A relação entre objetividade e subjetividade no ato estético
VerinotioNOVA FASE ISSN 1981 - 061X v. 27 n. 2, pp. 89-114 - mar. 2022| 107
A dialética entre essência e aparência, na forma estética, expressa a
simultaneidade dos atos de alienação e sua retroação nessa esfera específica do
espelhamento humano. É o que se depreende de:
Na esfera estética, a alienação e sua retroação estão estreitamente unidas: a
subjetividade se supera na alienação e a objetividade na retroação, de tal
modo que o momento da preservação e elevação a um nível superior adquire
certa preponderância no ato complexo da superação. Do efeito coincidente
dos dois movimentos resulta, pois, algo unitário: um mundo objetivo
conformado, como reflexo da realidade, o qual sublinha em sua intenção a
objetividade desta ainda mais energicamente do que ela se impõe nas
impressões e vivências da cotidianidade; pois o que se apresenta sempre ao
espectador ou ao leitor é um grupo de objetos relativamente pequeno, e essa
secção, esse fragmento, tem que evocar nele a realidade como um “mundo”
objetivo e fechado ou completo, e isso em circunstâncias que parecem ser
para ele efeito da objetividade mais desfavoráveis que as da cotidianidade
porque lhes falta necessariamente a força de convicção do meramente fático,
do
factum brutum
, posto que estão inevitavelmente postas como meros
reflexos, como formações miméticas que não podem conquistar uma
objetividade senão por seu conteúdo e por sua forma (LUKÁCS, 1970, p.
523-524).
O objeto conformado esteticamente, logo, é o que é não por sua materialidade
(ao contrário dos objetos em-si), mas pelo conteúdo que não está somente nele
mesmo, mas na sua relação com a subjetividade do artista e a do receptor que lhe dão
forma. Isso significa que:
A entrega do sujeito à realidade na alienação, sua imersão nela, produz desse
modo uma objetividade internamente intensificada. Mas esta – e tal é o
sentido da retroação no sujeito – está penetrada de subjetividade por todos
seus poros, e precisamente de uma subjetividade concreta e determinada. Na
obra mimética genuína esta subjetividade não é um acréscimo, um
comentário, nenhuma espécie de “aura” que circunda os objetos, mas é ao
contrário um momento constitutivo, uma parte integrante da sua própria
objetividade, é um elemento necessário, também a própria base de sua
existência determinada. (LUKÁCS, 1970, p. 524)
Alienação e retroação realizam o trânsito, a troca efetiva entre dois complexos
de realidade aparentemente exteriores um ao outro. O mundo objetivo das coisas e o
subjetivo e exclusivamente humano de sensações, desejos, sentimentos, ideais. Por
isso mesmo, na obra de arte, sempre se expressa a posição do artista frente ao mundo
que ele conforma. E não poderia ser de outro modo, já que essa conformação é
subjetiva, a obra expressa algo que o artista quer dizer sobre o complexo de realidade
que ele elaborou artisticamente. A própria definição do objeto a ser configurado é já
uma tomada de posição, mas esta, como mostra Lukács, não subjetiviza a obra:
É um preconceito moderno a suposição de que essa onipresença da tomada
de posição, da particularidade, subjetiviza as obras de arte. O caminho, que
passa pela alienação e leva à retroação desta, é o oposto estrito do
subjetivismo. Só se produz subjetivismo quando o sujeito é incapaz de, ou
se nega a, empreender o rodeio até si mesmo que passa pela alienação, pelo