Maurício Tragtenberg
depois, sem poder beneficiar-se do movimento da expansão europeia, 30 anos antes,
para encontrar a resistência afro-asiática à sua presença em terra árabe.
Os sionistas, por ocasião do Congresso da Basiléia de 1897, não conheciam a
Palestina, onde jamais puseram os pés. Só conheciam uma realidade: a Europa, com
seus “pogroms”, discriminações e terríveis presságios de futuras tragédias. Sabiam
vagamente que a Palestina possuía alguns habitantes, mas isso na época não constituía
um centro de preocupações.
Herzl era um europeu, e suas ideias, respostas a situações europeias. Os
sionistas contemplavam o passado do povo judeu, e não a paisagem da Palestina.
Sion e a menor colina de Jerusalém tornam-se símbolo religioso, local da palavra
divina. A estrela de David é o símbolo do novo movimento. O novo estado escolhe
a “menorah”, o candelabro do templo, como símbolo agregado. Nesse universo
simbólico não há espaço para o período não hebraico da história da Palestina, muito
menos para a herança gloriosa de outras nações semíticas irmãs.
Herzl procurava o apoio das grandes potências para seus projetos, daí dirigir-
se ao sultão da Turquia: “Se Sua Majestade, o sultão, nos desse a Palestina, poderíamos
comprometer-nos a estabilizar completamente as finanças da Turquia. Para a Europa,
constituiríamos ali um bastião contra a Ásia, seríamos a sentinela avançada da
civilização contra a barbárie. Manteríamos, como estado neutro, relações constantes
com toda a Europa, que deveria garantir nossa existência.” (HERZL, 1926, p. 95)
Eis o sionismo colocado no quadro das políticas imperialistas europeias. O texto
aprovado significava, no pensamento dos fundadores, visar à autonomia da Palestina
judia, sob a soberania do sultão, com a garantia das grandes potências.
Outro traço da política de Herzl era especular com o antissemitismo e com o
desejo de se desembaraçar da população judia, para promover a emigração à
Palestina. Assim, em 1903, Herzl obteve [aval] do ministro tsarista Plehve, organizador
de “pogroms”, iniciando uma tradição política em que a convergência do programa
sionista com o dos antissemitas, abertamente reconhecida por ele, tornava-se quase
fatal. Plehve promete ao sionismo “apoio material e moral, na medida em que certas
de suas medidas práticas sirvam para diminuir a população judia na Rússia”, conforme
relata Bernfeld (1920, pp. 399ss).
Isso leva Herzl a dizer que “até hoje, meu partidário mais ardente é o
antissemita de Petersburgo (hoje Leningrado) Ivan V. Simonyi”, conforme relata A.
Chouraqui (HERZL, 1926, p. 141). Witte, ministro das Finanças do tsar, explica a Herzl
que, “se fosse possível afogar no Mar Negro seis ou sete milhões de judeus, ficaria
perfeitamente satisfeito com isso; mas, como tal não é possível, nesse caso, devemos
Verinotio
434 |
ISSN 1981 - 061X, v. 30 n. 2, pp. 432-443 – jul.-dez., 2025
nova fase