DOI 10.36638/1981-061X.2024.29.1.715  
O conceito de “justiça” em Marx: seus elementos,  
contextos e debates  
The concept of “justice” by Marx: its elements, contexts,  
and debates  
Thiago Aguiar Simim*  
Resumo: Este artigo tem o objetivo de tratar do  
tema da “justiça” na obra de Karl Marx, a partir  
das ocorrências deste conceito e de suas  
variações no própria obra do autor. A ideia  
desta análise é contextualizar e sintetizar o  
sentido dado por Marx à “justiça” no quadro  
teórico de sua crítica ao capitalismo. O debate  
contemporâneo sobre “justiça em Marx” emerge  
em especial após a década de 1970, com a  
intensificação da discussão normativa na filosofia  
política, por ocasião da revitalização da teoria da  
justiça liberal igualitária. Com isso, diversos  
autores buscaram compreender os critérios  
normativos por trás da crítica de Marx ao  
capitalismo e se questionaram se tal padrão de  
crítica poderia ser entendido como um ideal de  
justiça para ele. Sendo assim, o próprio sentido  
de justiça em Marx teve que ser negligenciado,  
em prol de uma definição mais ampla e mais  
atual de justiça com fronteiras menos claras  
com conceitos como “moral” e “ética”. A intenção  
deste artigo vai no sentido oposto, de restringir  
os termos da discussão, tentando inicialmente  
identificar quais os elementos, os contornos e o  
contexto do emprego do conceito de “justiça” na  
obra de Marx.  
Abstract: The aim of this article is to discuss the  
theme of “justice” in the work of Karl Marx,  
based on the occurrences of this concept and  
its variations in the author's own work. The  
idea of this analysis is to contextualize and  
synthesize the meaning given by Marx to  
“justice” within the theoretical framework of his  
critique to capitalism. The contemporary debate  
on “justice in Marx” emerged especially after the  
1970s, with the intensification of the normative  
discussion in political philosophy, on the  
occasion of the revitalization of the liberal  
egalitarian theory of justice. As a result, various  
authors sought to understand the normative  
criteria behind Marx's critique of capitalism and  
questioned whether this pattern of critique  
could be understood as an ideal of justice for  
him. Therefore, the very meaning of justice in  
Marx had to be neglected in favor of a broader  
and more current definition of justice with less  
clear boundaries with concepts such as  
“morality” and “ethics”. The intention of this  
article is to restrict the terms of the discussion,  
initially trying to identify the elements, contours  
and context of the use of the concept of “justice”  
in Marx's work.  
Palavras-chave: Karl Marx; Conceito de Justiça;  
Crítica do capitalismo.  
Keywords: Karl Marx; Concept of Justice;  
Critique of capitalism.  
1. Introdução  
A pergunta “seria o capitalismo seria injusto para Marx?” já foi levantada e  
discutida por diversos autores (cf. COHEN, 1980; GARGARELLA, 2008; GERAS, 2018;  
*
Doutor em Sociologia pela Universidade de Frankfurt/M e pelo Instituto de Pesquisa Social (IfS/  
Frankfurt). Professor adjunto na área de Sociopolítica do Departamento de Administração Pública da  
Verinotio  
ISSN 1981 - 061X v. 29 n. 1 jan.-jun., 2024  
nova fase  
 
O conceito de “justiça” em Marx: seus elementos, contextos e debates  
KALLSCHEUER, 1986).1 Na verdade, mais que “justiça”, este debate se desenrolou em  
torno de categorias morais e éticas na obra de Marx de forma mais ampla, algumas  
vezes abrindo mão inclusive da definição desses conceitos para Marx, na intenção de  
compreender o sentido da crítica ao capitalismo nos termos do debate na filosofia  
política normativa contemporânea. O contexto deste debate é inicialmente os Estados  
Unidos e a Europa do pós-guerra, em especial dos anos 1970 em diante.  
Usualmente este contexto é apresentado a partir da revitalização da teoria da  
justiça pelo liberalismo igualitário de John Rawls (cf. RAWLS, 1999). Este contexto  
abrange, contudo, não somente um desenvolvimento teórico específico, mas também  
condições históricas e políticas do pós-guerra. Kallscheuer (1986) expõe sobretudo o  
ambiente pós-1970 a partir de três condicionantes: uma teórico-histórica, uma  
doutrinária filosófica e outra de concepção política (1986, p. 121 ff). Do ponto de vista  
(i) teórico-histórico a década de 1970 marca a chamada “crise do marxismo”, a qual  
ganhou impulso, não por último, dos movimentos de 1968. Com a pretensa perca da  
centralidade da classe trabalhadora vem à tona também, mesmo no seio de correntes  
marxistas, a discussão sobre o papel das instituições sociais e dos princípios  
normativos para a luta política. Já a incursão (ii) doutrinária se relaciona inicialmente  
com o diálogo de algumas correntes teóricas marxianas com a teoria da justiça de  
Rawls. De acordo com Kallscheuer (1986), esta condicionante histórica é mais  
propriamente acadêmica e anglo-saxã, surgindo a partir da retomada mais ampla do  
kantismo e do debate ético na crítica ao utilitarismo (cf. também GARGARELLA, 2008).  
A saída neocontratualista e principiológica de Rawls recoloca os termos do debate em  
teoria da justiça e passa a representar uma posição com ou contra a qual diversas  
autoras e autores da filosofia política e social não puderam deixar de argumentar.  
Nesta arena se posicionaram também defensores da obra marxiana, os quais  
produziram a maior parte das teorias sobre “justiça” em Marx, como já mencionado  
acima (cf. ANGEHRN; LOHMANN, 1986; GERAS, 2018; WOOD, 1980). A (iii) terceira  
mudança histórica que condiciona a emergência deste debate é, segundo Kallscheuer  
(1986), da ordem da concepção política, afetando a existência do socialismo como  
1
Norman Geras formula um panorama e uma classificação sobretudo dos autores “norte-americanos”  
neste debate, apresentando uma lista nominal que aparece na primeira nota de rodapé de seu texto, cf.  
GERAS, 2018, p. 506. Vide sobretudo a coletânea em COHEN, 1980. Para uma análise mais específica  
do debate entre os marxistas analíticos cf. CARVER; THOMAS, 1995; GARGARELLA, 2008, p. 103 ff.  
Sobre debate normativo em Marx no contexto alemão cf. ANGEHRN; LOHMANN, 1986; KALLSCHEUER,  
1986.  
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alternativa presente no horizonte da ação política. Se até antes da crise do stalinismo  
na década de 1950 haveria entre “socialistas kantianos” – representados nos partidos  
social-democratas – e “marxismo ortodoxo” um debate em torno de como alcançar e  
qual socialismo se almejar, este confronto teria deixado de existir. No lugar grande  
parte dos partidos e governos de esquerda passam a questionar o próprio socialismo  
como objetivo, adotando o chamado “compromisso histórico” com a economia de  
mercado (KALLSCHEUER, 1986, p. 124). Para além da mudança na concepção política,  
no sentido do Estado de bem-estar social, esta virada representou também uma  
mudança no jargão político, a exemplo da profusão de termos como “justiça social”.  
Neste projeto, a esquerda e a classe trabalhadora se sentiam representadas pelas  
políticas sociais, de redistribuição e nos acordos carreados pela classe trabalhadora  
tradicional e sindicalizada. Com o desmantelamento do Estado social a partir dos anos  
1970, os limites do projeto político da esquerda ficaram ainda mais claros, o que a  
forçou a reinventar sua posição e seus objetivos políticos para além do repertório  
marxiano. Nesse sentido, segundo Kallscheuer, o debate sobre “justiça” em Marx é  
fruto de uma crise “ético-política” mais ampla, uma “crise da própria ideia da esquerda”  
(1986, p. 125). Com esta breve reconstrução do ambiente histórico em que emerge o  
debate sobre “justiça” em Marx, é possível compreender sua função, suas razões e  
suas condicionantes, para além de uma perspectiva centrada na história das ideias.  
Como mencionado, a pergunta sobre a “justiça” em Marx se deu, na maior parte  
das vezes, em torno da pergunta sobre a normatividade de maneira ampla, e em alguns  
casos a resposta sobre se essa normatividade estaria abrangida pelo conceito de  
justiça ou não. As categorias mais diretas são, por óbvio, a “alienação” e a “exploração”  
(cf. p.e. PEFFER, 1990; WILDT, 1986), porém alguns autores defendem Marx teria  
também padrões positivos, como “solidariedadeou necessidade(cf. TUCKER, 1969).  
Igualmente, tanto Ziyad Husami (1980) quanto Philip Kain (1986) afirmam que Marx  
adota uma concepção moral positiva, contudo de forma posicionada, na moral da  
classe proletária. Nesse sentido, ele critica, de fato, a justiça da sociedade burguesa  
enquanto uma ideologia da classe dominante, mas se coloca ao lado da moral  
proletária, que representaria, segundo Husami (1980), o ponto de vista da superação  
da cisão entre classes, da perspectiva, portanto, de um estágio histórico posterior ao  
capitalismo, de uma sociedade sem classes. Por outro lado, a moral burguesa  
desempenharia uma função na manutenção das relações de exploração. Ela aparece  
como troca livre, mas sua realidade efetiva consistiria em uma troca “injusta”, conforme  
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Kain (1986). A “sociedade sem classes” é vista por Douglas Kellner (1981) como um  
ideal normativo na teoria de Marx, ou seja, uma sociedade na qual o trabalho pudesse  
ser realizado de maneira não-alienada e que não representasse uma relação de  
exploração. De maneira semelhante, Charles Taylor, um dos principais representantes  
do debate em teoria da justiça contemporânea da oposição fundamental ao  
liberalismo rawlsiano já havia defendido (cf. TAYLOR, 1966) que a posição moral de  
Marx está implícita na sua construção teleológica da natureza humana, o que se  
manifesta, não por último, também na bandeira política de Marx em prol de uma  
sociedade comunista.  
Também nos anos 1980, Georg Brenkert (1983) defende que na base da teoria  
de Marx haveria um critério normativo transcultural e trans-histórico presente no  
conceito de “liberdade”. Este conceito normativo se manifesta na crítica à esfera da  
produção capitalista, que necessita de trabalhadores expropriados, “livres” dos (ou  
seja, sem os) meios de produção e livres para contratar, os quais, para viver, são na  
verdade forçados a vender sua única mercadoria (a força de trabalho), para trabalhar  
sob o comando do capitalista, portanto com sujeição, de forma não-livre. Não se trata,  
é claro, da liberdade formal individual, mas de um conceito positivo de liberdade, de  
inspiração na “eticidade” hegeliana e na ética aristotélica (cf. LINDNER, 2013). Para  
Brenkert a “liberdade” para Marx pode ser entendida como uma ética da  
autodeterminação, a qual se compõe de virtudes e não de deveres. Além deste sentido  
de “liberdade”, o objetivo prático político da obra de Marx poderia ser compreendido  
a partir da perspectiva da “emancipação” (cf. DEMIROVIĆ, 2017) humana, ou seja, da  
“libertação”, o que seria passível de interpretação também através poucas passagens  
que Marx escreveu sobre o comunismo.2  
2 É bem representativa dessa relação a seguinte passagem do Livro III dO Capital: O reino da liberdade  
só começa, de fato, onde cessa o trabalho determinado pela necessidade e pela adequação a finalidades  
externas; portanto, pela própria natureza da questão, isso transcende a esfera da produção material  
propriamente dita. Assim como o selvagem tem de lutar com a Natureza para satisfazer suas  
necessidades, para manter e reproduzir sua vida, assim também o civilizado tem de fazê-lo, e tem de  
fazê-lo em todas as formas de sociedade e sob todos os modos de produção possíveis. Com seu  
desenvolvimento, amplia-se esse reino da necessidade natural, pois se ampliam as necessidades; mas,  
ao mesmo tempo, ampliam-se as forças produtivas, que as satisfazem. Nesse terreno, a liberdade só  
pode consistir em que o homem social, os produtores associados, regulem racionalmente esse seu  
metabolismo com a Natureza, trazendo-o para seu controle comunitário, em vez de serem dominados  
por ele como se fora por uma força cega; que o façam com o mínimo emprego de forças e sob as  
condições mais dignas e adequadas à sua natureza humana. Mas este sempre continua a ser um reino  
da necessidade. Além dele é que começa o desenvolvimento das forças humanas, considerado como  
um fim em si mesmo, o verdadeiro reino da liberdade, mas que só pode florescer sobre aquele reino da  
necessidade como sua base” (MARX, 1986, p. 273). [MEW 25, p. 828]  
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De um outro lado, como para Allen Wood, as categorias normativas não seriam  
centrais para Marx, pois ele teria uma abordagem metaética de justiça ou, como Wood  
afirma de um modo contraintuitivo, um conceito “não moral” de “bom” (cf. WOOD,  
1980). Tanto Wood, quanto autores como Richard Miller (cf. 2020), entre outros,  
sustentam a posição fundamental de que não seria possível encontrar em Marx a  
adesão a nenhum princípio moral positivo. Os motivos de tal negação categorial da  
“justiça” são de diferentes ordens, como tratarei melhor no desenvolvimento deste  
artigo.  
Contudo o objetivo deste artigo não consiste em apresentar as construções  
teóricas dos autores e teses exemplificadas acima e nem recolocar a pergunta sobre  
se Marx criticaria o capitalismo como injusto. Na verdade, a diversidade de critérios  
presentes nessas teorias é reflexo do modo fragmentado e pouco sistemático –  
provavelmente intencionalmente (cf. HAUG, 1986) – que Marx dá ao tema da “justiça”.  
Por este motivo tratar da justiça a partir de uma definição atual da filosofia política,  
para analisar a obra de Marx me parece uma tarefa complexa e que depende de  
diversas ressalvas, apesar de poder ser um tema legítimo. A intenção do presente  
artigo é bem mais singela e mais próxima ao texto de Marx: o de entender “justiça” a  
partir dos aspectos presentes nas ocorrências deste conceito e de suas variações em  
sua obra. Inicialmente não se fez aqui nenhuma distinção entre textos de juventude e  
de maturidade, nem de textos mais filosóficos, ou mais econômicos, ou mais políticos.  
O objetivo aqui é tentar inicialmente refletir em geral sobre quais elementos, quais  
condicionantes e qual abordagem Marx apresentou no conceito de “justiça”.  
2. Elementos do conceito de “justiça” na obra de Marx  
Não é uma novidade que “justiça” seja, como outros conceitos normativos,  
inevitavelmente um conceito polissêmico e aberto, o que abriga a possibilidade de  
sentidos não somente distintos como também contraditórios entre si (cf. DUBET,  
2014). Perguntar sobre “justiça” em Marx, portanto, implica partir do sentido que ele  
atribui a este conceito. Entendo que nas poucas passagens em que Marx emprega o  
termo “justiça” pode-se extrair acepções distintas mas que possuem uma linha  
condizente com a teoria marxiana, sendo algumas delas as mais frequentes, como  
tratarei abaixo lembrando que, em geral, Marx raramente empregou este conceito  
(cf. DEMIROVIĆ, 2017; HAUG, 1986) e o utilizou em geral em citações ou em menção  
direta a outros autores.  
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O conceito de “justiça” em Marx: seus elementos, contextos e debates  
No todo, as ocorrências do conceito de justiça em Marx não aparecem de uma  
forma positiva, pois, em geral, seu emprego consiste em uma referência direta a  
concepções com as quais Marx está, na ocasião do texto, rivalizando ou as quais ele  
pelo menos critica, como veremos em seguir. Sendo assim, identificar os termos do  
debate como seus opositores, ideias, correntes e conjunturas políticas pode  
contribuir para a compreensão do sentido atribuído por ele ao conceito de justiça. E  
mais que os debates e conjunturas mais situadas, o pano de fundo central da crítica à  
ideia de justiça é a sua análise ampla da estrutura e funcionamento do capitalismo.  
Um dos primeiros e mais significativos destinatários da crítica de Marx é o  
socialismo de Pierre-Joseph Proudhon. É a ele e a seu “socialismo utópico” – e mais  
tarde em relação à economia política que Marx acusa de defender uma noção de  
“justiça eterna”, ou seja, uma “justiça” a-histórica. Algumas passagens neste sentido  
se encontram inicialmente na Sagrada Família (MARX; ENGELS, 1962), em especial na  
sessão dedicada à leitura que o jovem hegeliano Edgar Bauer faz de Proudhon, em  
que Marx critica a interpretação de Edgar Bauer, já apontando contudo também uma  
crítica à ideia “absoluta” de justiça. Como se sabe, as críticas mais diretas de Marx a  
Proudhon são trabalhadas sobretudo na Miséria da Filosofia (MARX, 1977), mas a  
remissão à “justiça eterna” de Proudhon continua tendo lugar em textos posteriores,  
como no próprio livro I de O Capital (MARX, 1996b, a).  
Em Miséria da filosofia Marx menciona algumas vezes a “justiça eterna” (cf.  
MARX, 1985a, p. 45, 58, 79, 139)3 do “Senhor Proudhon” (MARX, 1985a, p. 58),  
apontando para a justiça como concepção própria do modo de produção na sociedade  
burguesa dito em outros termos, como consciência e forma de pensar ideológicas  
(cf. HAUG, 1986).  
É central aqui, para Marx, a percepção da naturalização da “concorrência” por  
Proudhon e seu discurso moralista e sobre como o socialismo de Proudhon trata das  
demais categorias da sociedade civil burguesa como se fossem verdades naturais e  
eternas.4 Com a cegueira quanto ao caráter histórico e objetivo do modo de produção  
3
[MEW 4, p. 73, 85, 105, 161]. Utilizo, onde é possível, as publicações traduzidas das passagens  
citadas de Marx. Nestes casos, insiro aqui, em nota de rodapé, a referência abreviada do texto no  
original, nas Marx-Engels-Werke (MEW), seguida do número do volume e da página, para fins de  
consulta.  
4 Como bem ilustra a seguinte passagem: “Toda a lógica do Sr. Proudhon se resume nisto: a concorrência  
é uma relação social no interior da qual desenvolvemos atualmente as nossas forças produtivas. Desta  
verdade, ele não oferece desdobramentos lógicos, mas fórmulas frequentemente bem desenvolvidas,  
dizendo que a concorrência é a emulação industrial, o modo atual de ser livre, a responsabilidade no  
trabalho, a constituição do valor, uma condição para o advento da igualdade, um princípio de economia  
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resta à crítica proudhoniana moralizar a ação humana, debatendo com a economia  
política no âmbito da superfície e da aparência dos fenômenos econômicos. De modo  
semelhante Marx se posiciona, no curto texto Die moralisierende Kritik und die  
kritisierende Moral (A crítica moralizante e a moral criticante) (MARX, 1977), em uma  
querela com Karl Heinzen5, o qual é criticado, entre outros motivos, por fazer uma  
crítica moralizante. Heinzen menciona, na referência que Marx faz, a “injustiça nas  
relações de propriedade privada” (MARX, 1977, p. 337; 338)6, como se essa  
“injustiça” fosse fruto do poder político da burguesia, enquanto Marx insiste em dizer,  
em relação a esta opinião, que “se o proletariado derrubar a dominação política da  
burguesia, então sua vitória será somente temporária, somente um momento em  
serviço da própria revolução burguesa [...]” (MARX, 1977, p. 338).7 Ou seja, o objetivo  
da classe trabalhadora8 deveria ser não a justiça, mas revolucionar as condições  
materiais econômicas do modo de produção capitalista.  
O embate com os “socialistas” deixa muito claro o tom do emprego de “justiça”  
e “injustiça” para Marx, enquanto um jargão que pertence a uma crítica moralizante  
das relações entre indivíduos na crítica a Proudhon, por exemplo ou entre classes  
na crítica a Heinzen , uma terminologia, portanto, que não se presta à transformação  
real e à emancipação da sociedade. A leitura de uma justiça como ideia absoluta é  
própria dessa sociedade burguesa, a qual os socialistas também criticam,  
reproduzindo, contudo, o mesmo discurso da “justiça eterna”. Os principais elementos  
desse conceito de “justiça” são o fato de ela ser compreendida como eterna, enquanto  
ela, na verdade, consiste em uma concepção moralizante própria da sociedade  
social, uma necessidade da alma humana, uma inspiração da justiça eterna, a liberdade na divisão, a  
divisão na liberdade, uma categoria econômica(MARX, 1985a, p. 138139). [MEW 4, p. 160-161]  
5
Esta mesma querela na qual Engels se posiciona no texto chamado “Die Kommunisten und Karl  
Heinzen“ (Os comunistas e Karl Heinzen), no qual se tem uma das melhores passagens sobre “justiça”  
a partir de uma leitura marxista já que o texto é assinado não por Marx, mas por Engels: O Sr. Heinzen  
parece, com isso, supostamente aludir ao fato de que os comunistas ridicularizaram a sua feição  
altamente moral e zombaram de todas aquelas ideias sagradas e sublimes, como virtude, justiça,  
moralidade, etc., as quais o Sr. Heinzen imagina serem o fundamento de toda a sociedade. Nós  
aceitamos essa acusação. Os comunistas não serão impedidos, pela indignação moral do ilustre Sr.  
Heinzen, de zombar dessas verdades eternas. A propósito, os comunistas asseveram que aquelas  
verdades eternas não seriam de forma alguma a base, mas, pelo contrário, o produto da sociedade na  
qual elas figuram(ENGELS, 1977, p. 319, tradução livre).  
6 Tradução livre de: „Die Ungerechtigkeit in den Eigentumsverhältnissen.  
7 Tradução livre de: Stürzt daher das Proletariat die politische Herrschaft der Bourgeoisie, so wird sein  
Sieg nur vorübergehend, nur ein Moment im Dienst der bürgerlichen Revolution selbst sein […].  
8 Este endereçamento direto à classe trabalhadora no sentido de discutir suas bandeiras está presente  
também em diversos outros textos de Marx, como no “Manifesto do partido comunista” (MARX; ENGELS,  
1977), como em “Salário, preço e lucro” (MARX, 1982b) e na “Crítica do programa de Gotha” (MARX,  
2012).  
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O conceito de “justiça” em Marx: seus elementos, contextos e debates  
burguesa.  
Tais elementos da “justiça” permanecem em maior ou menor grau em toda a  
obra de Marx, mas sua abordagem ganha contornos mais próximas da sua análise  
econômica materialista do modo de produção capitalista. Uma síntese da crítica a  
Proudhon é apresentada no livro I dO Capital nos seguintes termos:  
Proudhon cria, primeiramente, seu ideal de justiça, da justice éternelle,  
a partir das relações jurídicas correspondentes à produção de  
mercadorias, com o que, diga-se de passagem, proporciona a prova  
tão consoladora a todos os filisteus de que a forma de produção de  
mercadorias é algo tão eterno quanto a justiça. Depois inversamente,  
ele pretende remodelar a produção real de mercadorias e o direito  
real correspondente a ela segundo esse ideal. (MARX, 1996b, p. 209,  
nota de rodapé 126).9  
O que esta citação nos mostra é que, para Marx, a “justiça” deve, em oposição  
à noção “eterna” e ideal de Proudhon, ser entendida de modo relativo10 a uma  
determinada realidade social, como adequada a determinado modo de produção e  
correspondente ao ideal jurídico. Neste sentido, a “justiça” é tratada como  
manifestação daquilo que Marx chama frequentemente de “leis econômicas”,  
sobretudo à lei da troca de equivalentes. As citações mais usadas neste debate (cf.  
KALLSCHEUER, 1986) sobre justiça em Marx são aquelas que reproduzem justamente  
esse mecanismo de funcionamento entre base material e concepções políticas, jurídicas  
e culturais. Uma delas, no Livro I d’O Capital, diz:  
A circunstância de que a manutenção diária da força de trabalho só  
custa meia jornada de trabalho, apesar de a força de trabalho poder  
operar, trabalhar um dia inteiro, e por isso, o valor que sua utilização  
cria durante um dia é o dobro de seu próprio valor de um dia, é grande  
sorte para o comprador, mas, de modo algum, uma injustiça contra o  
vendedor (MARX, 1996b, p. 311)11.  
Aqui Marx está explicitando a conversão de dinheiro em capital a partir da  
compra e venda da força de trabalho, na forma do trabalho assalariado, e conclui na  
sequência que “finalmente a artimanha deu certo. Dinheiro se transformou em capital.  
Todas as condições do problema foram resolvidas e, de modo algum, as leis do  
intercâmbio de mercadorias foram violadas. Trocou-se equivalente por equivalente”  
(MARX, 1996b, p. 312, grifos meus)12. Desse modo, a justiça deve ser compreendida  
9 [MEW 23, p. 99, nota de rodapé 38].  
10  
Tanto Brenkert (1983) quanto Wood (1980) afirmam de maneira mais enfática que Marx teria uma  
concepção “relativista” de justiça e de moral.  
11 [MEW 23, p. 208].  
12 [MEW 23, p. 209].  
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como uma espécie de adequação ao modo de produção, às suas leis econômicas.  
A troca de equivalentes no modo de produção capitalista se mantém ilesas na  
exploração do trabalho. Marx reafirma constantemente esta realidade econômica nos  
seus debates com os socialistas e indiretamente também com políticos social-  
democratas (cf. MARX, 2012) , que insistem em tratar dos problemas sociais advindos  
deste sistema a partir do jargão da justiça. Já nos Grundrisse (2011b) Marx trata com  
muita clareza desse ponto de partida da sua análise, a qual deve, portanto, ir para  
além desses termos: Temos de supor aqui que é pago o salário economicamente  
justo, i.e., o salário determinado pelas leis gerais da economia.” (MARX, 2011b, p.  
349)13. Mesmo que haja a possibilidade e a tendência de injustiças concretas no  
pagamento de um salário menor que o valor da força de trabalho, diz Marx (cf. MARX,  
2011b, p. 349), acusar esta injustiça não tem em si o poder de transformar as relações  
de exploração, que se mantêm intactas mesmo com o pagamento justo do salário. Em  
resumo, como Marx apresenta em “Para a crítica da economia política” (MARX, 2010):  
O capitalista paga ao trabalhador um equivalente pelo valor diário da sua capacidade  
laboral; mas ele recebe por isso o direito de valorizar a capacidade laboral para além  
do seu valor14 (MARX, 1990, p. 164)15. Esta ideia é apresentada também em Salário,  
preço e lucro (MARX, 1982) de uma maneira intencionalmente mais didática:  
Dentro do sistema do salariado, o valor da força de trabalho se fixa  
como o de outra mercadoria qualquer; e, como distintas espécies de  
força de trabalho possuem distintos valores ou exigem para a sua  
produção distintas quantidades de trabalho, necessariamente tem que  
ter preços distintos no mercado de trabalho. Pedir uma retribuição  
igual ou simplesmente uma retribuição justa, na base do sistema do  
salariado, é o mesmo que pedir liberdade na base do sistema da  
escravatura. O que pudésseis considerar justo ou equitativo não vem  
ao caso. O problema está em saber o que vai acontecer necessária e  
inevitavelmente dentro de um dado sistema de produção (MARX,  
1982b, p. 160161)16.  
Aquilo que é correto depende justamente dos critérios, que são, como Marx  
afirma em diversas passagens, dependentes do contexto, em especial do modo de  
produção material da vida em uma determinada sociedade. Um dos trechos mais  
13 [MEW 42, p. 340].  
14  
Tradução livre de: Der Kapitalist zahlt dem Arbeiter ein Äquivalent für den täglichen Wert seines  
Arbeitsvermögens; aber er erhält dafür das Recht, das Arbeitsvermögen über seinen eignen Wert hinaus  
zu verwerten.  
15  
Trata-se aqui dos manuscritos de 1861 a 1863, que compõem o “Terceiro capítulo – O capital em  
geral” do Para a crítica da economia política. Existe uma versão traduzida deste texto (vide MARX,  
2010). Eu utilizo, contudo, a versão original da MEW 43, por não ter acesso a essa tradução.  
16 [MEW 16, p. 131-132].  
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O conceito de “justiça” em Marx: seus elementos, contextos e debates  
citados neste ponto é extraído do livro III d’O Capital, como a seguir:  
A justiça das transações que se efetuam entre os agentes da produção  
baseia-se na circunstância de se originarem das relações de produção  
como consequência natural. As formas jurídicas em que essas  
transações econômicas aparecem como atos de vontade dos  
participantes, como expressões de sua vontade comum e como  
contratos cuja execução pode ser imposta à parte individual por meio  
do Estado não podem, como simples formas, determinar esse  
conteúdo. Elas apenas o expressam. Esse conteúdo é justo contanto  
que corresponda ao modo de produção, que lhe seja adequado. É  
injusto, assim que o contradisser. A escravatura, na base do modo de  
produção capitalista, é injusta; da mesma maneira a fraude na  
qualidade da mercadoria (MARX, 1986, p. 256)17.  
As comparações históricas do modo de produção capitalista com o sistema  
servil ou escravocrata são exploradas em diversos momentos por Marx, não somente  
como forma de exemplificar as especificidades do atual momento, mas também  
desnaturalizar ou seja, relativizar – o “estado atual” (cf. MARX, 1985a; MARX;  
ENGELS, 1962). A citação acima não deixa dúvida de que Marx entende “justiça” como  
uma forma de adequação a um dado contexto. Esta é uma característica central do  
conceito de justiça em Marx: sua forma relacional e situada em um contexto histórico  
mesmo naqueles contextos que entendem a si mesmos como naturais, absolutos e  
universais.  
Outro elemento que aparece nas últimas passagens citadas é a relação entre a  
“justiça” e o “jurídico”. Esta relação não é óbvia, ainda mais se pensada a partir do  
debate contemporâneo em teoria da justiça (cf. GARGARELLA, 2008), portanto da  
perspectiva de uma filosofia política normativa, que pretende apresentar uma  
concepção moral abrangente e independente de determinações do direito e de suas  
categorias. Também por este motivo os termos do debate sobre “justiça em Marx” se  
apresentam com alguns enviesamentos conceituais. De todo modo, em Marx essa  
relação entre a “justiça” e o “direito legítimo” – mesmo que contra legem, como em  
Proudhon (cf. MARX, 1985a; MARX; ENGELS, 1962) faz parte da sua definição de  
justiça, o que aponta para um sentido bem mais restrito que o atual conceito de justiça  
apresenta. Um exemplo dessa relação é a passagem extraída do livro I d’O Capital, e  
já citada mais acima, sobre a “justiça eterna” de Proudhon, a qual é redigida justamente  
como uma nota de rodapé ao trecho no qual Marx comenta as categorias e formas  
jurídicas que formam as ficções presentes no funcionamento do intercâmbio de  
17 [MEW 25, p. 351-352].  
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mercadorias como o reconhecimento da propriedade da mercadoria, a relação  
jurídica através do contrato e o respeito à manifestação de vontade dos indivíduos ,  
cujo conteúdo “é dado por meio da relação econômica mesma(MARX, 1996b, p.  
209)18. Além disso, Marx, em diversas passagens ou opõe a “injustiça” (Unrecht) ao  
“justo / jurídico / legítimo” (Recht), ao “correto”, ou assemelha este mesmo “Recht” à  
“justiça” e ao “justo” (gerecht). “Finalmente, daí é deduzido o eterno direito do capital  
aos frutos do trabalho alheio, ou, melhor dizendo, seu modo de aquisição é  
desenvolvido a partir das leis simples e “justas” da troca de equivalentes” (MARX,  
2011b, p. 414)19. No livro I d’O Capital está presente, no mesmo sentido da citação  
dos Grundrisse acima, a versão publicada da mesma ideia, empregando o termo “justo”  
(desta vez sem as aspas) em relação direta ao jurídico20, ao direito legítimo.  
A mais-valia é sua propriedade, ela jamais pertenceu a outro. [...] Que,  
dessa vez, esse fundo se origina do trabalho não-pago de seus  
trabalhadores, não altera absolutamente nada na coisa. Se o  
trabalhador B é ocupado com a mais-valia que o trabalhador A  
produziu, então, primeiro, A forneceu essa mais-valia sem que se  
tenha deduzido um real do justo preço de sua mercadoria, e, segundo,  
B não tem absolutamente nada a ver com esse negócio. O que B exige  
e tem direito de exigir é que o capitalista lhe pague o valor de sua  
força de trabalho (MARX, 1996a, p. 219, grifos meus)21.  
Na contramão da filosofia prática moderna, a concepção de “justiça” em Marx  
não se apresenta como um “dever-ser” apartado da realidade social, mas sim como  
vinculada a esta realidade material. Por este motivo, o ideal de justiça, segundo Marx,  
está estreitamente conectado às “leis econômicas” e às categorias jurídicas que  
outorgam legitimidade leia-se “justiça” – a esta estrutura de exploração do trabalho.  
Nas Glosas marginais ao Manual de economia política de Adolph Wagner (2017) Marx  
comenta o fato de que “no valor não ‘constituídopelo trabalho do capitalista está  
incluída uma parte da qual ele pode se apropriar legalmente, isto é, sem ferir o direito  
correspondente ao intercâmbio de mercadorias(MARX, 2017, p. 256)22. Neste  
sentido, “exploração” e “injustiça” fazem parte, para Marx, de dois registros diferentes  
de crítica.23 Por isso, o esforço em se responder à pergunta sobre se “Marx critica o  
18 [MEW 23, p. 99].  
19 [MEW 42, p. 412].  
20 Este é também o entendimento de Allen Wood: “The concept of justice [...] is in the Marxian account  
the highest expression of the rationality of social facts from the juridical point of view” (WOOD, 1980,  
p. 13).  
21 [MEW 23, p. 612].  
22 [MEW 19, p. 360].  
23 É importante ressaltar, novamente, para evitar equívocos, que esta conceituação teórica e restrita de  
“justiça” em Marx não coincide com o uso da noção de “justiça” nos contextos teóricos e concretos  
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O conceito de “justiça” em Marx: seus elementos, contextos e debates  
capitalismo como injusto?” (cf. GERAS, 2018) só seria possível se se ampliasse o  
conceito de justiça para além daquele empregado pelo próprio Marx. A proposta do  
presente artigo não consiste em tomar posição sobre a pertinência desta questão, mas  
sim em compreender, neste primeiro momento, qual o significado do conceito de  
justiça para Marx.  
Em síntese, analisando as ocorrências da “justiça” em Marx, entendo que ela  
não pode ser compreendida como um conceito positivo postulado por ele, mas sim  
como um termo na versão restritiva de Marx, como adequação ao direito legítimo  
em um determinado modo de produção manejado usualmente de forma equivocada  
quando tratado como uma verdade imutável (como entre alguns socialistas e na  
economia política) ou um conceito que limita a reflexão e o horizonte da prática  
transformadora (no caso do debate com os socialistas, com os partidários da recém  
criada social-democracia alemã ou com as organizações políticas de trabalhadores).  
Sendo assim, o impulso do debate sobre “justiça” em Marx é externo e condicionado  
por sua intenção crítica.  
O termo “justiça distributiva”, por exemplo, é tematizado por Marx por ocasião  
do emprego deste conceito no projeto político do Programa de Gotha. Desse modo, a  
Crítica do programa de Gotha (MARX, 2012) é um dos principais textos em que Marx  
discute o conceito de justiça, mesmo que não haja, a meu ver, nenhuma novidade no  
sentido de justiça neste texto, se comparado aos elementos dos textos mais antigos  
já mencionados.24 De todo modo, a citação de um trecho deste texto é válida, pela  
síntese que produz do debate:  
O que é distribuição “justa”?  
Os burgueses não consideram que a atual distribuição é “justa”? E  
não é ela a única distribuição “justa” tendo como base o atual modo  
de produção? As relações econômicas são reguladas por conceitos  
jurídicos ou, ao contrário, são as relações jurídicas que derivam das  
relações econômicas? Os sectários socialistas não têm eles também  
as mais diferentes concepções de distribuição “justa”?  
contemporâneos. Em tais contextos, a crítica à “injustiça da exploração” parte de um significado mais  
abrangente do termo, seja pela influência da filosofia kantiana nas teorias da justiça (cf. GARGARELLA,  
2008; RAWLS, 1999), seja pelo uso amplo e indiscriminado da acusação de “injustiça” nos contextos  
concretos da luta política da classe trabalhadora (cf. DÖRRE, 2017; DUBET, 2014; SIMIM, 2023), o que  
proporciona o uso frequente da denúncia, por exemplo, à “exploração injusta”.  
24  
Com a ressalva do slogan frequentemente citado – “De cada um segundo suas capacidades, a cada  
um segundo suas necessidades!” (MARX, 2012, p. 32) que aparece como artifício teórico de crítica à  
justiça distributiva pelo prisma de uma sociedade emancipada, comunista, pois “[...] apenas então o  
estreito horizonte jurídico burguês poderá ser plenamente superado(MARX, 2012, p. 32). [MEW 19,  
p. 21]  
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Para saber o que, nesse caso, deve-se entender pela fraseologia  
“distribuição justa”, temos de justapor o primeiro parágrafo ao  
segundo. Neste, supõe-se uma sociedade em que “os meios de  
trabalho são patrimônio comum e o trabalho total é regulado  
cooperativamente”, enquanto, no primeiro parágrafo, temos que “o  
fruto do trabalho pertence inteiramente, com igual direito, a todos os  
membros da sociedade”. “A todos os membros da sociedade”?  
Também aos que não trabalham? Como fica, então, o “fruto integral  
do trabalho”? Ou apenas aos membros da sociedade que trabalham?  
Nesse caso, como fica “o igual direito” de todos os membros da  
sociedade? (MARX, 2012, p. 2728)25.  
De modo geral, a obra de Marx deixa, com o tempo, de criticar a “justiça eterna”  
na filosofia jovem-hegeliana e socialista, para levantar objeções contra adoção do  
conceito de justiça presente na economia política e nas demandas políticas, mantendo,  
contudo, os mesmos objetivos teóricos, ainda que os oponentes e os temas variem.  
Assim, ele se dedica igualmente a explicitar, sem equívocos, quais objetivos a prática  
política deveria se colocar: a saber, para além da “correção”, da justa adequação, o  
objetivo da transformação do modo de produção no sentido da emancipação humana.  
Em Salário, preço e lucro (MARX, 1982b), Marx comenta a importância da luta pelas  
melhorias nas condições de trabalho sobretudo no aumento de salário , mas alerta  
que a classe trabalhadora “não deve esquecer-se de que luta contra os efeitos, mas  
não contra as causas desses efeitos”, pois com as melhorias ela “aplica paliativos, mas  
não cura a enfermidade” e, portanto, “em vez do lema conservador de: Um salário  
justo para uma jornada de trabalho justa!, deverá inscrever na sua bandeira esta divisa  
revolucionária: Abolição do sistema de trabalho assalariado!’” (MARX, 1982b, p.  
184)26.  
Apesar de já mencionado acima, vale ressaltar o caráter ideológico da “justiça”,  
na acepção empregada por Marx, no interior da sociedade burguesa (MAIHOFER,  
1992; MARX; ENGELS, 1977, p. 480). A “justiça”, neste sentido, seria um ideal  
condicionado pela estrutura material da sociedade, que possuiria uma função na  
manutenção desta mesma sociedade e que encontraria, apesar de “ideológica”, uma  
realidade objetiva, cuja transformação não depende somente de uma tomada de  
consciência, mas também da prática revolucionária. Em A guerra civil na França  
(2011a) Marx comenta, em uma das ocorrências do termo “justiça” em sua obra, em  
que medida essa ideologia se desestabiliza em momentos de tensão na luta de classes:  
“a civilização e a justiça da ordem burguesa aparecem em todo o seu pálido esplendor  
25 [MEW 19, p. 18].  
26 [MEW 16, p. 150].  
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O conceito de “justiça” em Marx: seus elementos, contextos e debates  
sempre que os escravos e os párias dessa ordem se rebelam contra seus senhores.  
Então essa civilização e essa justiça mostram-se como uma indisfarçada selvageria e  
vingança sem lei(MARX, 2011a, p. 72)27.  
Para além do valor de sua análise conjuntural histórica, esta passagem sugere  
algo presente em boa parte da crítica da economia política marxiana, a saber, o fato  
de que, por trás da relação justa entre portadores de mercadoria que trocam  
equivalentes através do contrato, um ato formalmente volitivo, individual e livre, ou  
seja, por trás da justiça das transações se oculta, de modo constitutiva, a força e a  
violência.28 Neste sentido, o termo “justiça” traz implicitamente uma concepção de paz  
social e harmonia, que é própria da imagem de mundo da sociedade burguesa.  
Assim, um aspecto relevante na crítica de Marx à concepção de justiça se  
encontra justamente em seu caráter ideológico e, portanto, determinado pelas  
condições materiais. Isso significa que a crítica moralizante ao capitalismo, embasada  
no conceito de justiça, é insuficiente, limitadora e falseadora, na medida em que abdica  
de uma análise das condições objetivas (SARTORI, 2022). Em uma passagem das  
Glosas marginais ao Manual de economia política de Adolph Wagner (MARX, 2017)  
Marx reafirma, por um lado, a “justa” e legítima apropriação do mais-valor pelo  
capitalista, apontando, contudo, em oposição à crítica moralizante, a existência de uma  
dimensão objetiva do mecanismo de valorização do valor:  
Ora, em minha apresentação, de fato, o ganho do capital não é  
"apenas uma subtração ou um 'roubo' do trabalhador". Pelo contrário,  
apresento o capitalista como funcionário necessário da produção  
capitalista e demonstro bem extensamente que ele não apenas  
"subtrai" ou "rouba", mas arranca à força a produção do mais-valor,  
ou seja, ajuda primeiro a criar aquilo a ser subtraído; demonstro  
detalhadamente, ainda, mais adiante, que mesmo sendo o caso de que  
no intercâmbio de mercadorias são trocados apenas equivalentes, o  
capitalista desde que pague ao trabalhador o valor efetivo de sua  
força de trabalho ganharia com todo direito, ou seja, com o direito  
correspondente a esse modo de produção, o mais-valor (MARX, 2017,  
27 [MEW 17, p. 355].  
28  
Na citação apresentada esta violência se manifesta nas ações do aparato estatal da sociedade  
burguesa na manutenção da ordem. Contudo a análise de Marx sobre o fundamento do Capital  
demonstra justamente como que por trás de uma ficção da economia política clássica se encontra, na  
verdade, um ato violento de expropriação, uma violência necessária para cindir os produtores de seus  
meios de produção e criar trabalho “livre”, no duplo sentido da palavra. Trata-se da violência necessária  
na criação de trabalhadores assalariados e para disciplina-los para esta nova atividade , além de ter  
sido necessária também na “assim chamada acumulação primitiva” (cf. MARX, 1996a). Mesmo que a  
análise de Marx da expropriação seja situada historicamente (cf. MARX, 1987), sua dinâmica real como  
um ato de violência é exemplificativa do funcionamento do capital em sua constituição e, segundo Rosa  
Luxemburgo, também em sua expansão histórica (LUXEMBURG, 2013). Uma versão atualizada e mais  
contemporânea desta tese se encontra, por exemplo, em David Harvey (2005) e em Klaus Dörre (2012).  
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p. 256)29.  
Desse modo, é como se na crítica moral à injustiça levantada pelos socialistas  
o modo de produção não figurasse como um problema central, mas sim uma simples  
forma de apropriação indevida, “inapropriada” (MARX, 2017, p. 277)30, pelo  
capitalista, sem se perceber a objetividade do funcionamento do sistema capitalista.  
Em um dos anexos sobre a economia vulgar e o socialismo vulgar no Teorias do mais-  
valor, Marx formula de forma suscinta mais uma vez seu desinteresse pela “justiça”  
frente à importância do movimento real do capitalismo. Conforme esta passagem, o  
processo de produção é visto como um instrumento para “pescar trabalho alheio” e  
“não importa que se ache isso justoou injusto, com ou sem fundamento. Aí  
pressupõe-se e subentende-se sempre a relação do capitalista com o trabalhador”  
(MARX, 1985b, p. 1495)31. Como já mencionado, o objetivo de fazer uma análise da  
realidade efetiva do modo de produção capitalista relega às manifestações culturais,  
políticas e sociais um caráter secundário. O direito e, por conseguinte, a “justiça”  
pensada a partir de sua racionalidade, pertence a esta ordem de fenômenos, como  
lembra Marx no prefácio de Para a crítica da economia política (MARX, 1982a), algumas  
linhas acima da conhecida citação sobre a relação entre “base” e “superestrutura”  
(1982a, p. 25), que as “relações jurídicas, tais como formas de Estado, não podem ser  
compreendidas nem a partir de si mesmas, nem a partir do assim chamado  
desenvolvimento geral do espírito humano, mas, pelo contrário, elas se enraízam nas  
relações materiais de vida [...]” (MARX, 1982a, p. 25).  
Essa primazia da realidade objetiva que marca o materialismo de Marx tem  
como ponto de partida o modo de produção enquanto o motor da história. A relação  
entre as diferentes esferas da economia, um tema constante na obra de Marx, tem  
consequências teóricas importantes para a abordagem da “justiça” – ou melhor, para  
a recusa da abordagem enfática deste tema. Na Introdução para a crítica da economia  
política (MARX, 1982a) Marx debate com os “representantes” e os “inimigos” da  
economia política e se posiciona claramente contra a cisão operada por estes entre as  
esferas da produção e da distribuição, contra a ideia de que “[...] a distribuição é uma  
esfera independente, autônoma, que existe ao lado da produção” (MARX, 1982a, p.  
29 [MEW 19, p. 359].  
30 [MEW 19, p. 382].  
31 [MEW 26 (3), p. 446]. Para evitar equívocos, reproduzo aqui este trecho na sua versão original: “Dies  
mag als ‚Recht‘ oder ‚Unrecht‘, begründet oder unbegründet, verhandelt werden, das Verhältnis des  
Kapitalisten zum Arbeiter ist hier immer unterstellt und untergedacht.“ (MARX, 1968, p. 446).  
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O conceito de “justiça” em Marx: seus elementos, contextos e debates  
7). Ele critica sobretudo a tendência dos economistas em pensar a esfera da  
distribuição como ponto de partida da economia, como se o que determinasse a  
produção fosse a distribuição de recursos, ao invés de enxergar essas duas esferas  
como momentos de uma unidade (MARX, 1982a, p. 7). Isso porque a distribuição  
aparece aos indivíduos de forma imediata e parece determinar a sua posição na esfera  
da produção. Ou seja, segundo este pensamento da economia vulgar, a economia é  
compreendida do mesmo modo que ela apareceria para os indivíduos: seria a  
disposição sobre certos recursos, como determinadas ferramentas, instrumentos de  
produção, conhecimentos ou propriedade ou a ausência desses recursos que  
determinaria a posição dos indivíduos na esfera da produção como agricultor, como  
trabalhador, como capitalista etc. Portanto, conforme esta forma de pensar, seria a  
distribuição o momento determinante, como se o modo de produção se escravocrata,  
feudal, capitalista, se agrário ou industrial32 não tivesse relação com a distribuição  
de bens e recursos. Nesse sentido, a distribuição é vista como historicamente  
condicionada, enquanto a produção é naturalizada, como se não houvesse variação  
entre seus diferentes modos na história. Nas palavras de Marx, “aqui ressurge  
novamente o absurdo dos economistas que consideram a produção como uma verdade  
eterna, enquanto proscrevem a História ao domínio da distribuição33 (MARX, 1982a,  
p. 12)34. O resultado prático deste pensamento é a naturalização do modo de produção  
32  
Estes exemplos do caráter histórico e determinante do modo de produção estão no próprio Marx:  
“Pelo próprio processo de produção convertem-se de fatores espontâneos em fatores históricos e se,  
em relação a um período, aparecem como pressuposição natural à produção, em relação a outro  
constituem seu resultado histórico. No interior da produção são constantemente transformados. O  
emprego da máquina, por exemplo, modifica a distribuição dos instrumentos de produção tanto como  
dos produtos, e até a grande propriedade fundiária moderna é resultado tanto do moderno comércio  
como da indústria moderna, como também da aplicação desta à agricultura(MARX, 1982a, p. 12).  
[MEW 13, p. 628].  
33  
Em outra citação, um pouco mais longa e completa, Marx detalha melhor seu argumento: “Mas isso  
ainda não é tudo o que, efetivamente, preocupa os economistas nesta parte geral. Trata-se, antes, de  
representar a produção veja por exemplo Mill diferentemente da distribuição, como regida por leis  
naturais, eternas, independentes da História; e nessa oportunidade insinuam-se dissimuladamente  
relações burguesas como leis naturais, imutáveis, da sociedade in abstrato. Essa é a finalidade mais ou  
menos consciente de todo o procedimento. Na distribuição, ao contrário, os homens permitir-se-iam,  
de fato, toda classe de arbitrariedade. Abstraindo a brutal disjunção da produção e da distribuição, e  
de sua relação efetiva, e de todo evidente, à primeira vista, que por diversificada que possa ser a  
distribuição nos diferentes graus da sociedade, deve ser possível tanto nesta como na produção buscar  
determinações comuns, do mesmo modo que é possível confundir e extinguir todas as diferenças  
históricas em leis geralmente humanas. O escravo, o servo, o operário assalariado, por exemplo,  
recebem todos uma quantia de alimentos que lhes permite existirem como escravo, servo, operário  
assalariado. Enquanto vivam, o conquistador de tributo, o funcionário de impostos, o proprietário  
fundiário da renda, o frade de esmolas, e o levita dos dízimos, todos recebem uma cota da produção  
social, cota que é determinada por leis distintas da dos escravos etc.” (MARX, 1982a, p. 56). [MEW  
13, 618-619]  
34 [MEW 13, p. 628]  
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capitalista e o deslocamento do debate e das possibilidades de transformação para a  
esfera da distribuição, na qual figura, portanto, a concepção de “justiça”. A “justiça  
distributiva”, portanto, não se questiona sobre a origem dos bens a serem distribuídos,  
mas se resume a pensar a depender de sua corrente em formas mais igualitárias,  
equitativas, eficientes, racionais etc. de alocação de recursos. Este é um dos motivos  
pelos quais Marx crítica mais tarde a “justiça das transações” e a “justiça distributiva”,  
nas passagens já citadas mais acima, extraídas respectivamente do Livro III do Capital  
(MARX, 1986) e da Crítica do programa de Gotha (MARX, 2012).  
Apesar de haver, para Marx, uma clara prevalência da esfera produtiva, ele deixa  
claro que não se trata aqui de ignorar a distribuição, o que seria pressupor uma cisão  
entre essas dimensões. Para ele as relações de distribuição não passam de relações  
de produção sob outro aspecto” (MARX, 1985b, p. 1111)35, elas se constituem,  
portanto, em um momento no funcionamento do capitalismo. Não se trata aqui de  
afirmar que “a produção, a distribuição, o intercâmbio, o consumo, são idênticos, mas  
que todos eles são elementos de uma totalidade, diferenças dentro de uma unidade”  
(MARX, 1982a, p. 13)36. Com o foco na distribuição, a “justiça” abdica de compreender  
e transformar o conteúdo das relações econômicas, se limitando a refletir sobre uma  
de suas expressões, sobre um momento, sobre a aparência desta realidade (cf.  
SARTORI, 2017).  
3. Considerações finais  
A intenção deste artigo foi oferecer um panorama dos elementos centrais  
presentes na definição de “justiça” na obra de Marx. Não importou, neste primeiro  
momento, a classificação e interpretação das passagens sobre o tema de acordo com  
as diferentes fases do pensamento de Marx, apesar de um recorte temporal mais  
restrito poder ser relevante no aprofundamento do debate.  
A partir deste sobrevoo na obra de Marx, pode-se, como tratado no item acima,  
encontrar as seguintes condicionantes e elementos centrais na sua conceituação de  
justiça: quanto aos termos do debate, (i) “justiça” vem como provocação externa. A  
análise das ocorrências dos termos “justiça”, “injustiça”, “justo” e “injusto” em Marx  
demonstra que boa parte desses termos se manifestam nas citações que Marx faz de  
outros autores. Salvo as poucas e conhecidas passagens, Marx parece evitar usar o  
35 [MEW 26 (3), p. 51]  
36 [MEW 13, p. 630]  
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O conceito de “justiça” em Marx: seus elementos, contextos e debates  
conceito de “justiça” de um modo positivo (cf. HAUG, 1986). Os (ii) debates são  
travados sobretudo com os “socialistas” – sejam os franceses, os utópicos, vulgares  
ou os de cátedra , com os representantes da economia política clássica e vulgar, bem  
como em discussões sobre a prática política de organizações como partido político e  
sindicato.  
Quanto ao status da “justiça” em geral, para Marx, (iii) as comparações com  
outras épocas e contextos históricos sugerem que “justiça” seria relativa, seria uma  
adequação a um determinado estado de coisas. Em todo caso, (iv) a compreensão e a  
crítica da “justiça” só podem advir de uma análise da objetividade, uma vez que Marx  
adota uma perspectiva materialista. Além disso, (v) tratar dos fenômenos sociais,  
econômicos, políticos e históricos em termos de “justiça” consistiria em moralizar  
relações que são, na verdade, objetivas e materiais. Portanto, a crítica social deve partir  
desta realidade efetiva.  
Mais especificamente quanto à crítica de Marx ao capitalismo mesmo que ele  
sugira que alguns desses aspectos seriam transversais , (vi) em sua obra, o problema  
central do conceito de “justiça” passa pela sua adequação à ordem burguesa, sua  
função ideológica; (vii) enquanto ideologia, a “justiça” defendida por seus oponentes  
apresenta a ficção de serem naturais, universais, eternas e necessárias ou um estágio  
de evolução necessário e mais avançado, por isso a comparação constante, tanto de  
Marx quanto de seus oponentes, com a escravidão e a servidão categorias que, na  
verdade, são sociais, historicamente condicionadas e relativas. Outro aspecto  
significante é a (viii) correspondência da “justiça” a uma forma de racionalidade  
especificamente jurídica, portanto própria do direito, sendo que o direito pode ser  
visto – nessas passagens em que Marx trata da “justiça” – como um epifenômeno das  
leis gerais da economia, da base material. Tal base material (ix) não pode ser  
totalmente apreendida a partir da esfera da distribuição, como sugerem as análises  
econômicas clássicas, mas sim a partir da esfera da produção, do modo de produção  
material da sociedade capitalista, que tem uma prevalência na análise de Marx frente  
aos outros momentos na economia, de tal modo que a justiça distributiva ou nas  
transações pode ser criticada no mínimo como parcial, incompleta e, nesse sentido,  
falsa (cf. DEMIROVIĆ, 2017).  
Neste sentido, apesar de ser possível que Marx possua critérios normativos em  
sua análise crítica, sejam eles trans-históricos ou não, seja liberdade, a emancipação,  
a solidariedade, a necessidade, seja a realização da natureza humana no trabalho, o  
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ideal do comunismo, seja a sociedade sem classes , esse padrão não pode ser  
conceituado, para ele, como “justiça”. Essa vinculação só seria possível se  
transpusermos o conceito de justiça da filosofia política contemporânea para as  
contribuições teóricas da análise de Marx, à revelia de sua própria definição.  
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Como citar:  
SIMIM, Thiago Aguiar. O conceito de “justiça” em Marx: seus elementos, contextos e  
debates. Verinotio, Rio das Ostras, v. 29, n. 1, pp. 412-432; jan.-jun., 2024  
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