Verinotio - Revista on-line de Filosofia e Ciências Humanas. ISSN 1981-061X. ano XV. jul./dez. 2020. v. 26. n. 2
Vladmir Luís da Silva
210
ela penetra nas massas,” os “momentos” e “determinações que fazem da
teoria, do método dialético, o veículo da revolução”. Apenas uma dada forma
de relação entre a consciência e a realidade possibilitaria a união entre a
teoria e a práxis. A esse respeito, Lukács escreve:
a conscientização precisa se transformar no passo decisivo a ser
dado pelo processo histórico em direção ao seu próprio objetivo
/.../. Somente quando a função histórica da teoria consistir no fato
de tornar esse passo possível na prática; quando for dada uma
situação histórica, na qual o conhecimento exato da sociedade
tornar-se, para uma classe, a condição imediata da sua
autoafirmação na luta; quando, para essa classe, seu
autoconhecimento significar, ao mesmo tempo, o conhecimento
correto de toda a sociedade; quando, por consequência, para tal
conhecimento, essa classe for, ao mesmo tempo, sujeito e objeto do
conhecimento e, portanto, a teoria interferir, de modo imediato e
adequado no processo de revolução social, somente então a
unidade da teoria e da prática, enquanto condição prévia da função
revolucionária da teoria, será possível (LUKÁCS, 2003, pp. 65-6).
Ao contrário das demais classes sociais, o proletariado é capaz de
alcançar o ponto de vista que lhe permite a compreensão da sociedade
capitalista enquanto totalidade, superando o nível do imediato. Isto é, a
dialética materialista, enquanto consciência de classe do proletariado, lhe
permite compreender a si mesmo e, portanto, a totalidade da sociedade,
limpando o terreno para a revolução. Desse modo, a teoria marxista se
vincula de modo necessário ao processo de revolução, como sua condição
prévia. O esclarecimento desta função da teoria ajuda a entender o método
dialético. E aqui Lukács já lança uma leve censura contra Engels. Esse último
negligenciou justamente a questão das interações entre sujeito e objeto. De
fato, Engels descreve o método dialético enquanto oposto à metafísica, isto é,
como procedimento no qual a rigidez dos conceitos é dissolvida e a passagem
de uma determinação a outra é fluida. Aqui, consequentemente, a ação
recíproca ocupa o lugar da causalidade rígida e unilateral da metafísica. Não
obstante, Lukács vê problemas na descrição engelsiana:
Mas o aspecto mais geral dessa ação recíproca, a relação dialética
do sujeito e do objeto no processo da história, não chega a ser
mencionado, e muito menos colocado no centro (como deveria sê-
lo) das considerações metodológicas. Ora, privado dessa
determinação, o método dialético (malgrado a manutenção,
puramente aparente, é verdade, dos conceitos “fluidos”) deixa de
ser um método revolucionário. (LUKÁCS, 2003, p. 67)
Desse modo, ao ignorar a dialética de sujeito e objeto, Engels não
capta a principal diferença entre os estudos guiados pela metafísica e pelo
método dialético, a saber, que no primeiro há a prevalência de uma
perspectiva contemplativa e no segundo o problema central é a
transformação da realidade.
No entender de Lukács, outra falta cometida por Engels foi a de ter
estendido indevidamente o método dialético ao conhecimento do âmbito da
natureza. Contra essa postura, que é também a de Hegel, o filósofo húngaro
considera importante a restrição de tal procedimento à realidade histórico-