A batalha pelos significados dos Grundrisse
movimento dialético de fundo de todo os Grundrisse” (Ibid., p.20). Assim, Dussel, em
oposição àqueles que defendem que desde 1845 a problemática marxiana seria
somente econômica, defende que, nos Grundrisse, há a inauguração definitiva da
filosofia como um marco problemático não negligenciável do projeto marxiano, posto
que é no horizonte ontológico que tais categorias se constituem e ordenam. Por isso,
querer reduzir capital, mais-valor, produção, circulação, lucro etc., em
Marx, a somente categorias econômicas é destruir seu discurso; o
mesmo que reduzi-lo a mero discurso filosófico. [A obra de Marx] é
uma ontologia da economia, e uma economia ontológica (Ibid., p.348).
A teoria marxiana, para Dussel, em especial nos Grundrisse, constitui-se na
primeira ontologia do capital, que, pela clareza de seu delineamento categorial, logra
alcançar linhas definitivas de sua crítica da economia política. Entretanto, em
discordância com a ontologia do ser social de Lukács, “que hipostasia a totalidade e
bloqueia a visão do ‘fora’” (Ibid., p.350), Dussel busca na ontologia marxiana o
caminho para exterioridade ao mundo do capital. Nesse sentido, a criticidade da teoria
marxista origina-se da ontologia, mas a partir dessa ideia de exterioridade, que se
encontra para além dessa mesma ontologia: o não-capital, o outro (como sujeito vivo),
o trabalhador como capacidade criadora de valor. “A totalidade do capital é superada
por um âmbito que transcende seu fundamento. Se a ontologia pensa o ser (e a crítica
da economia política capitalista é, por isso, uma ‘ontologia econômica’), a crítica do
ser se efetua desde uma alteridade” (DUSSEL, 1985, p.359). A exterioridade que se
consubstancia nessa utopia concreta (à Bloch) – alteridade futura – como “polo afetivo,
tendencial (triebende, diria Marx) que mobiliza a ação. O oprimido, alienado,
subsumido ao capital tem, assim, um ‘projeto de libertação’ que cria o fundamento
para uma práxis revolucionária libertadora” (Ibid.) – uma ética da libertação, uma teoria
da justiça, em oposição à realidade capitalista e à moral burguesa.
A realização desta crítica ao ser do capital, desde a exterioridade prática e
utópica, é o que Dussel conceitua como transcendentalidade analética – “por analética
queremos indicar o ‘para além’ (em grego anó-) do horizonte ontológico” (Ibid., p.366).
Desta forma, “a negação da negação da totalidade (a negação do trabalho assalariado
como subsumido ao capital) somente pode partir da afirmação da exterioridade
analética ou desde a capacidade da transcendentalidade que o homem possui por ser
homem” (Ibid.). Tal afirmação pode se realizar somente através da realização das
mediações concretas de libertação, “mas antes de sua concretização, há que se situar
na prática a denominada exterioridade, há que se formular uma teoria crítica radical,
Verinotio
ISSN 1981 - 061X v. 29 n. 1, pp. 213-237 – jan.-jun., 2024 | 229
nova fase