, que deve estar  
subordinada aos nobres proprietários de terras, para quem o desfrute  
dos direitos civis comuns é concedido apenas como uma graça  
especial (a migração, por exemplo), e que qualquer pompadour5 pode  
controlar como se fossem pessoas trancafiadas em uma casa de  
trabalho forçado. E os sociais-democratas apoiam incondicionalmente  
a reivindicação de plena restauração dos direitos civis dos  
camponeses, abolição total de todos os privilégios da nobreza,  
eliminação da tutela burocrática sobre o campesinato e concessão de  
meios de comunicação francês e pela miséria dos camponeses. A exploração do seu campo de produção,  
a parcela [Produktiοnsfeld] não permite nenhuma divisão do trabalho, nenhuma utilização de métodos  
científicos e, por consequência, nenhum desenvolvimento diferenciado, nenhuma variedade de talentos,  
nenhuma riqueza de relações sociais. Cada família camponesa é quase autossuficiente, produz  
diretamente a maior parte do que consome e procura seus meios de subsistência antes no intercâmbio  
com a natureza do que no intercâmbio com a sociedade. A parcela, o camponês, a sua família; ao lado,  
outra parcela, outro camponês, outra família. Certo número amontoado dessas unidades constitui uma  
aldeia e um amontoado de aldeias, um departamento. Assim, a grande massa da nação francesa se  
constitui por uma simples adição de grandezas homônimas mais ou menos como batatas em um saco  
constituem um saco de batatas.’ (Der achtzehnte Brumaire des Louis Bοnaparte. Hamburgo, 1885 p.  
9899). Certamente, essa transposição da concepção marxiana sobre os camponeses franceses para  
os camponeses russos confrontaria não apenas a posição de Marx sobre o campesinato russo da  
obshchina (cf. MARX; ENGELS, 2013), como a própria posição mais tardia de Lênin, principalmente após  
1905, a respeito desta classe.  
5
A palavra “помпадур [pompadur]” em russo é um termo pejorativo que deriva do nome de Madame  
de Pompadour, tida como amante do rei Luís XV da França, que, na Rússia, passou a ser usada para  
descrever uma pessoa arrogante, pretensiosa e de elevada posição social, que exerce seu poder de  
maneira desdenhosa ou tirânica, muitas vezes abusando de sua autoridade para manipular e controlar.  
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autonomia a eles (LÊNIN, 2022, p. 211).  
Como se vê, ao ironizar os “senhores Iujákov e VV”, intelectuais naródniks  
liberais, Lênin discorda que de seja a “ausência de direitos” a causa da “expropriação  
e exploração” dos camponeses russos. Na verdade, o que está implícito na posição do  
jovem revolucionário é que a ruína econômica do campesinato naquelas décadas –  
além das reminiscências de um regime de servidão na prática não plenamente abolido  
– era a verdadeira base dessa “expropriação e exploração”. Lênin demarca aqui com  
clareza sua diferença com a teoria naródniki ao apontar a origem da “expropriação e  
exploração” dos camponeses nas relações econômicas e não na “ausência de direitos”.  
No entanto, Lênin também não deixa de demarcar que é “indiscutível” a  
“opressão da administração sobre o campesinato”, e mais que uma “simples opressão”,  
tratava-se de “uma direta humilhação dos camponeses, tratados como uma ‘plebe  
desprezível’”. Porém, sua proposta não é a atividade de advogados entre o  
campesinato” ou a “proposta de advogados se deslocarem até as províncias com  
sessões itinerantes nos tribunais distritais para a defesa dos réus” (LÊNIN, 2022, p.  
168), mas sim de que “os sociais-democratas”, através de seu partido socialista de  
trabalhadores, apoiem “incondicionalmente a reivindicação de plena restauração dos  
direitos civis dos camponeses, abolição total de todos os privilégios da nobreza,  
eliminação da tutela burocrática sobre o campesinato e concessão de autonomia a  
eles” (LÊNIN, 2022, p. 211). Trata-se, portanto, de uma luta política direta contra o  
estado tsarista. E aqui cumpre papel aquela necessária “crítica materialista das  
instituições políticas” (LÊNIN, 2022, p. 169) ausente no pensamento liberal-naródnik.  
A esse respeito, Lênin, em uma nota de rodapé, chama atenção para uma  
“instituição impressionantemente reacionária, que chamou relativamente pouca  
atenção de nossos revolucionários”, que “é a burocracia nacional, que de facto (de  
fato, na prática) governa o estado russo”.  
Alimentada principalmente pelos ráznotchintsev6, essa burocracia é,  
tanto por sua origem, quanto por sua função e natureza de suas  
atividades, profundamente burguesa, mas o absolutismo e os enormes  
privilégios políticos dos nobres proprietários de terras lhe conferiram  
qualidades particularmente nocivas. É como uma biruta que orienta  
sua tarefa principal para combinar os interesses dos proprietários de  
terras e da burguesia. É um judasinho [иудушка; judushka] que usa  
suas simpatias e conexões com o sistema de servidão para enganar  
6
A palavra “разночинцев” se refere aqui a membros da chamada intelligentsia provenientes de várias  
classes sociais. No contexto histórico russo dos séculos XVIII e XIX, designava uma camada social  
composta por pessoas de diferentes origens não nobres, incluindo filhos de comerciantes, camponeses,  
clérigos e pequenos funcionários, que se destacavam por sua educação e envolvimento em atividades  
intelectuais e políticas. Durante o século XIX, os ráznotchintsev eram uma força significativa na sociedade  
russa e não só compunham a burocracia estatal como também, muitas vezes, participaram de  
movimentos por reformas políticas e sociais, tendo sido influentes no movimento naródnik.  
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Lênin como advogado: um problema inicial no estudo do direito na obra leniniana  
trabalhadores e camponeses, promovendo, sob o disfarce de  
“proteção do economicamente fraco” e “tutela” sobre eles contra o  
kulak e o usurário, medidas que reduzem os trabalhadores à condição  
de “plebe desprezível”, entregando suas cabeças ao proprietário  
senhorial de terras [крепостнику-помещику] e tornando-os ainda mais  
indefesos contra a burguesia. É o hipócrita mais perigoso, instruído  
pela experiência dos mestres da reação da Europa ocidental e que  
esconde habilmente seus desejos araktcheievistas7 sob as folhas de  
figo das frases dos amantes do povo. (LÊNIN, 2022, pp. 212-3)  
É notável a observação de Lênin de que a burocracia russa que de fato  
governava o estado russo não era um simples restolho nobiliárquico, mas sim uma  
complexa “instituição” “profundamente burguesa” que, ao mesmo tempo, era marcada  
pelo “absolutismo” e pelos “enormes privilégios políticos dos nobres proprietários de  
terras”. Essa burocracia, que recrutava seus quadros principalmente entre as classes  
sociais intermediárias liberais, unia a moderna “experiência dos mestres da reação da  
Europa ocidental” – isto é, as diversas formas sociais correspondentes à fase de  
dominação social das mais avançadas burguesias europeias ao arcaísmo do  
absolutismo tipicamente russo. Temos aqui um papel complexo e contraditório desta  
burocracia que promove “sob o disfarce de ‘proteção do economicamente fraco’ e  
‘tutela’ sobre” trabalhadores e camponeses “contra o kulak e o usurário, medidas que  
reduzem os trabalhadores à condição de ‘plebe desprezível’” e entregam “suas  
cabeças ao proprietário senhorial de terras”.  
Em outra nota de rodapé, o jovem revolucionário russo reafirma isso ao postular  
que  
os “amigos do povo” são os piores reacionários quando dizem que a  
tarefa natural do estado é proteger os economicamente fracos (assim  
deveria ser, segundo a sua moral banal e envelhecida), enquanto toda  
a história russa e a política interna testemunham que a tarefa do nosso  
estado é proteger apenas os proprietários senhoriais de terra e os  
grandes burgueses e reprimir de forma brutal qualquer tentativa dos  
economicamente fracos” de se defenderem. E essa, é claro, é a sua  
tarefa natural, porque o absolutismo e a burocracia estão  
completamente impregnados do espírito senhorial-burguês8, e  
porque, no domínio econômico, a burguesia reina e governa de forma  
7 Referência ao general Aleksei Andreievitch Araktcheiev, que ascendeu durante o reinado de Pavel I e  
de Aleksandr I, ficando conhecido por sua violência e brutalidade.  
8
É preciso destacar aqui que a expressão russa “крепостнически-буржуазным [krepostnitcheski-  
burjuaznim]” é normalmente traduzida como “feudal-burguês”. No entanto, esta expressão é  
originalmente constituída pela palavra “крепостнически”, que tem sua raiz em “крепость [krepost]” –  
algo como “fortaleza” – e refere-se ao sistema de servidão russo, o chamado “крепостное право  
[krepostnoie pravo]”, que, se tomado em sua literalidade, poderia ser traduzido como “direito de  
servidão” ou “lei de servidão”. Além de existir na língua russa uma palavra específica para “feudal” –  
феодальный [feodalnii]” –, nos parece que “крепостнически” tem um vínculo estreito com a  
especificidade da servidão russa, a qual, muitas vezes, foi comparada com um tipo de escravidão (cf.  
STANZIANI, 2018). Assim, na medida em que “крепостнически” designa literalmente algo “relativo ao  
sistema de servidão”, mas que a tradução “espírito servil-burguês” não expressaria o sentido original  
em nossa língua, optamos pela tradução “espírito senhorial-burguês”.  
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incontestável, mantendo o trabalhador “mais calmo que a água, menor  
que a relva” (LÊNIN, 2022, p. 171).  
Diferentemente dos naródniki “amigos do povo”, a “crítica materialista das  
instituições políticas” permite que Lênin veja que “a tarefa natural do estado” russo  
não “é proteger os economicamente fracos”, mas sim de “proteger apenas os  
proprietários senhoriais de terra e os grandes burgueses”. O que levava o narodismo  
liberal a defender a atuação através das “pequenas ações” – como “a atividade de  
advogados entre o campesinato”, “a proposta de advogados se deslocarem até as  
províncias com sessões itinerantes nos tribunais distritais para a defesa dos réus” e “a  
instalação de armazéns de kustari” (LÊNIN, 2022, p. 168) – era a crença de que seria  
possível convencer o estado russo, por meio destas “pequenas ações”, de  
desempenhar aquela que seria sua “tarefa natural”, isto é, a proteção dos  
“economicamente fracos”. Entretanto, isso contrasta com o fato de que o “absolutismo  
e a burocracia” do estado russo estavam “completamente impregnados do espírito  
senhorial-burguês” e, portanto, tinha como “tarefa natural” “reprimir de forma brutal  
qualquer tentativa dos ‘economicamente fracos’ de se defenderem”.  
Mesmo que a “ausência de direitos dos camponeses”, através da “opressão da  
administração sobre o campesinato”, da subordinação “aos nobres proprietários de  
terras, para quem o desfrute dos direitos civis comuns é concedido apenas como uma  
graça especial” (LÊNIN, 2022, p. 211), remeta principalmente às formas feudais, Lênin  
não defende uma atuação por uma via jurídica, por assim dizer. Um bom exemplo disso  
é que, ao tratar do monopólio de certos ramos da produção na Rússia que contava  
com a chancela do estado tsarista –, Lênin afirma que “esses resquícios da ordem  
medieval apenas acrescentam às desgraças capitalistas ainda desgraças piores as  
medievais”, de modo que, sem “dúvida, é necessário eliminá-los e quanto mais rápido  
e mais radical for, melhor [...]” (LÊNIN, 2022, p. 161). Segundo o revolucionário  
marxista, se as “pequenas ações” – “esse remendo dócil e liberal da ordem atual” –  
não mereceriam uma oposição por parte dos sociais-democratas em princípio (LÊNIN,  
2022, p. 168), sua decisão é pelo método “mais rápido” e “mais radical” que de fato  
elimine os “resquícios da ordem medieval”, mesmo “para que, ao limpar a sociedade  
burguesa das correntes semi-servis que herdou, se libertem as mãos da classe  
trabalhadora, facilitando sua luta contra a burguesia” (LÊNIN, 2022, p. 161).  
Assim, diante dessa ausência de direitos civis dos camponeses que,  
certamente, seria o palco ideal para aqueles que propõem uma espécie de “advocacia  
popular” –, para Lênin, a resolução da questão se dá no âmbito político do problema,  
na medida em que a luta política toca no “espírito senhorial-burguês”, pois não só  
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limpará a “sociedade burguesa” russa das “correntes semi-servis que herdou”, como  
também preparará a classe trabalhadora para a burguesia que, no “domínio  
econômico”, “reina e governa de forma incontestável” (LÊNIN, 2022, p. 171).  
Nos parece, portanto, que a concepção de luta revolucionária leniniana, que  
estabelecia como “tarefa direta” a organização de um partido socialista de  
trabalhadores (LÊNIN, 2022, p. 217), tem apoio precipuamente na esfera da política,  
não constituindo as demandas jurídicas uma forma de luta tática. Mesmo quando se  
trata da “reivindicação de plena restauração dos direitos civis dos camponeses”, de  
“abolição total de todos os privilégios da nobreza” e de “eliminação da tutela  
burocrática sobre o campesinato e concessão de autonomia a eles” (LÊNIN, 2022, p.  
211), Lênin fala de um apoio dos sociais-democratas a tais demandas camponesas  
que tem como pressuposto uma luta política contra o estado “senhorial-burguês”  
tsarista em detrimento das “pequenas ações” dos naródniki liberais, como “a atividade  
de advogados entre o campesinato” e “a proposta de advogados se deslocarem até  
as províncias com sessões itinerantes nos tribunais distritais para a defesa dos réus”  
(LÊNIN, 2022, p. 168).  
Conclusão  
Tendo tudo isto posto, é necessário observar a respeito da posição de  
Pachukanis que se, por um lado, ele nunca cogitou a ideia de uma “advocacia popular”  
propriamente dita, por outro lado, a concepção defendida por ele da advocacia como  
“método de luta” de Lênin demonstrou certa fragilidade diante de alguns fatos. Em  
primeiro lugar, temos a vulnerabilidade da narrativa do caso dos barqueiros de Samara,  
a qual parece muito mais uma anedota do que propriamente um evento da vida de  
Lênin passível de alguma apreciação teórica. Na verdade, a fragilidade dessa narrativa  
é mais um dos diversos pontos da biografia do jovem Lênin sobre o qual temos poucas  
certezas. Como vimos, a falta de uma bibliografia consistente a respeito das  
concepções de formas de luta defendidas por Lênin antes de 1894 dão ensejo a  
diversos tipos de elaborações a respeito de um vínculo do jovem revolucionário às  
táticas do antigo narodismo russo, hipóteses estas tão carentes de comprovação cabal  
quanto aquela hipótese pachukaniana de que a advocacia configurou como “método  
de luta” leniniano. Além do mais, a desconsideração da possibilidade de que Lênin  
tenha exercido a advocacia de modo precipuamente profissional no período 1892-  
1893 como Krausz parece sugerir torna essa posição ainda menos sustentável.  
No que diz respeito a Júlio Moreira, Ricardo Pazello e Pedro Ferreira, a  
fragilidade de origem do caso dos barqueiros não só é transmitido de Pachukanis a  
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eles, como também a afirmação da existência de uma “advocacia popular”  
propriamente dita se choca com a robusta argumentação de Lênin contra as “pequenas  
ações” dos “amigos do povo”, como a atuação e a assistência de advogados aos  
camponeses, a partir de 1894. Como vimos, já em Quem são os “amigos do povo” e  
como lutam contra os sociais-democratas?, há uma clareza no texto leniniano ao  
estabelecer que sua forma de luta baseava-se na organização de um partido social-  
democrata, privilegiando pelo menos até aquele momento a atuação entre os  
trabalhadores fabris urbanos e levando a cabo uma luta política contra o estado  
tsarista – de “espírito senhorial-burguês” – e, ao mesmo tempo, contra a burguesia  
russa, que, no “domínio econômico”, reinava incontestavelmente na Rússia.  
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Como citar:  
BADÔ, Pedro Rocha. Lênin como advogado: um problema inicial no estudo do direito  
na obra leniniana. Verinotio, Rio das Ostras, v. 30, n. 2, pp. 234-255, 2025.  
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