RESENHA  
DOI 10.36638/1981-061X.2024.29.1.720  
Pachukanis e o estreito horizonte do Direito  
Resenha:  
PACHUKANIS, Ievguiénii B. O marxismo revolucionário de Pachukanis:  
obras escolhidas. Trad. Anna Savitskaia, Oleg Savitskii. São Paulo: Lavra  
Palavra, 2023, p. 368 p.  
Antonio Ugá Neto*  
No ano de centenário da publicação da primeira edição de sua obra teórica  
seminal, Teoria Geral do Direito e o Marxismo (doravante TGDM), o legado do  
revolucionário soviético Evgeny Pachukanis (2017) encontra um notável  
reconhecimento editorial e acadêmico no Brasil. Inspiradas pelo trabalho pioneiro de  
Márcio Bilharinho Naves (2008), além de diversas coletâneas e dossiês sobre a crítica  
pachukaniana ao Direito, várias obras traduzidas diretamente do russo têm sido  
disponibilizadas em português desde 2017.  
Dentre essas iniciativas, O marxismo revolucionário de Pachukanis, destaca-se  
como uma das mais abrangentes. Além da quantidade de textos traduzidos, a  
amplitude da obra apresentada ao público brasileiro possui dois aspectos principais:  
em primeiro lugar, abarca praticamente todo o período de maturidade da produção  
intelectual do autor soviético, desde textos escritos originalmente em 1922, dois anos  
antes da publicação de TGDM, até 1936, próximo à sua trágica execução pelo Estado  
soviético em 19371. Em segundo lugar, oferece uma variedade temática inédita em  
português. Além dos tradicionais ensaios sobre crítica marxista ao direito, inclui textos  
que exploram temas como história, filosofia e fundamentos da crítica marxista, bem  
como textos de embate político imediato na conjuntura da revolução soviética e do  
marxismo internacional.  
Pela amplitude temática, embora os ensaios da coletânea estejam dispostos em  
*
Doutorando em Direito PPGD-UFMG. Mestre em Serviço Social PPGSS-UFAL. Especialista em Direito  
Processual (UNIT/AL). Bacharel em Direito (FDA/UFAL). Pesquisador do Grupo de Pesquisa Estado,  
Direito e Capitalismo Dependente (CNPQ/UFAL). E-mail: antoniouganeto@gmail.com.  
1 Diferente de outras coletâneas e publicações mais frequentes, a maioria dos ensaios se concentra na  
década de 1930.  
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Antonio Ugá Neto  
ordem cronológica, propomos os agrupar a partir de uma divisão em dois eixos  
temáticos para melhor realizar a exposição.  
A primeira divisão temática são os trabalhos de embate teórico e crítica seja no  
interior do marxismo ou com outras correntes teóricas. Primeiramente, há os artigos  
específicos sobre a conjuntura e história da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas  
(URSS), notadamente: A ditadura do proletariado e a oposição (1928); Sobre a questão  
da luta de classes no interior da transição (1930); A reconstrução do aparato do Estado  
e a luta contra o burocratismo (1934); O bolchevismo e os Soviets de 1905 (1935).  
Também podemos inserir nesta linha ensaios de crítica teórica sobre contribuições de  
autores específicos, uma vez que a tônica é sempre a disputa de interpretações seja  
com teóricos burgueses, seja com a social-democracia da II Internacional ou no interior  
da URSS, são os textos: As novíssimas revelações de Karl Kautsky (A propósito do livro  
A concepção materialista da história) (1929); Hegel: o Estado e o Direito (Em  
homenagem ao centenário de sua morte) (1931); A teoria da luta e vitória do  
proletariado (a propósito do 50º aniversário da morte de Marx) (1931); O leninismo  
segue triunfando (1934); Engels como teórico do marxismo e lutador pelo marxismo  
revolucionário (1936).  
A segunda divisão temática trata da análise sobre a história e estudo do direito,  
presentes principalmente nos textos: Os primeiros meses de existência do Tribunal  
Popular de Moscou (1922); Sobre os momentos revolucionários do Estado e do Direito  
inglês (1927); A propósito da questão da preparação de quadros edificação soviética  
e do Direito Soviético (1934); A constituição de Stálin e a legalidade socialista (1936)  
e O Estado e o Direito sob o Socialismo (1936). Pelos limites de uma resenha,  
priorizaremos o estudo deste eixo temático, ainda que mencionado brevemente  
comentários esporádicos sobre a crítica ao Direito presentes nos demais trabalhos.  
Antes, no entanto, é importante observar que a coletânea impõe uma atenção  
redobrada ao leitor. Como iniciativa de editora independente, é compreensível que,  
em suas mais de 360 páginas, tenha sido dada prioridade à publicação do máximo de  
ensaios do revolucionário soviético. Contudo, como resultado, além das notas da  
tradução e edição, resta apenas uma breve apresentação dos tradutores na orelha do  
livro. Dada a abrangência temporal e temática supracitada, evidencia-se a carência de  
um debate que situe os textos dentro da trajetória intelectual do revolucionário  
soviético. Essa falta é agravada pelo fato de Pachukanis ser um autor que, além das  
mudanças e amadurecimentos teóricos típicos, foi obrigado a realizar diversas  
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autocríticas e até mesmo a modificar radicalmente suas posições ao longo do tempo.  
Portanto, se em geral, a obra de Pachukanis requer uma leitura cuidadosa que  
considere não apenas o contexto histórico e conjuntural, mas também a periodização  
específica das citadas modificações. A atenção deve ser redobrada em relação à  
coletânea que concentra em sua maioria textos posteriores à década de 1930. Dentre  
as propostas de periodização da crítica ao Direito do autor soviético, a proposição do  
teórico brasileiro Márcio Bilharinho Naves (2008) nos parece a mais frutífera.  
É por essa razão que, antes de comentar sobre os ensaios presentes em O  
marxismo revolucionário de Pachukanis, importante apresentar brevemente a proposta  
de Naves (2008, p. 125) para compreensão dessa intricada produção teórica, o autor  
brasileiro caracteriza a substancial modificação das concepções teóricas da crítica ao  
direito originárias de TGDM como processo de autocrítica e recuperação do Direito  
burguês. Adverte, porém, que a identificação do momento no qual Pachukanis realiza  
essa mudança é uma polêmica entre os estudiosos, não apenas de fundo teórico, mas  
pelas determinantes políticas e ideológicas de cada pesquisador.  
Alguns autores localizam o processo de revisão das teses centrais expostas em  
TGDM já em 1925, antes, inclusive da sua segunda (1926) e terceira edição (1927)2.  
Tal perspectiva, no entanto, descaracteriza o cerne do que provoca as principais  
mudanças teóricas do autor soviético: as suas autocríticas realizadas partir da década  
de 1930 não são fruto de uma simples revisão teórica, mas provocadas por uma  
crescente perseguição e amoldamento realizados durante a consolidação do período  
stalinista.  
Contudo, a riqueza da interpretação de Naves (2008, p. 127-128) se expressa  
na divergência com autores que localizam simplesmente a “virada” teórica em 1930,  
afirmando que, embora o período de fato demarque mudanças de concepções, textos  
publicados até 1935 retomam aspectos centrais de TGDM, cujo abandono completo e  
explícito apenas ocorre nos derradeiros ensaios de 1936 (presentes na coletânea),  
apenas neste ano culmina o processo de “recuperação do Direito burguês”. O contraste  
presente entre a produção precedente e as “novas posições” assumidas por  
Pachukanis permitem uma reflexão mais acurada sobre suas principais contribuições  
para a crítica ao Direito, algo que certamente será provocado pela iniciativa da  
coletânea. Embora não se concentre apenas em aspectos jurídicos, alguns dos ensaios  
2 A terceira edição é a base para as traduções disponíveis em português.  
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de O marxismo revolucionário de Pachukanis expressam o percurso e ponto de  
chegada do completo abandono das teses centrais de TGDM, algo que trataremos em  
pormenor ao dialogar sobre tais trabalhos.  
Realizadas as ressalvas, partamos para os comentários sobre os ensaios de  
crítica ao direito. A coletânea é inaugurada pelo pequeno texto Os primeiros meses de  
existência do Tribunal Popular de Moscou (1922), um relato da experiência de  
Pachukanis enquanto juiz-popular, seu principal atributo é demonstrar as dificuldades  
históricas provenientes do período de transição e do exercício jurisdicional após o  
decreto que estabelecia o fim da estrutura jurídica pré-revolução e estabelecia a  
definição de juízes-populares a partir das votações democráticas pelos sovietes.  
Ao defender o decreto, colabora a visão de Pokrovski que, na primeira reunião  
de juristas convocada pelo Soviete de Moscou, expressava que o proletariado não  
poderia deixar o “[...] aparato judicial fora da luta revolucionária”, deixando “[...] os  
tribunais nas mãos de seus inimigos de classe”, afirmando que mesmo nos marcos de  
disputas interburguesas “[...] para atingir os seus fins e incluir entre os magistrados  
seus partidários”. Concluindo a estranheza de se “[...] exigir que o proletariado abra  
mão disso na sua revolução” (Pachukanis, 2023, p. 9).  
O soviete esperava dos juristas revolucionários um trabalho prático, consistente  
em preparar a organização dos tribunais populares e as eleições de juízes-populares  
nos bairros e controlar o aparato judicial. Logo Pachukanis foi eleito juiz-popular,  
mesmo sem estar presente e opinar sobre a questão, algo que o surpreendeu diante  
da ausência de qualquer experiência prática na esfera judicial, uma vez que mesmo  
formado em direito, desempenhava estudos no âmbito da filosofia e teria geral do  
direito (Pachukanis, 2023, p. 10). O boicote dos antigos juízes de paz czaristas e dos  
servidores da justiça, foi um dos primeiros obstáculos para a prestação de contas e  
utilização das estruturas da justiça. Antes da inauguração das Câmaras de Julgamentos,  
realizaram-se reuniões de intenso trabalho que funcionavam como  
[...] uma espécie de cursos de capacitação. A metade dos juízes eram  
oriundos dos operários. Era preciso traçar, às pressas, as linhas  
principais de trabalho para o tribunal popular. As questões  
organizacionais e processuais, as questões do direito material, tudo  
isso requeria solução imediata e as reuniões gerais dos juízes  
populares eram o único lugar em que se elaborava e se generalizava  
a nova prática. Não é de admirar que, inicialmente, elas costumavam  
ser realizadas semanalmente e prolongar-se até as 11-12h da noite.  
(Pachukanis, 2023, p. 12)  
O desafio de Pachukanis enquanto juiz-popular também se deu para encontrar  
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assessores jurídicos entre o proletariado, somente tornado possível a partir  
sensibilização do Soviete de Moscou, sindicatos e fábricas, e a realização de colóquios  
formativos e aulas regulares, cujo resultado prático foi que “[...] da primeira leva de  
assessores jurídicos, conseguimos escolher os juízes populares-operários para  
preencher as vagas desocupadas nas Câmaras de Julgamento” (Pachukanis, 2023, p.  
12). Por fim, conclui que o desenvolvimento dos tribunais populares acontecia em  
consonância com o da República Soviética, perpassando “[...] por todas as etapas da  
luta pela sua existência, sofria de todos os seus males e agora” e, quando da  
publicação do texto “[...] ocupa um lugar firme e indiscutível, tal como o próprio poder  
soviético, em meio ao mundo burguês circundante(Pachukanis, 2023, p. 12).  
O problema de construção de instituições jurídico-políticas e mesmo normativas  
em uma sociedade de transição pós-capitalista impunha aos revolucionários soviéticos,  
além da busca pela superação dos limites do marxismo da Segunda Internacional e  
aprofundamento da crítica marxista, a necessidade de investigação de exemplos  
históricos precedentes. Como a experiência anterior de maior perenidade da luta  
revolucionária do proletariado foi a Comuna de Paris, com a duração de pouco mais  
de dois meses, tornou-se imperioso estudar períodos de transição das revoluções  
anteriores, em especial as capitaneadas pela burguesia. Uma vez que “[...] é indiscutível  
que a natureza genuína das instituições estatais e jurídicas se revela de forma mais  
nítida nos momentos da demolição do sistema social antigo e se sua substituição pelo  
novo” (Pachukanis, 2023, p. 15).  
Razão pela qual a Seção de Direito da Academia Comunista estabeleceu como  
tarefa a investigação das épocas revolucionárias mais relevantes. E. B. Pachukanis ficou  
responsável pelo estudo das revoluções inglesas, o que resultou no ensaio Sobre os  
momentos revolucionários do Estado e do Direito inglês (1927), o mais extenso texto  
da coletânea. Contrariando a lógica dos juristas burgueses que valorizavam a chamada  
“Revolução Gloriosa” de 1688-1689, e a perenidade de suas mudanças institucionais,  
e desprezaram a Revolução de 1642-1649 tratando-a como “Grande Rebelião”, centra  
especial atenção nesta última, argumentando quanto mais massificado e popular um  
processo de revolta e revolução “[...] mais forte fica o desejo dos ideólogos burgueses  
de retratá-lo como uma revolta cega e infecunda que apenas destrói, mas nada cria”  
(Pachukanis, 2023, p. 18), uma vez que “[...] o traço comum dos historiadores  
burgueses é que, para eles, a auto-organização das massas equivale ao caos”  
(Pachukanis, 2023, p. 63). Ao contrário O significado de transformações sociais de  
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grande monta, como é o caso de revoluções, não se limita, é claro, a conquistas  
imediatas e explicitamente expressas na forma de novas instituições e novos cargos”,  
considerando que “[...] as reformas das velhas instituições são, amiúde, apenas  
subprodutos das revoluções” que “[...] são pontos nodais do desenvolvimento social,  
o qual é por elas predeterminado por séculos à frente” (Pachukanis, 2023, p. 18).  
O centro da argumentação do autor soviético não está em observar as simples  
características institucionais e normativas, mas as posições das classes em conflito e  
as lições apreendidas no período de duplo poder e de transição, uma vez que somente  
“[...] as referências ao curso inevitável do desenvolvimento histórico são  
completamente insuficientes”, portanto, defende que “[...] uma investigação realmente  
materialista e marxista deve ter como tarefa elucidar precisamente quais eram as  
classes que travavam a luta e os meios que empregavam” (Pachukanis, 2023, p. 40).  
Para Pachukanis (2023, p. 59, grifo original), são comumente desconsiderados,  
os fatos mais relevantes do ponto de vista revolucionário, quais sejam: “[...]o espírito  
de iniciativa das massas populares, a criação de organizações por sua própria iniciativa,  
organizações que são órgãos de luta revolucionária e, por conseguinte, órgãos  
embrionários do poder revolucionário, o destaque da análise se dá não a história das  
instituições, elementos jurídicos ou da legalidade, mas à luta política de massas. Neste  
cenário, a fundamentado em Lenin, estabelece-se uma disjuntiva no processo  
revolucionário, uma vez que:  
Na realidade, a solução de questões políticas por meio do uso da força  
armada e da renúncia à legalidade está longe de esgotar o conceito  
de revolução, inclusive na esfera puramente política. Deve-se, aqui,  
levar em conta a distinção na qual insistia Lênin: ou a mudança é  
efetivada pelas massas populares que cerram fileiras no próprio  
processo de luta, criando, a partir de baixo, os órgãos da insurreição  
espontâneos estaremos, então, diante de uma revolução popular; –  
ou essa mudança é obra de uma minoria, e, ainda por cima, de uma  
minoria que faz parte das classes possuidoras privilegiadas e que se  
apoia em uma organização pronta, por exemplo, no exército. Nesse  
caso, a massa popular não desempenha um papel ativo e  
independente. Ela é posta de antemão à disposição da elite dirigente  
e está fadada a desempenhar o papel de instrumento cego  
(Pachukanis, 2023, p. 67-68).  
Em resumo, são nítidas na exposição as correlações traçadas com a revolução  
russa e a transição socialista, com destaque para as lições da experiência de duplo  
poder do Conselho de Soldados de Oliver Cromwell, suas insuficiências e vacilações,  
para a duplicidade de poder própria aos sovietes de trabalhadores, camponeses e  
soldados da Revolução Russa e as lições para as demais experiências revolucionárias.  
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Publicado contemporaneamente às primeiras autocríticas explícitas em relação  
às concepções expostas em TGDM, em Hegel: o Estado e o Direito (Em homenagem  
ao centenário de sua morte) (1931) Pachukanis expõe as diferentes possibilidades  
abertas pela obra de Hegel, sua apropriação pelos setores reacionários da burguesia,  
o uso pela social-democracia e reconhece sua importância para o desenvolvimento da  
obra de Marx, Engels e Lenin, as principais influências teóricas do jurista soviético.  
Embora neste exercício não centre atenção nas dimensões jurídicos, retoma um  
dos aspectos centrais de TGDM quando reconhece como relevantes e significativos os  
raciocínios de Hegel sobre a sociedade civil burguesa. Em sua Filosofia do Direito,  
com base na economia política inglesa, o teórico alemão destaca que as pessoas  
particulares se relacionam, se afirmam e satisfazem suas necessidades por meio da  
outra, de tal modo que “[...] a necessidade externa manifesta-se formalmente como um  
contrato”, raciocínio que, para Pachukanis (2023, p. 23) deve ser contraposto às  
passagens “[...] do primeiro volume de O capital, onde Marx estabelece a relação entre  
o fato da troca de mercadoras e algumas formas jurídicas da propriedade e do  
contrato” (Pachukanis, 2023, p. 182). O revolucionário soviético conclui que “[a] teoria  
idealista de Hegel é posta sobre seus próprios pés. As formas jurídicas são explicadas  
pelas relações econômicas que jazem na sua base” (Pachukanis, 2023, p. 182).  
Já em A propósito da questão da preparação de quadros edificação soviética e  
do Direito Soviético (1934), Pachukanis realiza uma crítica da formação e preparação  
dos quadros dos diferentes organismos administrativos do Estado soviético e do  
judiciário (incluindo tribunais e a procuradoria), apontando inúmeras deficiências e  
ressaltando as potenciais consequências drásticas desse despreparo: “[...] uma  
abordagem inábil, politicamente míope, com uma organização ruim, tal processo pode  
converter-se em seu contrário, trazer prejuízo à edificação socialista e fazer o jogo do  
inimigo de classe” (Pachukanis, 2023, p. 259). Para o Pachukanis (2023, p. 273), a  
negligência com a lei soviética, gera “Caos, desordem, desorganização e confusão”, os  
problemas na seleção e formação dos potenciais quadros da edificação soviética e  
para as tarefas jurídicas, as condições estruturais, as desigualdades regionais e a  
ausência de professores qualificados geram consequências nos processos judiciais e  
investigativos:  
Daí, a qualidade correspondente do trabalho dos investigadores, da  
procuradoria e da justiça; daí as queixas constantes quanto à má  
preparação dos casos, quanto ao grande número de decisões que têm  
de ser anuladas, quanto ao grande número de processos instaurados  
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que têm de ser extintos; daí as queixas de que os trabalhadores da  
procuradoria e da justiça não demonstram o devido faro político, não  
sabem focar sua atenção nos aspectos mais importantes do trabalho  
no sentido político-econômico e separar casos ou categorias de casos  
que, em certas circunstâncias, representam o elo decisivo. Daí as  
queixas quanto ao formalismo de um lado, e quanto a exageros, de  
outro (Pachukanis, 2023, p. 263)  
Embora Pachukanis nunca tenha negado a existência e mesmo papel do Direito  
na transição socialista e necessária preparação de quadros para cumprirem tarefas  
jurídicas, o artigo apresenta elementos de revisão das ideias originárias mesmo sem  
ainda afirmar expressamente a existência de um “Direito socialista”, ressaltando uma  
“legalidade revolucionária” e o papel do Direito soviético:  
Quanto ao Direito soviético, ainda deparamos, na prática, com  
atitudes desdenhosas que, às vezes, se estendem, inclusive, às tarefas  
de preparação de quadros correspondentes. É óbvio que, em teoria,  
ninguém contesta a legalidade revolucionária todos são a favor da  
legalidade revolucionária, mas, na realidade, na prática, não raras  
vezes, encontramos uma atitude “esquerdista” desdenhosa em relação  
a toda a espécie de “sutilezas jurídicas” (Pachukanis, 2023, p. 272-  
273)  
A teoria staliniana de fortalecimento do Estado e do Direito durante a ditadura  
do proletariado é afirmada por Pachukanis (2023 p. 274), “[...] o papel do Direito  
soviético e da lei soviética crescerá e a nossa tarefa consiste em fazer a lei soviética  
mais eficaz, mais flexível, mais vigorosa”, uma vez que o Direito protege “[...] a  
propriedade pública socialista, que regula o trabalho e a produção, que determina a  
remuneração segundo a qualidade e a quantidade”, já a lei “[...] pune o inimigo de  
classe e qualquer um que viole a disciplina socialista, qualquer desorganizador da  
produção socialista”, de tal modo que “[...] estão longe de definhar”..  
O artigo evidencia que mesmo inserido no processo autocrítico e revisando  
parte de suas concepções originais, permanece no revolucionário soviético uma ampla  
criticidade sobre a realidade da URSS, denunciando problemas que serão  
corporificados de maneira intensa nos processos de Moscou que o vitimaram poucos  
anos depois. No entanto, a revisão completa de suas teses estão presentes nos dois  
últimos textos da coletânea.  
Ressalve-se, porém, que Pachukanis sempre esteve preocupado em confrontar  
os aspectos teóricos com a realidade concreta do capitalismo e do processo  
transicional, um estudo profundo de suas mudanças teóricas e autocríticas na década  
de 1930 demandaria uma análise também histórica, biográfica e elementos que estão  
para além dos textos escritos, ainda mais considerados apenas os disponíveis na  
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coletânea. Dentre estes, os ensaios de polêmica e disputa no interior do Partido  
Bolchevique, que datam desde 1928, expressam uma posição crítica de Pachukanis  
tanto em relação à “oposição de esquerda”, liderada por Trotsky, quanto à “oposição  
de direita”, capitaneada por Bukhárin. Em suma, ao menos nos ensaios disponíveis, o  
revolucionário soviético nunca deixou de reconhecer o processo soviético e legitimar  
a posição da liderança de Stálin, a aparência do processo e sua adesão política  
impunha do ponto de vista teórico confrontar aspectos de sua teorização presentes  
em TGDM, algo que não pode ser exclusivamente atribuído às coerções que sofreu,  
portanto a tarefa interpretativa impõe imensa dificuldade.  
Nesse diapasão, entre os ensaios presentes na coletânea, principalmente a  
partir de 1930, é possível notar um adensamento nas referências à Josef Stálin, no  
início são realizadas citações esparsas e mesmo protocolares, algumas de fato  
dialogam com a temática de cada ensaio, principalmente quando se tratam de disputas  
no interior da URSS, no entanto, as citações laudatórias passam a ganhar cada vez  
mais destaque e ganham culminância no artigo que destaca o então líder soviético no  
próprio título, A constituição de Stálin e a legalidade socialista (1936). Embora  
apresente aspectos teóricos importantes, o ensaio contrasta com os demais por  
estarem ausentes a riqueza de citações à Marx, Engels, Lenin e outros autores,  
possuindo maior caráter descritivo e mesmo de análise legislativa constitucional.  
Pachukanis (2023, p. 327) afirma o projeto de Constituição então submetido  
ao sufrágio popular como “[...] um grandioso monumento histórico à época stalinista  
da edificação vitoriosa da sociedade socialista sem classes”, uma vez que “[o] primeiro  
plano quinquenal erigiu os fundamentos da economia socialista” e, com o segundo  
plano quinquenal, “[...] esses fundamentos teriam de ser coroados com uma  
superestrutura correspondente”, considerado o “[...] socialismo não como um conceito  
abstrato, mas como uma sociedade socialista concreta, historicamente efetivada[...]” na  
União Soviética (Pachukanis, p. 333-334).  
Com o fim do processo de coletivização do campo e a eliminação dos culaques,  
defende-se o fim da existência das classes exploradoras e a transformação do campo  
em socialista, no entanto, há certa imprecisão e ambiguidade no artigo (ou ao menos  
em sua tradução), em alguns momentos Pachukanis afirma que, como previsto na  
Constituição, a base social do Estado socialista de trabalhadores e camponeses  
pressupõe a existência da divisão de classes, uma vez que “[...] a eliminação das  
distinções de classe entre a classe operária e o campesinato ainda não é um fato  
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consumado, que o processo de supressão das diferenças ainda continua e tem seus  
prazos” (Pachukanis, 2023, p. 331). Para em outros reafirmar existência de “[...] uma  
sociedade sem classes” (Pachukanis, 2023, p. 329), apresentando “operários e  
camponeses” como as “[...] duas camadas sociais [que] constituem o fundamento social  
da URSS” e “[...] cuja aliança é o princípio superior da ditadura do proletariado”,  
camadas sociais que são acompanhadas pela “[...] intelligentsia trabalhadora soviética  
e uma numerosa camada de servidores estatais e sociais [...]” que se juntaram aos  
operários, camponeses e soldados do Exército Vermelho nos renomeados sovietes de  
deputados dos trabalhadores (Pachukanis, 2023, p. 331, grifo nosso).  
O centro da argumentação de Pachukanis (2023, p. 327-328) é que a  
Constituição Stalinista “[...] é a expressão mais generalizada de uma nova  
superestrutura política estatal e jurídica da sociedade socialista” e traz uma miríade de  
contribuições teóricas importantes à “[...] doutrina marxista-leninista socialista e, em  
particular, sobre o papel e o significado do Estado sob o socialismo, assim como sobre  
a democracia socialista soviética”. É dada especial atenção à “[...] doutrina do camarada  
Stálin sobre o fortalecimento do poder de Estado por todos os meios possíveis no  
período de edificação da sociedade sem classes”, tese que é considerada uma  
grandiosa realização da teoria marxista-leninista, uma vez que “[...] dá uma resposta  
concreta sobre caminhos a seguir rumo à fase superior do comunismo”, tratando-se  
[...] não de algum problema particular ou de uma fase de curta duração, mas da questão  
fundamental para todo o período histórico” (Pachukanis, 2023, p. 329). Portanto,  
afirma Pachukanis (2023, p. 329),  
Trata-se do fato de que apenas uma organização estatal poderosa  
poderá garantir uma consolidação mais rápida do sistema econômico  
socialista e dos fundamentos da sociedade sem classes na URSS,  
assim como da vitória do socialismo à escala mundial.  
A ambiguidade no tratamento da existência ou não de classes sociais também  
se dá em relação ao tratamento do Estado da “sociedade sem classes”, uma vez que  
em determinado momento Pachukanis (2023, p. 329) questiona “Se os elementos  
capitalistas realmente foram eliminados e uma sociedade sem classes foi construída  
na URSS, por que é que ainda se conserva o Estado ali?”. Ainda que a qualifique como  
uma pergunta “inocente” e que mascara “[...], com sucesso, a sua verdadeira face de  
um hipócrita, de um inimigo raivoso do socialismo”, tendemos a concordar com a  
interpretação de Naves (2008, p. 150) que, na esteira de N. S. Timasheff, ressalta “[...]  
o sentido crítico dessa passagem, não apenas porque Pachukanis não oferece uma  
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resposta satisfatória à sua pergunta, mas também porque, deixando de fazê-lo, sugere  
que a sociedade soviética pode não ter uma natureza socialista”, embora compreende-  
se que o questionamento principal não é sobre o caráter “socialista”, mas sobre a não  
existência de classes sociais.  
Por fim, o autor soviético afirma que a Constituição coroa uma série de decisões  
partidárias e governamentais realizadas nos anos anteriores e “[...] voltadas para a  
consolidação da legalidade socialista”, de forma que “a lei soviética não é apenas um  
registro que põe por escrito o que foi incorporado na vida, ela é um meio de ação  
ativa sobre as relações sociais, ela é um ato que organiza e dirige a ação das massas”  
(Pachukanis, 2023, p. 337). É então que Pachukanis afirma “[...] a edificação com base  
[na constituição] de um sistema íntegro do direito socialista”.  
A afirmação de um Direito Socialista e uma nova revisão e negação explícita de  
TGDM é realizada no derradeiro ensaio O Estado e o Direito sob o Socialismo (1936),  
com maior densidade teórica e consideravelmente menos ambíguo que o artigo  
anterior, o revolucionário soviético reafirma inicialmente a eliminação das classes  
exploradoras e o Estado soviético “[...] enquanto superestrutura política da sociedade  
socialista sem classes”, diante de uma nova etapa de desenvolvimento ditadura do  
proletariado e da democracia soviética, fundadas nas transformações socioeconômicas  
que resultaram na “[...] criação das relações de produção socialista de um só tipo tanto  
na cidade como no campo” (Pachukanis, 2023, p. 349).  
A partir de uma citação de O Estado e a Revolução de Lenin, Pachukanis (2023,  
p. 352) destaca que tal qual existem diferentes formas de Estado capitalistas, sem que  
se altere a sua essência de ditadura da burguesia, a transição entre a sociedade  
capitalista e sua superação até que se chegue ao comunismo, o Estado proletário  
manterá o seu papel e “[...] apesar de toda a variedade de possíveis formas políticas,  
a ditadura do proletariado será a essência e o conteúdo desse Estado”. De tal modo,  
embora o poder soviético represente uma forma estatal da ditadura do proletariado  
de importância histórica mundial, o Estado soviético é mutável e se desenvolve “[...]  
em ligação com os sucessos na luta pela eliminação das classes” (Pachukanis, 2023,  
p. 352). Afirma ainda, inexistir antagonismo entre Estado socialista e sociedade, o que  
o difere do Estado capitalista (Pachukanis, 2023, p. 354)  
O marxista soviético afirma que apesar de, no fundamental, construída a  
sociedade sem classes, não se chegou a fase superior da sociedade comunista,  
segundo sua interpretação a distinção entre o socialismo e o comunismo “[...] ou entre  
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a fase superior e a fase inferior do comunismo consiste, sobretudo, no fato de que,  
sob o socialismo, que se caracteriza pelo domínio da propriedade social socialista, a  
distribuição de bens se dá segundo o trabalho”, já no comunismo, pressupondo a  
consolidação e o desenvolvimento da propriedade social, [...] o desenvolvimento da  
propriedade social, a distribuição se dará segundo as necessidades”, possibilitando  
“[...] também a supressão das contradições entre o trabalho intelectual e físico e a  
transformação do trabalho em primeira necessidade do ser humano”, resultando,  
somente então, nas circunstâncias nas quais “[...] as pessoas são capazes de trabalhar  
sem ‘capatazes e contabilistas’, sem normas jurídicas e sem força coercitiva, sem o  
Estado (Pachukanis, 2023, p. 352-353, grifo nosso).  
De tal modo, o processo de definhamento do Estado é próprio apenas à etapa  
futura e superior do comunismo, uma vez que “[...] não poderá ser desencadeado sem  
que, antes, desapareça o caráter coercitivo do trabalho”, premissa econômica  
fundamental “[...] para que o processo de definhamento, de adormecimento do poder  
de Estado possa começar”, por desconsiderar tal premissa econômica, a teoria que  
afirmava o início do processo real de definhamento Estado já a partir da Revolução de  
Outubro é qualificada pelo revolucionário soviético como errônea e oportunista  
(Pachukanis, 2023, p. 353). Confusão gerada, segundo Pachukanis (2023, p. 353),  
[...] dessa questão ser confundida com a questão da natureza do  
Estado proletário enquanto semi-Estado, enquanto um Estado que,  
diferentemente dos Estados exploradores, não pretende ser eterno,  
mas, pelo contrário, prepara as condições e premissas para a  
destruição do Estado propriamente dita. Uma vez derrubada a  
burguesia, o proletariado cria um Estado de tipo especial, o qual, em  
oposição aos Estados exploradores, não representa o poder da  
minoria exploradora sobre a maioria, mas, ao contrário, é um  
instrumento da maioria trabalhadora dirigido contra os exploradores.  
Pachukanis (2023, p. 355-356) adensa a necessidade do Estado numa  
“sociedade sem classes” ao afirmar a persistência da luta de classes e a continuidade  
imperativa “[...] tanto do trabalho subsequente de educação e reeducação das massas  
trabalhadoras quanto da repressão dos elementos hostis” que não se renderam e  
permanecem resistindo em luta contra o socialismo “[...] que, que se mascaram, que  
prejudicam”, de tal forma que “[o] aparato de coerção é indispensável para combater  
os inimigos do socialismo”. Também permanecendo “[...] a tarefa de organização da  
defesa contra o cerco capitalista. A defesa da pátria socialista exige preocupação  
incansável com a consolidação do poderio militar do Exército Vermelho e de todas as  
forças armadas” (Pachukanis, 2023, p. 356).  
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Afirma-se, portanto, a manutenção completa do Estado Socialista e do Direito  
Socialista até a etapa superior do comunismo, momento em que “[...] as pessoas  
aprenderão a trabalhar sem capatazes e sem normas jurídicas”, é então que Pachukanis  
(2023, p. 356) reafirma explicitamente a sua autocrítica em relação as concepções de  
TGDM, “[...] para evitar a repetição dos velhos equívocos e da velha confusão em outras  
formas e em outra base”, reelabora a sua interpretação da passagem sobre o Direito  
presente em Crítica ao Programa de Gotha de Marx:  
Visto que a distribuição segundo o trabalho guarda certa semelhança  
com a troca equivalente de mercadorias, Marx e Lênin apontavam que,  
sob o socialismo, o Direito burguês seria completamente abolido  
apenas em relação à propriedade dos meios de produção. Aqui, a  
propriedade privada é substituída pela propriedade social. Mas, na  
esfera da distribuição, vigora um Direito que, condicionalmente, entre  
aspas, podemos chamar de Direito burguês, pois consiste na aplicação  
de uma escala igual a pessoas que são, de fato, desiguais. Ele inclui a  
manutenção da desigualdade efetiva entre pessoas; baseado na  
medida média igual do trabalho, não leva em consideração as  
diferenças de forças, capacidades, estado civil etc. (Pachukanis, 2023,  
p. 356-357)  
Pachukanis (2023, p. 357) reconhece que o “[...] princípio de remuneração  
segundo o trabalho é um princípio socialista”, uma vez que é aplicado “[...] em uma  
sociedade em que ninguém pode dar senão seu trabalho, onde não há exploração,  
nem crises e nem desemprego”. De forma que tal Direito “burguês” não guarda  
qualquer relação com os interesses da burguesia, de tal forma que “[...] esse Direito é  
o Direito do Estado socialista que serve aos interesses dos trabalhadores e do  
desenvolvimento da produção socialista”, portanto, afirmar este “[...] Direito com  
desprezo como um Direito ‘burguês’ só é próprio dos heróis da ‘fraseologia  
esquerdista’, simpatizantes do anarquismo, e dos defensores da nivelação pequeno-  
burguesa”. Assim, se Marx afirmava a “[...] necessidade da distribuição segundo o  
trabalho como um “defeito” da sociedade socialista, é evidente por si mesmo que essa  
expressão tem um significado muito relativo”, somente considerado em relação a fase  
superior do comunismo (Pachukanis, 2023, p. 357).  
A concepção existente em TGDM é considerada como uma exposição  
completamente equivocada e antimarxista, uma vez que no livro o Direito, o Estado e  
a moral são puramente “[...] declarados como formas burguesas que não podem ser  
preenchidas com nenhum conteúdo socialista e devem definhar na medida de  
realização desse conteúdo”, assegura-se, pelo contrário, o caráter proletário do  
Estado, a moral proletária comunista e, ao fim, o “[...] Direito soviético enquanto Direito  
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do Estado proletário, enquanto Direito que serve como instrumento de edificação do  
socialismo” (Pachukanis, 2023, p. 357).  
Critica-se, também, a concepção do “[...] Direito “exclusivamente como uma  
forma que medeia a troca mercantil”, na qual “[a] relação entre os proprietários de  
mercadorias foi proclamada como o verdadeiro conteúdo específico de qualquer  
Direito”, pelo contrário “[...] o principal conteúdo de classe de qualquer sistema de  
Direito que consiste na propriedade dos meios de produção foi empurrado para o  
plano de fundo” (Pachukanis, 2023, p. 358). Pachukanis (2023, p. 358) chama de  
“teoriazinhas esquerdistas” as concepções sobre “[...] o definhamento do comércio e  
do dinheiro, e da transição para a troca direta de mercadorias encontram-se lógica e  
imediatamente ligadas às teorias do ‘definhamento do Estado’ e da ‘erosão da  
superestrutura jurídica’”.  
Apesar de pouco extenso, o artigo traz outras dimensões teoricamente  
relevantes para estudos, contudo, sua exposição extrapolaria os limites da presente  
resenha. Em resumo, a coletânea tende a confirmar o centro da tese de Naves (Naves,  
2008, p. 159-164) de que somente no último período da obra de Pachukanis há uma  
aceitação plena da caracterização e existência de um direito socialista e a consequente  
adoção de uma concepção normativista do direito, que se torna hegemônica na União  
Soviética e se consolida nas interpretações de Pavel Yudin e Andrey Vychinski. Antes  
da culminância desse processo nos textos de 1936, há um destaque do  
reconhecimento do caráter de classe do direito, principalmente com o delineamento  
do caráter proletário do direito soviético, acompanhado pelo paulatino abandono da  
concepção de correlação entre forma jurídica e troca mercantil em favor de uma  
determinação direta do direito pelas relações de produção tratadas genericamente,  
que, por fim, é desconsiderada em benefício de uma determinação normativa do  
direito. O direito passa a ter papel de instrumento na construção do socialismo. De tal  
forma que o “[...] direito proviria das relações de produção, mas essa determinação só  
produz os seus efeitos por meio da mediação do aparelho de Estado”, o papel central  
da norma jurídica e, consequentemente do Estado, é apenas mitigado por uma  
determinação abstrata da superestrutura política enquanto “reflexo” da economia  
(Naves, 2008, p. 151-152).  
Verifica-se, por fim, que a coletânea traz a público ensaios que demonstram o  
caráter multifacetado de Pachukanis, autor que não se circunscreve ao papel de  
“jurista”, mas que, cumprindo tarefas neste terreno, procurou avançar na crítica  
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marxista ao Direito. O acesso aos textos publicadas após suas autocríticas iniciadas na  
década de 1930 demonstram que, mesmo no processo de negação das teses centrais  
da década de 1920, temos um crítico perspicaz e não subordinado totalmente ao  
“marxismo oficial” imposto. É, então, facilitado aos leitores do português realizar uma  
estudo crítico do percurso teórico de Pachukanis e explorar caminhos que ele foi  
impedido de realizar no âmbito da crítica ao Direito.  
Referências  
NAVES, Márcio Bilharinho. Marxismo e direito: um estudo sobre Pachukanis. São Paulo:  
Boitempo, 2008.  
PACHUKANIS, Evgeny. A teoria geral do direito e o marxismo e ensaios escolhidos  
(1921-1929). Tradução: Lucas Simone. São Paulo: Sundermann, 2017.  
Como citar:  
UGÁ NETO, Antonio. Pachukanis e o estreito horizonte do Direito. Verinotio, Rio das  
Ostras, v. 29, n. 1, pp. 521-535; jan-jun, 2024.  
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