RESENHA  
DOI 10.36638/1981-061X.2024.29.1.719  
Continuando com o direito insurgente  
Resenha:  
PAZELLO, Ricardo Prestes. Direito insurgente: para uma crítica marxista  
ao direito. Rio de Janeiro: Lumen Juris, v. 1, 2021.  
Marina Marques de Sá Souza*  
Em meados de julho de 2021, Guilherme Cavicchioli Uchimura e Pedro Pompeo  
Pistelli Ferreira escreveram Retorno ao Direito Insurgente, por ocasião do lançamento,  
em maio do mesmo ano, do primeiro volume da obra de Ricardo Prestes Pazello,  
intitulado Direito insurgente: para uma crítica marxista ao direito. Desde então, alguns  
eventos separam a publicação do livro do verão de 2024, como o acirramento das  
contradições do capital à época da pandemia do coronavírus, conflitos geopolíticos e  
o retorno de um governo progressista no Brasil. Se “é próprio de cada retorno nunca  
se encontrar a mesma totalidade de coisas fixadas” (Uchimura; Ferreira, 2021, p. 390),  
como advertiram aqueles autores, é certo que as formulações de Pazello, calcadas no  
materialismo-histórico, continuam sendo bússola a orientar a compreensão da  
totalidade orgânica e concreta sob a qual erige o sistema capitalista.  
Professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e integrante do Bloco de  
Samba Boca Negra, Ricardo Pazello tem uma trajetória consolidada na produção  
teórica dedicada à crítica marxista ao direito e ao giro descolonial. Fazendo jus à sua  
biografia, o autor reflete em suas incursões as virtudes que o compõem: a forma  
jurídica é pensada por meio da poesia de Manoel de Andrade, escolhida para epigrafar  
o livro; da música popular, embalado por “O malandro”, de Chico Buarque (Pazello,  
2019), ou pelas canções latino-americanas que interpreta, sempre acompanhado de  
um violão; e mesmo por meio do futebol nacional (Pazello; Almeida; D’Carmo, 2023),  
mirado desde o ponto de vista da teoria da dependência.  
Apesar de suas características particulares, que singularizam os seus escritos,  
* Professora e advogada. Mestra em Direito pela Universidade Estadual do Norte do Paraná (UENP), pós-  
graduada em Filosofia e Direitos Humanos (PUC/PR) e doutoranda em Direito Ecológico e Direitos  
Humanos  
pela  
Universidade  
Federal  
de  
Santa  
Catarina  
(UFSC).  
E-mail:  
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o pesquisador militante registra que a obra, resultado da tese de doutoramento, é  
fruto de um projeto de compartilhamento coletivo. Escrito na primeira pessoa do plural,  
o livro reflete a sua gestação, que se deu em meio às discussões no Grupo Temático  
“Direito e Marxismo” do IPDMS (Instituto de Pesquisa Direitos e Movimentos Sociais),  
coordenado também por ele. Mas não só. Na melhor convergência entre marxismo e  
luta popular, pressupostos da refundação da crítica jurídica brasileira, o professor  
curitibano é também coordenador do Movimento de Assessoria Jurídica Universitária  
Popular MAJUP Isabel da Silva/UFPR. Pesquisa, ensino e extensão integram o  
quefazer pedagógico de Pazello rumo à compreensão do fenômeno jurídico,  
equalizando no direito insurgente às ondas sonoras do uso tático do direito e do seu  
necessário definhamento.  
Para a compreensão do direito sob o signo da insurgência, entendida como “o  
vínculo que torna possível o contato entre reivindicações e contestações e, portanto  
entre direito e movimentos populares” (Pazello, 2021, p. 36), o autor divide sua  
exposição, tão somente para fins didáticos, porquanto complementares, entre crítica  
marxiana e crítica marxista ao direito.  
No primeiro capítulo, a análise recai sobre o entendimento de Marx acerca do  
jurídico. Metodologicamente, o direito é compreendido considerando “a totalidade  
concreta na qual se insere, a historicidade categorial que representa e, sob uma  
linguagem dialética, o movimento que desenvolve entre a aparência do fenômeno e  
sua essência” (Pazello, 2021, p. 35). Para tanto, são manejados textos em que Marx  
enfrentou a problemática jurídica, dentre eles, Sobre a questão judaica, Crítica do  
Programa de Gotha e O capital.  
Naquela que foi a obra máxima e definitiva do autor alemão, O capital, Pazello  
elencou mais de 700 oportunidades em que Marx se debruçou sobre a ideia de direito  
e legalidade, resultando em um mapa conceitual dos cinco sentidos em que o jurídico  
pode ser concebido contrariando, portanto, entendimentos que negligenciam a  
contribuição de Marx para o trato da “matéria das leis” (Pazello, 2021, p. 52). Da  
pluralidade de sentidos atribuídos à forma jurídica, Pazello a organiza em formas  
aparentes (lei e decisão judicial) e transitivas (moral e regulação privada), que são  
atreladas à forma fundante (relação econômica) e que têm na especificidade da  
garantia da circulação de mercadorias, entre sujeitos equivalentes, a sua forma  
essencial. As intersecções dos sentidos do direito evidenciam, segundo o autor, duas  
coisas: “de um lado, a função não negligenciável das legislações, de outro, a íntima  
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vinculação entre o processo de produção econômica e as relações jurídicas” (Pazello,  
2021, p. 86).  
Esta conclusão, a propósito, só é possível quando compreendida a forma  
jurídica como decorrência da análise do valor, empreitada didaticamente explorada por  
Pazello. Pela teoria do valor como relação social, entende-se que o trabalho abstrato  
“expressa a forma social do valor que aparece na superfície dos fenômenos sociais  
como valor de troca. É quando uma troca se realiza entre pessoas individualizáveis  
que se pode estabelecer a gênese lógica do direito”, pressuposto que será  
aprofundado posteriormente por Pachukanis (Pazello, 2021, p. 58). É do trabalho  
como fonte de explicação do valor que se extrai uma das interpretações que  
fundamentam o direito insurgente, a saber, a luta pela limitação e redução da jornada  
de trabalho. A defesa dos postulados legais que limitam a exploração da mercadoria  
força trabalho pelos operários manifesta-se, a um só tempo, como “proteção dos  
trabalhadores” e como “concentração do capital com a generalização da indústria”  
(Pazello, 2021, p. 80) um uso tático, portanto, do direito, mas compreendendo o  
seu limite no contexto da legalidade burguesa.  
Outros dois textos compõem o arsenal teórico em que Marx confronta o  
fenômeno jurídico, rechaçando a sua atemporalidade, porque direito burguês, mas  
reconhecendo o seu uso, ainda que no estreito horizonte jurídico da sociedade  
capitalista. Em Sobre a questão judaica, Marx não rejeita completamente a  
emancipação política (e sua luta por direitos) dos judeus, dada ser a única emancipação  
possível dentro da ordem, mas assinala que esta distinta, portanto, de uma  
emancipação humana é própria do estado completo, “que pressupõe a liberdade  
religiosa, assim como a liberdade proprietária” (Pazello, 2021, p. 98).  
Já na Crítica do Programa de Gotha, no bojo na tentativa de unificação dos  
partidos operários alemães a Associação Geral dos Trabalhadores Alemães (ADAV)  
e o Partido Social-Democrata dos Trabalhadores (SDAP) o autor alemão distingue  
um período político de transição, caracterizado pela ditadura revolucionária do  
proletariado, e o comunismo propriamente dito (Pazello, 2021, p. 101). Trata-se do  
direito “potencialmente extinguível ainda que remanescente na transição  
revolucionária” (Pazello, 2021, p. 103).  
Das leituras sobre a participação da forma jurídica na totalidade de reprodução  
do capital, Pazello conclui pela indissociabilidade entre a crítica à sociedade concreta  
e a transição que torna possível superar esta mesma sociedade. Ainda que com os  
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“limites de toda e qualquer reivindicação dentro da ordem” (Pazello, 2021, p. 104),  
combates ordinários, como a movimentação operária do século XIX, aguçam o que está  
para além da sociedade fundada no modo de produção capitalista. Eis a convergência  
entre a classe trabalhadora e o projeto político revolucionário, que inaugura o debate  
sobre os movimentos sociais ou populares e que encerra a primeira parte da pesquisa  
do autor de Direito insurgente.  
O segundo capítulo é dedicado à crítica marxista ao direito, desde a tradição  
dos seguidores de Marx. Verticalmente, trata-se da busca por respostas à pergunta  
sobre “o que é direito”; horizontalmente, a visualização da trajetória da crítica jurídica  
marxista na Europa. A análise é tida, ainda, como interna ou externa ao campo do  
jurídico. A pesquisa situa-se na crítica ao direito externa, portanto, posto que  
reconhece os limites e imperfeições do campo jurídico e pugna pela sua ultrapassagem  
histórica.  
O direito continua sendo interpretado por Pazello, é bom dizer, à luz da crítica  
das relações sociais, mas lastreado pela sua inserção na luta de classes: “os  
movimentos sociais não apenas são formas sociais que ganham sua plenitude com a  
sociedade capitalista, mas também implicam necessariamente reivindicações de  
direitos (por certo, direitos de estreito horizonte burguês) e, daí, um uso político do  
jurídico” (Pazello, 2021, p. 139). Trata-se de um uso tático do direito, porque se  
vincula a um projeto anticapitalista, em contraposição a um uso estratégico, que faz  
da juridicidade seu fim último.  
A relação entre projeto político revolucionário e uso tático do direito é  
enfrentada por meio do tripé Lênin-Stutchka-Pachukanis. Em Lênin, há o  
desenvolvimento de uma teoria da organização política para a concretização do  
processo revolucionário socialista. Preocupado com a especificidade contextual russa,  
à época da revolução, Lênin defendeu a legalização do movimento operário, o que não  
deveria significar, por certo, a “hipertrofia da organização política” (Pazello, 2021, p.  
166). Para Pazello, a posição leninista não deixa dúvidas, “pois significa aproveitar-se  
dos potenciais que a legalidade proporciona, aventando-se, inclusive, que a cilada  
armada não é a da burguesia contra os operários, mas o contrário” (Pazello, 2021, p.  
166).  
Stutchka e Pachukanis, por sua vez, convalidaram o uso tático do direito no  
período da transição revolucionária. Para o primeiro, a extinguibilidade do jurídico é  
necessária, desde que finalizado o processo revolucionário e atingida, portanto, a fase  
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superior da sociedade comunista. Para Pazello, Stutchka “esteve mais preocupado com  
a construção de um direito durante o após-revolução, por força das circunstâncias, do  
que em refletir sobre seu necessário definhamento” (Pazello, 2021, p. 201-202). O  
letão desempenhou, entretanto, função importante no trabalho concreto com o direito,  
prevenindo posturas que remetam a um antinormativismo anarquista.  
É com Pachukanis, contudo, que a crítica marxista ao direito atinge um novo  
estágio. Valendo-se das elaborações teóricas de Stutchka, Pachukanis percebe o  
direito não só como forma fundada nas relações econômicas, mas também como  
detentor de uma especificidade: para o soviético, o sujeito de direito “é o sólido ponto  
de partida para compreender a realidade na qual o direito se insere exatamente porque  
é este sujeito que representa as mercadorias em suas relações de troca” (Pazello,  
2021, p. 212). Quanto ao tema da transição, Pachukanis reconhece a sobrevivência  
do estreito horizonte jurídico burguês, “ainda que o processo revolucionário  
caracterize-se por debelar a hegemonia das relações mercantis no seio da sociedade”  
(Pazello, 2021, p. 231).  
Como não poderia deixar de ser, em uma pesquisa que se pretenda materialista  
e histórica, há a preocupação do autor com as lutas concretas, em especial, com a  
práxis dos movimentos populares latino-americanos. Por certo, elas serão mais bem  
aprofundadas com a publicação do segundo volume da obra, dedicado ao giro  
decolonial do poder e que tem na assessoria jurídica popular o seu elemento-chave.  
No entanto, é possível extrair de Direito insurgente, desde logo, categorias úteis para  
a compreensão do uso político do jurídico no Brasil contemporâneo, a saber, o uso  
tático do direito por povos e comunidades tradicionais.  
A partir de certo entendimento marxiano, povos originários compõem a  
chamada “superpopulação relativa”, fruto da “acumulação de miséria correspondente  
à acumulação de capital” (Marx, 2017, p. 877). Como destaca Pazello, “novas  
subformas da forma geral movimento social, subsumida pelo contínuo originar de  
novos estratos da população centripetamente constituídos, têm no movimento  
operário sua forma originária” (Pazello, 2021, p. 116). Nesse sentido, as bases  
materiais e objetivas do movimento indígena podem ser pensadas desde o movimento  
operário como síntese de formas de revolta. Assim, o movimento social dos  
trabalhadores e dos povos indígenas têm um ponto de partida em comum: a  
expropriação com relação aos seus meios de produção bem como “a submissão de  
sua energia vital a uma estrutura social de opressão” (Pazello, 2021, p. 106).  
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Em que pese o entrelaçamento das resistências históricas, a heterogeneidade  
de lutas e o aprofundamento da crise estrutural do capital promovem a disputa em  
torno de um modelo de transição para uma outra sociabilidade e, consequentemente,  
táticas a serem empreendidas para a superação do modo de produção capitalista.  
Enquanto para uma parcela dos movimentos sociais temas como a transição energética  
e a sustentabilidade não sejam de primeira ordem na agenda revolucionária, para a  
população originária, ciente dos riscos da generalização, o desmatamento zero é  
condição para a manutenção de seus modos de vida. Há, atualmente, departamentos  
jurídicos indígenas distribuídos por todo o território nacional para tornar visível a  
situação dos direitos dos povos originários e reivindicar do Estado brasileiro o  
atendimento das demandas e reivindicações dos povos indígenas.  
Na senda do que propõe Ricardo Pazello sobre a crítica ao direito, a formulação  
teórica do direito insurgente, antes que justo meio entre posições que remetam a um  
socialismo jurídico ou a um anarquismo antinormativista, configura uma “totalidade  
que dialetiza a forma histórica do direito, buscando desvendar sua essência partindo  
dos fenômenos aparentes que o ensejam” (Pazello, 2021, p. 153). Por essa razão,  
cabem aos/às pesquisadores/as militantes e à luta massiva continuar tensionando as  
categorias abstratas com a realidade social, para que, desta forma, uma teoria marxista  
do direito desde a periferia atinja avanços qualitativos na compreensão e contestação  
sobre o direito.  
Referências  
Marx, Karl. O capital: crítica da economia política: livro I: o processo de produção do  
capital / Karl Marx ; tradução Rubens Enderle. 2. ed. São Paulo: Boitempo, 2017.  
(Marx-Engels).  
Pazello, Ricardo Prestes. Direito Insurgente: para uma crítica marxista ao direito. Rio  
de Janeiro: Lumen Juris, vol. 1, 2021.  
Pazello, Ricardo Prestes. Teorias críticas do direito e assessoria jurídica popular.  
Revista Direitos Humanos & Sociedade, PPGD UNESC, v. 2, n. 2, p. 141-161, 2019.  
Disponível  
em:  
em: 26 jan. 2024.  
Pazello, Ricardo Prestes; Almeida, Alexandre Oliveira; D’Carmo, Max (orgs.). As veias  
abertas do futebol brasileiro: memórias crônicas e paixões sociais. Porto Alegre:  
Letra1, 2023.  
Uchimura, G. C.; Ferreira, P. P. P. Retorno ao Direito Insurgente: PAZELLO, Ricardo  
Prestes. Direito Insurgente: para uma crítica marxista ao direito. Rio de Janeiro:  
Lumen Juris, 2021. InSURgência: revista de direitos e movimentos sociais, Brasília,  
v. 7, n. 2, p. 388396, 2021. DOI: 10.26512/insurgncia.v8i2.38970. Disponível  
Verinotio  
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Marina Marques de Sá Souza  
em: 26 jan. 2024.  
Como citar:  
SOUZA, Marina Marques de Sá. Continuando com o direito insurgente. Verinotio, Rio  
das Ostras, v. 29, n. 1, pp. 514-520; jan.-jun., 2024.  
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