DOI 10.36638/1981-061X.2025.30.2.778  
“Zoon politikon” para Marx: o ser social e a  
historicidade da política  
“Zoon politikon” for Marx: social being and the  
historicity of politics  
Ana Carolina Marra de Andrade*  
Resumo: No presente artigo são feitas  
considerações sobre o uso dado por Marx à  
famosa frase aristotélica “o homem é um animal  
político [ζον πολιτικόν]” em três momentos  
distintos de sua elaboração teórica: nos textos de  
1857-8, nomeadamente a “Introdução” de 1857  
e as Formas que precederam a acumulação  
capitalista, que fazem parte dos Grundrisse; no  
Livro I de O capital: crítica da economia política  
(1867); e nos excertos sobre A sociedade antiga  
de Lewis Morgan, escritos em 1881, publicados  
posteriormente como parte dos chamados  
Cadernos etnológicos de Marx. Assim, analisa-se  
de que modo Marx interpreta a expressão  
aristotélica, e até que ponto é possível considerar  
que ele discorda da afirmação de que “o homem  
é um animal político [ζον πολιτικόν]”. Entende-  
se que Marx insere a afirmação em seu contexto  
histórico, enquanto uma “característica da  
Antiguidade clássica”, mas que remete também  
Abstract: This article discusses Marx's use of the  
famous Aristotelian phrase “man is a political  
animal [ζον πολιτικόν]” at three different  
moments in his theoretical development: in the  
texts of 1857-8, namely the Introduction of  
1857 and the Forms that preceded capitalist  
accumulation, which are part of the Grundrisse;  
in book I of Capital: critique of political economy  
(1867); and in the excerpts on Lewis Morgan's  
Ancient Society, written in 1881, later published  
as part of Marx's so-called Ethnological  
notebooks. Thus, we analyze how Marx  
interprets the Aristotelian expression, and to  
what extent it is possible to consider that he  
disagrees with the statement that “man is a  
political animal [ζον πολιτικόν]”. It is  
understood that Marx places the statement in  
its historical context, as a “characteristic of  
Classical Antiquity”, but that it also refers to an  
important universal feature: the sociability of the  
human being, that is “if not a political animal, in  
any case a social animal”. With these inferences,  
Marx opposes theorists who take the isolated  
individual as their historical starting point,  
naturalizing civil-bourgeois society. In this  
sense, this analysis is not only relevant as a  
mere Marxian interpretation of Aristotle, but  
also for the unveiling of two fundamental  
concepts for Marx, which are intrinsically  
connected: the ontologically social character of  
the human being and the historicity of politics,  
which ultimately provides the basis for  
overcoming the State itself as a human creation.  
para um caráter universal importante:  
a
sociabilidade do ser humano, que é, a saber, “se  
não um animal político, em todo caso um animal  
social”. Com essas inferências, Marx se opõe aos  
teóricos que tomam o indivíduo isolado  
enquanto  
ponto  
de  
partida  
histórico,  
naturalizando a sociedade civil-burguesa. Nesse  
sentido, esta análise não é relevante apenas  
enquanto mera interpretação marxiana de  
Aristóteles, mas também para a apresentação de  
duas concepções fundamentais para Marx,  
intrinsecamente  
conectadas:  
o
caráter  
ontologicamente social do ser humano e a  
historicidade da política, o que, em última  
análise, fornece as bases para a superação do  
próprio estado enquanto criação humana.  
Keywords: Political animal; social being; Karl  
Marx; history.  
Palavras-chave: Animal político; ser social; Karl  
Marx; história.  
* Mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).  
E-mail: anamarra7@gmail.com. Orcid: 0000-0002-8477-8578.  
ISSN 1981 - 061X v. 30, n. 2 jul.-dez., 2025  
Verinotio  
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“Zoon politikon” para Marx: o ser social e a historicidade da política  
[...] e assim elas [as pessoas] estão jogando seus problemas na sociedade, e  
quem é a sociedade? Isso não existe! Existem homens e mulheres individuais  
e existem famílias, e nenhum governo pode fazer nada a não ser por  
intermédio das pessoas, e as pessoas olham para si mesmas primeiro. [...] Se  
as crianças têm um problema, a culpa é da sociedade. Não existe essa coisa  
de sociedade. Há uma malha viva de homens, mulheres e pessoas, e a beleza  
dessa malha e a qualidade de nossas vidas dependerão do quanto cada um  
de nós está preparado para assumir a responsabilidade por si mesmo e  
[quanto] cada um de nós estará preparado para dar a volta por cima e ajudar  
com seus próprios esforços aqueles que são desafortunados.  
Margaret Thatcher, 19871  
Introdução: a recepção marxiana d’A política e posição do problema  
A célebre frase aristotélica “o homem é um animal político [ζον πολιτικόν]”  
figura entre as afirmações mais retomadas na história da filosofia. No presente artigo,  
examina-se como Karl Marx interpreta tal asserção, evidenciando-a como um  
diagnóstico da Antiguidade clássica. Argumenta-se, assim, que Marx, em diferentes  
momentos, resgata a frase não como um mero intérprete do filósofo grego, mas no  
intuito de destacar algo importante para seu próprio arcabouço teórico: como o ser  
humano, enquanto ser social, possui uma natureza histórica.  
Para isso, abordaremos como essa concepção aparece em três momentos  
diferentes da obra do autor: (1) em dois dos textos que vieram a integrar os  
Manuscritos econômicos de 1857-1858 ou Esboços da crítica da economia política ou  
Grundrisse, especificamente a Introdução de 1857 e as Formas que precederam a  
acumulação capitalista; (2) dez anos depois, no primeiro livro de O capital: crítica da  
economia política (1867); e, por fim, em (3) seus extratos sobre Lewis Henry Morgan,  
um conjunto de anotações redigidas em 1881 sobre a obra A sociedade Antiga  
[Ancient society] (1877), publicadas pela primeira vez em 1972, nos assim chamados  
Cadernos etnológicos, compilados por Lawrence Krader. Em seguida, iremos trazer um  
breve debate com outros textos de Marx, passando pela noção de ser social  
apresentada nos Manuscritos econômico-filosóficos de 1844, e a concepção de estado  
desenvolvida pelo autor em seus excertos sobre Lições sobre a história antiga das  
instituições [Lectures on the early history of institutions] (1875), de Henry Sumner  
Maine, também parte dos assim chamados Cadernos etnológicos.  
Com isso, pretende-se traçar um panorama de como Marx enxerga a afirmação  
1
Em tradução livre de: “[...] and so they [the people] are casting their problems on society and who is  
society? There is no such thing! There are individual men and women and there are families and no  
government can do anything except through people and people look to themselves first. [...] If children  
have a problem, it is society that is at fault. There is no such thing as society. There is living tapestry of  
men and women and people and the beauty of that tapestry and the quality of our lives will depend  
upon how much each of us is prepared to take responsibility for ourselves and each of us prepared to  
turn round and help by our own efforts those who are unfortunate.”  
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aristotélica, que, adianta-se, é compreendida em relação a seu contexto histórico.  
Nesse sentido, entende-se que tal asserção exprime uma consideração relevante para  
a obra marxiana que remete ao modo como o próprio Marx entende o ser humano,  
porém diferenciando-se de Aristóteles ao reconhecer o caráter especificamente  
histórico de sua consideração isto é, a historicidade da pólis. Não obstante, o  
diagnóstico aristotélico também pode ser interpretado como uma constatação acerca  
da sociabilidade do ser humano, algo que é ignorado por boa parte da teoria burguesa,  
que parte do ponto de vista do indivíduo isolado. Assim, é importante retomar este  
tema na obra de Marx como uma chave para sua própria compreensão acerca do ser  
humano. Em suma, pretende-se demonstrar como, para Marx, o ser humano é  
ontologicamente social, em outras palavras, é um ser social.  
Nosso objetivo não é interpretar a teoria de Aristóteles, e sim entender Marx.  
Não obstante, para isso, será necessário apresentar, ainda que superficialmente, o  
contexto em que a frase em questão é apresentada em A política. Ela aparece no cap.  
2, “Origem da cidade: casal, família aldeia; leia-se:  
Estas considerações evidenciam que uma cidade é uma daquelas  
coisas que existem por natureza e que o homem é, por natureza, um  
ser vivo político. Aquele que, por natureza e não por acaso, não tiver  
cidade, será um ser decaído ou sobre-humano, tal como o homem  
condenado por Homero como "sem família, nem lei, nem lar"; porque  
aquele que é assim por natureza, está, além do mais, sedento de ir  
para a guerra, e é comparável à peça isolada de um jogo. (1253a, 1-  
7).  
ζον πολιτικόν, transliterado2, Zoon politikon, que se costuma traduzir por  
animal social, ou animal político ou animal da pólis; “ζον” animal, ser animado, e  
πολτικόν” é, político ou referente à “πλις”. Zoon é uma palavra que pode significar  
animado ou animal, isto é, ser vivo no sentido de que possui anima, sopro vital.  
Utilizamos a tradução de António Campelo Amaral e Carlos de Carvalho Gomes, em  
português de Portugal, na qual ζον πολιτικόν foi traduzido como ser vivo político.  
Não vamos nos delongar em questões de tradução, até mesmo porque, para os fins  
do presente trabalho, é mais relevante a interpretação marxiana que o sentido  
aristotélico original.  
Logo, pode-se entender que, para Aristóteles, o ser humano é o ser da pólis, a  
cidade-estado grega. Sobre o que entende pela cidade, ainda no segundo capítulo de  
A política, tem-se que:  
A cidade, enfim, é uma comunidade completa, formada a partir de  
várias aldeias e que, por assim dizer, atinge o máximo de  
2
Para as regras de transliteração, cf. Prado (2006).  
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autossuficiência. Formada a princípio para preservar a vida, a cidade  
subsiste para assegurar a vida boa. É por isso que toda a cidade existe  
por natureza, se as comunidades primeiras assim o foram. A cidade é  
o fim destas, e a natureza de uma coisa é o seu fim, já que, sempre  
que o processo de génese de uma coisa se encontre completo, é a  
isso que chamamos a sua natureza, seja de um homem, de um cavalo,  
ou de uma casa. Além disso, a causa final, o fim de uma coisa, é o seu  
melhor bem, e a autossuficiência é, simultaneamente, um fim e o  
melhor dos bens. (1252a, 28 - 1253a, 1).  
Assim, a cidade não apenas cumpre o papel inicial de preservação da vida  
humana, mas também o de “assegurar a boa vida”. O ser humano em si não é  
autossuficiente, mas a cidade o é, sendo, assim, um animal social, isto é, que vive em  
sociedade. O bem é a finalidade humana, e a vida na cidade é uma condição teleológica  
para alcançar o bem, sendo, portanto, a essência da natureza do homem. Não há um  
homem que não tem cidade por natureza (e não por acaso), sendo então “um ser  
decaído ou sobre-humano”, e Aristóteles expõe os motivos para tal da seguinte  
maneira:  
A razão pela qual o homem, mais do que uma abelha ou um animal  
gregário, é um ser vivo político em sentido plena, é óbvia. A natureza,  
conforme dizemos, não faz nada ao desbarato, e só o homem, de entre  
todos os seres vivos, possui a palavra. Assim, enquanto a voz indica  
prazer ou sofrimento, e nesse sentido é também atributo de outros  
animais (cuja natureza também atinge sensações de dor e de prazer e  
é capaz de as indicar), o discurso, por outro lado, serve para tomar  
claro o útil e o prejudicial e, por conseguinte, o justo e o injusto. E  
que, perante os outros seres vivos, o homem tem as suas  
peculiaridades: só ele sente o bem e o mal, o justo e o injusto; é a  
comunidade destes sentimentos que produz a família e a cidade  
(1253a, 8-17).  
Logo, o homem não é um mero animal gregário. Como um animal dotado da  
palavra, do discurso (logos), é essencialmente um ser vivo político, de modo que “só  
ele sente o bem e o mal, o justo e o injusto”, sentimentos que conjuntamente produzem  
a família e a cidade, que vão além do gregarismo, isto é, de uma mera aglomeração  
de pessoas. Desta compreensão, estão excluídos mulheres, estrangeiros, escravos e  
homens não-adultos. Como explica Henrique Cláudio de Lima Vaz, o “homem” para  
Aristóteles é o “homem livre” ou “cidadão” da pólis:  
O homem livre, o eleútheros na tradição grega, é aquele que tem  
direito à palavra na assembleia dos cidadãos. Mas a pólis abriga em  
seu seio o mudo trabalho do escravo, igualado à condição do animal  
entre os bens do oikos, da sociedade doméstica. Na esfera do político  
a relação do reconhecimento se efetiva historicamente na liberdade  
de palavra do cidadão. (1981, p. 24)  
O homem livre, o cidadão, é aquele que tem direito à palavra, participando das  
discussões na Ágora, e por isso a importância do discurso. Não cabe ao escopo do  
presente artigo entrar em mais minúcias sobre as citações aristotélicas. A partir desta  
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apresentação superficial, já é possível adentrar no debate proposto por Marx, que irá  
se debruçar na especificidade histórica desta asserção, desenvolvendo uma  
compreensão própria sobre a natureza humana. Ao resgatar o traçado aristotélico,  
Marx se opõe à naturalização do indivíduo moderno como um pressuposto a-histórico,  
muito comum à economia política, compreende o ser humano enquanto um ser social.  
Vejamos primeiramente como isso se coloca nos manuscritos econômicos de 1857-8.  
Os textos de 57-8: um animal social  
1. “Introdução” de 1857: um animal que se isola em sociedade  
No manuscrito intitulado “Introdução”, feito em 1857, tido, em geral, como  
parte integrante dos manuscritos econômico-filosóficos posteriormente denominados  
Grundrisse, Marx escreve que “O ser humano é, no sentido mais literal, um ζον  
πολιτικόν3, não apenas um animal social, mas um animal que somente pode isolar-se  
em sociedade” (MARX, 2011, p. 40). Voltemo-nos para o contexto dessa afirmação.  
Marx está tratando da produção material, e afirma que seu primeiro pressuposto é a  
sociedade humana: “Indivíduos produzindo em sociedade por isso, o ponto de  
partida é, naturalmente, a produção dos indivíduos socialmente determinada” (MARX,  
2011, p. 39). O autor de O capital não poderia ser mais claro: toda produção material  
pressupõe indivíduos em sociedade. O que pode parecer óbvio é o oposto do que se  
servem os economistas políticos clássicos:  
O caçador e o pescador, singulares e isolados, pelos quais começam  
Smith e Ricardo, pertencem às ilusões desprovidas de fantasia das  
robinsonadas do século XVIII, ilusões que de forma alguma expressam,  
como imaginam os historiadores da cultura, simplesmente uma reação  
ao excesso de refinamento e um retorno a uma vida natural mal-  
entendida. (MARX, 2011, p. 39)  
Smith e Ricardo, portanto, recorrem a “robinsonadas” para explicar a história, a  
saber, uma transposição das relações da sociedade civil-burguesa até um tempo  
fantástico remoto que serviria para uma analogia da gênese própria sociedade-civil  
burguesa. Os economistas políticos do século XVIII antecipam a sociedade capitalista,  
consequentemente, naturalizando-a. Assim, “não se trata de uma mera crítica ao  
romance oitocentista de Daniel Defoe, mas é uma anedota sobre a transposição do  
mundo capitalista até o mundo abstrato da economia política, feita com frequência  
pelos economistas políticos” (ANDRADE, 2023, p. 7).  
Como coloca Musto, na “Introduçãode 1857 esta concepção teórica, que  
3 Transliterado, “Zoon politikon”.  
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reforça o ponto de vista burguês, é a que Marx está tentando rebater: “O alvo polêmico  
de Marx eram as ‘robinsonadas do século XVIII, o mito de Robinson Crusoé como  
paradigma do Homo oeconomicus, ou a extensão dos fenômenos típicos da era  
burguesa a todas as outras sociedades que já existiram, inclusive as primitivas.” (2023,  
p. 37) Marx aponta que essa transposição é falsa, e que “antes dessa época, o  
indivíduo isolado, típico da era capitalista, simplesmente não existia” (MARX, 2011, p.  
39)4.  
Nesse sentido, também estamos de acordo com Alves quando afirma que:  
Este peso de pressuposto é dado exatamente em virtude de ser a  
existência social dos indivíduos um fato inegável, primário, o qual  
garante e estabelece a produção e as ações daqueles. Toda produção  
e manifestação individuais são determinadas, em Marx, pelo ser em  
comum dos indivíduos. A propositura acerca da existência primária de  
indivíduos isolados, livres por natureza, essencialmente indiferentes,  
se encontra também negada, em razão desta mesma determinação.  
(1999, p. 17)  
O pressuposto da “produção dos indivíduos socialmente determinada” é,  
portanto, um pressuposto do caráter social do ser humano. O próprio indivíduo, na  
concepção moderna, possui uma gênese histórica, ou seja, é ele próprio socialmente  
produzido, de modo que não pode existir um indivíduo isolado e livre por natureza.  
Essa noção fica mais clara na análise do curso da história, nas palavras de Marx:  
“Quanto mais fundo voltamos na história, mais o indivíduo, e por isso também o  
indivíduo que produz, aparece como dependente, como membro de um todo maior.”  
(MARX, 2011, p. 40) O ponto de vista dos economistas políticos é o do indivíduo  
isolado, o indivíduo da sociedade civil-burguesa: “Somente no século XVIII, com a  
‘sociedade burguesa’5, as diversas formas de conexão social confrontam o indivíduo  
como simples meio para seus fins privados, como necessidade exterior. Mas a época  
que produz esse ponto de vista, o ponto de vista do indivíduo isolado, é justamente a  
época das relações sociais (universais desde esse ponto de vista) mais desenvolvidas  
até o presente.” (MARX, 2011, p. 40)  
4
Marx também utiliza a expressão “robinsonadas”, ou outras referências a Robinson Crusoé sentido  
semelhante, em Miséria da filosofia: resposta à Filosofia da miséria do Sr. Proudhon, no Livro I de O  
capital. Não iremos aprofundar, aqui, no tema das “robinsonadas”, mas para fins de elucidação  
menciona-se a explicação de Alves: “As robinsonadas são determinadas como sendo, na melhor das  
hipóteses, "uma antecipação da 'sociedade civil', que se preparava desde o século XVI e que, no século  
XVIII deu passos gigantescos à sua maturidade. Nessa sociedade onde reina a livre concorrência, o  
indivíduo aparece destacado dos liames naturais, etc., que faziam dele em épocas anteriores dependente  
de um aglomerado humano determinado e delimitado." Tais proposituras expressariam de uma maneira  
idealizada e abstrata o fato de os indivíduos, nesta nova forma societária, poderem atuar frente aos  
seus múltiplos nexos recíprocos, de maneira livre e independente.” (1999, p. 18)  
5 Trouxemos a citação conforme traduzido na edição em questão (cf. MARX, 2011), mas entende-se que  
o termo em alemão “bürgerliche Gesellschaft” é melhor traduzido por sociedade civil-burguesa, termo  
utilizado por nós, em substituição da “sociedade burguesa”, ao longo do presente texto.  
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Nesse contexto, Marx parece reafirmar a constatação de Aristóteles: “O ser  
humano é, no sentido mais literal, um ζον πολιτικόν”, porém o sentido ressaltado  
aqui é o seu caráter social em geral, não o caráter específico da sociedade política  
grega. Em outras palavras, Marx está enfatizando o sentido de que o ser humano  
precisa viver em sociedade e até mesmo o isolamento individual só é possível  
pressupondo um grupo social não especificamente em uma sociedade propriamente  
política. Como coloca Musto, “Marx nunca negou que o homem fosse um ζον  
πολιτικόν (zoon politikon), um animal social, mas enfatizou que ele era um animal que  
só pode se isolar na sociedade’” (2023, p. 39).  
Assim, o próprio indivíduo isolado é socialmente produzido e historicamente  
situado, e então: “A produção do singular isolado fora da sociedade – um caso  
excepcional que decerto pode muito bem ocorrer a um civilizado, já potencialmente  
dotado das capacidades da sociedade, por acaso perdido na selva é tão absurda  
quanto o desenvolvimento da linguagem sem indivíduos vivendo juntos e falando uns  
com os outros.” (MARX, 2011, p. 40) O ser humano é um animal político em seu  
sentido social, e é neste sentido de sua afirmação que Aristóteles estaria correto. Não  
obstante, como veremos, isso não significa que Marx concorda com o todo da  
afirmação em especial, com seu caráter político.  
A interpretação marxiana do traçado aristotélico deve ser tratada, aqui, como  
uma crítica à noção do indivíduo ontologicamente isolado, que é necessariamente  
imaginária, dado que a própria produção deste indivíduo é social e histórica. A  
sociabilidade humana é um pressuposto de toda a produção. Marx afirma, portanto, o  
caráter do ser humano enquanto um ser social, e, como ficará explícito a seguir, de  
forma alguma isso significa que Marx concorde com o sentido político do Zoon  
politikon.  
2. Formen: um animal gregário, de forma alguma em sentido político  
Em Formas que precederam a produção capitalista [Formen, die der  
kapitalistischen Produktion vorhergehen], conhecido apenas como Formen, texto que  
também faz parte dos Grundrisse, ao tratar de formas que precederam o modo de  
produção capitalista, Marx afirma o seguinte: “O ser humano só se individualiza pelo  
processo histórico. Ele aparece originalmente como um ser genérico, ser tribal, animal  
gregário ainda que de forma alguma como um ζον πολιτικόν em sentido político.”  
(MARX, 2011, p. 407) Esta afirmação é um complemento ao comentário anterior,  
deixando ainda mais claro que o ser humano é um Zoon politikon no sentido social  
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implicado no termo, não em seu sentido político.  
Ao voltar-se para a história, Marx segue sua crítica às noções que partem do  
ponto de partida do indivíduo isolado. Em suma, é como afirma György Lukács:  
Marx polemiza contra a imaginária, restrita ao plano da consciência,  
não ontológica constituição do indivíduo isolado, tendo em vista  
sempre as grandes questões da teoria da sociedade. Trata-se, em  
última análise, de que não são os indivíduos que ‘constroem’ a  
sociedade, mas de que eles, ao contrário, surgem da sociedade, do  
desenvolvimento da sociedade, e que, portanto repetindo o que já  
enfatizamos várias vezes , o complexo real tem sempre prioridade  
ontológica sobre seus componentes. (2018, pp. 398-9)  
Assim, o ser humano é social, e este é um pressuposto da produção em geral  
e, com isso, da própria história. Não obstante, ele não é político nesse mesmo sentido.  
Do mesmo modo que os indivíduos não constroem a sociedade, mas surgem da  
sociedade, a política não é uma característica inerente dos seres humanos, mas um  
construto social. Ao voltar-nos para a história, percebe-se que o ser humano aparece  
originalmente como um ser que possui um elo imediato com seu todo social “um ser  
genérico, ser tribal, animal gregário”.  
A forma inicial de organização comunitária humana é um gregarismo, um  
sistema de coletividade tribal. Como Marx explica: “A coletividade tribal que surge  
naturalmente, ou, se preferirmos, o gregarismo, é o primeiro pressuposto a  
comunidade de sangue, linguagem, costumes etc. da apropriação das condições  
objetivas da sua vida e da atividade que a reproduz e objetiva (atividade como pastor,  
caçador, agricultor etc.).” (MARX, 2011, p. 389) Nesse sentido, o pertencimento a uma  
sociedade natural e espontânea (aqui, sinônimo de tribo) é uma “condição natural de  
produção para o indivíduo vivo” (MARX, 2011, p. 403), e “equivale neste contexto a  
ser mero membro de um conjunto, pertencer inteiramente a ele, beirando à indistinção,  
tal o significado de ser de rebanho” (MARX, 2011, p. 48).  
Para Marx, portanto, o ser humano nos primórdios de sua história pode de fato  
aparecer enquanto um animal gregário, no sentido de “um ser genérico, ser tribal”, de  
modo que a individualidade se coloca imersa dentro do todo social, mediada pela  
coletividade, isto é, o ser humano que não é um indivíduo propriamente dito no sentido  
moderno. Para Aristóteles, o ser humano não é um animal gregário, como seria a  
abelha, por exemplo, por causa da palavra “a razão pela qual o homem, mais do que  
uma abelha ou um animal gregário, é um ser vivo político em sentido plena, é óbvia.  
A natureza, conforme dizemos, não faz nada ao desbarato, e só o homem, de entre  
todos os seres vivos, possui a palavra” (1253a). No entanto, o gregarismo tratado por  
Marx aqui não está colocado como oposto à linguagem, ao discurso (logos), sendo  
afirmado no sentido de reforçar a inexistência do indivíduo autônomo. O gregarismo  
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mesmo comporta a existência da linguagem, dos costumes, da comunidade organizada  
em torno do parentesco. Nas palavras de Marx: “A coletividade tribal que surge  
naturalmente, ou, se preferirmos, o gregarismo, é o primeiro pressuposto a  
comunidade de sangue, linguagem, costumes etc. da apropriação das condições  
objetivas da sua vida e da atividade que a reproduz e objetiva (atividade como pastor,  
caçador, agricultor etc.).” (MARX, 2011, p. 389)  
Assim, o que está em questão na afirmação do gregarismo é que a própria  
individualidade é historicamente situada, enquanto a sociedade é uma condição de  
existência do ser humano, enquanto condição da própria história. As mudanças da  
própria natureza humana só são compreensíveis na medida em que os seres humanos  
transformam a si próprios em comunidade, fazendo a história. O ser humano aparece  
inicialmente como um ser genérico, isto é, cuja própria existência individual se coloca  
imersa nos laços sociais ser é pertencer imediatamente à comunidade, ou seja: a  
coletividade é um pressuposto da existência do ser humano, para a reprodução e  
produção de sua própria vida. E na Antiguidade, indivíduo e sociedade aparecem de  
modo de fato indissociáveis, como coloca J. Chasin:  
Zoon politikon, o homem é aristotelicamente, isto sim, naturalmente  
social, ou seja, tem por condição natural a sociabilidade, fora da qual  
a realização de sua individualidade fica comprometida, ou se torna  
mesmo impossível. [...] Diante disto, é impossível a contraposição  
entre indivíduo e sociabilidade, o que de fato é uma figura  
teoricamente desconhecida na Grécia Antiga. (2023, p. 140)  
O ser humano é um ser social, e Aristóteles percebe-o a partir da  
impossibilidade da individualidade fora da sociedade. Porém, como uma condição da  
própria história, não significa que o ser humano é imutável, pelo contrário, a própria  
existência do ser gregário é historicamente situada. Do mesmo modo, o ser humano  
só aparece enquanto indivíduo a partir de um determinado momento histórico, porque  
ele só pode se isolar já em sociedade. Como coloca Alves: “Os indivíduos não entram  
em relação por via de uma deliberação autônoma, nem é para eles uma acidentalidade,  
mas é assim a condictio sine qua non da realização dos fins individuais. A relação dos  
indivíduos entre si é a possibilidade da existência destes, enquanto individualidades  
propriamente ditas.” (1999, p. 23) Nesse sentido, o gregarismo inicial tampouco deve  
ser compreendido como uma mera aglomeração de indivíduos, mas uma coletividade  
complexa na qual não há a compreensão do indivíduo isolado.  
Se ser humano é pertencer à sociedade, para Aristóteles é ser o cidadão grego,  
conceito do qual, é válido ressaltar, estão excluídos mulheres, estrangeiros, escravos  
e homens não-adultos. O ser humano é, portanto, um ser social, que em um  
determinado momento histórico aparece “como um ζον πολιτικόν em sentido  
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“Zoon politikon” para Marx: o ser social e a historicidade da política  
político, como apareceu para Aristóteles. Na Antiguidade, ele não é mais o ser  
gregário, mas suas relações sociais são mediadas pela pólis. Como vamos mencionar  
posteriormente, para Marx este “político” se refere à politicidade Antiga, ao cidadão  
da pólis, cidade-estado grega, não tem o mesmo sentido da política moderna. Por  
hora, é suficiente compreender que a própria politicidade em geral é um atributo  
histórico. Marx, portanto, nega o caráter naturalmente político do ser humano, mas  
reafirma sua existência enquanto um ser social, o que é a condição de sua própria  
historicidade. A política não é um fator eterno, sempre existente, e nem tampouco a  
própria finalidade da vida humana em sociedade, como coloca Aristóteles, mas o  
resultado de um processo histórico. Em O capital: crítica da economia política, Marx  
irá retomar essa concepção, novamente enfatizando o caráter propriamente grego da  
asserção aristotélica.  
O capital: se não um animal político, em todo caso um animal social  
No “Capítulo 11. Cooperação, da Seção IV. A produção de mais-valor relativo,  
do Livro I d' O capital, Marx, ao tratar do grande aumento de rendimento da produção  
capitalista com a implementação da fusão das forças individuais, acelerando o  
rendimento dos trabalhadores, traça o seguinte paralelo com a afirmação aristotélica:  
Sem considerar a nova potência que surge da fusão de muitas forças  
numa força conjunta, o simples contato social provoca, na maior parte  
dos trabalhos produtivos, emulação e excitação particular dos  
espíritos vitais [animal spirits] que elevam o rendimento dos  
trabalhadores individuais, fazendo com que uma dúzia de indivíduos  
forneça, numa jornada de trabalho simultânea de 144 horas, um  
produto total muito maior qe o de doze trabalhadores isolados, cada  
um deles trabalhando 12 horas, ou que o de um trabalhador que  
trabalhe 12 dias consecutivos. A razão disso está em que o homem é,  
por natureza, se não um animal político, como diz Aristóteles, em todo  
caso um animal social. [...] A definição de Aristóteles é, na verdade, a  
de que o homem é cidadão por natureza. Ela é tão característica da  
Antiguidade clássica quanto a definição de Franklin, segundo a qual  
o homem é por natureza um fazedor de instrumentos, é característica  
da sociedade ianque. (MARX, 2017, pp. 401-2)  
No trecho acima, Marx está tratando da cooperação, uma “forma de trabalho  
em que muitos indivíduos trabalham de modo planejado, uns ao lado dos outros e em  
conjunto, no mesmo processo de produção ou em processos de produção diferentes  
porém conexos” (MARX, 2017, p. 400). É evidente que o rendimento da produção  
coletiva é materialmente muito superior ao da produção de indivíduos isolados, de  
modo que o trabalho de cada um representando diferentes fases do processo de  
trabalho total, como partes contínuas de uma ação conjunta, a produção se eleva  
quantitativamente. Porém, a diferença quantitativa gera outra diferença, de caráter  
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qualitativo, na produção, de modo que “não se trata somente do aumento da força  
produtiva individual por meio da cooperação, mas da criação de uma força produtiva  
que tem de ser, por si mesma, uma força de massas” (MARX, 2017, p. 401). Assim,  
trabalhadores empregados por um mesmo capital individual é um marco da gênese da  
própria produção capitalista (cf. MARX, 2017, p. 397)  
Conforme Marx, a potência da agregação de trabalhadores na elevação do  
rendimento fabril está relacionada com uma característica inerente do ser humano –  
sua sociabilidade, a condição sine qua non da própria produção. Nesse sentido, “ao  
cooperar com outros de modo planejado, o trabalhador supera suas limitações  
individuais e desenvolve sua capacidade genérica [Gattungsvermögen]” (MARX, 2017,  
p. 405). A produção humana enquanto essencialmente coletiva é potencializada, a  
saber, tem seus níveis de produtividade elevados, com a cooperação6.  
O que nos interessa nesse contexto é que Marx reitera sua concepção já  
apresentada nos manuscritos econômicos de 1857-8: o homem é um Zoon politikon  
em seu sentido social, não em seu sentido político. Porém, o autor acrescenta, ainda,  
que a caracterização inerentemente política do homem é um diagnóstico de sua época,  
isto é, também tem valor histórico. Na Antiguidade grega, o homem de fato aparece  
como o cidadão da pólis, o ser vivo político, e Aristóteles acerta na medida em que  
faz um diagnóstico da própria sociedade grega. Do mesmo modo, é possível afirmar  
sobre os Estados Unidos no século XVIII que “o homem é por natureza um fazedor de  
instrumentos” – esta é uma “característica da sociedade ianque”, um diagnóstico  
atribuído a Benjamin Franklin que serve para seu próprio tempo.  
A definição de Franklin, como a de Aristóteles, também esconde algo sobre a  
natureza humana: o trabalho em geral como uma categoria que diferencia o ser  
humano dos animais7. O paralelo suscitado por Marx no “Capítulo 11”, destacado por  
nós, pressupõe uma discussão já trazida no “Capítulo 5. O processo de trabalho e o  
processo de valorização. Para Marx:  
O uso e a criação de meios de trabalho, embora já existam em germe  
6
No capítulo seguinte, Marx avança afirmando que “a cooperação fundada na divisão do trabalho  
assume sua forma clássica na manufatura. Como forma característica do processo de produção  
capitalista, ela predomina ao longo do período propriamente manufatureiro, que, em linhas gerais,  
estende-se da metade do século XVI até o último terço do século XVIII” (MARX, 2017, p. 411).  
7 É válido mencionar que, como explica Maurício Vieira Martins: “Marx foi acusado por seus críticos de  
haver incorrido numa espécie de glorificação do trabalho erro de interpretação de Hannah Arendt que  
tristemente fez escola na literatura posterior , de haver ingenuamente suposto que, pelo desabrochar  
do ato laboral, seria possível chegar a algo semelhante a uma redenção da humanidade. Porém, quando  
se examina com atenção os textos de Marx, ele se apresenta como um crítico arguto do Arbeit, do  
trabalho realizado sob a pressão da necessidade. O que é valorizado pelo autor é a atividade [Tätigkeit]  
consciente, que permite a expansão da vontade e não renuncia à interação com segmentos mais  
diferenciados da realidade. É neste âmbito que se entendem as restrições do autor diante da visão  
parcial de Hegel e dos economistas.” (2024, p. 42)  
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em certas espécies de animais, é uma característica específica do  
processo de trabalho humano, razão pela qual Franklin define o  
homem como “a toolmaking animal”, um animal que faz ferramentas.  
A mesma importância que as relíquias de ossos tem para o  
conhecimento de organização das espécies de animais distintas têm  
também as relíquias dos meios de trabalho para a compreensão de  
formações socioeconômicas extintas. O que diferencia as épocas  
econômicas não é “o que” é produzido, mas “como”, “com que meios  
de trabalho”. (MARX, 2017, p. 257)  
O trabalho a que Marx se refere, aqui, trata-se do metabolismo entre ser  
humano e natureza, o pôr teleológico do ser humano que transforma tanto a natureza  
externa quanto a interna a si. Em suas palavras:  
O trabalho é, antes de tudo, um processo entre o homem e a natureza,  
processo este em que o homem, por sua própria ação, medeia, regula  
e controla seu metabolismo com a natureza. Ele se confronta com a  
matéria natural como com uma potência natural [Naturmacht]. A fim  
de se apropriar da matéria natural de uma forma útil para sua própria  
vida, ele põe em movimento as forças naturais pertencentes a sua  
corporeidade: seus braços e pernas, cabeça e mãos. Agindo sobre a  
natureza externa e modificando-a por meio desse movimento, ele  
modifica, ao mesmo tempo, sua própria natureza. [...] Pressupomos o  
trabalho numa forma em que ele diz respeito unicamente ao homem.  
Uma aranha executa operações semelhantes às do tecelão, e uma  
abelha envergonha muitos arquitetos com a estrutura de sua colmeia.  
Porém, o que desde o início distingue o pior arquiteto da melhor  
abelha é o fato de que o primeiro tem a colmeia em sua mente antes  
de construí-la com a cera. No final do processo de trabalho, chega-se  
a um resultado que já estava presente na representação do  
trabalhador no início do processo, portanto, um resultado que já  
existia idealmente. (MARX, 2017, pp. 255-6)  
Essa definição de trabalho, essencialmente humana, subjaz à concepção  
historicamente ianque da afirmação de Franklin, que é, ao mesmo tempo, um reflexo  
da aparência do ser humano em suas determinações históricas específicas. Para Marx:  
“Como criador de valores de uso, como trabalho útil, o trabalho é, assim, uma condição  
de existência do homem, independente de todas as formas sociais, eterna necessidade  
natural de mediação do metabolismo entre homem e natureza e, portanto, da vida  
humana.” (MARX, 2017, p. 120). O trabalho como metabolismo entre ser humano e  
natureza é o que faz o ser humano ser capaz de transformar a si próprio, é um  
pressuposto da história, assim como sua socialidade, fundamento de qualquer  
produção.  
Para Marx, as categorias, portanto, possuem um desenvolvimento histórico.  
Uma categoria que é verdadeira em determinado contexto histórico e geográfico pode  
não ser para outro. Portanto, o diagnóstico de Franklin não é falso, mas é uma  
constatação de como o ser humano aparece nos Estados Unidos no século XIX.  
Aparência, aqui, não deve ser entendida como uma mera ilusão ou uma dissimulação,  
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mas enquanto parte superficial da realidade, em outras palavras, o modo como algo  
se coloca imediatamente. No contexto de Franklin, o homem aparece imediatamente  
como um fazedor de instrumentos; o que é ignorado por sua constatação é a diferença  
da conformação específica da sociedade capitalista ianque diante da definição de  
trabalho humano em geral.  
Assim, a definição de Franklin é característica da sociedade ianque, como a  
Aristóteles não está completamente enganado ao apresentar também o caráter político  
do ser humano na expressão “Zoon politikon”, mas diz algo relativo à sociedade grega.  
De modo semelhante, o caráter social contido na mesma afirmação aristotélica é algo  
que de fato toca o ser humano em geral, e a categoria de trabalho em geral que subjaz  
à definição atribuída a Franklin também. O caráter imanentemente social do ser  
humano é justamente o que permite que a própria natureza humana não seja uma  
essência fixa, mas historicamente mutável o caráter essencialmente social do ser  
humano não é contrário à mutabilidade de sua natureza, mas condição dela. A  
socialidade é o pressuposto da própria história: ela não é o resultado da ação de  
indivíduos isolados, mas o campo no qual os sujeitos se formam e agem, de modo que  
Os homens fazem a sua própria história; contudo, não a fazem de livre  
e espontânea vontade, pois não são eles quem escolhem as  
circunstâncias sob as quais ela é feita, mas estas lhes foram  
transmitidas assim como se encontram. A tradição de todas as  
gerações passadas é como um pesadelo que comprime o cérebro dos  
vivos. (MARX, 2011a, p. 25)  
Isso, contudo, não implica negar a importância dos indivíduos na história ao  
contrário, figuras históricas singulares só podem ser plenamente compreendidas em  
sua relevância a partir das determinações sociais de seu tempo. Se “as circunstâncias  
fazem os homens, assim como os homens fazem as circunstâncias” (ENGELS; MARX,  
2007, pp. 42-3), é precisamente no interior do prisma social que o indivíduo encontra  
as condições de sua própria ação, as condições da própria história. Na concepção  
marxiana da história é necessário a compreensão da relação entre indivíduo e todo  
social. As más compreensões da história são aquelas que isolam um de seus  
elementos: o indivíduo ou o todo social, colocando-se como um predomínio absoluto  
diante do outro, como coloca Lukács:  
Para compreender a especificidade do ser social é preciso  
compreender e ter presente essa duplicidade: a simultânea  
dependência e independência de seus produtos e processos  
específicos em relação aos atos individuais que, no plano imediato,  
fazem com que eles surjam e prossigam. As muitas más interpretações  
do ser social nascem, em sua maioria, porque um dos dois  
componentes que só são reais em sua interação recíproca é inflado  
à condição de único existente ou como o que possui predomínio  
absoluto. (LUKÁCS, 2018, p. 345)  
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“Zoon politikon” para Marx: o ser social e a historicidade da política  
O ser social deve ser entendido a partir do todo social e dos atos individuais,  
isto é, à luz da “simultânea dependência e independência de seus produtos e  
processos específicos em relação aos atos individuais”. O ser humano em sociedade  
produz a si próprio através do trabalho, isto é, do metabolismo com a natureza, e  
assim faz sua própria história (mas não de pura e espontânea vontade).  
Em suma, retoma-se que, ao tentar entender o contexto ao qual Aristóteles se  
refere, chega-se à historicidade da política: ela não é uma essência do ser humano,  
mas algo que emerge historicamente, uma construção social. Desta constatação não  
decorre que a política é algo imutável, muito pelo contrário, enquanto uma formação  
histórica ela também não é idêntica em qualquer contexto. Logo, é importante  
considerar a diferença do sentido político do Zoon politikon na Grécia Antiga com o  
que política significa na Modernidade, e é isto que Marx sugere em um texto posterior,  
tratado no tópico a seguir.  
Os “assim chamados” Cadernos etnológicos: o cidadão urbano de  
Aristóteles  
Em 1972, o etnólogo estadunidense Lawrence Krader publicou textos de Marx  
até então inéditos, um compilado de anotações denominadas por ele Cadernos  
etnológicos. Trata-se de um compilado de anotações feitas por Marx em seus cadernos  
de estudos, das quais Krader selecionou as notas sobre Ancient society de Lewis Henry  
Morgan; sobre The aryan village in India & Ceylon, de John Budd Phear; sobre The  
origin of civilisation and the primitive condition of Man de John Lubbock (Lord Avebury);  
e sobre Lectures on the early history of institutions, de Henry Sumner Maine. As  
anotações foram retiradas dos Cadernos B 1468 e B 1609 de Marx. Estes textos,  
escritos em 1881, ao final da vida de Marx, são meras anotações feitas para  
esclarecimento pessoal, não chegando a constituir propriamente um manuscrito. Não  
obstante, é possível extrair delas contribuições relevantes de Marx acerca de diferentes  
temas envolvendo relações de parentesco, sociedades sem estado, história Antiga,  
dentre outros. A integralidade dos cadernos redigidos entre 1879 e 1881 foi  
publicada em versão digital pela Marx-Engels Gesamtausgabe (Mega) em 2023(cf.  
MEGA, 2025).  
Nos excertos sobre Morgan, Marx afirma:  
8
Que continha as notas de (1) Lewis H. Morgan, Ancient society; (2) J. W. B. Money, Java, or how to  
manage a colony; (3) Sir. J. Phear, The aryan village in India & Ceylon; (4) Dr. Rud. Sohm, Fränkisches  
Recht & Römisches Recht; (5) Sir H. S. Maine, Lectures on the early history of institutions; e (6) E.  
Hospitaller, Les principales aplications de l’electricité.  
9 Que continha as notas de (1) John Lubbock, The origin of civilisation and the primitive condition of man;  
(2) Michael George Mulhall: Egyptian finance; e (3) Sheldon Amos, Spoiling the Egyptians: revised version.  
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A sociedade grega é observada pela primeira vez por volta da 1ª  
Olimpíada (776 a.C.); desde então, até a legislação de Clístenes (509  
a.C.), ocorre a transição da organização gentílica para a organização  
política (civil). Ele deveria ter dito que político aqui tem o significado  
de Aristóteles = relativo à cidade [städtisch] e animal político =  
cidadão urbano [Stadtbürger].(MARX, 2025, p. 68 tradução livre  
grifos nossos)10  
Aqui, Marx está comentando a asserção de Morgan acerca do surgimento do  
estado grego. Para o antropólogo, foi durante a era de Clístenes que a política se  
consolidou, anteriormente convivendo com elementos típicos de uma sociedade sem  
estado, isto é, em um momento de transição11. A parte destacada por nós em negrito  
trata-se de uma contribuição direta de Marx, enquanto a frase anterior é uma citação  
indireta de Morgan. Para os fins do presente artigo, não iremos adentrar na obra do  
antropólogo estadunidense, sendo mais relevante o comentário direto de Marx12.  
Para Marx a política antiga não pode ser tratada do mesmo modo que a  
Moderna. Na Grécia de Clístenes, a política é sinônimo do relativo à cidade, pólis, e  
este seria o mesmo significado que adquire na obra aristotélica. Marx não aprofunda  
mais que isso em seus comentários, não deixando explícitas as demais consequência  
de sua asserção, porém, à luz de seus comentários anteriores sobre o “Zoon politikon”,  
podemos constatar que, para ele, há dois significados do termo: um que remete ao  
caráter inerentemente social do ser humano, o qual possui uma universalidade, e outro  
que diz respeito à forma como o ser humano aparece na perspectiva historicamente  
específica, isto é, ser político. Aqui, Marx vai além, constatando também que o  
diagnóstico do humano (neste caso, homem livre) como um animal político não pode  
ser tratado no mesmo sentido de político no século XIX. Em outro texto,  
desenvolvemos o seguinte argumento:  
Desta pequena afirmação, pode-se inferir que a transição para a  
política, aqui, significa, para Marx, uma forma específica de  
organização política ligada à pólis, que implica uma estrutura urbana  
particular (pressupondo a forma grega de separação entre cidade e  
campo) e a existência dos cidadãos gregos. Assim, Marx traz, aqui, a  
determinação generalizante de Morgan que não raro aproxima  
elementos da sociedade moderna para explicar outras formas de  
10 Griechische society comes first under notice about 1sst 1st Olympiade (776 B.C.); von da bis legislation  
of Cleisthenes (509 B.C.) vorgehend Uebergang von gentile in political (civil) Organization. Er hätte  
sagen sollen dass political hier Sinn des Aristoteles hat = städtisch u. politisches animal = Stadtbürger.⦘  
(MARX, 2025, p. 67)  
11 Não há espaço para aprofundar na temática, mas vale mencionar que, para Morgan, há uma transição  
entre as sociedades ditas gentílicas, organizadas em torno do parentesco entre seus membros e cuja  
unidade é a gens (ou génos, no caso grego), e nas quais não existe o estado, para a sociedade política  
(cf. MORGAN, 1983, pp. 6-7). Essa transição seria gradual e, nas sociedades em que se consumou,  
como a grega, passaria por um grande período transicional em que elementos tipicamente políticos  
poderiam conviver com elementos tipicamente gentílicos até que se consolide o estado propriamente  
dito.  
12 Para aprofundar nas críticas de Marx a Morgan, cf. Álvares (2019); Andrade (2025).  
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“Zoon politikon” para Marx: o ser social e a historicidade da política  
organização distintas para o específico, local, reafirmando a  
diferença entre o estado moderno e a pólis grega. (ANDRADE, 2025,  
p. 154)  
Nesse sentido, há uma referência marxiana à separação entre cidade e campo  
que operava na Grécia Antiga o termo pólis refere-se à cidade-estado grega. Marx é  
contra todo tipo de transposições anacrônicas de seu próprio tempo na análise de  
sociedades distintas, o que justifica sua crítica a Morgan por não diferenciar o  
significado do político na modernidade do da antiguidade. O que se consolidou na era  
de Clístenes não foi o estado nos termos modernos, mas a pólis, o estado grego13. Do  
mesmo modo, o animal político aristotélico é o cidadão urbano, o significado político  
de “politikon” diz respeito à pólis, à cidade, em outras palavras, o atributo do político  
no sentido Antigo está diretamente associado ao urbano.  
Entende-se que a diferença específica apontada por Marx acerca do animal  
político aristotélico em seus excertos sobre Morgan é algo que está em consonância  
com o que desenvolveu sobre o tema em outros momentos de sua vida. A  
compreensão sugerida pelo autor de O capital em suas anotações de 1881 é  
complementar às que aparecem em seus textos desde 1857. Para Marx, o ser humano  
é um ser social, de modo algum inerentemente político, apesar de aparecer como  
político em momentos históricos determinados, os quais também devem ser  
apreendidos a partir de suas diferenças específicas.  
Outros excertos sobre a concepção de “ser social” e a formação  
histórica do estado  
O argumento marxiano sobre o caráter social do ser humano também pode ser  
sumarizado em uma outra asserção do autor de Manuscritos econômico-filosóficos, de  
1844, embora não haja neles um debate direto com Aristóteles:  
Acima de tudo é preciso evitar fixar mais uma vez a “sociedade” como  
uma abstração frente ao indivíduo. O indivíduo é o ser social. Sua  
manifestação de vida mesmo que ela também não apareça na forma  
imediata de uma manifestação comunitária de vida, realizada  
simultaneamente com outros é, por isso, uma externação e  
confirmação da vida social. (MARX, 2010, p. 107).  
A sociedade não é uma abstração oposta ao indivíduo, mas o indivíduo é uma  
manifestação da vida social, tanto é que ele só se isola em sociedade. O ser humano,  
enquanto ser social, é capaz de elaborar-se a si mesmo, conformando-se como um ser  
genérico, e cria a se próprio através do trabalho:  
[...] por isso, na elaboração do mundo objetivo [é que] o homem se  
13 Acerca da politicidade antiga, cf. Chasin (2023).  
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confirma, em primeiro lugar e efetivamente, como ser genérico. Esta  
produção é a sua vida genérica operativa. Através dela a natureza  
aparece como a sua obra e a sua efetividade [Wirklichkeit]. O objeto  
do trabalho é portanto a objetivação da vida genérica do homem:  
quando o homem se duplica não apenas na consciência,  
intelectual[mente], mas operativa, efetiva[mente], contemplando-se,  
por isso, a si mesmo num mundo criado por ele (MARX, 2010, p. 85).  
O ser social transforma a si mesmo na transformação da natureza, de modo a  
conferir este caráter mutável em sua própria natureza interna. O seu caráter genérico  
deve-se à sua capacidade de elaborar o mundo objetivo através do trabalho, da  
transformação da natureza de modo a objetivar-se nela, em um metabolismo entre o  
ser humano e a natureza.  
O ser humano é, portanto, um ser social; sua vida, a vida social, ainda que não  
apareça imediatamente enquanto uma vida comunitária. Lukács resgata essa  
concepção, explicando-a da seguinte maneira:  
O que se costuma chamar de indivíduo isolado apoia-se sobre um  
estado particular da consciência, no interior da socialidade  
fundamentalmente objetiva, mas também subjetiva, do homem. A  
posição ontológica segundo a qual o ser humano, na medida em que  
é ser humano, é um ser [Wesen] social; segundo a qual, em todo ato  
de sua vida, como quer que este se espelhe em sua consciência, o ser  
humano sempre e sem exceções realiza de modo contraditório a si  
mesmo e simultaneamente ao respectivo estágio de desenvolvimento  
do gênero humano. (2018, p. 397)  
Assim, o indivíduo isolado, eis o ponto de partida da economia política. O ser  
humano é ontologicamente social, é isso seria aquilo de essencial que está por trás da  
afirmação aristotélica. Por isso Marx retoma-a, em seus Grundrisse, polemizando contra  
os economistas políticos que partem do indivíduo isolado: enquanto Aristóteles, ainda  
que naturalizando o cidadão da pólis, consegue apreender o caráter social do ser  
humano, os economistas políticos enxergam a sociedade como uma mera aglomeração  
de indivíduos, ignorando a inevitável relação entre indivíduo e sociedade, e portanto  
aquém da própria concepção aristotélica.  
Ainda assim, a concepção aristotélica não compreende o ser humano como um  
ser genérico, o que se manifesta enquanto ser humano é, para ele, o cidadão da pólis,  
a saber, os membros da comunidade na qual ele vive. Nesse sentido, estamos  
igualmente de acordo com a explicação dada por Lukács:  
Assim como a consciência específica humana só pode nascer em  
ligação com a atividade social dos homens (trabalho e linguagem) e  
como consequência dela, também o pertencimento consciente ao  
gênero se desenvolve a partir da convivência e da cooperação  
concreta entre eles. Disso resulta, porém, que a princípio não se  
manifesta como gênero a própria humanidade, mas apenas a  
comunidade humana concreta na qual vivem, trabalham e entram em  
contato os homens em questão. Por esses motivos, o surgimento da  
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“Zoon politikon” para Marx: o ser social e a historicidade da política  
consciência genérica humana apresenta ordens de grandeza e graus  
muito variados: desde as tribos, com vínculos ainda quase naturais,  
até as grandes nações (2018, p. 400)  
Não era possível, na Grécia Antiga, a consciência plena do ser genérico, e por  
isso mesmo Aristóteles faz um diagnóstico da própria sociedade grega: o ser humano  
é o ser de sua comunidade, o animal político, cidadão urbano, o homem livre e adulto.  
Ele parte de um complexo social no qual o vínculo comunitário não é um todo unitário,  
mas é mediado por classes sociais. Em outras palavras, ele parte das relações concretas  
entre os cidadãos.  
Por outro lado, os economistas políticos partem do indivíduo isolado,  
ignorando que a ideia de um indivíduo oposto à sociedade também é um resultado  
do próprio desenvolvimento histórico:  
O fato de que em sociedades relativamente bem desenvolvidas, em  
particular durante períodos de crise, possa surgir em indivíduos  
singulares a ideia de que todas as relações do indivíduo com a  
sociedade são puramente externas, secundárias, simplesmente  
ajustadas, até mesmo produzidas artificialmente, anuláveis e  
revogáveis a bel-prazer, é um fato da história da cultura. (2018, p.  
397)  
Em determinadas sociedades (não há espaço, aqui, para explicar ou debater o  
vínculo entre desenvolvimento e crise sustentado por Lukács), emerge a  
autonomização dos indivíduos singulares. Isso é um fato histórico, culturalmente  
explicável, que já pressupõe uma relação comunitária cujos vínculos sociais não são  
imediatos, isto é, o indivíduo isolado em sociedade, ou que a própria sociedade, como  
postula Margareth Thatcher14, nem sequer existe, sendo apenas um aglomerado de  
indivíduos. A afirmação de Thatcher, contudo, não contém uma asserção universal é  
uma afirmação totalmente vulgarizada sobre o modo como a sociedade atual se  
manifesta. Este não deve ser um ponto de partida para a análise da realidade, pois  
inverte a relação: o indivíduo só se isola em sociedade, é com o desenvolvimento das  
forças produtivas que surge o sujeito moderno, e não a sociedade que é formada a  
partir do encontro de vários indivíduos, a própria (re)produção da vida humana é  
coletiva, social.  
Ao tomar o ser humano como um ser social, Marx não está criando uma natureza  
fixa e imutável ao ser humano, pelo contrário. O “pressuposto” da natureza social do  
ser humano é o “pressuposto” da própria história – é em sociedade que se faz história.  
Em outras palavras, é enquanto ser social que o próprio ser humano se transforma  
14 Uma das mais famosas inferências de Margareth Thatcher é que a sociedade não existe, cf. Thatcher  
(1987).  
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Ana Carolina Marra de Andrade  
enquanto ser genérico é por ser social que o ser humano é capaz de fazer história.  
Negando o caráter social do ser humano, nega-se também a história, como fazem os  
economistas políticos que recorrem a “robinsonadas” para explicar a natureza humana.  
Eles partem das determinações de seu tempo como um universal abstrato válido para  
qualquer contexto, e portanto completamente destituído de história. Seu caráter  
ontologicamente social incorpora a capacidade do ser humano de produção e  
reprodução de sua própria natureza, que se transforma ao longo da história com a  
emergência do indivíduo isolado, por exemplo, que se isola também em sociedade.  
Como mencionado a partir do “Capítulo 5” do Livro I d’O capital, há um grande  
papel do trabalho, enquanto pôr teleológico do ser humano na natureza, como  
definidor do próprio ser humano, algo presente também em seus Manuscritos de  
1844. O ser social é capaz de fazer história na medida em que é capaz de transformar  
as naturezas externa e interna a si próprio através do trabalho, que o conforma  
enquanto ser genérico. A produção pressupõe a socialidade, logo este não é um feito  
individual.  
Em suma, tem-se que Marx não nega a existência dos indivíduos, apenas pontua  
como a noção do sujeito moderno é, ela própria, historicamente constituída. De modo  
semelhante, ao compreender o caráter histórico da política, ela se coloca não como  
um pressuposto imutável, mas como capaz de ser transformado, e até mesmo  
destruído pelas mesmas forças sociais que a engendraram. Ela surge com a ação do  
ser social e é capaz de submergir por ela o que, obviamente, não é a mera do  
indivíduo isolado, nem de um todo social abstrato e oposto à subjetividade. O estado  
não é um pressuposto insuperável, ou um télos inevitável, mas o resultado da ação  
humana, isto é, das condições econômicas, materiais, de (re)produção da vida humana  
em sociedade. Assim, a compreensão marxiana sobre o Zoon politikon, que afirma sua  
posição sobre o ser social e, consequentemente, a historicidade da política, é a base  
para a compreensão de Marx acerca da superação do próprio estado, da política  
enquanto tal (e não apenas de seus modos específicos).  
Vejamos por exemplo, nos extratos sobre Maine dos assim chamados Cadernos  
etnológicos, a crítica de Marx à Teoria da Soberania adotada pelo jurista inglês15, na  
qual explica sobre a origem do estado:  
[Maine ignora algo que é muito mais profundo: que a aparente  
existência suprema e independente do próprio estado é apenas  
aparente e que, em todas as suas formas, ele é uma excrescência da  
sociedade; assim como seu aparecimento só ocorre em um  
determinado estágio do desenvolvimento social, ele desaparece  
15 Para aprofundar no tema, cf. Andrade (2024).  
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“Zoon politikon” para Marx: o ser social e a historicidade da política  
novamente assim que a sociedade atinge um estágio ainda não  
alcançado. Somente quando a individualidade é arrancada dos  
vínculos originalmente não despóticos (como Maine entende), mas dos  
vínculos satisfatórios e aconchegantes do grupo, da comunidade  
primitiva e, portanto, da elaboração unilateral da individualidade.  
Mas a verdadeira natureza desses últimos só se torna aparente  
quando analisamos o conteúdo – os interesses desses “últimos”.  
Descobrimos então que esses interesses são, mais uma vez, interesses  
comuns a certos grupos sociais e que os caracterizam, interesses de  
classe etc., ou seja, essa individualidade em si é individualidade de  
classe etc. e, em última instância, tem todas as condições econômicas  
como base. O estado se constrói sobre essas bases e as pressupõe.]  
(MARX, 2025, p. 191 tradução livre)16  
Não cabe ao escopo do presente artigo aprofundar acerca das bases materiais  
da formação do estado. Porém, o que se pretende resgatar aqui é que uma  
consequência da compreensão do ser humano como ontologicamente social é que se  
a política é histórica, então é necessário entender quais bases materiais a conformam,  
a saber, por que ela existe e o que a sustenta. De modo bastante superficial, tem-se  
que, para Marx, a política surge da dissolução dos vínculos sociais imediatos  
comunitários a partir do desenvolvimento da propriedade privada, das classes sociais  
e da elaboração unilateral da individualidade, ela não só pode, mas deve ser superada  
em uma sociedade sem classes, no comunismo, para a emancipação humana real17.  
Em suma, ao compreender o caráter ontologicamente social do ser humano,  
Marx é capaz de compreender que a natureza humana não é fixa, mas produzida o  
ato de produzi-la é ele próprio conformado através do trabalho enquanto atividade  
vital humana, metabolismo entre ser humano e natureza. Através disso, o autor é capaz  
de olhar para a história sem pressupostos, desnaturalizando determinações de sua  
época, dentre elas a própria existência do estado. Ao voltar-se para as sociedades  
concretas, descobre-se que o estado se constrói sobre bases econômicas específicas,  
16  
Maine ignores das viel Tiefere: dass die scheinbare supreme selbständige Existenz des Staats selbst  
nur scheinbar u. dass er in allen seinen Formen eine excrescence of society is; wie seine Erscheinung  
selbst erst auf einer gewissen Stufe der gesellschaftlichen Entwicklung vorkömmt, so verschwindet sie  
wieder, sobald die Gesellschaft eine bisher noch nicht erreichte Stufe erreicht hat. Erst Losreissung der  
Individualität von den ursprünglich nicht despotischen Fesseln (wie blockhead Maine es versteht),  
sondern befriedigenden u. gemüthlichen Banden der Gruppe, der primitiven Gemeinwesen, u. damit  
die einseitige Herausarbeitung der Individualität. Was aber die wahre Natur der letzteren zeigt sich erst  
wenn wir den Inhalt die Interessen dieser »letzteren« analysiren. Wir finden dann, dass diese Interessen  
selbst wieder gewissen gesellschaftlichen Gruppen gemeinsame u. sie carakterisindere charakterisirende  
Interessen, Klasseninteressen etc sind, also diese Individualität selbst Klassen- etc Individualität ist u.  
diese in letzter Instanz haben alle ökonomische Bedingungen zur Basis. Auf diesen als Basen baut sich  
der Staat auf u. setzt sie voraus.(MARX, 2025, p. 191)  
17 Em Sobre a questão judaica (1843), Marx trata da diferença da emancipação política da emancipação  
real. Trazemos um trecho para ilustrar esta distinção: “[...] a emancipação humana só estará plenamente  
realizada quando o homem individual real tiver recuperado para si o cidadão abstrato e se tornado ente  
genérico na qualidade de homem individual na sua vida empírica, no seu trabalho individual, nas suas  
relações individuais, quando o homem tiver reconhecido e organizado suas ‘forces propres’ [forças  
próprias] como forças sociais e, em consequência, não mais separar de si mesmo a força social na forma  
da força política” (MARX, 2010a, p. 54).  
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pressupondo-as, passando por diferenciações importantes ao longo das décadas, e a  
política grega, baseada na cidade-estado, é diferente da política moderna.  
Considerações finais: ser humano e sociedade na história  
Ante o exposto, tem-se que, para Marx, a asserção aristotélica de que “o homem  
é um animal político [ζον πολιτικόν]pode ser analisada de duas maneiras distintas:  
no sentido político, como um diagnóstico de seu tempo, e no sentido social, como  
uma inferência universal acerca do ser humano. Em ambas, ela possui um sentido  
verdadeiro a falsidade está em atribuir o sentido político enquanto o sentido  
universal. Aristóteles compreende a humanidade a partir do modo como a sociedade  
grega aparece para ele, isto é, como a pólis, que é composta por seus cidadãos, logo  
o ser humano é o cidadão urbano, estando excluídos as mulheres, os escravos, os  
estrangeiros e os homens não-adultos. Em última instância, gira em torno de uma  
tautologia: o cidadão urbano grego é o ser da pólis.  
O sentido político da afirmação aristotélica é, portanto, uma constatação  
verdadeira do sobre a dimensão da aparência, isto é, do modo como a sociedade se  
manifesta para ele. Porém, como “toda a ciência seria supérflua se a forma de  
manifestação e a essência das coisas coincidissem imediatamente” (MARX, 2017a, p.  
970), ela tida isoladamente ignora o que há de essencial sobre o ser humano em geral,  
para além dos cidadãos gregos: seu caráter social, o que também é uma dimensão  
interpretativa possível do “Zoon politikon”. Sob esse prisma, concordamos com as  
palavras de J. Chasin:  
É mais do que sabido que os gregos, mais e melhor do que quaisquer  
outros, formularam com tino universal o sentido da mundanidade  
antiga. Porém, não será um prejuízo essencial para o inerente poder  
das ideias atribuir a elas capacidade autônoma ou incondicionada de  
influir e determinar, e com isso unilateralizando e embotando as  
explicações? (2023. p. 23)  
Atribuir à frase aristotélica seu tino universal é inseri-la em seu contexto  
histórico, isto é, não tomá-la como uma explicação autônoma e unilateral da existência  
humana, mas tratando-a como uma elaboração complexa do sentido da mundanidade  
antiga. A sociedade grega do tempo de Aristóteles era uma sociedade política em um  
sentido muito diferente do atual, organizando-se em torno das cidades-estado,  
diferenciando-se, por exemplo, de um gregarismo inicial nos termos marxianos.  
O ser humano é um ser social, um animal que só pode se isolar em sociedade,  
e que aparece inicialmente enquanto um animal gregário, de forma alguma em sentido  
político. Nas palavras de Marx, é “se não um animal político, em todo caso um animal  
social”. Porém, ele aparece como um ser político em determinadas sociedades, como  
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“Zoon politikon” para Marx: o ser social e a historicidade da política  
para Aristóteles, que concebe o ser humano, em certo sentido, enquanto o cidadão  
urbano. Do mesmo modo, o ser humano irá aparecer como um fazedor de instrumentos  
dentro do contexto de Benjamin Franklin, isto é, os Estados Unidos do século XVIII.  
Político no sentido Antigo (isto é, da Antiguidade clássica) diz respeito à pólis ,  
Aristóteles tem em mente o cidadão grego e Marx entende a política a partir de uma  
dimensão profundamente histórica, mutável. O estado tem uma gênese (não é sempre  
existente) e não é sempre idêntico, devendo ser analisado também a partir de suas  
diferenças específicas (históricas, geográficas, dentre outras).  
A possibilidade de superação do estado é dada a partir do momento em que  
se compreende suas bases materiais e sua característica de um produto social, isto é,  
do próprio ser humano. A relação entre indivíduo, estado e sociedade é, para Marx,  
um tanto quanto complexa e depende de uma série de mediações que devem ser  
levadas em conta ao tentar entender a realidade. Contudo, é essencial não partir do  
ponto de vista específico de um momento histórico isolado para se referir a todos os  
demais. Assim, vemos como a análise da asserção aristotélica “o homem é um animal  
político [ζον πολιτικόν]remete a aspectos muito relevantes do pensamento de Marx,  
resumidamente: de um lado, a caracterização do ser humano em geral enquanto um  
ser social; e de outro, a historicidade da política, ambos intrinsecamente conectados e  
fundamentais ao arcabouço teórico do autor.  
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Como citar:  
ANDRADE, Ana Carolina Marra de. “Zoon politikon” para Marx: o ser social e a  
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84 |  
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