DOI 10.36638/1981-061X.2025.30.2.781  
A exploração aeroespacial como fronteira de  
valorização do capital portador de juros:  
especulação e formas jurídicas  
Aerospace exploration as a frontier of valorization of  
interest-bearing capital: contracts, speculation, and  
juridical forms  
Rafael Silva dos Santos*  
Mateus Lima Furtado**  
Resumo: A corrida espacial do século XXI não  
representa apenas um renascimento da disputa  
tecnológica entre potências, mas a expressão de  
um novo estágio da acumulação capitalista, em  
Abstract: The twenty-first-century space race is  
not merely revival of technological  
a
competition among global powers, but an  
expression of a new stage of capitalist  
accumulation in which valorization relies on  
financialization and the controlled destruction  
of value. This article examines the New Space  
phenomenon the ongoing privatization and  
financialization of the aerospace sector as the  
most advanced form of the fusion between  
fictitious capital and interest-bearing capital,  
mediated by the State and by legal forms.  
Grounded in Karl Marx’s critique of political  
economy, the study situates the aerospace  
industry within the Third Department of  
expanded reproduction, showing that its  
structural function lies in absorbing surplus  
capital through legal and financial mechanisms  
that convert future expectations into tradable  
assets. The analysis demonstrates that law, by  
granting stability and legitimacy to these  
processes, becomes a constitutive element of  
que  
a
valorização se sustenta pela  
financeirização e pela destruição controlada de  
valores. O presente artigo analisa o fenômeno do  
New Space a crescente privatização e  
financeirização do setor aeroespacial como a  
forma mais acabada da fusão entre capital fictício  
e capital portador de juros, mediada pelo estado  
e pela forma jurídica. Partindo da crítica da  
economia política de Karl Marx, o estudo insere  
o setor aeroespacial no Departamento III da  
reprodução ampliada do capital, demonstrando  
que sua função estrutural é absorver excedentes  
por meio de mecanismos jurídicos e financeiros  
que convertem expectativas futuras em ativos  
negociáveis. A pesquisa evidencia que o direito,  
ao conferir segurança e legitimidade a tais  
processos, torna-se elemento constitutivo da  
acumulação contemporânea, transformando o  
fundo público em rentabilidade privada. Conclui-  
se que a exploração espacial não é uma ruptura  
com a lógica do capital, mas sua continuação sob  
formas cada vez mais sofisticadas, nas quais o  
cosmos se torna fronteira jurídica e financeira da  
valorização fictícia.  
contemporary  
accumulation,  
transforming  
public funds into private profitability. It  
concludes that outer space exploration does not  
break with the logic of capital; rather, it extends  
it through increasingly sophisticated legal and  
financial forms, turning the cosmos into a  
juridical and financial frontier of fictitious  
valorization.  
Palavras-chave: Crítica da economia política;  
capital fictício; direito e financeirização; setor  
aeroespacial; departamento III.  
Keywords: Critique of political economy;  
fictitious capital; law and financialization;  
aerospace sector; third department.  
* Bacharel e mestre em direito pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e doutor em direito pela  
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).  
** Bacharelando em direito pela Universidade Federal de Jataí.  
ISSN 1981 - 061X v. 30, n. 2 jul.-dez., 2025  
Verinotio  
nova fase  
   
A exploração aeroespacial como fronteira de valorização do capital portador de juros  
Introdução  
A chamada “corrida espacial” do século XXI não representa um simples  
renascimento da competição tecnológica entre potências ou um episódio de ambição  
científica isolada. Ela expressa, antes, uma das formas mais avançadas do atual estágio  
da acumulação capitalista, em que a valorização do capital se realiza cada vez menos  
por meio da produção direta de mercadorias e cada vez mais pela especulação, pela  
financeirização e pela destruição controlada de valores. Nesse sentido, a expansão do  
chamado New Space caracterizado pela entrada massiva de empresas privadas no  
setor aeroespacial e pela crescente dependência do financiamento público constitui  
uma nova e sofisticada fronteira de valorização do capital. Essa fronteira opera sob  
uma lógica que une tecnologia, crédito e direito, transformando o espaço sideral em  
um território de antecipação de lucros e de titularização de expectativas futuras.  
Mais do que a soma de iniciativas empresariais ou o resultado da capacidade  
técnica de determinados agentes econômicos, o New Space expressa uma necessidade  
histórica do capital. Diante de seus limites internos de valorização, o capital busca  
continuamente novos espaços de absorção de mais-valor e de compensação de sua  
tendência à queda da taxa de lucro. Nesse movimento, a exploração espacial surge  
como um campo ideal para a reprodução ampliada, pois combina a aparência de  
inovação com a realidade de destruição. A “colonização espacial” revela-se, assim,  
como uma resposta sistêmica às contradições da acumulação contemporânea: trata-se  
de uma expansão que não produz valores de uso socialmente relevantes, mas que se  
legitima por meio de uma engenharia jurídico-financeira capaz de transformar  
promessas de futuro em riqueza presente.  
O objetivo deste artigo é demonstrar que o New Space constitui a forma mais  
acabada da fusão entre capital fictício e destruição controlada de valores, configurando  
um modelo de acumulação sustentado pela mediação jurídica e pela intervenção  
estatal. O setor aeroespacial contemporâneo é analisado aqui como parte integrante  
do chamado departamento III da reprodução ampliada do capital esfera responsável  
pela produção de mercadorias que não retornam à reprodução social, mas que, ao  
contrário, funcionam como mecanismos de redistribuição e absorção do mais-valor. Ao  
contrário dos departamentos I e II voltados à produção de meios de produção e bens  
de consumo , o departamento III (MANDEL, 1982) atua como um espaço de  
compensação, onde o capital encontra formas indiretas de valorização baseadas na  
destruição produtiva e na antecipação financeira.  
O problema central que orienta esta investigação reside, portanto, em  
compreender como o setor aeroespacial se tornou um eixo estratégico de  
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redistribuição do mais-valor e de sustentação do capital fictício no capitalismo  
contemporâneo. Busca-se demonstrar que a expansão do New Space é viabilizada por  
um conjunto de formas jurídicas e mecanismos financeiros que convertem a incerteza  
tecnológica em propriedade, o risco em ativo e o gasto público em lucro privado. O  
direito, nessa dinâmica, não aparece como simples instrumento regulatório, mas como  
mediação necessária da financeirização, condição essencial para a estabilização das  
promessas de valorização em meio à crescente improdutividade material do sistema.  
A investigação ancora-se nos fundamentos da crítica da economia política  
formulada por Karl Marx, articulando as categorias de capital portador de juros, capital  
fictício e as lições sobre a reprodução ampliada à análise empírica das práticas  
contemporâneas de investimento e regulação do setor aeroespacial. Parte-se da  
hipótese de que o estado desempenha papel decisivo na transformação de fluxos  
financeiros em capital aparente, por meio da celebração de contratos, do financiamento  
de programas espaciais e da criação de marcos normativos que legitimam a  
apropriação privada de recursos públicos sob o pretexto da inovação científica e  
tecnológica.  
A estrutura do artigo foi organizada de modo a acompanhar o movimento  
interno do objeto investigado. Na primeira seção, são retomadas as bases teóricas da  
crítica marxista da economia política e a formulação do conceito de departamento III  
desenvolvida por Mandel (1982), situando-o no contexto da financeirização  
contemporânea, tal como se observa em Chesnais (1995). A segunda seção analisa o  
surgimento do New Space. Na terceira, examina-se a arquitetura jurídico-normativa  
internacional que regula a exploração espacial e a maneira como ela possibilita a  
conversão de expectativas em ativos financeiros. A quarta seção dedica-se à análise  
dos contratos empresariais e dos instrumentos financeiros que estruturam o New  
Space, evidenciando o papel do estado como garantidor jurídico e financeiro da  
especulação privada. A quinta seção investiga como os contratos privados e  
governamentais são formas jurídicas do capital portador de juros que se desdobram  
em capital fictício. A sexta irá expor como o direito atua no processo de redistribuição  
de mais valor entre os capitalistas, e como o setor aeroespacial se insere nessa  
dinâmica. A sétima demonstrará que a forma jurídica oferece garantia para  
redistribuição, operada em meio ao acúmulo de capital fictício. Por fim, na oitava e  
última seção, será exposto como o estado é agente indispensável de todo o processo  
exposto ao longo do texto.  
Em suma, este estudo propõe compreender o atual estágio da exploração do  
espacial não como uma promessa de futuro tecnológico, mas como uma expressão  
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A exploração aeroespacial como fronteira de valorização do capital portador de juros  
histórica da crise da valorização do capital e de sua tentativa de prolongar-se por meio  
da ficção jurídica do valor. A análise que segue buscará demonstrar que, ao converter  
o cosmos em mercado e o direito em instrumento de legitimação da especulação, o  
capitalismo contemporâneo não ultrapassa seus limites apenas os projeta para fora  
da Terra.  
2. DESENVOLVIMENTO  
2.1. Crise da valorização, capital fictício e departamento III  
A crise estrutural do capital, tal como delineada por autores como István  
Mészáros (2011) e François Chesnais (1995), está vinculada à dificuldade crescente  
de manter níveis satisfatórios de valorização do capital produtivo em setores  
industriais tradicionais Frente à queda tendencial da taxa de lucro e ao avanço das  
forças produtivas, o capital é forçado a buscar novas fronteiras de valorização uma  
expansão que ocorre de forma extensiva e intensiva, ou seja, intensificando-se o  
avanço sobre a taxa de mais valor e buscando se estender para novas formas e lugares.  
Tanto Mészaros quanto Chesnais concordaram que a atualidade da acumulação  
capitalista é dotada de uma dinâmica a qual há uma hipertrofia do Complexo Industrial-  
militar e da esfera financeira, que passa a operar sob uma lógica de capital fictício:  
valores que circulam como capital, mas que não correspondem, no imediato, à  
produção real de mercadorias1 ou serviços com valor de uso social. Trata-se, portanto,  
de uma resposta à uma crise endêmica e estrutural do Capital.  
Ambos, Chesnais e Mészáros leem a financeirização como resultado da  
tendência à sobreacumulação de capitais, vinculada à lei da queda tendencial da taxa  
de lucro. Esse é o ponto que interessa à presente pesquisa, pois é a partir da  
necessidade de uma resposta à taxa de lucros que o setor financeiro e aquilo que  
Mandel denominou de departamento III vão se juntar de modo simbiótico para  
responder à tal crise de lucratividade.  
A ascensão do capital financeiro foi seguida pelo ressurgimento de  
forças agressivas e brutais de procurar aumentar a produtividade do  
capital em nível microeconômico, a começar pela produtividade do  
trabalho. Tal aumento baseia-se no recurso combinado às  
modalidades clássicas de apropriação de mais-valia, tanto absoluta  
como relativa, utilizadas sem nenhuma preocupação com as  
1 A mercadoria é um objeto que, a partir de suas propriedades materiais, tem a propriedade de satisfazer  
as necessidades do homem. Essa característica é conhecida como valor de uso. Por outro lado, a  
mercadoria também tem a propriedade de poder ser trocada por mercadorias distintas de si própria ou,  
em outras palavras, de comprar outras mercadorias. A essa característica chamou-se valor de troca  
(CARCANHOLO, 1998, p. 18).  
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consequências sobre o nível de emprego, ou seja, o aumento brutal  
do desemprego, ou com os mecanismos viciosos da conjuntura ditada  
pelas altas taxas de juros. (CHESNAIS, 1996, pp. 16-17)  
Note-se então que Chesnais já indicava em sua obra Mundialização do capital,  
de 1996, já observava que o capital buscava forma de expandir o mais valor, e também  
se utilizava de mecanismos financeiros para potencializar essa margem de mais valor  
ou mesmo ou lucros de capitalistas isolados, o que propicia o acúmulo de capital  
fictício.  
A categoria de capital fictício, retomada por Marx no Livro III de O capital (2017,  
pp. 631-2) e amplamente desenvolvida por autores contemporâneos tais como os  
próprios Mészaros e Chesnais, refere-se a títulos, ações, contratos e créditos que  
operam como se fossem capital produtivo, mas que não representam valor  
efetivamente produzido. Como destacam Rossi e Palludeto (2018), trata-se de um  
capital que busca valorização futura, sustentado por promessas, projeções e  
expectativas institucionalizadas com base em uma infraestrutura jurídica e financeira  
que lhe confere aparente materialidade.  
Contudo, esse capital fictício não se reproduz no vazio. Ele exige espaços  
sociais e setores econômicos específicos que possam absorvê-lo e ancorá-lo, evitando  
que sua expansão se transforme imediatamente em colapso. É nesse contexto que se  
insere o chamado departamento III, conceito que remonta à tipologia de Mandel (1982)  
e foi aprofundado por estudos como o de Santos:  
As razões para que o governo continue investindo o que arrecada no  
Departamento III é justamente o fato de este departamento não  
produzir bens de consumo. No capitalismo, quando as forças  
produtivas conseguem criar bastante excedente econômico, significa  
que uma crise de superprodução está se anunciando. O que não  
permitiu que a economia dos anos dourados entrasse em colapso  
foram os gastos com armas elevados. (SANTOS, 2021, p. 56)  
Diferente dos departamentos I (meios de produção) e II (bens de consumo), o  
departamento III compreende gastos militares ou de luxo que, embora socialmente  
relevantes ou politicamente estratégicos, não reinserem valor na reprodução ampliada  
do capital. Seu papel, contudo, é decisivo na fase atual do capitalismo: ele funciona  
como dreno institucional do capital excedente, como já identificado por Kidron (1970)  
na noção de “vazamento” que esses setores possuem, algo que também foi debatido  
por autores como Cliff (1999) e Harman (1999), além do já citado Mandel (1982), em  
um confronto de ideais acerca da funcionalidade econômica do departamento III já  
exposto por Santos (2021). Na atualidade da acumulação capitalista, essa função do  
departamento III se amalgamou ao acúmulo de capital fictício, em especial no setor  
aeroespacial, um braço do complexo industrial-militar na gestão capitalista  
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A exploração aeroespacial como fronteira de valorização do capital portador de juros  
estadunidense.  
Em outras palavras, diante da crise de valorização no núcleo produtivo  
tradicional, o capital é forçado a projetar-se sobre áreas como o setor militar, a ciência  
aplicada de uso estratégico e a economia espacial setores que operam sob lógica de  
investimento massivo e retorno incerto, mas que garantem absorção de recursos e  
adiamento da crise.  
Assim se manifestam as contratendências à queda da taxa de lucro e à crise  
estrutural de uma economia que não encontra fôlego para a expansão e busca na  
dinâmica da financeirização forma de adiantar o acesso ao capital em escala cada vez  
mais profunda. No campo produtivo, a alternativa que se revela é aplicação de recursos  
humanos e materiais na produção de bens que não retornam à esfera de reprodução  
social, o que explicitaria, para Mészaros (2011), uma lei tendencial de taxa de  
utilização decrescente.  
O mesmo vale para a lei tendencial da taxa de utilização decrescente  
que, como vimos acima, se arma, no início, como a reabilitação do  
“LUXO” e da “PRODIGALIDADE” – junto com a expansão do círculo de  
consumo, que passa assim a abarcar também um número cada vez  
maior de “Pobres que trabalham”; a estes é proporcionada uma gama  
crescente de mercadorias à medida que o desenvolvimento das forças  
produtivas o torna tanto possível como necessário sem, porém,  
deixar de lado a “FRUGALIDADE”, a “ECONOMIA” e a “POUPANÇA”  
como momentos subalternos do capitalismo em sua ascensão. A  
mesma tendência, sob as condições do capitalismo plenamente  
desenvolvido, assume a forma de extrema PERDULARIDADE e  
DESTRUIÇÃO, mas é de novo contrabalançada em vários graus –  
pelo imperativo de poupar, bem como pela inevitável necessidade de  
reconstituir o capital depois da periódica destruição de sua magnitude  
“superproduzida”, no interesse da sobrevivência do sistema do  
capital. (MÉSZAROS, 2011, p. 645)  
O adensamento do departamento III é um dos fenômenos mais marcantes deste  
movimento de perdularidade e destruição contrabalanceado pelo imperativo de  
poupar ou de reconstruir o capital, como destacou Mészaros.  
O setor aeroespacial, articulado ao complexo industrial-militar (CIM), setores  
que produzem mercadorias que, em sua maioria, compõem o departamento III, passou  
a operar, a partir da década de 1980, com o programa de Guerra nas Estrelas da  
Administração Reagan2, como uma dessas novas fronteiras. Entretanto, no século XXI,  
o setor aeroespacial passa por uma inflexão: sua centralidade, aparentemente, passa  
2
O “programa de Guerra nas Estrelas”, nome popular da Strategic Defense Initiative (SDI), foi lançado  
pelo presidente norte-americano Ronald Reagan em 1983, com o objetivo de desenvolver um sistema  
defensivo composto por satélites e armas a laser para interceptar mísseis nucleares soviéticos durante  
a guerra fria. Apesar de ambicioso, o programa nunca foi plenamente implementado, mas impulsionou  
o avanço tecnológico no setor aeroespacial e militar dos Estados Unidos (SANTOS, 2025, p. 153).  
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a se deslocar da produção bélica estatal para a exploração privada de ativos  
extraterrenos e sistemas orbitais. Essa transição se dá sob a forma de investimentos  
altamente especulativos, voltados à expectativa de rendimentos futuros baseados em  
ativos incertos, como mineração em asteroides, turismo espacial e infraestrutura de  
telecomunicações orbitais, e uma nova era da exploração espacial denominada new  
space por Matos (2022, pp. 495-6), tema que será mais bem desenvolvido adiante.  
Esse é o movimento que junta dois setores fundamentais para o atual estágio  
da acumulação capitalista, fenômeno que já vem sendo observado há algum tempo  
por outros autores, mas que agora encontra no desenvolvimento privado do setor  
aeroespacial new space as condições ideais para o seu crescimento.  
[...] a taxa de lucro elevada, que é imanente a essas relações, atrai para  
o departamento III, sob a forma de capital-ações, capital-dinheiro  
potencial dos departamentos I e II, apressando o processo  
acumulativo. O PIB bélico aumenta a taxas fantásticas revelando a  
eficiência do sistema capitalista nos setores da produção destruidora.  
[...] Toda essa atividade econômica não corresponde a qualquer  
acréscimo de meios de produção e de meio de consumo. (DANTAS,  
2007, p. 50)  
Esse movimento não é apenas uma mutação tecnológica ou empresarial, é uma  
necessidade estrutural do atual estágio da acumulação capitalista. O setor espacial  
contemporâneo é reconfigurado como lugar privilegiado de absorção de capital fictício,  
sustentado por uma arquitetura jurídica que transforma ativos ainda inexistentes em  
promessas de rendimento. Tal como argumenta Marx no Volume III de O capital (2017),  
o capital portador de juros adquire autonomia em relação à produção, passando a  
valorizar-se na forma de promessa de rendimento futuro. Isso cria um ciclo de  
valorização sem lastro imediato em mercadorias reais, sustentado por uma base  
jurídica e institucional que garante o reconhecimento e circulação desses títulos como  
equivalentes monetários, e, assim, a “relação do capital oculta seus nexos internos ao  
submeter o trabalhador à completa irrelevância, à exterioridade e ao estranhamento  
diante das condições de realização de seu próprio trabalho” (MARX, 2017, p. 138).  
A configuração do setor aeroespacial como parte do departamento III da  
economia aquele responsável pelos meios de consumo improdutivo ou de luxo –  
reforça sua função como dreno de mais-valor. O setor não apenas consome recursos  
públicos por meio de contratos com agências como a Nasa e o Departamento de  
Defesa dos Estados Unidos, mas também canaliza volumes crescentes de capital  
privado via fundos de investimento, Special Purpose Acquisition Companies (Spac) e  
emissão de debêntures ligadas à expectativa de exploração futura.  
O setor espacial tem experimentado um crescimento exponencial em  
investimentos privados nas últimas décadas. De acordo com uma análise da McKinsey,  
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A exploração aeroespacial como fronteira de valorização do capital portador de juros  
o investimento privado no setor espacial demonstrou um crescimento massivo,  
saltando de US$ 300 milhões em 2012 para mais de US$ 10 bilhões em 2021 (BLAND  
et al., 2022). Essa tendência de crescimento se manteve nos anos seguintes, com  
dados da BryceTech indicando que o investimento total em startups do setor espacial  
entre 2020 e 2023 somou aproximadamente US$ 39,1 bilhões (BRYCETECH , 2025).  
A SpaceX exemplifica essa dinâmica de investimentos robustos no setor. No  
início de janeiro de 2023, a empresa levantou US$ 750 milhões em uma nova rodada  
de financiamento que a avaliou em US$ 137 bilhões, liderada pela empresa de capital  
de risco Andreessen Horowitz (a16z), que também participou da aquisição do Twitter  
por Elon Musk (REUTERS, 2023). Esse novo aporte se seguiu a um ano em que a  
SpaceX já havia captado mais de US$ 2 bilhões. Grande parte do capital de risco tem  
sido direcionada a empresas em estágio inicial para financiar pesquisa e  
desenvolvimento de produtos de capital intensivo, com os investimentos sendo  
canalizados para o desenvolvimento e escala de projetos como a rede de internet via  
satélite Starlink, que ultrapassou 1 milhão de assinantes, e o programa Starship  
(BLAND et al., 2022; REUTERS, 2023).  
Cabe destacar que nem todos os itens produzidos pelo setor aeroespacial  
integram o departamento III. Apesar de a maioria dos produtos espaciais não  
retornarem para a reprodução da força de trabalho, existem bens que ali são gestados,  
e poderão ser consumidos pela classe trabalhadora. A título de exemplo, a National  
Oceanic and Atmospheric Administration (NOAA) estima que mais de US$ 30 bilhões  
anuais serão aplicados para o serviço de previsões meteorológicas alimentadas por  
satélites (NOAA, 2023). Complementarmente, estudos de "value of information" da  
Nasa demonstram ganhos de milhões de dólares em respostas a enchentes com  
imagens em tempo quase real, enquanto a OECD (2023, p. 3), revelando que a redução  
dos custos de lançamento e o boom de satélites ampliaram a capacidade de  
comunicação e observação com impacto significativo em desafios públicos como  
desastres, mudanças climáticas e agricultura. Outro exemplo é a potencial expansão  
da banda larga, sugerindo que constelações de satélites de comunicação como os da  
Starlink, podem gerar benefícios macroeconômicos substanciais em regiões ainda mal  
atendidas. A Reuters reportou aproximadamente 4,6 milhões de usuários da Starlink  
em 2024, com projeções de crescimento adicional em 2025 (JOHNSON, 2025). Esses  
são elementos que, indubitavelmente, contribuem para a reprodução da força de  
trabalho, o que não quer dizer que o objetivo do desenvolvimento técnico no setor  
seja a melhoria de condições de vida para a humanidade. Quando se fala em  
reprodução social, trata-se apenas de uma categoria da crítica da economia política  
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que tem impactos objetivos para a acumulação capitalista como aqueles sumariamente  
apresentados no curto espaço do presente texto, mas que foram mais profundamente  
elaborados em Santos (2021).  
Grande parte desses investimentos no setor começam a render lucros para os  
burgueses que ali investem antes mesmo de se efetivarem entrega de bens e serviços,  
ainda no plano da mera expectativa. Inclusive, parte desses aportes não se destinam  
à produção imediata, mas à sustentação de um ciclo especulativo com promessa de  
monopolização futura de ativos extraterrenos. Esses investimentos são lastreados em  
documentos jurídicos que preveem titularização de ativos que ainda não se realizaram  
na esfera produtiva, como "direitos preferenciais de exploração" ou "acesso prioritário  
a órbitas e frequências". Em outras palavras, há uma arquitetura jurídica que sustenta  
um processo de antecipação de valor, análogo à lógica da bolha das hipotecas  
subprime, mas agora voltada ao cosmos.  
Assim, financeirização e departamento III encontram-se amalgamados enquanto  
contratendências do capital no setor aeroespacial, operando como válvula de escape  
para a crise de valorização do capital, mobilizando recursos sociais em larga escala  
sob a forma de capital fictício, em um movimento cujo a mediação do direito é  
imprescindível. A diferença fundamental é que, nesse caso, o objeto de especulação  
não é mais a casa, o crédito estudantil ou a dívida pública, mas o espaço sideral. Cabe  
estudar então como isso se desenvolveu historicamente, o que será exposto nos  
próximos sub itens.  
2.2. O surgimento do new space  
O chamado new space emerge como designação para um conjunto de  
transformações na exploração aeroespacial, em contraste com o chamado old space.  
Enquanto este último correspondeu ao período marcado pelo protagonismo estatal  
direto, especialmente no contexto da guerra fria e da corrida espacial entre Estados  
Unidos e União Soviética, o new space caracteriza-se pela crescente presença de atores  
privados, em especial corporações de tecnologia e fundos de investimento, que  
passam a disputar centralidade no setor.  
De modo descritivo, o old space baseava-se em projetos estatais de grande  
porte, tendo a Nasa e a Darpa como principais agências governamentais de fomento  
ao setor nos Estados Unidos em paralelo ao programa espacial soviético que também  
se pautava pela forte participação estatal, ambos os programas assentados em uma  
lógica geopolítica e militar. Já o new space apresenta-se como um rearranjo dessa  
lógica, onde o estado não abandona o protagonismo, mas o exerce de forma mediada  
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A exploração aeroespacial como fronteira de valorização do capital portador de juros  
pela indução de mercados, incentivos regulatórios e financiamento indireto.  
Como observa Matos (2022), a crise financeira de 2008 funcionou como marco  
fundamental para a inflexão no setor. Diante da estagnação da acumulação capitalista,  
o setor aeroespacial foi reposicionado como fronteira de valorização e espaço de  
absorção de capitais excedentes.  
O new space não é apenas uma “privatização do espaço”, mas uma forma  
reorganizada da intervenção estatal, condicionada pela materialidade da acumulação  
e conformada pelo fenômeno jurídico para que empresas como SpaceX, Blue Origin,  
Rocket Lab, Virgin Galactic e outras, ingressem no setor. O financiamento de risco  
(venture capital), a compra governamental de serviços de lançamento e a abertura de  
licitações públicas atuaram como mecanismos centrais, sempre com a mediação  
necessária do direito. O discurso de inovação tecnológica e de redução de custos  
(particularmente com a miniaturização de satélites e a recuperação de foguetes) oculta  
que tais avanços só se tornaram possíveis após décadas de investimentos estatais  
massivos em pesquisa e desenvolvimento. Assim, a aparente “desestatização” do setor  
é, na verdade, a continuação de sua dependência em relação ao estado, agora  
reconfigurada sob a hegemonia do capital financeiro.  
Como indica Matos (2022, p. 395), entre 2009 e 2010, o número de startups  
espaciais mais do que dobrou, e o investimento em capital de risco no setor aumentou  
55%. Esse crescimento foi empolgado pelas políticas adotadas como resposta à crise  
da bolha do mercado imobiliário de 2008, tais como a redução das taxas de juros a  
quase zero e a injeção massiva de liquidez, redirecionaram investimentos para  
mercados de maior risco, como o de venture capital (MATOS, 2022, p. 394). Isso  
resultou em um aumento significativo de financiamento para startups espaciais,  
criando as bases financeiras para o desenvolvimento do new space. A crise financeira  
de 2008 desencadeou uma série de mudanças no mercado financeiro, redirecionando  
investimentos para setores de risco como o espacial. Startups espaciais viram um  
aumento significativo de investimento por meio do mercado financeiro, mas ainda  
dependem fortemente de subsídios e contratos governamentais como será exposto ao  
longo do texto. “O investimento de risco em startups mostrou-se mais atraente em um  
cenário de taxas de juros próximas a zero, considerando a existência de investidores  
com perfil especulativo.” (MATOS, 2022, p. 495).  
Portanto, são considerados dois elementos importantes do poder  
monetário para a ascensão do new space: a atuação do estado no  
período pós-crise de 2008, com a elevada injeção de liquidez no  
mercado financeiro, levando à redução das taxas de juros e à mudança  
no direcionamento dos investimentos de risco do setor bancário para  
o de venture capital. (MATOS, 2022, p. 496)  
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A entrada de capitais privados nesse campo só pôde ocorrer porque os  
investimentos de longo prazo, altamente dispendiosos e arriscados, foram previamente  
absorvidos pelo complexo industrial-militar norte-americano. O estado, diante da crise  
de lucratividade e da necessidade de novas fronteiras de valorização, abriu o setor  
espacial para que se tornasse um campo de especulação e valorização do capital  
portador de juros, articulado a formas contratuais que titularizam expectativas futuras.  
Assim, a “inovação” do new space deve ser compreendida como continuidade  
reconfigurada, e não ruptura, uma vez que responde às determinações objetivas da  
acumulação capitalista em crise.  
A financeirização do setor transforma cada lançamento, cada satélite e cada  
contrato em ativo negociável, alimentando um ciclo de valorização especulativa. O  
capital fictício, que se amplia sob a promessa de retornos futuros, mas depende  
estruturalmente da mediação estatal. É nesse ponto que a análise de Mészáros (2011)  
se torna de extrema importância: a busca por novas fronteiras de acumulação não  
supera a crise estrutural do capital, apenas a desloca e aprofunda. O espaço exterior  
aparece, então, como mais uma tentativa de prolongar um padrão de acumulação  
marcado pela sobreacumulação e destruição de valores, algo que já ocorreu com o  
Complexo Industrial-militar durante os chamados anos dourados do capital (SANTOS,  
2021), e agora encontra potencializada na junção do setor aeroespacial e a  
financeirização. A partir dos anos dourados, no pós segunda guerra mundial, o  
complexo industrial-militar mostrou ser “o instrumento disposto e capaz de romper o  
nó górdio de como combinar a máxima expansão possível com a taxa de utilização  
mínima” (MÉSZÁROS, 2011, p. 677). Agora, o setor aeroespacial, como um braço do  
Complexo Industrial-militar, amalgamado ao setor financeiro, vem cumprindo essa  
função.  
Portanto, o new space deve ser entendido não como revolução espontânea do  
setor privado, mas como resultado de uma confluência entre estado e capital  
financeiro, em que os discursos de inovação tecnológica e empreendedorismo  
mascaram a lógica de reprodução ampliada do capital fictício como uma necessidade  
histórica do atual estágio da acumulação capitalista. Este novo arranjo demanda  
instrumentos jurídicos que sustentam tal dinâmica propriedade, contratos de  
investimento e regulação internacional , tema do próximo subitem.  
2.3. Arquitetura jurídica internacional e sua função legitimadora  
A expansão do setor aeroespacial se dá sob um arcabouço jurídico internacional  
formado principalmente pelo Outer Space Treaty (OST, 1967), o Moon Agreement  
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A exploração aeroespacial como fronteira de valorização do capital portador de juros  
(1979), e uma série de outros tratados e formados entre os anos 1960, 1970 e 1980  
em sua maioria e princípios orientadores da ONU que, embora formulados sob a  
retórica da paz e da cooperação, oferecem uma moldura aberta à apropriação privada  
indireta e à exploração econômica do espaço sideral, mas com um texto não muito  
claro nesse sentido, o que vem gerando debates em torno do tema.  
O OST, ao afirmar que “o espaço sideral, incluindo a lua e outros corpos  
celestes, não está sujeito à apropriação nacional por reivindicação de soberania, por  
meio de uso ou ocupação, ou por qualquer outro meio” (Art. II)3, parece limitar a  
soberania estatal, mas deixa espaço para formas contratuais de apropriação indireta  
por corporações privadas, sobretudo em regimes jurídicos favoráveis como o dos  
Estados Unidos. Como indicam Lyall e Larsen (2022), o tratado não aborda a  
titularidade sobre os recursos extraídos nem impede contratos entre empresas e  
estados. Essa ambiguidade é explorada por grandes players como a SpaceX, Blue  
Origin, Virgin Galactic e Planetary Resources para projetar investimentos e garantir  
juridicamente seus contratos de exploração.  
Mais incisivo e claro é o Moon Agreement, que propunha um regime  
internacional de gestão comum dos recursos lunares. Contudo, esse tratado não foi  
ratificado por nenhum dos países com capacidade real de exploração espacial (Estados  
Unidos, Rússia, China), o que reforça sua marginalidade prática. Ao contrário do que  
se dispõe nesse tratado, os Estados Unidos adotaram o mecanismo jurídico nacional  
como o US Commercial Space Launch Competitiveness Act (2015), que garante a todo  
cidadão norte-americano4 que tomar posse sobre um corpo celeste o direito sobre os  
recursos extraídos mesmo sem declarar soberania e jurisdição daquele território,  
expondo uma nova conformação jurídico-política, mas que não deixa perder no  
horizonte a necessidade da propriedade privada, e impondo-a pela força, em  
movimento semelhante àquele já visto na Terra durante a assim chamada acumulação  
primitiva com as terras da América Latina.  
Essa arquitetura jurídica atual do setor aeroespacial cumpre duas funções  
essenciais à financeirização:  
1. Legitimação do investimento especulativo: ao fornecer previsibilidade e  
respaldo legal às operações, permite a emissão de contratos com base em expectativas  
futuras de exploração, transformando-as em ativos negociáveis. No plano público, os  
Estados Unidos estruturaram instrumentos contratuais que ancoram fluxos de caixa em  
3
set 2025.  
4 Essa dicção “todo cidadão” revela um certo cinismo do legislador que conhece as limitações práticas  
da exploração do espaço sideral.  
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marcos técnicos (milestones5), reduzindo risco tecnológico e de execução, o que atrai  
o capital privado. Dentre esses “marcos técnicos”, que são instrumentos contratuais  
para remunerar cada etapa atingida do projeto, tem-se: (I) Space Act Agreements6  
(COTS/CCDev7): acordos com pagamentos por marcos técnicos (milestone-based).  
Aqui, a própria Space Act Agreements do COTS traz o anexo de milestones e valores  
vinculados a entregas verificáveis (NASA, 2006). (II) Commercial Lunar Payload Services  
(CLPS): IDIQ8 de preço fixo para entregas comerciais à Lua, com teto agregado de US$  
2,6 bi até nov/2028, viabilizando múltiplas janelas de receita contratual para private  
players (NASA, 2025). (III) Launch Service Agreements (OTA) & NSSL: acordos e  
compras plurianuais de serviços de lançamento (Phase 2: 48 missões 20222027,  
distribuídas entre SpaceX e ULA), estabilizando demanda futura e bancabilidade  
(Congressional Research Service, 2024). Ou seja, são formas contratuais que garantem  
um risco praticamente nulo ao contratado pelo estado.  
No âmbito privado e financeiro, contratos industriais e de financiamento  
incorporam sistematicamente “pagamentos por marcos técnicos” (milestone payments)  
e contas escrow9 como mecanismos de mitigação de risco até eventos críticos como  
entrega ou lançamento. Esta prática encontra-se documentada em purchase  
agreements (acordos de aquisição) de satélites que incluem cláusulas específicas de  
milestone payments (pagamentos por marcos técnicos alcançados), bem como em  
arquivos depositados junto à SEC10 demonstrando a utilização de escrow para  
5
O termo milestones, em tradução livre “marcos técnicos”, refere-se a etapas ou eventos específicos,  
mensuráveis e verificáveis, predefinidos no cronograma de um projeto. Em arranjos contratuais, o  
atingimento de cada marco funciona como um gatilho para a liberação de uma parcela do pagamento.  
Essa metodologia, conhecida como milestone payment, é um poderoso instrumento de mitigação de  
risco para os financiadores, pois condiciona a alocação de capital à entrega de resultados concretos e  
comprovados, tornando o investimento mais seguro e atrativo ao garantir que o financiamento  
acompanhe o progresso real da execução.  
6
Acesso em: 28 set. 2025  
7 Programas estatais do governo dos Estados Unidos para o desenvolvimento comercial da exploração  
Espacial. O Commercial Orbital Transportation Services (Cots). Foi um programa da Nasa para estimular  
o desenvolvimento de naves espaciais provadas e veículos de lançamento para entregas à Estação  
Espacial Internacional. O Commercial Crew Development (CCDev) foi um investimento da Nasa financiado  
por US$ 50 milhões dos fundos da American Recovery and Reinvestment Act (ARRA), para estimular os  
esforços dentro do setor privado que ajudam no desenvolvimento e demonstração de capacidades de  
transporte espacial seguras, confiáveis e econômicas.  
8
Termo em inglês que abrevia indefinite delivery/indefinite quantity (entrega indefini/quantidade  
indefinida). Forma contratual que prevê uma quantidade indefinida de suprimentos ou serviços durante  
um período fixo de tempo.  
9
Conta escrow (ou conta de garantia) é uma conta bancária mantida por um terceiro neutro (o agente  
escrow), onde fundos ou ativos são depositados para garantir o cumprimento de um contrato. O valor  
só é liberado para o vendedor/beneficiário após a confirmação de que todas as condições acordadas  
foram cumpridas, protegendo assim as partes envolvidas em transações de alto valor ou risco, como  
fusões e aquisições, operações imobiliárias e comércio internacional.  
10 Securities and Exchange Commission (SEC) é a agência reguladora do mercado financeiro dos Estados  
Unidos, responsável por supervisionar e garantir a transparência das informações financeiras divulgadas  
pelas empresas, similar à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) no Brasil. Sua atuação é fundamental  
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A exploração aeroespacial como fronteira de valorização do capital portador de juros  
assegurar parcelas relacionadas à fabricação e lançamento de sistemas espaciais,  
conforme evidenciado no caso da Globalstar e outras empresas do setor (DIGITAL  
GLOBE; BALL AEROSPACE, 2006).  
Desse modo, a conversão de expectativas futuras em ativos negociáveis no  
mercado de capitais materializou-se através de veículos equity-linked11, notadamente  
Special Purpose Acquisition Companies (Spac), que conduziram empresas espaciais ao  
mercado público antes da plena maturação operacional, ilustrado pelos casos da Virgin  
Galactic e Rocket Lab, caracterizando uma dinâmica de financeirização antecipada de  
ativos espaciais que permite a captação de recursos com base em potencial  
tecnológico e expectativas de mercado (ROCEKT LAB, 2021; VIRGIN GALACTIC, 2019).  
Ou seja, há cláusulas que operam de modo que o lançamento de satélites ou testes  
orbitais futuros funcionem como garantia real de remuneração futura.  
Diante disso, é possível concluir que a existência dos contratos governamentais  
de alto valor funcionam como uma garantia implícita que facilita a especulação no setor  
porque criam um fluxo de receita previsível e estável que serve como "colchão de  
segurança" para os investidores que se “lançam” nesses projetos, a partir dos marcos  
atingidos (milestones). Com essa base financeira assegurada, assumem-se riscos  
maiores em investimentos especulativos dentro do setor aeroespacial.  
2. Flexibilização da titularidade: atualmente não há regras rígidas de Direito  
Internacional sobre eventuais limites à propriedade de recursos celestes, e, assim, os  
contratos privados assumem papel central na definição dos direitos econômicos. A  
forma jurídica do contrato opera, nesse contexto, como substituto funcional da  
soberania e da jurisdição que só pode ser operado por países que tenham essa  
capacidade econômica, política e militar12, como é o caso dos Estados Unidos,  
convertendo interesses privados em expectativas juridicamente tuteladas, e, assim,  
antes mesmo da tomada da posse do território de corpos celestes o direito já estaria  
garantido acesso ao capital para uma parcela da burguesia. Nesse sentido, nota-se  
como que a forma jurídica é capaz de permitir acúmulo de capitais advindos da  
propriedade da terra de modo desvinculado à figura econômica da renda da terra, uma  
vez que nem se pode falar ainda, com precisão, qual é o nível de produtividade daquela  
terra.  
na fiscalização de contratos e documentos relacionados a setores econômicos estratégicos, como o  
espacial.  
11  
Equity-linked é um instrumento financeiro cujo retorno é vinculado ao desempenho de um ou mais  
ativos de renda variável, podendo ser ações ou índices. Comumente, possui uma estrutura que oferece  
proteção total ou parcial do capital investido, aliando características de renda fixa e variável.  
12  
Fenômeno que será analisado com mais cuidado quando for analisada a atuação do direito  
internacional nesse setor no sub item 2.6.  
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O que se observa é a consolidação de uma moldura jurídica minimalista,  
suficientemente ampla para evitar entraves à expansão do capital e adequadamente  
estruturada para sustentar juridicamente os fluxos especulativos.  
O direito internacional, nesse sentido, funciona como campo de debates  
jurídicos que para a mobilização privada em territórios juridicamente esvaziados, um  
tipo de "zona cinzenta" institucional, que se estivesse tratando de território terrestre,  
encontrariam barreiras políticas e jurídicas. Para o objeto do presente estudo, o direito  
internacional se revela como uma moldura jurídica funcional à hegemonia do capital  
fictício, que combina baixa regulação e alta rentabilidade potencial.  
No próximo subitem, veremos como o direito internacional se torna essa zona  
cinzenta para acomodar contratos privados, revelando o fenômeno jurídico como um  
lócus efetivo da mediação entre expectativa de lucro e valorização do capital portador  
de juros.  
2.4. A arquitetura jurídica internacional como forma de legitimação dos contratos  
privados no setor espacial  
A expansão das atividades espaciais pelo setor privado exige, para além da  
retórica ideológica do empreendedorismo, uma moldura jurídica que conforte os  
investimentos especulativos em uma base de legalidade transnacional. Ainda que os  
tratados internacionais, como Outer Space Treaty (OST, 1967) não reconheça tão  
claramente a apropriação nacional de corpos celestes, tampouco proíbe ao menos  
com efetividade , e o Moon Agreement (1979), que é um pouco mais claro nesse  
sentido, não foi ratificado por nenhuma potência do setor aeroespacial, nenhum desses  
mecanismos têm impedido a apropriação indireta via agentes privados, amparada por  
contratos celebrados sob jurisdições domésticas.  
Essa ambiguidade é precisamente o que permite a operação jurídica do capital  
portador de juros no setor espacial. Logo, aquilo que é considerado pelos  
jurisconsultos como uma falha técnica dos mecanismos jurídicos é, na verdade, o  
direito se conformando aos imperativos da realidade.  
Para compreender como o direito internacional, as lições de Pachukanis (1925)  
são de grande valor. O autor soviético revela que, no plano interno, o estado é o  
terceiro garantidor das relações jurídicas, assegurando a impessoalidade necessária às  
trocas mercantis e à reprodução do capital. No direito internacional, essa figura  
centralizadora inexiste (MIÉVILLE, 2016). Contudo, isso não significa que o direito  
internacional funcione sem coercitividade ou que sua lógica de operação escape à  
forma jurídica. Na ausência de um aparato estatal global, o uso da força, explícita ou  
implícita, é exercido por atores hegemônicos como os Estados Unidos, e esse se torna  
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A exploração aeroespacial como fronteira de valorização do capital portador de juros  
o principal mecanismo para garantir a observância das normas e a reprodução das  
relações de exploração. É por isso que Pachukanis expõe que “o verdadeiro conteúdo  
histórico do direito internacional, então, é a luta entre os estados capitalistas. O direito  
internacional deve sua existência ao domínio que a burguesia exerce sobre o  
proletariado e sobre os países colonizados” (PACHUKANIS, 1925 – tradução anônima).  
Essa lição do autor soviético fica clara ao se analisar o caso específico da conformação  
relativamente ampla do direito internacional no que tange os assuntos relacionados à  
apropriação privada de corpos celestes, permitindo a legitimidade da atuação dos  
estados que têm a capacidade econômica, política e militar para se apropriar desses  
terrenos. A burguesia dos estados com esse poderio irá se apropriar de forma privada  
dos meios de produção disponíveis em corpos celestes, excluindo o proletariado e os  
demais países dessa exploração.  
A dicção confusa e obscura das normas de direito internacional acerca da  
propriedade privada de corpos celestes oferece um campo fértil para o ímpeto  
manipulatório do direito (LUKÁCS, 2013), conduzindo a longos debates sobre a  
melhor forma de exploração do espaço sideral, mas sempre partindo do pressuposto  
da propriedade privada, como único modo possível.  
Nelson (2011), por exemplo, um advogado que atua em causas relacionadas à  
direito internacional e transfronteiriços, tece sua crítica aos atuais tratados que versam  
sobre a exploração espacial indicando a falha dos tratados em vigor. O advogado  
sustenta que o Acordo da Lua (o último da série inicial de tratados de direito espacial,  
dos quais o Tratado do Espaço Exterior de 1967 é o ponto alto) desencoraja o  
investimento privado e, nas palavras de Nelson,  
[…] a principal crítica ao Acordo da Lua não é que ele não proponha  
regulamentação, mas que ele propõe o tipo errado de  
regulamentação:  
o
tipo que desencoraja uma estrutura  
suficientemente estável e previsível que, por sua vez, desencoraja o  
investimento privado (NELSON, 2011, pp. 403-4 tradução livre).  
Nelson (2011) conduz sua crítica então para a necessidade de uma regulação  
do espaço sideral em âmbito internacional para que possa gerar segurança jurídica  
aos investidores privados. O advogado se alinha, nesse sentido, à Zhao (2004),  
professor da Universidade de Hong Kong da área de direito internacional e com foco  
de estudo em direito espacial. Anos antes, ele já defendia uma abordagem de livre  
mercado para reforçar a segurança jurídica de um sistema capaz de fornecer direitos  
de propriedade para desenvolver a indústria espacial privada que, naquele momento,  
em 2004, estava em um estágio bem embrionário no que tange à participação da  
iniciativa privada no setor. Zhao dirá que:  
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Uma abordagem de livre mercado reforçada pela segurança jurídica  
inerente a um sistema que fornece direitos de propriedade definidos  
faria muito para energizar o desenvolvimento estagnado da indústria  
espacial. (ZHAO, 2004, p. 290 tradução livre)  
A inexistência de um regime sancionador internacional robusto, somada à  
cláusula da “responsabilidade estatal pelos atos de seus nacionais” presente no art. VI  
do Tratado do Espaço Exterior13, abre espaço para que estados com maior capacidade  
de intervenção política na conformação normativa como os Estados Unidos—  
legislem de forma a garantir segurança jurídica às suas corporações. A arquitetura  
jurídica internacional, assim, não é um entrave, mas um suporte indireto para as  
operações do capital fictício.  
Uma outra preocupação recorrente dos autores é com relação ao chamado uso  
pacífico do espaço. Zhao (2004) alerta a necessidade de que o uso pacífico seja um  
princípio básico do direito espacial internacional.  
Idealmente, as atividades espaciais devem ser realizadas no interesse  
da manutenção da paz e da segurança internacionais. O uso pacífico  
do espaço exterior, sendo o princípio básico do direito espacial  
internacional, deve ser mantido. (ZHAO, 2004, p. 292 tradução  
livre)  
Essa preocupação com uso pacífico vem sempre acompanhada do alerta para a  
necessidade de regular juridicamente as atividades comerciais no espaço no âmbito  
internacional para evitar conflitos bélicos. Basta observar que os Tratados  
Internacionais que versam sobre a questão, seja o Outer Space Treaty (OST, 1967) ou  
o Moon Agreement (1979), são sempre criticados justamente por não oferecerem  
nenhuma segurança jurídica aos investidores e apontam para a possibilidade dessa  
insegurança gerar conflitos. Quinn (2008) afirma que juntar essa “fraqueza com a  
ausência de um tribunal internacional para julgar conflitos significa que, na primeira  
vez em que o Tratado do Espaço Sideral for testado, ficará claro que ele não tem força”  
(QUINN, 2008, p. 495).  
A ideia de evitar conflitos então se relaciona à necessidade de viabilizar as  
atividades comerciais, e não de um uso comum e pacífico por toda a humanidade.  
13 “ARTICLE VI - States Parties to the Treaty shall bear international responsibility for national activities  
in outer space, including the Moon and other celestial bodies, whether such activities are carried on by  
governmental agencies or by non-governmental entities, and for assuring that national activities are  
carried out in conformity with the provisions set forth in the present Treaty. The activities of non-  
governmental entities in outer space, including the Moon and other celestial bodies, shall require  
authorization and continuing supervision by the appropriate State Party to the Treaty. When activities  
are carried on in outer space, including the Moon and other celestial bodies, by an international  
organization, responsibility for compliance with this Treaty shall be borne both by the international  
organization and by the States Parties to the Treaty participating in such organization.” (UNITED  
NATIONS, 1966)  
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A exploração aeroespacial como fronteira de valorização do capital portador de juros  
Todo o debate jurídico atual acerca do direito espacial é motivado pelas necessidades  
da acumulação capitalista.  
2.4.1. Do direito internacional à legislação doméstica: a intermediação estatal  
O US Commercial Space Launch Competitiveness Act (2015) é exemplar para  
revelar como a ausência de um fator coercitivo eficiente no cenário internacional, junto  
a normas que trazem um texto bem aberto à interpretações, tem dado espaço para a  
regulação do espaço em âmbito doméstico nos Estados Unidos. Essa norma garante  
às empresas americanas o direito de explorar recursos espaciais (como minérios de  
asteroides) sem que isso implique reivindicação de soberania nacional um artifício  
jurídico que contorna os tratados internacionais ao mesmo tempo em que os  
instrumentaliza. A SpaceX, a Planetary Resources, Virgin Galactic, Blue Origin e outras  
companhias utilizam tais previsões para incluir em seus contratos cláusulas de  
expectativa legítima de exploração futura, as quais são convertidas em títulos  
financeiros e ativos contábeis.  
O US Commercial Space Launch Competitiveness Act (2015) reconhece aos  
cidadãos dos Estados Unidos o direito sobre recursos espaciais que venham a extrair  
(“possuir, deter, transportar, usar e vender”) e, ao mesmo tempo, registra que não há  
qualquer reivindicação de soberania ou jurisdição exclusiva sobre corpos celestes  
pelos Estados Unidos (UNITED STATES, 2015). Em paralelo, regimes nacionais como o  
Luxemburgo/201714 afirmam expressamente que “os recursos espaciais são passíveis  
de apropriação”15, condicionando a atividade a autorização ministerial arquitetura  
pensada para dar segurança jurídica a investidores e operadores (GRAND DUCHY OF  
LUXEMBOURG, 2017).  
Na prática, empresas voltadas à extração de recursos, como a Planetary  
Resources (e a então Deep Space Industries), invocaram esse mecanismo normativo  
doméstico em acordos e captações, inclusive com apoio estatal de Luxemburgo (MoU  
e aporte de capital/ P&D), estruturando planos de negócio ancorados em expectativas  
de exploração futura (GOUVERNEMENT..., 2016).  
Nesse cenário, o ambiente regulatório tanto nos Estados Unidos, como em  
outros países parceiros, a partir da US Commercial Space Launch Competitiveness Act  
14“Marco de Luxemburgo”: em 2017, Luxemburgo aprovou a Lei de 20 de julho de 2017 sobre a  
exploração e o uso de recursos espaciais, que (i) reconhece a possibilidade de apropriação dos recursos  
após a extração (“space resources are capable of being owned”), e (ii) cria um regime de autorização e  
supervisão ministerial para missões privadas, em conformidade com o direito internacional. A lei integra  
a estratégia SpaceResources.lu e sustenta iniciativas como o ESRIC, voltadas a P&D e à atração de  
investimentos no tema.  
15 Article 1. Space resources are capable of being owned.(GRAND DUCHY OF LUXEMBOURG, 2017)  
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of 2015, estabelece um pilar para a mineração espacial ao garantir que cidadãos norte-  
americanos (ou seja, a burguesia norte-americana) sejam donos dos recursos que  
extraírem, sem que isso represente uma reivindicação de soberania sobre o corpo  
celeste.  
Nos termos da Lei de Exploração e Utilização de Recursos Espaciais  
de 2015 (PL 114-90, Título IV; 51 USC. §51303), qualquer cidadão  
americano envolvido na extração comercial de recursos espaciais tem  
direito aos recursos obtidos, de acordo com a legislação aplicável. A  
mesma lei também determina que o governo federal facilite e promova  
a recuperação comercial de recursos espaciais. (LINDBERGH, 2024)16  
As eventuais insuficiências no âmbito internacional são preenchidas pelo direito  
doméstico de modo a acomodar as necessidades da acumulação capitalista ao discurso  
jurídico, em um ambiente mais favorável aos interesses de cada burguesia nacional,  
ou seja, o âmbito interno de seu próprio país. Diferente do que aponta Lindbergh  
(2024) ao dizer que incerteza sobre o direito de propriedade pode "deter o  
investimento financeiro"17 no setor aeroespacial, é justamente essa suposta incerteza  
que apresentou a condição adequada para discurso jurídico se acomodar à realidade  
no processo histórico.  
Veja-se, por exemplo, que a Lei de Competitividade de Lançamento Comercial  
Espacial (US Commercial Space Launch Competitiveness Act, USA, 2015) garante aos  
cidadãos e empresas norte-americanas o direito de explorar, possuir, utilizar,  
transportar e vender recursos espaciais (como água e minerais) extraídos de asteroides  
ou outros corpos celestes. No entanto, a mesma legislação, fala muito pouco sobre a  
questão ambiental no espaço sideral, e a única referência sobre o tema está exposta  
na seção 109, alínea “c”, item 5, que mencionará a preocupação acerca do tráfego  
espacial, a fim de evitar congestionamento do ambiente orbital, ou seja, o meio  
ambiente é assunto somente até o ponto em que pode inviabilizar os dificultar a  
acumulação de capitais. A referida lei garante a possibilidade de exploração dos  
recursos naturais dos corpos celestes, mas não estabelece limitação, relegando essa  
tarefa às normas internacionais. A Legislação de Competitividade de Lançamento  
Comercial Espacial até estabelece regras para a responsabilidade civil e indenização  
relacionadas às atividades de voo espacial, incluindo proteções legais para os  
participantes de voos espaciais e operadores licenciados, na seção 106, que versa  
16  
Under the Space Resource Exploration and Utilization Act of 2015 (P.L. 114-90, Title IV; 51 U.S.C.  
§51303), any U.S. citizen engaged in commercial space resource extraction is entitled to the resource  
obtained, in accordance with applicable law. The same law also directs the federal government to  
facilitate and promote commercial recovery of space resources.”  
17Some note that a perceived lack of entitlement certainty may deter financial investment in space  
resource extraction.(LINDBERGH, 2024)  
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A exploração aeroespacial como fronteira de valorização do capital portador de juros  
sobre a jurisdição federal. Mais uma vez, a preocupação se refere a uma  
responsabilidade civil, para resguardar eventuais prejuízos contratuais, passando ao  
largo a preservação do meio ambiente.  
Na mesma direção, o Outer Space Act do Reino Unido e outros mecanismos de  
autorização nacionais foram adotados também por países europeus, permitindo que  
contratos internacionais sejam registrados e supervisionados por entes nacionais,  
criando um duplo nível de legalidade que associa o direito internacional a autorizações  
administrativas internas.  
Nesse contexto, grandes players de transporte, como a SpaceX, se beneficiam  
indiretamente, pois a criação de um novo mercado de mineração gera uma demanda  
futura por serviços de logística e lançamento, ainda que seus contratos atuais não  
tratem da atividade em si. Essas previsões legais também facilitam a inclusão, em  
instrumentos de investimento privado, de cláusulas de “expectativa legítima” – como  
o atingimento de milestones que atuam como gatilhos financeiros que podem ser  
precificadas em captações e refletidas como ativos contratuais. A literatura jurídica,  
por sua vez, destaca justamente esse acoplamento entre o reconhecimento de direitos  
sobre recursos e a criação de estruturas financeiras para a mobilização de capital, um  
tema que permanece em debate na esfera internacional (MASSON-ZWAAN;  
PALKOVITZ, 2017).  
2.4.2. Contratos como dispositivos de titularização de expectativas  
O que os contratos governamentais evidenciam é que as previsões contratuais  
são elaboradas com base em normativas internacionais mínimas, mas são validadas  
por legislações domésticas, oferecendo aos investidores garantias formalmente  
estáveis para emissão de debêntures18, bonds19, tokens digitais20 e outros  
instrumentos de capital fictício.  
O contrato firmado entre a Blue Origin e a Nasa21, por exemplo, serve para dar  
substrato às expectativas futuras. Ele se insere em um contexto jurídico-institucional  
18Debêntures: Títulos de dívida de médio a longo prazo emitidos por sociedades anônimas (empresas  
não financeiras) para captação de recursos. Ao adquirir uma debênture, o investidor torna-se credor da  
companhia, recebendo uma remuneração (juros) pelo empréstimo até a data de vencimento do título.  
19Bonds: Termo genérico e internacional para títulos de dívida, sejam eles emitidos por empresas  
(corporate bonds) ou por governos (government bonds). A debênture é a nomenclatura jurídica utilizada  
no Brasil para designar um corporate bond.  
20Tokens Digitais: Ativos digitais registrados em uma rede blockchain que representam um direito ou  
o valor de um ativo real ou financeiro. No contexto de dívida, um security token pode representar  
digitalmente uma fração de uma debênture ou bond, permitindo sua negociação fracionada e com maior  
liquidez em um ambiente digital.  
21  
em: 4 out. 2025.  
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mais amplo, caracterizado pela ausência de normas internacionais vinculantes sobre a  
exploração comercial de recursos espaciais. Para suprir essa lacuna, os Estados Unidos  
vêm promovendo os chamados Artemis Accords22 um conjunto de diretrizes  
elaboradas pelo governo norte-americano, a partir de 2020, com o objetivo de  
estabelecer princípios para o uso civil e comercial do espaço sideral e são os Artemis  
Accords que dão a moldura institucional para contratos tais como o já mencionado e  
recentemente firmado entre Blue Origin e Nasa. Esses acordos, entretanto, não  
possuem natureza de tratado internacional, tampouco são dotados de força vinculante  
no sistema jurídico internacional: consistem em instrumentos de soft law, isto é, normas  
de caráter não compulsório que funcionam como orientações políticas e jurídicas para  
a atuação de empresas e estados signatários.  
Ainda que não criem obrigações jurídicas formais, os Artemis Accords exercem  
uma função normativa estratégica: oferecem um arcabouço simbólico de  
previsibilidade regulatória, o qual legitima a atuação de empresas privadas na  
exploração lunar e possibilita a titularização de direitos de exploração e posse futura  
de recursos ainda não apropriados. Tal “moldura normativa”, mesmo sem  
coercitividade formal, é mobilizada nos contratos como referência legítima e  
justificadora das expectativas de retorno dos investimentos, demonstrando, no plano  
formal, um compromisso com o cumprimento das diretrizes e princípios ali  
estabelecidos. Em outras palavras, os contratos fazem uso dessas normas flexíveis  
como base para conferir legitimidade aos contratos, viabilizando juridicamente a  
projeção de fluxos de caixa futuros condição indispensável à financeirização dos  
ativos espaciais, especialmente em setores como o de mineração lunar, transporte  
orbital e instalação de habitats artificiais.  
A operação é clara: a arquitetura jurídica internacional define os limites formais  
do que pode ou não ser feito no espaço; os contratos privados, por sua vez, operam  
nesses interstícios, amparando-se nas legislações nacionais para converter  
expectativas técnicas (viáveis ou não) e geopolíticas em ativos jurídicos negociáveis. A  
desmaterialização da posse convertida em mero título de propriedade sobre ativos  
espaciais é, assim, juridicamente mediada, em um movimento que acompanha a  
correlação de forças políticas, determinadas de modo reflexivo por aspectos concretos  
22Os Artemis Accords são um conjunto de princípios, diretrizes e boas práticas para orientar a  
cooperação internacional na exploração espacial civil (com foco nas missões do Programa Artemis),  
reforçando obrigações do Tratado do Espaço Exterior (1967). Entre os princípios estão: fins pacíficos,  
transparência, interoperabilidade, assistência em emergências, registro de objetos espaciais, divulgação  
aberta de dados científicos, preservação de patrimônio espacial, uso de recursos em conformidade com  
o Tratado, coordenação para evitar interferências [safety zones] e mitigação de detritos orbitais (NASA,  
2020).  
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A exploração aeroespacial como fronteira de valorização do capital portador de juros  
encontrados na crítica da economia política, onde está a anatomia das relações sociais.  
2.5. Contratos privados e governamentais como formas jurídicas do capital  
portador de juros e seu desdobramento em capital fictício  
O setor aeroespacial, ao configurar-se como nova fronteira de valorização do  
capital, não poderia expandir-se sem a intermediação de formas jurídicas que garantam  
a transformação de expectativas futuras em ativos comercializáveis no presente. É  
nesse ponto que os contratos privados desempenham uma função estruturante,  
constituindo-se como formas jurídicas por excelência do capital portador de juros no  
espaço sideral, tanto no mercado financeiro, bem como contratos administrativos com  
o governo podem funcionar como antecipações.  
Diferente da realização clássica do capital, que ocorre pela produção de  
mercadorias e sua venda no mercado, a lógica financeira que rege os contratos  
espaciais pressupõe a antecipação de um valor futuro incerto, sustentado por ativos  
jurídicos formalmente válidos, tendo em vista a gama de promessas a serem realizadas,  
e considerando que algumas delas são sabidamente inviáveis no atual estágio de  
desenvolvimento tecnológico. Esses contratos23 não se limitam a regular obrigações  
recíprocas entre partes privadas ou uma parte privada e o governo, mas são  
estruturados de modo a garantir fluxos de valorização contínuos e transnacionais,  
respaldados por sistemas jurídicos nacionais e internacionais.  
A prática de utilizar os contratos governamentais para aquisição e  
desenvolvimento tecnológico a partir de produtos militares enquanto uma forma de  
oferecer segurança e certeza para o capitalista não é novidade, e já havia sido  
identificada por Chesnais:  
[…] as particularíssimas condições da pesquisa e da produção  
militares geram nas empresas beneficiárias dos contratos de  
armamento o que Jean-Claude Derian (La grande panne de la  
téchnologie américaine, editora Albin Michel, 1988) chamou de cultura  
técnica de mentalidade “protegida”. Os lucros são altos e garantidos,  
graças a um faturamento em cost-plus (os custos havidos, mais uma  
margem automática); os contratos contêm cláusulas que permitem  
repetidas revisões quando aumentam os custos inicialmente  
anunciados; nenhum risco comercial está associado à inovação, pois  
eles são assumidos pelo autor da encomenda, que arca com as  
despesas em caso de fracasso tecnológico, mas que, pelo contrário,  
23  
“As metamorfoses da mercadoria, no processo de circulação (Livro II), parecem efetivamente apagar  
o processo produtivo; aqui, na superfície das figuras econômicas do processo global de produção (Livro  
III), porém, no capital portador de juros, ele já está apagado, não aparecendo, seja como um momento  
da metamorfose das mercadorias, seja como parte da reprodução do capital. O capital portador de juros  
está no polo oposto do capitalista funcionante (que investe produtivamente o capital ou com ele  
comercializa); o movimento essencial da economia se dá neste polo funcionante. As formas jurídicas,  
porém, juntamente com as garantias jurídicas, operam em meio à transferência de dinheiro ao capital  
portador de juros.” (SARTORI, 2023, p. 147)  
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faz importantes encomendas de material em caso de êxito. A “cultura  
protegida” gera, assim, modos de administração cada vez mais  
conservadores e distantes das condições de concorrência nos  
mercados civis. Mais ainda, graças à mobilidade dos dirigentes de  
empresa e dos executivos, esses modos de administração são  
contagiosos e se disseminam pelo conjunto do tecido industrial.  
(CHESNAIS, 1995, p. 138)  
O setor aeroespacial, um braço do Complexo Industrial-militar e que se  
desenvolveu a partir dele, foi capaz de amalgamar a garantia dos contratos  
governamentais à lógica especulativa do mercado financeiro de modo sistemático. As  
cláusulas contratuais examinadas em instrumentos de SpaceX, Boeing, OneWeb e  
Astrobotic evidenciam como expectativas técnicas futuras são juridicamente  
estruturadas e convertidas em ativos negociáveis. Para ilustrar, tem-se que nos  
contratos CCtCap24 com a Nasa (SpaceX e Boeing), os pagamentos são milestone-based  
e condicionados a entregas técnico-programáticas descritas no Attachment J-03,  
Appendix A Milestone Acceptance Criteria and Payment Schedule25. Os percentuais e  
critérios de liberação são modulados pela cláusula H.19 (Post-Certification Mission  
Payments, Milestones and ATP Criteria), transformando eventos de engenharia em  
gatilhos financeiros e reduz risco de execução ao investidor. Diante disso, a título de  
exemplo, veja-se como foi estruturado o contrato entre a Nasa e a Boeing (2014), que  
estabelece um cronograma de pagamentos baseado em milestones, com limites  
percentuais26:  
Até 20% após a Revisão de Certificação de Design da ISS;  
Até 30% após a Revisão de Linha Base do Veículo;  
Até 50% após a Revisão de Integração da Missão;  
Até 60% após a Revisão de Certificação;  
24  
Contratos de Capacidade de Transporte de Tripulação Comercial (CCtCap) são projetados para  
concluir a certificação da Nasa para sistemas de transporte espacial humano capazes de transportar  
pessoas para a órbita. Uma vez concluída a certificação, a Nasa planeja usar esses sistemas para  
transportar astronautas para a Estação Espacial Internacional e devolvê-los com segurança à Terra.  
25  
appendix-a.pdf>. Acesso em: 28 set 2025.  
26  
(e) PCM task order payment constraints: The total PCM task order payments made prior to and  
including: NNK14MA75C - Commercial Crew Transportation Capability (CCtCap) Contract Page 52 of  
114 (1) The completion of the SubCLIN 001A, ISS Design Certification Review (ISS DCR), (associated  
with the required crewed flight test to ISS; see Attachment J-03, Appendix A) shall not exceed 20% of  
the total price of the mission. (2) The completion of the Vehicle Baseline Review (VBR) shall not exceed  
30% of the total price of the mission. (3) The completion of the Mission Integration Review (MIR) shall  
not exceed 50% of the total price of the mission. (4) The completion of the SubCLIN 001B, Certification  
Review (CR), (see Attachment J-03, Appendix A) shall not exceed 60% of the total price of the mission.  
(5) The completion of the Nasa Flight Readiness Review (FRR) shall not exceed 75% of the total price  
of the mission. (6) The final milestone payment must equal at least 10% of the price of the mission  
(NASA; Boeing, 2014, pp. 52-3).  
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A exploração aeroespacial como fronteira de valorização do capital portador de juros  
Até 75% após a Revisão de Prontidão de Voo da Nasa;  
Pelo menos 10% no pagamento final.  
Ademais, cabe pontuar que o acordo entre Nasa e SpaceX segue os mesmos  
parâmetros de milestone-payment (NASA; SPACEX, 2014).  
Já nos contratos-padrão da Astrobotic27 para o serviço MoonBox28, os Terms  
and Conditions preveem que atrasos, reprogramações e até cancelamentos podem  
ocorrer “a critério” da empresa; os pagamentos são não reembolsáveis, podendo ser  
retidos, e há isenção/renúncia de responsabilidade por falhas, inclusive decorrentes de  
atraso ou não lançamento do payload. Esses dispositivos funcionam, na prática, como  
penalidades econômicas indiretas (retenção, perda de oportunidade e custo de capital  
imputado ao cliente), vinculadas ao desempenho/cronograma projetado, e viabilizam  
ajustes financeiros e remarcações contratuais. Ou seja, convertendo riscos operacionais  
em oportunidades de ajuste financeiro e renegociação de fluxos de capital  
(ASTROBOTIC, [s.d.]).  
Outro elemento recorrente é a previsão de cláusulas de arbitragem  
internacional, que deslocam eventuais litígios para fóruns mais favoráveis à proteção  
de investimentos, normalmente sediados em países centrais. Essa estratégia  
normativo-contratual reduz a insegurança jurídica percebida por investidores privados,  
pois, mediante eventuais alterações na conjuntura política interna a arbitragem  
internacional representaria a possibilidade de um agente impessoal, transformando a  
incerteza própria do setor em uma variável calculável, e, portanto, financiável.  
Os contratos com previsão de entrega em até 5 anos são utilizados para  
captação imediata de recursos, com base na titularização de direitos creditórios futuros  
no mercado financeiro. Ou seja, a expectativa de fornecimento de um serviço ou  
tecnologia, ainda em fase de desenvolvimento, converte-se em lastro para a emissão  
de debêntures, ações ou outros títulos, cuja negociação se insere no circuito do capital  
fictício.  
Essa titularização ocorre com acordos mútuos também baseados em  
expectativas e reembolsos futuros. O contrato firmado entre a OneWeb e a Eutelsat29,  
27  
Empresa privada norte-americana de robótica espacial que desenvolve módulos de pouso e rovers  
lunares. Atua como um serviço de logística, transportando cargas para a Lua para clientes como a Nasa  
(através do programa CLPS), empresas e instituições de pesquisa, com o objetivo de tornar o espaço  
mais acessível (ASTROBOTIC TECHNOLOGY, 2025).  
28  
O serviço MoonBox, da Astrobotic, empresa do setor aeroespacial, permite que indivíduos e  
empresas enviem pequenos objetos e lembranças para a superfície da Lua em uma "cápsula do tempo"  
transportada em suas missões de aterrissagem.  
29 Disponível em:  
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por exemplo, previa a entrega de capacidade de banda larga para regiões remotas  
como contrapartida futura à fusão de operações, permitindo a valorização antecipada  
da empresa resultante e seu ingresso em bolsas de valores.  
O arranjo contratual, portanto, não visa primariamente à execução técnica de  
um projeto espacial, mas à sua viabilidade como ativo financeiro. A forma jurídica do  
contrato, nesse contexto, é o suporte que permite ao capital portador de juros garantir  
sua autovalorização sem passar, necessariamente, pela produção material imediata, e,  
nos termos aqui apresentados, esses ativos acabam sendo garantidos, em última  
instância, pelo estado, por meio dos contratos governamentais. Esse padrão aparece  
em programas como COTS30 e Commercial Crew31, além do NLS II32, que contratam o  
desenvolvimento e a demonstração, e não só a operação madura, criando ativos  
contratuais e gatilhos financeiros antes da plena existência das tecnologias  
contratadas. Essas são inferências da realidade que se faz partindo os pressupostos  
teóricos da tradição marxista, desenvolvidos por Grespan (2019), e também por Sartori  
(2023), quando enfrentou os limites das elaborações de Pachukanis.  
A riqueza, assim, é distribuída, não mais somente de acordo com o  
trabalho dos agentes da produção, mas de acordo com o princípio da  
propriedade privada (GRESPAN, 2011; 2019). As formas jurídicas,  
como a propriedade privada reconhecida juridicamente, aqui, são  
bastante importantes no encaminhamento destas relações sociais.  
Ganham uma proeminência bastante grande. E, com isto na  
superfície da sociedade capitalista as transações jurídicas parecem  
ser essenciais. E até certo ponto, são: sem elas, muitas vezes, o  
encaminhamento de relações econômicas seria muito dificultado. Mas,  
também aqui, o essencial está na produção do mais-valor e na  
correlação, em primeiro lugar, das formas econômicas da mercadoria,  
do dinheiro e do capital e, secundariamente, na relação e na tensão  
entre figuras econômicas como lucro, juros e renda. As formas e as  
garantias jurídicas, em grande parte, conseguem operar tomando  
como pressuposto a relação-capital e a sua conformação específica.  
Elas, em meio aos conflitos entre as diversas classes e parcelas de  
classes (ligadas ao capital bancário, comercial, industrial, por  
exemplo), operam na distribuição da riqueza em meio às figuras  
concretas da economia capitalista, como juros, lucro e renda, trazendo  
diferentes combinações no que toca a distribuição do mais-valor entre  
estas diferentes figuras. (SARTORI, 2019 c, b) As transações, as  
expectativas e garantias jurídicas são formas pelas quais tomando o  
essencial da produção capitalista parcelas do mais-valor são  
out. 2025.  
30  
COTS (2006): a própria Space Act Agreement da Nasa com a SpaceX diz que o objetivo era  
“desenvolver e demonstrar” veículos e operações, com pagamentos por marcos, ou seja, contrato  
firmado antes do sistema existir. (NASA, 2006)  
31  
Commercial Crew / CCtCap (2014): os contratos foram “desenhados para completar o projeto,  
desenvolvimento, testes e certificação”, incluindo voo tripulado de teste, na qual a contratação vem  
antes da tecnologia certificada (NASA, 2014)  
32 NLS II (2020): a Nasa incluiu o New Glenn como serviço elegível no contrato-quadro antes do primeiro  
voo do foguete. (NASA, 2020)  
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distribuídas. E, assim, o papel das formas jurídicas, aqui, está muito  
mais na esfera da distribuição do que na esfera da circulação, como  
em Pachukanis. Elas encaminham a distribuição de parcelas do mais-  
valor, de modo que, mesmo não sendo, seu movimento parece  
arbitrário. (SARTORI, 2023, p. 148)  
Note-se então que o papel dos contratos se articula com a financeirização de  
fundos públicos. Muitos acordos envolvem agências estatais (como a Nasa ou a Darpa,  
no caso dos Estados Unidos) atuando como clientes-âncora, oferecendo demanda  
garantida para projetos privados. Essa estrutura contratual permite que empresas  
obtenham empréstimos a juros mais baixos e captem recursos via fundos de  
investimento, transformando o compromisso contratual com o estado em ferramenta  
de valorização privada no mercado financeiro, potencializando o acúmulo de capital  
fictício por meio dos adiantamentos de capital fundados em contratos administrativos  
com o governo.  
Em resumo, os contratos privados funcionam como veículos formais para a  
circulação do capital portador de juros no setor espacial, e que alavancam o valor de  
mercado das empresas, impulsionando o capital fictício. Eles não apenas organizam  
juridicamente as relações entre entes privados e também dos entes privados com o  
estado, mas sobretudo, garantem a projeção especulativa do valor futuro, alicerçada  
por formas jurídicas que podem se descolar completamente do processo produtivo, e  
servem de fundamento e base para a valorização de mercado da empresa contribuindo  
também para o acúmulo de capital fictício. Como consequência, o capital fictício que  
circula nesse setor é juridicamente ancorado, mesmo quando dissociado de qualquer  
base produtiva concreta.  
Seguindo essa lógica, o próximo capítulo abordará o papel do dinheiro no  
processo de equalização.  
2.6. O processo de equalização e o papel do direito  
No Volume III de O capital, Marx (2017) examina o processo de equalização o  
qual na concorrência entre capitais de diferentes ramos da economia, o mais-valor se  
iguala em diferentes taxas. Isso ocorre através da formação de preços de produção e  
da equalização das taxas de lucro, que tendem a se uniformizar entre as diversas  
indústrias e setores da economia. Trata-se de um mecanismo sistêmico pelo qual o  
capital flui de setores com menor rentabilidade para setores mais lucrativos, até que  
as taxas se igualem, compensadas pelas proporções de capital constante e variável  
aplicadas. No entanto, essa redistribuição ocorre mediada por formas jurídico-políticas  
muito específicas, sobretudo no capitalismo contemporâneo.  
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Por “equalização” (grifo nosso: poderia também ser traduzido por  
“nivelação” ou “compensação”, no sentido de um balanço, de uma  
operação pela qual as diferenças são compensadas conforme a nota  
de rodapé 29 do mesmo autor), Marx compreende os fenômenos  
relativos à distribuição de valores pela concorrência entre os capitais  
individuais. De certo modo, ele aparece já nas formas mais  
elementares pelas quais se apresenta o sistema capitalista, ou seja, na  
circulação simples de mercadorias, quando a migração dos produtores  
entre os ramos nos quais se divide o trabalho criador de diversos  
valores de uso fixa os tempos socialmente necessários e, assim, os  
valores; ela é nomeada no momento da criação de um sistema de  
preços pelo dinheiro, mediante processo generalizado de mensuração  
de valores e se desenvolve com a passagem para o capital, nos  
circuitos de comércio entre os diversos setores da produção. É o Livro  
III de O capital, no entanto, que integra em definitivo a equalização  
em um novo princípio distributivo e invertendo a operação do  
princípio anterior, de modo a colocá-lo em questão, junto com a  
eficácia e até com a própria existência do valor. (GRESPAN, 2019, p.  
39)  
O setor aeroespacial, enquanto componente do departamento III, apropria-se  
do mais-valor produzido pela classe trabalhadora, mas não gera bens que retornem à  
esfera da reprodução social. Essa característica confere ao departamento III uma função  
peculiar na dinâmica capitalista: ele atua como instância de redistribuição do mais-  
valor entre os diferentes departamentos da economia. Historicamente, esse papel foi  
decisivo para a transferência de valor entre os departamentos I e II responsáveis,  
respectivamente, pela produção de bens de produção e de bens de consumo ,  
equilibrando as desproporções inerentes ao processo de reprodução ampliada do  
capital. Contudo, com o avanço da financeirização, a função equalizadora desse  
departamento passa a ser progressivamente absorvida pelas dinâmicas do capital  
portador de juros, que passam a cumprir o papel de redistribuição e compensação de  
desequilíbrios entre setores.  
Essa redistribuição é fundamental porque, em termos tendenciais, o  
departamento I produtor de meios de produção enfrenta dificuldades de realização  
de suas mercadorias antes do departamento II, dada a estrutura de demanda  
interdepartamental, que prioriza o atendimento das necessidades produtivas antes das  
necessidades de consumo. O departamento III, ao atuar como mediador dessa relação,  
contribui para retardar as crises de superprodução, absorvendo parte do mais-valor  
excedente e realocando-o por meio de contratos estatais e investimentos estratégicos.  
No contexto contemporâneo, com o chamado new space, observa-se uma fusão entre  
o departamento III e as dinâmicas da financeirização: ambos se amalgamam no  
exercício da equalização, transformando o setor aeroespacial em um canal privilegiado  
de conversão de capital excedente em capital fictício, o que acelera e intensifica o  
processo de autonomização do valor frente à produção material.  
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A exploração aeroespacial como fronteira de valorização do capital portador de juros  
As mercadorias oriundas do complexo industrial-militar e do setor aeroespacial  
não possuem um valor de uso social geral, mas sim um valor de uso específico à  
burguesia: a imposição bélica de seus interesses na concorrência interestatal. O preço  
dessas mercadorias, portanto, não reflete a medida de trabalho socialmente necessário  
à sua produção, mas a correlação política e jurídica que esses setores estabelecem  
com o estado, especialmente por meio da elaboração das leis orçamentárias e da  
celebração de contratos públicos vantajosos. Nessa relação, o valor de uso dos bens  
de destruição, a política e o direito se fundem como mediações constitutivas da  
acumulação. O direito, em particular, opera como forma elementar de representação  
do valor cristalizando, em normas e contratos, a validade social dos preços e a  
legitimidade da apropriação privada do fundo público , convertendo o estado em um  
agente ativo da reprodução ampliada do capital fictício.  
Como assinala Grespan (2019), o preço não é o valor: o primeiro não expressa  
diretamente a quantidade de trabalho socialmente necessário, mas apenas uma forma  
fenomênica de sua representação. O preço, ao mesmo tempo em que deriva do valor,  
o encobre, porque se apresenta como sua medida imediata, quando na realidade é  
também condicionado pelo valor de uso e pelas mediações políticas e jurídicas que o  
sustentam. No caso do complexo industrial-militar e do setor aeroespacial, a  
intervenção estatal por meio de contratos e gastos públicos intensifica esse  
descolamento, fazendo com que o preço adquira uma autonomia relativa em relação  
ao valor.  
A produção de valor, enquanto transformação da natureza pelo trabalho  
humano, é invisibilizada nesse processo. O que aparece à consciência do capitalista é  
o preço a expressão monetária do valor , e é a partir dele que se estrutura a  
reprodução do capital. As formas mentais que emergem daí convertem o preço e o  
dinheiro nos referentes imediatos da riqueza, ofuscando a base material e o trabalho  
vivo que os originam. Assim, o dinheiro, que inicialmente funcionava como equivalente  
universal de troca, autonomiza-se como representante do valor, tornando-se o próprio  
meio de sua realização aparente. Ele não apenas expressa o resultado do valor gerado  
na produção, mas também o encobre ao se autonomizar, transformando-se na  
representação do capital.  
Nesse movimento, o preço enquanto expressão monetária do valor participa  
do processo de equalização entre capitais, tornando-se o instrumento de redistribuição  
do mais-valor socialmente produzido. É nesse ponto que a burguesia vinculada ao  
complexo industrial-militar e ao setor aeroespacial impõe-se mediante seu poder  
político, assegurando a celebração de contratos públicos que mantêm a circulação do  
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capital e garantem a conversão do valor socialmente produzido em lucro privado.  
Trata-se, assim, de uma equalização mediada juridicamente, em que o direito cumpre  
papel central na legitimação da forma fetichizada do valor e na perpetuação da  
acumulação ampliada sob a hegemonia do capital fictício.  
O que ocorre é apenas que o capitalista se esquece ou, antes, não  
o vê, já que a concorrência não mostra de que todos esses motivos  
compensatórios, que os capitalistas exigem uns dos outros no cálculo  
recíproco dos preços das mercadorias de diferentes ramos de  
produção, referem-se meramente ao fato de que todos eles, pro rata  
a seu capital, detêm iguais direitos ao butim coletivo, ao mais-valor  
total. Parece lhes, antes, uma vez que o lucro por eles embolsado é  
diferente do mais-valor que sugam, que seus motivos compensatórios  
não nivelam a participação no mais-valor total, mas criam o próprio  
Lucro, de maneira que este derivaria simplesmente do acréscimo ao  
preço de custo das mercadorias, acréscimo que seria motivado de uma  
forma ou de outra. (MARX, 2017, pp. 296-7)  
Marx observa que os preços operam como uma forma de divisão pro rata do  
mais-valor socialmente produzido, pela qual determinados setores como o complexo  
industrial-militar e o setor aeroespacial asseguram parcelas mais elevadas por meio  
de contratos públicos. Nessa dinâmica, o direito, tendo a propriedade privada como  
seu princípio estruturante, atua como mediador essencial da redistribuição, conforme  
enfatiza Sartori (2023). Os preços, ainda que se apresentem como equivalentes do  
valor, descolam-se dele e assumem uma função ativa de equalização do mais-valor  
entre os capitalistas dos diversos ramos da produção à circulação , sendo  
simultaneamente afetados por fatores ligados ao valor de uso, à concorrência  
intercapitalista e à formação de monopólios.  
No contexto do CIM e do setor aeroespacial, essa tendência assume contornos  
particularmente evidentes. As agências governamentais, como a NASA, asseguram  
vultosos recursos públicos a empresas privadas como SpaceX, Blue Origin, Virgin  
Galactic e Planetary Resources, por meio de contratos que somam bilhões de dólares.  
Esses contratos, porém, não resultam de uma concorrência entre capitais autônomos  
em um suposto mercado “livre”, mas da mediação estatal e da seletividade política  
que direciona o fundo público para determinados agentes privados. O direito, nesse  
processo, não se limita a formalizar juridicamente os contratos: ele institucionaliza a  
apropriação privada do mais-valor social por meio da legalidade e da forma contratual,  
conferindo aparência de neutralidade e legitimidade àquilo que é, em sua essência, um  
movimento de redistribuição seletiva e hierarquizada do valor.  
Essa forma de redistribuição pode ser compreendida como uma equalização  
politicamente dirigida, na qual o estado e o capital financeiro se articulam  
dialeticamente. O estado, ao garantir contratos de longo prazo e previsibilidade de  
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A exploração aeroespacial como fronteira de valorização do capital portador de juros  
receitas, assegura a continuidade da acumulação e a reprodução das condições de  
valorização do capital; o capital financeiro, por sua vez, acelera o processo de captação  
de recursos, transforma expectativas futuras em títulos negociáveis e realimenta a  
valorização fictícia. Trata-se, portanto, de uma unidade contraditória: enquanto o  
estado desempenha papel ativo na equalização interdepartamental do mais-valor, as  
finanças transformam essa operação em um mecanismo de reprodução ampliada do  
capital portador de juros.  
Nesse quadro, a concorrência e a monopolização aparecem não como forças  
antagônicas, mas como dimensões complementares do processo. A concorrência é  
formalmente preservada pela forma jurídica dos contratos por exemplo, editais e  
licitações , mas o conteúdo concreto dessas relações é marcado pela concentração  
de capital e pelo poder político de poucos grupos empresariais capazes de atender às  
exigências tecnológicas e financeiras impostas pelos programas espaciais. Assim, o  
que se apresenta como livre disputa entre capitais é, na realidade, uma forma  
fetichizada de repartição do mais-valor socialmente produzido, mediada pela política  
orçamentária e pelo direito, que garantem a perpetuação de um circuito de acumulação  
restrito e autocentrado.  
Dessa maneira, a função redistributiva do direito manifesta-se de forma  
concreta na equalização entre capitais por meio dos contratos públicos do setor  
aeroespacial. A legalidade das contratações, a proteção da propriedade privada e a  
própria estrutura jurídica da concorrência configuram um mecanismo de equalização  
juridicamente mediada, no qual o preço expressão monetária do valor torna-se  
instrumento de redistribuição de mais-valor sob a aparência de neutralidade técnica e  
legitimidade institucional. Esse movimento, sustentado pela mediação estatal e  
financeira, exemplifica o modo pelo qual a forma jurídica do valor se autonomiza,  
ocultando as relações de exploração que a fundamentam e convertendo a política e o  
direito em operadores centrais da acumulação capitalista no campo aeroespacial.  
A análise do processo de equalização e do papel do direito permite  
compreender que a redistribuição do mais-valor no interior do capitalismo  
contemporâneo não se dá apenas como um mecanismo técnico de equilíbrio entre  
setores produtivos, mas como uma operação jurídica e política profundamente  
estruturada. O estado e o capital financeiro, articulados por meio da forma jurídica,  
transformam o direito em instrumento de legitimação da apropriação seletiva do mais-  
valor, assegurando a reprodução das condições de acumulação sob a aparência de  
neutralidade normativa. Essa dinâmica abre caminho para o próximo capítulo, no qual  
se examinará como o capital fictício ao converter expectativas futuras de valorização  
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em títulos negociáveis depende da forma jurídica como elemento de garantia e  
estabilização dessa redistribuição. Será demonstrado que, no capitalismo  
financeirizado, o direito não apenas regula as relações entre capitais, mas constitui o  
próprio terreno de sustentação da ficção de valor, operando como mediação  
indispensável para a continuidade da acumulação ampliada e para a manutenção da  
hegemonia do capital portador de juros.  
2.7. Capital fictício e a forma jurídica como garantia da redistribuição  
A dinâmica anteriormente exposta evidencia que o processo de redistribuição  
do mais-valor sob a forma de equalização politicamente dirigida tem no estado e no  
direito mediadores fundamentais. Essa relação alcança seu ponto mais elaborado  
quando se observa que os contratos governamentais não apenas asseguram a  
continuidade material da acumulação, mas também funcionam como garantias jurídicas  
para a valorização financeira dos capitais privados. O caso do setor aeroespacial é  
paradigmático nesse sentido: os contratos firmados entre agências estatais e empresas  
privadas cumprem papel decisivo na estruturação do capital fictício, pois conferem  
respaldo jurídico a fluxos de valorização que não derivam diretamente da produção de  
mercadorias, mas de expectativas institucionalizadas de lucro futuro.  
No caso da SpaceX, por exemplo, o contrato firmado em 2008 com a Nasa, no  
valor de aproximadamente 1,6 bilhão de dólares, foi determinante para evitar a  
insolvência da empresa e assegurar sua inserção definitiva no mercado aeroespacial.  
Em 2014, com o Commercial Crew Program, novos aportes públicos estimados em  
cerca de 2,6 bilhões de dólares consolidaram sua posição como principal parceira  
estatal nos programas de transporte espacial tripulado (NASA, [s.d.]). Mais  
recentemente, a nova Força Espacial dos Estados Unidos celebrou contratos que  
totalizam cerca de 22 bilhões de dólares, dos quais 13,5 bilhões foram distribuídos  
entre SpaceX, United Launch Alliance (ULA) e Blue Origin, para missões previstas entre  
2027 e 2032 (WALL, 2025). Esses contratos não apenas garantem receita estável,  
mas, sobretudo, conferem credibilidade financeira e lastro jurídico às expectativas de  
valorização, convertendo a relação contratual em um título de confiança pública que  
sustenta a capitalização privada.  
Não se trata, portanto, de simples negociações comerciais, mas de operações  
jurídico-políticas de redistribuição do mais-valor, nas quais o capital portador de juros  
atua como mediador entre o estado, o sistema financeiro e as empresas privadas. A  
emissão de títulos de dívida pública, os programas de financiamento e as políticas de  
crédito criam liquidez que é canalizada diretamente ao setor aeroespacial seja por  
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A exploração aeroespacial como fronteira de valorização do capital portador de juros  
meio de contratos de prestação de serviços, seja por incentivos fiscais e fundos de  
investimento público. Esse circuito financeiro revela que a acumulação do setor não  
depende da produção direta de mais valor, mas da formalização jurídica de direitos  
futuros de valorização. É por meio dessa forma jurídica expressão concentrada da  
propriedade privada que se garante a transformação de promessas em ativos  
negociáveis.  
A partir das lições de Marx no Livro III de O capital (2017), compreende-se que  
o capital portador de juros constitui uma forma derivada do capital industrial: ele se  
autonomiza quando o capitalista empresta dinheiro sob a promessa de retorno futuro,  
apropriando-se de parte da mais-valia produzida na esfera produtiva. O capital fictício,  
contudo, dá um passo além dessa autonomização: ele não representa capital  
efetivamente emprestado para aplicação produtiva, mas a titularização de expectativas  
de rendimento, que passam a circular autonomamente nos mercados financeiros.  
Assim, as ações, títulos e contratos adquirem cotação e são negociados como se  
representassem valor real, quando, na verdade, correspondem a direitos jurídicos  
sobre rendimentos futuros ainda não produzidos.  
É precisamente nesse ponto que a forma jurídica desempenha papel  
estruturante. As cláusulas contratuais analisadas nos casos do setor aeroespacial que  
estabelecem milestones técnicos, prazos, direitos de recompra, exclusividade sobre  
patentes futuras e participação em receitas ainda não realizadas materializam o  
caráter fictício da valorização. O capital investido não possui garantia de retorno  
produtivo, mas encontra amparo jurídico suficiente para ser titularizado, negociado e  
redistribuído, como se fosse um ativo material. Marx (2017), trouxe lições elementares  
para a compreensão desse fenômeno.  
Na medida em que a acumulação desses títulos expressa a acumulação  
de ferrovias, minas, navios a vapor etc., ela representa a ampliação do  
processo real de reprodução, do mesmo modo que, por exemplo, a  
ampliação de uma lista de impostos sobre a propriedade imobiliária  
representa a expansão dessa propriedade. Porém, como duplicatas  
que, em si mesmas, podem ser negociadas como mercadorias e, por  
isso, circulam como valores-capitais, elas são ilusórias, e seu montante  
de valor pode diminuir ou aumentar com absoluta independência do  
movimento de valor do capital real, sobre o qual são títulos. Seu  
montante de valor, isto é, sua cotação na Bolsa, tende a subir com a  
queda da taxa de juros, na medida em que esta, independentemente  
dos movimentos peculiares do capital monetário, é simples  
consequência da queda tendencial da taxa de lucro, de modo que essa  
riqueza imaginária, de acordo com a expressão de valor de cada uma  
das alíquotas de determinado valor nominal originário, só por essa  
razão se expande no curso do desenvolvimento da produção  
capitalista. (MARX, 2017, p. 567)  
Como observam Rossi e Paludeto (2020, p. 2), o capital fictício corresponde ao  
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“excesso ou diferença de valor entre a ação e o capital materializado em meios de  
produção e força de trabalho”, ou seja, à representação de um valor que não existe  
senão como expectativa juridicamente reconhecida.  
Esse mecanismo permite o adiantamento de fluxos futuros de valor para o  
presente, criando múltiplas camadas de valorização dissociadas da produção efetiva,  
mas juridicamente asseguradas e financeiramente operacionalizáveis. O direito, nesse  
contexto, não apenas confere legalidade à especulação, mas também atua como  
mecanismo de validação contábil e institucional: contratos e títulos tornam-se base  
para balanços empresariais, avaliações de risco e auditorias, sendo reconhecidos pelo  
próprio estado como ativos legítimos. Desse modo, a forma jurídica converte-se na  
infraestrutura simbólica e normativa que sustenta a circulação do capital fictício,  
transformando promessas de rentabilidade em riqueza reconhecida.  
Tal dinâmica demonstra que o capital fictício é um desdobramento necessário  
do processo de equalização politicamente dirigida anteriormente analisado. O estado,  
ao garantir contratos de longo prazo, prazos de execução e estabilidade orçamentária,  
atua como organizador jurídico da confiança, assegurando que o fluxo financeiro  
mantenha continuidade mesmo diante da ausência de produção imediata de valor.  
Assim, a acumulação no setor aeroespacial expressa uma dupla dependência: de um  
lado, a dependência estrutural do estado como fiador jurídico e financeiro; de outro, a  
dependência da forma jurídica como mediadora da redistribuição de mais-valor entre  
as frações do capital.  
É precisamente essa autonomia crescente da forma jurídica que revela o grau  
de descolamento entre valor e produção no capitalismo contemporâneo. Como destaca  
Grespan (2019, pp. 81-2):  
Vimos que todos esses processos indicam o gradual descolamento da  
propriedade privada, como princípio distributivo do mais-valor, em  
relação ao trabalho criador do mais-valor. É que, quando posta na  
base do capital industrial predominantemente no mundo moderno, a  
propriedade privada se generaliza e se impõe socialmente como modo  
de exclusão que expropria os meios de trabalho do trabalhador. Por  
isso, mesmo presente em modos de produção antigos, em que houver  
comércio, a propriedade privada só passa a ser determinante ao  
fundar a exclusão que institui o capital industrial e o trabalho  
assalariado como opostos. Se antes ela era só o pressuposto da  
circulação de mercadorias, agora a propriedade privada tem a ver com  
o despojamento dos trabalhadores, fundando daí, o sistema de  
exploração da força de trabalho e de criação do excedente econômico.  
A reflexão de Grespan permite compreender que o fundamento jurídico da  
propriedade privada, ao se autonomizar da produção, torna-se o próprio princípio de  
redistribuição do mais valor no capitalismo financeirizado. No setor aeroespacial, essa  
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lógica manifesta-se de forma exemplar: o direito assegura juridicamente a apropriação  
de parcelas do mais valor socialmente produzido por empresas que não  
necessariamente participam do processo produtivo, mas que se legitimam como  
detentoras de contratos, patentes e títulos derivados. A forma jurídica, nesse sentido,  
não é mero reflexo da economia, mas instrumento ativo de redistribuição seletiva, ao  
garantir que as expectativas de valorização possam ser reconhecidas, transferidas e  
capitalizadas.  
Desse modo, o capital fictício depende inteiramente da confiança jurídica sem  
contrato, não há especulação possível. A juridicidade torna-se a condição de existência  
do valor fictício, assegurando que fluxos futuros possam ser convertidos em capital  
presente. Essa é a essência da redistribuição mediada pelo direito: ao legitimar a  
antecipação de valor futuro, o ordenamento jurídico perpetua a ficção da valorização  
autônoma e, com isso, consolida a hegemonia do capital portador de juros sobre a  
totalidade da reprodução social.  
A análise do capital fictício e da forma jurídica como garantias da redistribuição  
evidencia que o estado não é uma instância exterior ou meramente reguladora das  
relações de produção, mas parte constitutiva da própria engrenagem de valorização  
do capital. Através dos contratos, da política fiscal, das emissões de dívida e da  
normatividade jurídica que as sustenta, o estado atua como garantidor da confiança e  
fiador da circulação do valor fictício, convertendo expectativas em ativos, promessas  
em capital e despesas públicas em rentabilidade privada. Essa estrutura revela que a  
acumulação no capitalismo contemporâneo depende de uma complexa arquitetura  
jurídico-política em que a forma estatal é chamada a assegurar a continuidade da  
valorização mesmo diante do esgotamento da produção material de valor. No caso do  
setor aeroespacial, o estado não apenas contrata e financia: ele redistribui o mais-valor  
socialmente produzido entre as frações do capital monopolista, legitimando  
juridicamente a apropriação privada do fundo público sob o pretexto da inovação  
tecnológica e da segurança nacional. Assim, o próximo capítulo analisará o estado  
como engrenagem de redistribuição, destacando como sua atuação jurídica, fiscal e  
institucional se converte em mediação necessária para a reprodução ampliada do  
capital, consolidando o vínculo estrutural entre direito, finanças e poder político.  
2.8. O estado como engrenagem de redistribuição  
A dinâmica anteriormente analisada permite compreender que a existência e a  
expansão do setor aeroespacial contemporâneo dependem estruturalmente da ação  
estatal. A forma jurídica e os contratos públicos, elementos centrais do processo de  
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valorização fictícia, só adquirem eficácia e estabilidade porque o estado atua como  
mediador e garantidor da redistribuição do mais-valor. É ele quem cria as condições  
institucionais que tornam possível a autonomização do capital em relação à produção  
material, oferecendo o suporte jurídico e financeiro indispensável para a circulação de  
títulos, ações, patentes e contratos baseados em expectativas futuras.  
O papel do estado é, portanto, insubstituível. Sem sua intervenção direta por  
meio de contratos públicos, incentivos fiscais, compras antecipadas, garantias  
financeiras e, sobretudo, da produção de formas jurídicas que assegurem  
previsibilidade e segurança aos investidores , o setor aeroespacial, tal como se  
consolidou nas últimas décadas, não existiria. O estado funciona como fiador da  
confiança e gestor do risco: ao mesmo tempo em que transfere recursos públicos para  
a esfera privada, assegura a legitimidade desse movimento através de instrumentos  
jurídicos que revestem a redistribuição do mais-valor de uma aparência de  
neutralidade técnica e racionalidade administrativa, que, até certo ponto, é, de fato,  
impessoal. Assim, o aparato estatal não apenas regula o capital, mas participa  
ativamente da produção e reprodução de suas formas, como um terceiro agente  
impessoal, porém atuando nos interesses da acumulação capitalista, que são  
expressões pessoais dos interesses da burguesia.  
O caso norte-americano evidencia de modo exemplar essa dinâmica. Programas  
públicos como o Commercial Lunar Payload Services (CLPS) e o Near Space Network  
da Nasa garantem não apenas contratos de valor elevado, mas uma estrutura de  
previsibilidade que ancora o fluxo financeiro de empresas privadas. Entre 2019 e  
2024, o CLPS previu um teto de 2,6 bilhões de dólares em contratos até 2028,  
enquanto a Near Space Network atingiu valor potencial de 4,82 bilhões (NASA, 2024;  
NASA, 2025). Mesmo empresas que acumulam prejuízos expressivos, como a Intuitive  
Machines que registrou perdas de 37,9 milhões de dólares em 2021, 5,5 milhões  
em 2022 e 56,2 milhões em 2023 e a Redwire Corporation, com resultados  
negativos de 61,5 milhões (2021), 130,6 milhões (2022) e 27,3 milhões (2023)  
(INTUITIVE MACHINES, 2023; 2024; REDWIRE CORPORATION, 2022; 2024), mantêm  
elevados níveis de capitalização e confiança do mercado em razão da solidez  
contratual com o estado. A Redwire, por exemplo, encerrou 2023 com carteira  
contratada de 372,8 milhões de dólares; já a Intuitive Machines, somente com o CLPS,  
recebeu ordens de serviço de 77 milhões (2019) e 77,5 milhões (2021) (NASA, 2019;  
2021).  
Esses dados demonstram que o estado norte-americano não é um mero  
comprador de serviços espaciais, mas o núcleo organizador da redistribuição de valor  
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entre as frações do capital. Ao converter contratos públicos em garantias financeiras,  
o estado transforma o fundo público em ativo rentável, ancorando fluxos de capital  
fictício que sustentam avaliações de mercado e ciclos de investimento. A forma jurídica  
dos contratos e das parcerias público-privadas é o mecanismo que permite essa  
conversão, pois confere segurança jurídica às promessas de valorização,  
transformando expectativas futuras em direitos presentes, reconhecíveis e negociáveis.  
Esse processo revela que o setor aeroespacial, longe de ser uma exceção ou  
uma extravagância tecnológica, constitui uma das expressões mais refinadas do  
capitalismo financeirizado. Nele, a produção direta de bens é substituída pela  
administração jurídica do valor, e o crescimento decorre não do aumento da  
produtividade, mas da capacidade institucional de garantir fluxos de valorização. O  
capital, já incapaz de expandir-se mediante a simples ampliação da produção material,  
busca reter valor, antecipar ganhos e destruir excedentes, tudo sob formas contratuais  
e normativas que lhe confiram aparência de racionalidade e legitimidade social.  
Como já se viu até aqui ao longo do texto, o que circula não é valor efetivamente  
produzido, mas a expectativa juridicamente assegurada de sua futura realização. No  
caso do setor aeroespacial, essa expectativa é convertida em ativo negociável por meio  
da autoridade do estado, que produz as formas jurídicas e orçamentárias capazes de  
sustentar a credibilidade desses fluxos. Trata-se, portanto, de um capital garantido  
juridicamente, ainda que desvinculado da produção e frequentemente improdutivo do  
ponto de vista social.  
Como assinalam François Chesnais (1995)33 e István Mészáros (2011)34, o  
estado moderno não desaparece com a financeirização; ao contrário, ele assume papel  
cada vez mais ativo na reprodução ampliada do capital, convertendo sua estrutura  
normativa e fiscal em instrumento de transferência permanente de valor. No caso  
estadunidense, o complexo industrial-militar e o setor aeroespacial são exemplos  
privilegiados dessa engrenagem: áreas em que o estado atua simultaneamente como  
contratante, financiador, garantidor jurídico e propagador de confiança no mercado,  
assegurando a circulação do capital portador de juros e o prolongamento da  
33 “[…] despesas de pesquisa e desenvolvimento-militar, que incluem, evidentemente, a indústria nuclear  
de objetivos militares e uma parte considerabilíssima das pesquisas espaciais, constituem de longe o  
item mais importante da P&D financiada pelo estado nos grandes países da OCDE.” (CHESNAIS, 1995,  
p. 137)  
34  
“O ‘capitalismo avançado’ também inventa um tipo de produção – centrado em torno do complexo  
industrial/militar em relação ao qual o tradicional desafio do consumo (utilidade) só se aplica, se tanto,  
marginalmente. Ao mesmo tempo em que consomem destrutivamente, na sua produção, imensos  
recursos materiais e humanos, os produtos resultantes desse processo podem juntar-se às montanhas  
de mercadorias ‘consumidas’ já no momento em que atravessam os portões das fábricas.” (MÉSZAROS,  
2011, p. 640)  
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acumulação.  
Assim, o estado cumpre uma função dupla e dialética: de um lado, atua como  
instrumento político-jurídico de estabilização do capital, oferecendo previsibilidade e  
proteção contra as oscilações da concorrência; de outro, serve como mediador da  
redistribuição do mais-valor, ao canalizar o excedente socialmente produzido para  
setores improdutivos, que operam com base em contratos e ativos fictícios. A forma  
jurídica é o elo que une essas duas dimensões, pois transforma a apropriação seletiva  
de recursos públicos em uma operação formalmente legítima e socialmente aceitável.  
Portanto, o estado aparece não como um ator externo à economia, mas como  
uma forma necessária da reprodução do capital, cuja função é garantir a circulação e  
a valorização do mais-valor sob novas condições históricas. Ao sustentar juridicamente  
o capital fictício, o estado não apenas preserva a coesão do sistema, mas também  
institucionaliza a assimetria de poder entre as frações do capital. Sua atuação é a  
engrenagem que mantém em funcionamento o circuito da redistribuição, assegurando  
que o valor socialmente produzido seja continuamente reconduzido ao circuito do  
lucro privado.  
Em síntese, o estado é o mediador que transforma a fragilidade da acumulação  
contemporânea em estabilidade aparente. Ele institui juridicamente a ficção da  
valorização contínua, converte dívida em ativo, expectativa em propriedade e gasto  
público em lucro. Nesse movimento, o direito cumpre a função de tornar o irracional –  
a acumulação sem produção em algo racionalmente administrável, dando à crise  
estrutural do capital uma aparência de normalidade. O estado, enquanto engrenagem  
de redistribuição, é, portanto, o ponto de convergência entre o capital fictício e a forma  
jurídica: o dispositivo que garante, simultaneamente, a permanência da valorização e  
a ilusão de sua legitimidade.  
Considerações finais  
A análise desenvolvida ao longo deste artigo demonstrou que a exploração  
aeroespacial, situada, em grande medida, no interior do departamento III da economia  
capitalista, constitui uma das expressões mais avançadas da atual fase de valorização  
do capital. Diferentemente dos departamentos I e II voltados à reprodução do capital  
por meio da produção de bens de produção e de consumo , o departamento III opera  
sob uma lógica distinta: sua função estrutural é redistribuir e absorver o mais valor  
produzido socialmente, sustentando a acumulação por aparatos jurídico-financeiros  
com a mediação do estatal. No caso do setor aeroespacial, essa função assume uma  
forma particularmente complexa, caracterizada pela destruição controlada de valores  
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A exploração aeroespacial como fronteira de valorização do capital portador de juros  
e pela conversão do não-retorno à esfera social em elemento funcional à continuidade  
da acumulação capitalista.  
A investigação expôs que o processo de equalização do mais-valor, conforme  
delineado por Marx no Livro III de O capital, não se realiza por meio dos mecanismos  
espontâneos de mercado. Ele é politicamente dirigido e juridicamente garantido, por  
meio de mecanismos que se distanciam cada vez mais da produção real de valor,  
expressando a incapacidade do capital de expandir-se unicamente pela via da  
produção material. Nesse novo cenário, a equalização ocorre com a necessária  
intervenção da financeirização e da criação de mercados artificiais de valorização,  
sustentados pelo estado e pelo direito. O setor aeroespacial em articulação direta  
com o complexo industrial-militar exemplifica essa transição, convertendo  
expectativas futuras em ativos presentes e institucionalizando a valorização fictícia sob  
a aparência de inovação tecnológica e racionalidade científica, amalgamando a  
destruição de valores do departamento III à tendência de acúmulo de capital fictício.  
O capital fictício, longe de representar uma anomalia do sistema, é parte  
constitutiva de sua reprodução contemporânea. Por meio de contratos públicos, títulos  
de dívida e instrumentos financeiros derivados de promessas de retorno, o capital  
antecipa lucros e transforma expectativas em valor negociável. O estado desempenha  
papel central nesse processo: garante previsibilidade, socializa riscos e assegura  
juridicamente a continuidade da valorização em setores que, isoladamente, seriam  
insolventes. A ação estatal converte o fundo público em ativo rentável, transferindo  
continuamente o mais-valor produzido por toda a sociedade para um núcleo restrito  
de corporações tecnológicas e financeiras. Assim, o estado não apenas regula, mas  
produz e reproduz as formas de valorização, conferindo-lhes legitimidade e  
estabilidade institucional.  
A forma jurídica aparece, nesse contexto, como o elemento que dá coesão e  
aparência de racionalidade à dinâmica de destruição e especulação. É o direito que  
possibilita a conversão da incerteza em propriedade, da expectativa em título e da  
promessa em ativo financeiro. Ao instituir contratos, garantias e marcos normativos –  
como os Artemis Accords e os grandes programas da Nasa , a forma jurídica cria a  
ilusão de estabilidade e previsibilidade em um campo marcado pela incerteza e pela  
improdutividade sob o aspecto reprodutivo da acumulação. Assim, o direito não  
apenas reflete a realidade econômica, mas a constitui: ele traduz a irracionalidade da  
valorização sem produção em norma jurídica e, desse modo, legitima a redistribuição  
assimétrica do valor sob a aparência de legalidade e neutralidade técnica.  
A chamada “colonização espacial” deve, portanto, ser compreendida como uma  
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ideologia funcional à reprodução do capital. Sob o discurso do progresso científico e  
da exploração interestelar, o capital reconstrói suas próprias fronteiras de valorização  
em torno de promessas cósmicas, convertendo o espaço exterior em um novo campo  
de acumulação financeira. A atual corrida espacial não é, infelizmente, expressão de  
emancipação tecnológica, mas de uma crise de valorização prolongada, na qual o  
capital depende cada vez mais da especulação, da antecipação e da destruição  
controlada. O setor aeroespacial, ao lado do complexo industrial-militar, transforma o  
orçamento público e a técnica científica em mecanismos de sustentação de uma  
acumulação que já não se baseia na produção de valor, mas na sua representação  
jurídica e contábil.  
Desse modo, o estado se consolida como engrenagem da redistribuição. Sua  
atuação simultaneamente legislativa, fiscal e contratual é o elo entre o capital  
fictício e a forma jurídica, permitindo que a valorização aparente se mantenha mesmo  
diante da estagnação material da economia. O estado garante a confiança dos  
investidores, assegura a liquidez dos ativos e preserva a coesão sistêmica mediante a  
transformação do fundo público em lucro privado. A legalidade, nesse processo,  
encobre a violência estrutural da acumulação, revestindo de racionalidade o que, em  
essência, é uma política de esgotamento do comum.  
Em síntese, a exploração aeroespacial como fronteira de valorização do capital  
portador de juros representa a forma histórica pela qual o capitalismo contemporâneo  
prolonga sua existência. Inscrita no departamento III, ela expressa a tentativa do  
sistema de reproduzir-se por meio do capital fictício, mediado pelo direito, assegurado  
pelo estado. Trata-se, contudo, de um fenômeno ainda em curso, cujos  
desdobramentos permanecem abertos no tempo histórico. O desafio teórico consiste  
em compreender que essa nova fronteira não é promessa de futuro, mas  
prolongamento de uma crise estrutural que o capital tenta ocultar sob a ficção jurídica  
da valorização. Longe de simbolizar uma utopia científica, a exploração espacial  
representa a mais sofisticada forma jurídica de destruição planejada, expressão da  
permanência de um sistema que, incapaz de superar suas próprias contradições,  
transforma o próprio limite o cosmos em mercadoria.  
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Como citar:  
SANTOS, Rafael Silva dos; FURTADO, Mateus Lima. A exploração aeroespacial como  
fronteira de valorização do capital portador de juros: especulação e formas jurídicas.  
Verinotio, Rio das Ostras, v. 30, n. 2, pp. 342-384, 2025.  
Verinotio  
384 |  
ISSN 1981 - 061X, v. 30, n. 2, pp. 342-384 jul.-dez., 2025  
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