Verinotio - Revista on-line de Filosofia e Ciências Humanas. ISSN 1981-061X. ano XV. jan./jun. 2020. v. 26. n. 1
Renata Altenfelder Garcia Gallo
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elas, Lukács assinala um traço bastante curioso: apesar de apresentarem em si
um traço amundanal (ausência de mundo), ainda assim apresentam certo
realismo. Entende-se, assim, que essas figuras, normalmente reproduções de
animais, não possuem qualquer ligação com elementos presentes em seu
entorno, visto que são realizadas de modo “solto” no espaço em que foram
produzidas. É, precisamente, nesse sentido que Lukács assinala a ausência de
mundo dessas representações, apesar de apontar que elas reúnem um certo
caráter realista. Pode parecer estranho este traço, entretanto ele se apresenta
devido à alta capacidade de observação que esse homem do período Paleolítico
possuía, pois a necessidade da caça, da pesca e da coleta em prol da
sobrevivência fez com que essa habilidade – observação – fosse potencializada.
Nesse sentido, devemos novamente ressaltar a noção de que tudo surge a partir
da e na vida cotidiana. A habilidade estética dos povos caçadores do Paleolítico,
ao reproduzir imagens individualizadas e típicas de animais surge,
precisamente, de sua necessidade cotidiana de sobreviver.
Lembremos que essas pinturas rupestres tinham como finalidade, por
exemplo, o logro na caça ou na pesca e não um êxito estético. Desse modo,
essas reproduções obedecem a finalidades mágicas, impostas por uma
determinação externa, que, neste caso, é a comunidade. Observando as
condições de nascimento dessas pinturas bem como as suas finalidades, é
altamente compreensível que os homens que produziram tais figuras se
voltassem, somente, para a representação do animal que pretendiam caçar e,
não, para questões estéticas. Sendo assim, não era necessário desenhar uma
paisagem de fundo para abrigar a presa pretendida e incrementar, assim,
aquela pintura, pois as finalidades deste homem não demandavam tal
comportamento, exigiam, somente, a representação do animal para que
impusessem sobre ele um domínio no momento da caça. Lukács sintetiza a
questão:
O paradoxo das obras primas da pintura rupestre paleolítica
consiste que os animais reproduzidos, considerados objetos soltos,
parecem possuir aquela totalidade intensiva das determinações, ou
seja, uma intenção de mundanidade, ao passo que, ao mesmo
tempo, são representados isoladamente, em seu abstrato ser-para-
si, como se a sua existência não interagisse com o espaço que
imediatamente o rodeia, nem, ao menos, com o seu ambiente
natural. Essas figuras estão – artisticamente – fora de todo o mundo,
e sua configuração é em última instância amundanal (LUKÁCS,
1972, p. 126, tradução nossa).
Pelos motivos apontados por Lukács, a pintura paleolítica carrega em si
uma situação contraditória, haja vista que magia e arte, em sua essência, se
opõem: “aquela visa à consecução de finalidades materiais pela manipulação
de forças transcendentes, essa visa à transformação da subjetividade do
homem pela afirmação de sua terrenalidade” (PATRIOTA, 2010, p. 157). Se a