DEBATES  
DOI 10.36638/1981-061X.2025.30.2.785  
Dialética do sionismo1  
Maurício Tragtenberg*  
O sionismo aparece como um fato “revolucionário”: leva pessoas a deixarem  
seu país para viver uma vida radicalmente diversa, renunciando à sua origem social, à  
sua língua, à sua cultura, às suas relações sentimentais, rompendo brutalmente com  
seu passado, para reconstruir sua vida. Os únicos precedentes paralelos são as  
Cruzadas e os emigrados que fundam os Estados Unidos. Nos futuros estados-nações  
não estava previsto um lugar para os judeus. Eles eram “diferentes”. Mais e mais[, ]  
largar tudo e construir um “lar nacional” animava os judeus. Todos esses movimentos  
nacionais tinham uma matriz comum: voltados ao passado, cada povo cada povo  
cuidava de inventar um passado nacional glorioso, pretendendo marcar por sua  
existência o retorno a uma “idade de ouro”. Era natural que os primeiros sionistas, na  
lógica dos movimentos nacionalistas da época, [tivessem] a tendência a ver num  
território nacional a solução do problema judeu e visualizar na sua vida num novo  
estado um prolongamento da história judaica, após curta interrupção de 2.000 anos.  
Os velhos reinos judeus criaram a primeira comunidade, centrada no Primeiro Templo.  
Após o retorno do exílio babilônio, a segunda comunidade judaica instituiu-se em  
torno do Segundo Templo. Era chegado o momento de criar uma Terceira  
Comunidade, um estado judeu moderno, um verdadeiro Terceiro Templo. O  
pensamento político sionista torna-se inseparável de uma mística religiosa. Embora  
Herzl, o autor de O estado judeu, não fosse movido por uma inspiração messiânica,  
com o contato [com] as massas judaicas da Europa Central, convence-se de que essa  
mística era essencial ao sionismo.  
Outro elemento integra o desenvolvimento do nacionalismo judaico: o ideal  
socialista. Para os jovens judeus dos guetos da Rússia e da Polônia, os evangelhos  
eram Marx, Tolstói. O trabalho manual exerce uma atração mágica sobre esses jovens  
que assistem seus parentes envelhecerem como comerciantes ou usurários. Todas  
essas aspirações resumem-se numa só: partir, não ser mais uma minoria sem defesa,  
1
[Publicado originalmente na revista Nova Escrita Ensaio, São Paulo, Ensaio, ano IV, n. 10, pp. 105-  
13, 1982. Revisado por Vânia Noeli Ferreira de Assunção. NE]  
*
[1929-1998]. Cientista político e professor da Escola de Administração de Empresas da Fundação  
Getúlio Vargas (FGV), professor da PUC/SP onde lecionou por vários anos e da Faculdade de Educação  
da UNICAMP.  
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à mercê da primeira tropa de cossacos que encontram no judeu o “bode expiatório”  
da incapacidade do tsarismo em atender aos reclamos populares.  
Deixar essa miserável existência que leva ao autodesprezo do corpo e do  
espírito. Trabalhar a terra e se libertar pelo contato místico com ela, nossa mãe. Criar  
uma sociedade sem senhores e escravos, onde todos serão iguais. Realizar isso no  
“seu” país, marchar nas esteiras dos antigos heróis de seu povo, ressuscitar uma  
comunidade judia, viver nos espaços dos relatos bíblicos, tal era o sonho. Esse sonho  
maravilhoso, exaltante, conduziu inúmeros jovens judeus da Europa Central a uma  
província turca denominada Palestina.  
Esse movimento de libertação, puro e corajoso, se propunha a criar uma  
sociedade harmoniosa onde a única luta a ser travada era a luta contra si mesmo; no  
meio de tanto entusiasmo um fato perdeu-se de vista: a Palestina já era um território  
habitado.  
O sionismo político inicia-se com a obra de T. Herzl O estado judeu, que trata  
da “habitação dos trabalhadores”, da “aquisição de terras”, dos “operários não  
qualificados”; tudo é previsto, inclusive as cores da nova bandeira nacional.  
Em toda a obra de Herzl não há uma só menção sobre a existência dos árabes  
palestinos. Explica-se quando Herzl sonha com o “estado judeu” pensando em localizá-  
lo em qualquer lugar, Argentina, Canadá ou Uganda. Somente quando redige o último  
capítulo de seu livro verifica que só a Palestina como espaço do futuro “estado judeu”  
seria capaz de mobilizar emocionalmente as massas judias da Europa Central. Para ele,  
o “estado judeu” na Palestina se constituiria num “ponto firme da civilização contra a  
barbárie”, num “posto avançado da Europa na Ásia”.  
Chaim Weizmann que se tornou primeiro presidente de Israel , no Congresso  
Sionista de 1931, admite que Herzl não ligava necessariamente o sionismo a um  
estado judeu, nem [apontava] a Palestina como sede.  
Weizmann nota que, no Primeiro Congresso Sionista em 1897, quando Herzl  
admite a ideia de a ressurreição do povo judeu dar-se na Palestina, a fórmula “estado  
judeu” desaparece de suas declarações. O programa sionista adotado pelo Congresso  
preocupa-se em “assegurar uma existência legal aos judeus na Palestina”.  
Era a época do apogeu do imperialismo, aureolado de glória e idealismo,  
quando os poemas de Kipling cantam o “fardo” do homem branco em territórios  
inóspitos. Cecil Rhodes era convertido em herói. Não se relacionava o ressurgimento  
da Ásia ou África com o surgimento dos nacionalismos europeus.  
O sionismo no seu início não é somente o produto dos nacionalismos europeus,  
faz parte da última vaga da expansão imperialista. O sionismo apareceu cem anos  
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depois, sem poder beneficiar-se do movimento da expansão europeia, 30 anos antes,  
para encontrar a resistência afro-asiática à sua presença em terra árabe.  
Os sionistas, por ocasião do Congresso da Basiléia de 1897, não conheciam a  
Palestina, onde jamais puseram os pés. Só conheciam uma realidade: a Europa, com  
seus “pogroms”, discriminações e terríveis presságios de futuras tragédias. Sabiam  
vagamente que a Palestina possuía alguns habitantes, mas isso na época não constituía  
um centro de preocupações.  
Herzl era um europeu, e suas ideias, respostas a situações europeias. Os  
sionistas contemplavam o passado do povo judeu, e não a paisagem da Palestina.  
Sion e a menor colina de Jerusalém tornam-se símbolo religioso, local da palavra  
divina. A estrela de David é o símbolo do novo movimento. O novo estado escolhe  
a “menorah”, o candelabro do templo, como símbolo agregado. Nesse universo  
simbólico não há espaço para o período não hebraico da história da Palestina, muito  
menos para a herança gloriosa de outras nações semíticas irmãs.  
Herzl procurava o apoio das grandes potências para seus projetos, daí dirigir-  
se ao sultão da Turquia: “Se Sua Majestade, o sultão, nos desse a Palestina, poderíamos  
comprometer-nos a estabilizar completamente as finanças da Turquia. Para a Europa,  
constituiríamos ali um bastião contra a Ásia, seríamos a sentinela avançada da  
civilização contra a barbárie. Manteríamos, como estado neutro, relações constantes  
com toda a Europa, que deveria garantir nossa existência.” (HERZL, 1926, p. 95)  
Eis o sionismo colocado no quadro das políticas imperialistas europeias. O texto  
aprovado significava, no pensamento dos fundadores, visar à autonomia da Palestina  
judia, sob a soberania do sultão, com a garantia das grandes potências.  
Outro traço da política de Herzl era especular com o antissemitismo e com o  
desejo de se desembaraçar da população judia, para promover a emigração à  
Palestina. Assim, em 1903, Herzl obteve [aval] do ministro tsarista Plehve, organizador  
de “pogroms”, iniciando uma tradição política em que a convergência do programa  
sionista com o dos antissemitas, abertamente reconhecida por ele, tornava-se quase  
fatal. Plehve promete ao sionismo “apoio material e moral, na medida em que certas  
de suas medidas práticas sirvam para diminuir a população judia na Rússia”, conforme  
relata Bernfeld (1920, pp. 399ss).  
Isso leva Herzl a dizer que “até hoje, meu partidário mais ardente é o  
antissemita de Petersburgo (hoje Leningrado) Ivan V. Simonyi”, conforme relata A.  
Chouraqui (HERZL, 1926, p. 141). Witte, ministro das Finanças do tsar, explica a Herzl  
que, “se fosse possível afogar no Mar Negro seis ou sete milhões de judeus, ficaria  
perfeitamente satisfeito com isso; mas, como tal não é possível, nesse caso, devemos  
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deixá-los viver”. Quando Herzl observa que espera do governo russo certos estímulos,  
ele responde: “Mas damos aos judeus estímulos para emigrarem como, por exemplo,  
pontapés.” (HERZL, 1926, pp. 301ss). Herzl reconhece: “Objetar-me-ão razoavelmente  
que faço o jogo dos antissemitas quando proclamamos que constituímos um povo, um  
povo único.” (HERZL, 1926, p. 259)  
A realização do estado sionista liga-se a um ato político inglês, a Declaração  
Balfour, de 2/11/1917. Por que motivos a Inglaterra emitiu a Declaração Balfour?  
Para alguns antissemitas, ela o fez para compensar os pretensos esforços dos judeus  
norte-americanos para arrastarem os Estados Unidos para a guerra ou pelas vultosas  
compras de títulos de guerra pelos judeus ingleses, ou pela teoria romântica, segundo  
a qual a “declaração” se deu como resposta à invenção de um poderoso explosivo por  
Heinz Weizmann utilizado pela Inglaterra. [O que mostra] como é inaceitável a tese de  
Chaim Weizmann, segundo a qual isso se deu por obra da sedução exercida pelo  
grande retorno sionista no espírito dos ingleses impregnados pela Bíblia (como ele  
formula em WEIZMANN, 1950, p. 226).  
Sabia Weizmann que uma potência empenhada numa guerra de alcance mundial  
não se moveria por razões metafísicas para conferir aos sionistas um lar nacional  
judeu” na Palestina, daí escrever ele que, “ao apresentar-vos a vossa resolução,  
confiamos o nosso destino nacional e sionista ao Foreign Office e ao Gabinete de  
Guerra Imperial, esperançados em que o problema seria considerado à luz dos  
interesses imperiais defendidos pela ‘Entente’(WEIZMANN, 1950, p. 258).  
Os grandes motivos da Declaração Balfour foram outros. Foram os efeitos de  
propaganda esperados sobre os judeus dos impérios centrais e da Rússia, na  
esperança de colher benefícios na futura liquidação do Império Otomano. Os judeus  
da Alemanha (onde esteve instalada a sede da Organização Sionista até 1914) e da  
Áustria-Hungria tinham sido conquistados para o esforço de guerra pelo fato de se  
tratar de combater a Rússia tsarista, perseguidora dos judeus. No território russo  
conquistado, os alemães apresentavam-se como protetores dos judeus oprimidos,  
como libertadores do jugo moscovita. “Por demasiado tempo haveis sofrido o jugo de  
ferro moscovita”, declara, na sua proclamação aos judeus da Polônia, o Alto Comando  
dos Exércitos Alemão e Austro-Húngaro em agosto/setembro de 1914. É irônico,  
depois da experiência que se seguiu com o nazismo , ler esta violenta denúncia dos  
“pogroms” e do antissemitismo tsarista. Os partidos social-democrata alemão e austro-  
húngaro utilizavam também o álibi da luta contra o tsarismo como reacionário e  
antissemita para justificar seu apoio ao governo na guerra imperialista.  
Por outro lado, a Revolução Russa reforçava as tendências derrotistas na Rússia.  
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Atribuía-se aos judeus papel importante na Revolução Russa. Era fundamental dar-lhes  
motivos para apoiarem a causa aliada. Não constitui mera coincidência [o fato de] a  
Declaração Balfour surgir cinco dias antes de 7 de novembro (25 de outubro, no  
calendário juliano), em que os bolcheviques tomaram o poder. Um dos objetivos da  
Declaração era apoiar Kerensky. Pensava-se também na força dos judeus norte-  
americanos, pois os Estados Unidos juntaram-se aos Aliados, daí ser necessário obter  
um esforço máximo quando neles predominava a tendência ao pacifismo. Isso  
confirmado pela declaração de Lloyd George à Palestine Royal Commission em 1936:  
“Os dirigentes sionistas fizeram-nos a promessa firme de que, se os aliados se  
comprometessem a dar-lhes facilidades para o estabelecimento de um lar acional na  
Palestina, fariam o que estivesse ao seu alcance para mobilizar os sentimentos e o  
auxílio dos judeus à causa aliada através do mundo. Fizeram o melhor que podiam”,  
conforme G. Lencowski (1962, pp. 81ss). Era necessário antecipar-se aos sionistas  
alemães e austríacos que negociavam com os seus governos uma espécie de  
“Declaração Balfour”, conforme relata K. J. Herrmann (1965, pp. 303-20).  
Enquanto isso, as grandes potências manobravam junto a Hussein para uma  
revolta contra os turcos em troca de um grande reino árabe; no mesmo momento o  
acordo Sykes-Picot partilhava em 1916, na mesma região, as zonas de influência entre  
Inglaterra e França; essa utilizava suas relações com os libaneses para edificar a  
“Grande Síria” (incluindo a Palestina), não era mau dispor no Oriente Médio de uma  
população ligada à Inglaterra pelo reconhecimento e necessidade. Converter a  
Palestina em problema especial, atribuindo à Inglaterra uma responsabilidade  
particular, que era obter base sólida de reivindicação na partilha após a guerra.  
Weizmann insistiu no seu pedido à Inglaterra para que ela exercesse um  
protetorado sobre o futuro estado judaico (1950, p. 243). A vitória sobre o Império  
Otomano na Palestina e Síria permitiu a aplicação da “Declaração Balfour”.  
Segundo Weizmann, até 1918 a questão árabe estava em segundo plano e os  
sionistas a tinham negligenciado. Porém, a fase de realização do sionismo coincide  
com o surgimento do movimento nacionalista árabe. Ainda era possível uma aliança  
entre o sionismo e o movimento nacional árabe; o dirigente árabe mais importante  
oferecia na época aos sionistas um estado autônomo reunido à Síria sob sua coroa;  
30 anos depois o rei Abdullah, irmão de Faiçal, fazia o mesmo. Mas a direção do  
movimento sionista instalada na Palestina após 1918 não o aceitou. Nenhum de seus  
membros tinha a mais leve noção do que era o movimento nacionalista árabe, a união  
contra o imperialismo lhe parecia sem importância. Faiçal mostra-se favorável ao  
estabelecimento de uma comunidade judaica na Palestina sob sua coroa. No seu  
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universo tribal, a raça se constituía em fator importante, ele considerava os judeus  
membros da família semítica. Numa de suas “Mensagens”, ele desculpa-se por não  
poder comparecer a uma das assembleias da Organização Sionista por razões  
puramente circunstanciais, ajuntando que “tais manifestações são importantes para a  
compreensão entre duas nações unidas por tão antigos laços”. Em 1919 ele manifesta-  
se junto ao líder judeu norte-americano, Felix Frankfurter: “Sabemos que árabes e  
judeus são irmãos de raça. Faremos tudo que estiver ao nosso alcance para aceitarmos  
as propostas sionistas na Conferência de Paz e acolheremos de todo coração os judeus  
que se juntarem a nós. O movimento judeu não é um movimento imperialista, é um  
movimento nacional. Creio verdadeiramente que, para atingir seus objetivos, cada um  
de nós precisa do outro.” O acordo Faiçal-Weizmann previa a formação de um grande  
estado árabe apoiado pela Organização Sionista e o apoio árabe à formação de um  
estado palestino. Isso jamais foi realizado. Faiçal colocou como condição a aceitação  
de suas pretensões à Síria junto à Conferência de Paz; fazia o acordo depender da  
outorga da independência árabe, sem o que não valia. Os franceses invadem Damasco,  
depõem Faiçal, reprimem o nacionalismo sírio e palestino. Mas em 1920, na  
Conferência de San Remo, as teses sionistas são aceitas pelas grandes potências.  
A situação tem seu desfecho com o mandato conferido à Inglaterra, concedido  
pela Sociedade das Nações a 24 de julho de 1922, com a finalidade de criar um estado  
de coisas destinado ao estabelecimento de um lar nacional na Palestina aos judeus.  
Algumas conclusões parciais se impõem. A realização de um projeto sionista  
iniciou-se depois, graças a um ato político obtido da Grã-Bretanha pela pressão da  
Organização Sionista. Com isso, esperava a Inglaterra obter o apoio à sua política geral  
em relação aos judeus da Rússia e dos Estados Unidos, também em função de seus  
interesses no Oriente Médio após a decadência do Império Otomano. A Inglaterra  
conciliava o apoio ao projeto sionista com o apoio à dinastia hachemita. Os dirigentes  
sionistas ajudaram essa conciliação mantendo em hibernação a ideia de um estado  
judeu, contentando-se em reivindicar direito a emigração de judeus à Palestina. Razão  
pela qual os palestinos árabes podem legitimamente considerar que a implantação de  
um elemento estrangeiro novo (o europeu) lhes foi imposto por uma nação europeia,  
graças à vitória militar de um grupo de nações europeias contra um outro grupo a  
que aderiu o Império Otomano.  
A reivindicação da independência do estado de Israel ante a Inglaterra tem  
como base a existência, em 1943, de 539.000 judeus, ou seja, 31,5% da  
população total, quando em 1922 a proporção não atingia 11%. Essa imigração  
maciça só foi possível com o apoio inglês. Daí os dirigentes sionistas sob mandato  
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inglês reclamarem o reforço do corpo de polícia britânica e se oporem a qualquer  
organismo representativo que diminuísse, por pouco que fosse, a autoridade do alto  
comissário.  
Os mesmos acontecimentos que serviram de base para a instalação de um  
estado judaico serviram para desembaraçar os árabes do jugo turco. Porém, em vez  
do estado árabe unitário independente, eles assistiram à “balcanização” da região  
pelas potências ocidentais, dividida a região entre a França e a Inglaterra. Enquanto,  
porém, as organizações nacionalistas árabes tinham como base de suas reivindicações  
as massas locais, as organizações sionistas tinham contra elas a maioria do povo do  
país onde queriam estabelecer um estado soberano.  
A Inglaterra publica o Livro branco em 1939, onde rechaça a ideia de um  
estado judeu englobando toda a Palestina, ao mesmo tempo em que limita a imigração  
e a venda de terras a sionistas. O nazismo tornou-se num elemento de pressão do  
judaísmo na Palestina, contrário ao Livro branco e às limitações à imigração. Em fins  
de 1943, a população judia na Palestina atingia 32%.  
Isso possibilitava ao sionismo falar claro: “O fim do sionismo manteve-se  
inalterável desde Herzl: a transformação da Palestina numa pátria judaica, a fundação  
de um estado judeu. Por motivos de tática política, esse fim nem sempre foi  
abertamente enunciado. Mas o desenvolvimento da Palestina e do problema judaico  
em geral atingiram um tal grau de maturidade que se tornou necessário falar claro.”  
(WEIZMANN, 1950, p. 139)  
No Livro branco a Inglaterra tornava claro que o estabelecimento de um lar  
nacional judeu na Palestina não significava impor a nacionalidade judia a todos os  
habitantes da Palestina, mas desenvolver a comunidade judaica já existente com o  
concurso de judeus de outras partes do mundo. A Organização Sionista decidiu aceitar  
o Livro branco supondo que “se for aplicado oferece-nos um quadro para constituir  
uma maioria judaica na Palestina e para levar à eventual fundação de um estado judeu”  
(WEIZMANN, 1950, p. 361).  
Foi com o acordo sionista sobre a interpretação da Declaração Balfour excluindo  
um estado judeu que foi apresentado na Liga das Nações o projeto do texto  
concedendo à Inglaterra o mandato sobre a Palestina, que a Liga das Nações retificou  
a 24 de julho de 1922.  
Com isso não concordava a facção “revisionista” dirigida por Jabotinsky, no  
seio da Organização Sionista; pleiteava ela uma ação militar que constituísse o estado  
judeu nas duas margens do Jordão, sem levar em conta os árabes.  
Bem ou mal, a Inglaterra representou junto à comunidade judaica na Palestina  
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o papel de metrópole de uma colônia de povoamento, devido ao apoio ao crescimento  
dela, da mesma maneira como protegeu a colonização britânica na América do Norte,  
e a França, a colonização francesa.  
A primeira revolta dirigiu-se contra a Inglaterra, daí a formação das unidades  
terroristas do “Irgun” e “Grupo Stern”, quando surge o “Programa de Baltimore”, que  
pede um estado judeu sobre toda a Palestina e um exército judaico e a imigração  
ilimitada de judeus à Palestina. Isso fez passar ao segundo plano a questão árabe.  
O que impressiona é ver jovens exaltados em querer livrar “seu país” da tirania  
inglesa não lembrarem que os “indígenas árabes” teriam algo a dizer também. Embora  
grupos árabes se dirigissem ao “Irgun” oferecendo-se para combater contra o  
imperialismo inglês. Porém, nesse momento, a ideia de um estado binacional entra em  
desuso, ficando claro que no futuro estado instalado na Palestina judaizada pela  
imigração ilimitada os árabes teriam que escolher entre a subordinação e a imigração.  
Por isso, em 1946, Martin Buber censurava o sionismo oficial por procurar  
firmar-se mais em acordos internacionais em vez de um acordo na região com os  
árabes, interessados diretos. Daí precisar ele que “o Programa de Baltimore (nome de  
um hotel americano onde se realizou a reunião da Organização Sionista), interpretado  
como reconhecendo o objetivo da ‘conquista’ do país mediante manobras  
internacionais, não só desencadeou a cólera árabe contra o sionismo oficial, mas tornou  
suspeitos todos os esforços tendentes a uma compreensão entre judeus e árabes”  
(BUBER; MAGNES; SIMON, 1947, pp. 7-13).  
Daí veio a partilha decretada pela ONU, não aceita pelos árabes, que  
desencadeou a “Guerra de Independência” de Israel. Porém, é necessário entender  
que, para as massas árabes, aceitar as decisões da ONU significava uma capitulação  
sem condições perante um diktat da Europa, do mesmo tipo que a capitulação dos  
reis negros ou amarelos do século XIX ante os canhões ocidentais apontados para  
seus palácios. A Inglaterra, como potência mandatária na Palestina, impediu uma  
reação indígena para expulsar esses colonos, ao mesmo tempo em que se dava a  
garantia falaciosa de que se tratava da implantação pacífica de alguns grupos  
perseguidos e inofensivos, destinados a permanecer minoritários. Quando o designo  
real deles se revela, o mundo euro-americano, com a União Soviética, queria impor  
aos árabes o fato consumado. Roosevelt e Truman não prometeram que não tomariam  
nenhuma decisão a respeito da Palestina sem consultar judeus e árabes, em cartas a  
Ibn Seud de 5/4/45 e 28/10/46? Após a Guerra, a minoria árabe em Israel ficou  
sendo considerada quinta-coluna, daí a ampliação das medidas discriminatórias que já  
estava sofrendo havia tempos.  
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Isso leva-nos a uma conclusão particular. A implantação na Palestina de uma  
nova população de origem europeia se deu em consequência de um movimento  
ideológico europeu, o sionismo. Alcançou sua finalidade: o domínio sobre o território  
onde se implantavam os imigrantes, graças à Declaração Balfour, com força de direito  
internacional pela vitória dos Aliados sobre o Império Otomano, graças à força da  
comunidade judaica na Palestina, com sua capacidade de manipular técnicas modernas,  
armas e organização do poder de pressão de que dispunha na Europa e América. Alie-  
se o sentimento de culpa europeu pelo genocídio cometido pelos nazistas, seus irmãos  
de cultura europeia, e seu desejo de se desculpar, sem grande mal, em detrimento dos  
árabes palestinos. No decurso do processo, desejos, sentimentos e aspirações árabes  
não foram levados em consideração. O acordo Faiçal-Weizmann nascera morto, pois o  
primeiro não conseguiu o apoio das massas árabes para suas reivindicações. Por outro  
lado, a história tem sua lógica interna: querer criar um estado judeu na Palestina árabe  
no século XX só conduziria a uma situação colonial, com um tipo de racismo e  
afrontamento militar de etnias.  
Fundamentar em direitos históricos a colonização sionista é não conhecer a  
história. O último estado verdadeiramente independente da Palestina desapareceu a  
63 aC, quando Pompeu se apoderou de Jerusalém.  
Esse processo termina com a revolta de Bar Kochba contra o imperialismo  
territorial romano a 135. A população judia na Palestina diminuiu em consequência  
das deportações e da escravização, mas sobretudo pela emigração (já considerável  
muitos séculos antes da perda da independência) e pela conversão de inúmeros judeus  
ao paganismo, cristianismo e islamismo. É muito provável que os habitantes  
considerados árabes da palestina possuíam mais “sangue” hebraico do que a maior  
parte dos judeus da Diáspora (Dispersão), cujo exclusivismo religioso não impedia a  
absorção dos convertidos de origem diversa. O proselitismo religioso foi importante  
na própria Europa Ocidental, durante séculos, e o mesmo ocorreu em outros locais  
durante longos períodos. Historicamente, bastará para nos convencermos disso evocar  
o estado judeu da Arábia do Sul no século XI, de base árabe meridional judaizada, o  
estado judeu turco dos Khazars, no sudeste da Rússia nos séculos VIII a X, os judeus  
assimilados da China, os judeus negros do Cochim, os Falashas da Etiópia. Admite-se  
que o grupo heterogêneo formado por todos os judeus do mundo permanecesse em  
contato com o judaísmo religioso, fosse considerado dotado de caracteres  
permanentes a despeito de suas mudanças internas; cabe perguntar: como seria  
possível atribuir-lhes direitos sobre um território determinado? Nesse caso, poderiam  
os árabes reivindicar a Espanha.  
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O caráter colonial da implantação do sionismo na Palestina reside no fato de  
que o sionismo não desejava as riquezas do país, mas sim a substituição da mão de  
obra árabe pela judaica na Palestina. A compra de terras, pela Organização Sionista,  
dos latifundiários árabes levou o “felah” à exclusão do processo produtivo: quanto  
mais aumenta a compra sionista de terras, mais aumenta o número de camponeses  
árabes sem terra. É a colonização sionista que cria reativamente o nacionalismo árabe.  
Os camponeses árabes diaristas, despojados de suas terras, são a base do problema  
palestino. Inimigo da assimilação judia, o sionismo crê que possa assimilar os árabes  
a seu projeto.  
A criação de uma central sindical ao mesmo tempo empresarial, como a  
Histadruth, que integra o “trabalho judeu” nas suas fileiras e exclui o árabe, é um dos  
fundamentos de uma formação econômico-social de “apartheid”. Trabalho “judeu” e  
produção “judia” são a base da Histadruth. Ela é a responsável por 20% do produto  
bruto produzido.  
Segundo o líder trabalhista sionista Tabenkin, o movimento operário sionista,  
sofrendo concorrência da mão de obra árabe, estabelece uma economia judia nova. O  
processo de autocriação de uma classe operária judia em Israel se dá pela expulsão  
da mão de obra árabe das colônias judias e a criação de uma economia sionista nova,  
fundada sobre a colonização operária, por meio do fundo nacional e instituições  
associadas. Como a mão de obra judia é mais cara que a árabe, o empresário judeu é  
subsidiado pela Organização Sionista para aceitá-la.  
Após a proclamação do estado de Israel, verifica-se a espoliação metódica das  
terras árabes; assim publicava em 1948 uma Proclamação de rgência sobre as  
propriedades de pessoas ausentes, elevada a lei em 1950 com o título “Lei sobre a  
Propriedade de Pessoas Ausentes”. Considera-se ausente o camponês árabe em Israel  
que abandonou seu antigo domicílio antes de 1/8/48 ou que se instalou por qualquer  
razão naquelas áreas da palestina controladas por forças opostas ao estado de Israel  
entre 29/11/47 e a abolição do “estado de emergência” instituído pelo governo  
em 19/4/48.  
[O caso de] muitos dos árabes “ausentes” se deveu ao temor do campesinato  
árabe [da] repetição do massacre da aldeia de Deir Yassin, onde a “Irgun”, exército  
terrorista de Beguin, massacrou mais de 200 camponeses com mulheres e crianças. A  
lei permite ao governo declarar “zonas fechadas” por razões de “segurança” qualquer  
área. Para se entrar ou sair tem que se ter uma justificação escrita passada pelo  
comandante militar. Muitas das zonas de aldeia foram declaradas “zonas interditas”  
depois de seus habitantes terem sido expulsos. Com isso, comodamente suas terras  
Verinotio  
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Maurício Tragtenberg  
foram confiscadas. Com as “leis de emergência” em vigor, o ministro da Defesa recebia  
poderes para declarar “zona de segurança” qualquer região de Israel, dela expulsando  
todos os habitantes, dez dias depois dessa Declaração. Foi assim que foram expulsos  
à força os habitantes árabes camponeses de duas aldeias da Galileia, Ikret e Kfar  
Baram. Apelaram ao Supremo Tribunal; antes que ele se pronunciasse, o Exército  
dinamitou as casas dos aldeões. Em 1953, foi promulgada a Lei sobre a Propriedade  
Fundiária, seis meses depois, com base na lei, foram confiscadas terras de 250 aldeias  
árabes. Para fixar a indenização expropriatória, fixou-se o preço do dunan (dez dunans  
valem um hectare) em vigor em janeiro de 1950, valendo cinco vezes menos que em  
1953, quando a lei entrou em vigor. Em 1958, promulgou-se a Lei de Prescrição, uma  
emenda de leis otomanas que fixava em dez anos o período segundo o qual poderia  
o camponês que trabalhava a terra registrá-la em seu nome. A Lei de Prescrição  
estende para 20 anos o prazo, tornando impossível muitas vezes que o camponês  
registrasse a terra em seu nome, permitindo ao estado de Israel pôr as mãos sobre  
uma superfície de terras árabes, que atingem muitos milhões de dunans. Surgiu a Lei  
da Ordenação Fundiária (desapropriação por interesse público) em 1943; com ela, o  
governo apropriou-se de grande parte das terras árabes em volta de Nazaré,  
construindo uma cidade judaica.  
Igual expropriação se deu na região onde se construiu a cidade judaica de  
Carmelo. Isso contraria a resolução das Nações Unidas de 29/11/47, que estipula:  
“Não se poderá proceder a qualquer expropriação de terra de um árabe, no estado  
judaico, salvo em casos de interesse público. Em todos os casos de expropriação, o  
Supremo Tribunal fixará o montante da indenização que terá que ser paga  
integralmente antes de se proceder à expropriação.” Os bens religiosos (Wakfs)  
islâmicos foram expropriados pelo estado, que retirou da comunidade islâmica o seu  
usufruto, apoderando-se de sua administração, apossando-se de seus rendimentos. Os  
bens islâmicos produzem grandes lucros, porém, a comunidade muçulmana em nada  
se beneficia, daí a estagnação de suas atividades religiosas e culturais.  
No campo, a implantação do “kibutz”, a exploração coletiva da terra por quem  
nela trabalha, se dá em terras de “refugiados” árabes onde se dá a exploração da  
mão de obra árabe, especialmente nas terras confiscadas. Nas mãos do capital  
bancário que o absorve, o “kibutz” se torna uma exploração coletivista da mão de obra  
assalariada árabe das aldeias próximas. Quando instalado na fronteira, integra-se no  
Exército de Israel para vigiar a volta de “infiltrados”, [que] são os “árabes expropriados,  
transformados em ‘refugiados’ e mortos como ‘infiltrados’”.  
A estrutura coletivista do “kibutz” insere-se na mecânica da economia  
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capitalista de Israel; eles são integrados no mercado capitalista e dele dependem.  
Ocupam mais de 70% da terra cultivada, seus componentes na sua maioria são  
mestres, contramestres e administradores. Se se suprimi[sse] a mão de obra assalariada  
árabe, eles desapareceriam, na sua maioria. Na Galileia, foram instalados 20 “kibutzim”  
em terras expropriadas de camponeses árabes. Entre 1948 e 1953, foram instalados  
370 novos “kibutzim”, em Nazaré foram expropriados 120 hectares de terras em 1956  
para fundar “kibutzim”.  
As “zonas ocupadas” pelo estado de Israel têm como finalidade suprir a  
burguesia israelense de mão de obra a preço vil, explorando um trabalhador sem  
defesa sindical. Em suma, economia “autárquica” judaica fechada ao “árabe” palestino,  
expropriação deste e sua transformação em “refugiado”, discriminação racial, criando  
um cidadão de segunda classe: o estado sionista procura realizar-se pelo  
expansionismo a pretexto de “defesa”. Os massacres de Sabra a Chatila mostram até  
que ponto o racismo pode levar ao extermínio; aliás, os judeus sentiram-no em sua  
pele na II Guerra Mundial. Seria o caso de não transformar os palestinos nos “judeus  
do século XX”.  
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1920.  
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LENCOWSKI, George. The middle East in world affairs. Ithaca, N.Y.: Cornell University  
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WEIZMANN, Chaim. Trial and error. London: East and West, 1950.  
Como citar:  
TRAGTENBERG, Maurício. Dialética do sionismo. Verinotio, Rio das Ostras, v. 30, n. 2,  
pp. 432-443, 2025.  
Verinotio  
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